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Competências no ensino e treino de jovens futebolistas
Júlio Garganta

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 45 - Febrero de 2002

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    Na fase de construção da presença do adversário pretende-se:

  1. no plano ofensivo, melhorar o controlo da bola, alargando o campo perceptivo do jogador, do espaço próximo ao espaço afastado; desenvolver a capacidade para a conquista e conservação da posse da bola, bem como a aptidão para o duelo;

  2. no plano defensivo, adoptar uma atitude defensiva básica, aprender a orientar os apoios e a enquadrar-se defensivamente, primeiro na marcação individual nominal (marca sempre o mesmo adversário), depois na marcação individual não nominal, de transição individual-zonal (marca sempre o adversário que estiver na sua zona).

    A fase 4 corresponde ao desenvolvimento da noção de cooperação, na sua relação com a aplicação dos princípios do jogo, e pretende-se:

  1. no plano ofensivo, passar do jogo a solo ao jogo combinado, partindo do jogo a 2, base dos jogos desportivos colectivos (Corbeau, 1988), que corresponde já a um alargamento das possibilidades de jogo e possibilitando o aparecimento de situações como a cobertura ofensiva e de combinações como o passa e vai (um-dois) e o passa e segue. Progressivamente, vai-se passando ao jogo a 3, no qual assumem particular importância a velocidade de execução, a criação de linhas de passe (em apoio e em rotura), as coberturas ofensivas, o jogo curto e o jogo longo;

  2. no plano defensivo, passar de um jogo em que os jogadores defendem muito afastados uns dos outros, a outro em que os jogadores encurtem as distâncias entre si, e defendam constituindo um bloco compacto, o que facilita a execução de coberturas defensivas e dobras, bem como a anulação das linhas de passe do adversário. A situação de jogo 3x3 revela-se como a estrutura mínima que garante a essência do jogo, na medida em que reúne o portador da bola e dois recebedores potenciais, permitindo passar duma escolha binária (conservo a bola ou passo-a ao meu colega) para uma escolha múltipla conservo a bola ou posso optar por passá-la ao colega 1 ou ao colega 2). Do ponto de vista defensivo, esta situação permite reunir um defensor directo ao portador da bola para realizar a contenção, e dois defensores relativamente mais afastados do portador da bola, para concretizarem eventuais coberturas, dobras e compensações, respeitando os restantes princípios defensivos: cobertura, equilíbrio e concentração.


As tarefas dos jogadores

    No ensino do Futebol, importa implementar regras de acção específicas que permitam melhorar objectivamente a qualidade do jogo. Para que essas regras sejam assimiladas, deverão as mesmas ser experimentadas e exercitadas quotidianamente, em situações de ensino e treino criadas para o efeito.

    Nos Quadros 2 e 3 (adap. Gréhaigne, 1992) exemplificamos algumas regras de acção que se afiguram importantes para que os jogadores e as equipas assegurem o cumprimento das finalidades e dos objectivos do jogo, nas suas diferentes fases.

Quadro 2 - Regras de acção para melhorar a acção ofensiva
Nível equipa
* Dispôr o número máximo de recebedores potenciais
* Canalizar o ataque pelos espaços mais vulneráveis do adversário
* Alternar jogo directo/indirecto e jogo curto/jogo longo
* Variar o ritmo de jogo
Nível jogador
# Criar linhas de passe ao portador da bola
# Movimentar-se afastando-se dos adversários
# Mascarar a direcção do passe

Quadro 3 - Regras de acção para melhorar a acção defensiva
Nível equipa
* Possuir o número ideal de jogadores entre a bola e a baliza a defender
* Cobrir e reforçar permanentemente o eixo central do terreno (baliza-baliza)
* Enviar o ataque para a periferia (corredores laterais)
* Recuperar a bola nas zonas que nos garantam um ataque eficaz
Nível jogador
# Defender atrás da linha da bola
# Pressionar o portador da bola
# Fechar a linha de progressão do portador da bola para a baliza
# Demorar o ataque do adversário, particularmente quando se é o último defensor
# Obrigar o adversário a cometer erros, reduzindo-lhe o espaço e o tempo para jogar
# Anular as linhas de passe mais importantes


Construção das situações de ensino e treino

    A construção das situações de ensino e treino do Futebol, deve partir duma hierarquização dos requisitos para jogar, tendo em conta, por um lado aquilo que o praticante já conhece e é capaz de fazer, e, por outro, as aquisições fundamentais. Deste modo, a adaptabilidade deverá ser solicitada e estimulada em situações simultaneamente ajustadas ao nível de desenvolvimento do praticante e às exigências do jogo.

    Para que os princípios e as regras de gestão do jogo possam ser vivenciados e interiorizados, afigura-se aconselhável o recurso a um conjunto de variáveis de evolução, cuja utilização permite induzir transformações na configuração dos exercícios, bem como nos comportamentos e atitudes dos jogadores. Aqui referimos algumas dessas variáveis de evolução, de acordo com Gréhaigne (1992):

    Em síntese, gostaríamos de reafirmar um conjunto de orientações para o ensino do Futebol.

  • O ensino do Futebol é o ensino do jogo e, como tal, a componente táctica ocupa uma posição nuclear no quadro das exigências da modalidade. Os demais factores (técnicos, físicos ou psíquicos), devem ser abordados de forma a poderem cooperar para facultarem o acesso a níveis tácticos cada vez mais elevados.

  • Deve assim cultivar-se no praticante de Futebol, e desde os primeiros momentos, uma atitude táctica permanente. Quando na posse da bola, o jogador necessita de utilizar a visão para as funções superiores de leitura do jogo (jogar de cabeça levantada).

  • O desenvolvimento da capacidade de controlo da bola exige a criação de condições de exercitação que passam pela necessidade do praticante efectuar contactos frequentes e diversificados com a bola, para que se verifique uma melhoria do nível de execução.

  • O desenvolvimento da extensão do campo perceptivo é um dos aspectos mais importantes na formação do jogador. Este deve saber jogar nos espaços próprio, próximo e afastado. Se o número de jogadores a referenciar num jogo fôr elevado e se a isso adicionarmos um terreno de jogo com grandes dimensões, a percepção das linhas de força do jogo torna-se mais complexa, dificultando o acesso a níveis de jogo superiores.

  • Ao nível do processo ofensivo, no caso dos principiantes, se as situações de ensino e treino do Futebol não propiciarem a criação de várias ocasiões de finalização, o jogador perde de vista o objectivo central do jogo (o golo) e fixa a sua actuação quase exclusivamente ao nível do jogo de transição, o que conduz a um uso e abuso do jogo indirecto em detrimento do jogo directo.

  • Ao nível do processo defensivo, sugerimos que nas fases iniciais da prática do Futebol, se utilize a defesa individual nominal. Nesta situação, cada jogador tem única e exclusivamente a responsabilidade de marcar o seu adversário directo. Quando o jogador já domina os princípios da marcação individual, somos apologistas da passagem para uma defesa do tipo individual não nominal (ou de transição individual-zonal). Esta situação é já mais complexa e requer que o defensor saiba regular a sua marcação tendo como referência não apenas o seu oponente directo mas também a posição da bola, dos colegas e dos outros adversários. Dentro deste tipo de defesa surgem as situações e noções de cobertura, dobra e compensação, tão importantes para o desenvolvimento do pensamento e atitude táctica do praticante.

  • A situação de jogo 3x3 revela-se como a estrutura mínima que garante a essência do jogo, na medida em que reúne o portador da bola e dois recebedores potenciais, permitindo passar duma escolha binária a uma escolha múltipla, preservando assim a noção importante de jogo sem bola. Do ponto de vista defensivo, reúne um defensor directo ao portador da bola (1° def.) para realizar a contenção e dois defensores (2° e 3°) relativamente mais afastados do portador da bola, para concretizarem eventuais coberturas, dobras e compensações, respeitando os restantes princípios defensivos: cobertura, equilíbrio e concentração.

  • As posições por nós sustentadas conduzem à ideia de que, no ensino do Futebol, deve propôr-se ao principiante um jogo acessível, isto é, com regras ajustadas, com número de jogadores e espaço adequados, de modo a permitir a continuidade das acções, o domínio perceptivo do espaço, uma frequente participação dos jogadores e variadas possibilidades de finalização.


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