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Espaços de esporte & lazer na literatura específica |
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Universidade Estadual Paulista. Instituto de Biociências. Depto. de Educação Física (Brasil) |
José Roberto Gnecco
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http://www.efdeportes.com/
Revista Digital - Buenos Aires - Año 5 - N° 27 - Noviembre de 2000
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Neste século em particular, as atividades de lazer passaram a exigir a intervenção humana para a criação de espaços como condição para a existência do próprio lazer, além da prévia necessidade de tempo livre e uma atitude lúdica por parte de seus usufruidores e, conforme afirma o urbanista paulistano Wilheim, vinculando-se ao problema das áreas livres: "mais recentemente percebeu-se que para esse usufruto [do lazer] era necessário, além de tempo livre, de espaço; e por esse motivo o problema do lazer se ligou e se superpôs ao problema do meio ambiente".1
A degradação da natureza como conseqüência da Revolução Industrial levou ao desaparecimento das áreas verdes naturais com ocupação espontânea pela população, fazendo que mesmo aquelas áreas naturais remanescentes necessitassem da intervenção humana para sua preservação: "para evitar o caráter destrutivo da recreação é necessário o planejamento e organização dos espaços, assim como uma conscientização dos usuários". 2
Curiosamente, o sociólogo francês Dumazedier afirma que o termo recreação origina-se do inglês recreation enquanto recriação, ou seja, a recriação de áreas verdes degradadas pela exploração industrial do capitalismo. A recreação é o que ocorre nestas áreas...
A quase totalidade da população se deslocou para as grandes cidades e se colocou o problema do remanejamento da natureza abandonada pelos habitantes que se transferiram para a cidade... Essas terras abandonadas foram organizadas em parques nacionais para evitar a deteriorização da terra [sic!], da vegetação, para preservar os recursos naturais para o futuro... Este problema dos Parques Nacionais rapidamente colocou o problema de sua animação, para que a população pudesse circular sem estragar, sem destruição e sem se aborrecer. É nesse contexto que nasce e toma grande importância o conceito de recreação. 3
A idéia de intervenção planejada e profissional nas atividades lúdicas do tempo livre nasce, então, de um problema de OCUPAÇÃO ESPACIAL!
A cidade como espaço de lazerParalelamente à degradação da natureza pela Revolução Industrial, acontece o grande crescimento das cidades. Sobre as cidades construídas nos tempos da Modernidade, Dumazedier afirma que:
Nas sociedades industriais, os construtores de cidades tiveram, antes de tudo, um ponto de vista utilitário; a transformação da natureza se fez em detrimento de sua contemplação, as relações sociais têm sido marcadas de maneira primordial pelo trabalho produtivo. 4
Troppmair mostra a presença desta forma de pensar e agir sobre o mundo numa pesquisa sobre cidades médias paulistas:
os poderes municipais olham com especial carinho o desenvolvimento dos distritos industriais em detrimento de problemas ligados à infra-estrutura e planejamento do uso racional do solo, o que vem se refletir de forma negativa sobre as áreas verdes de lazer.5
Mas Dumazedier reflete sobre a cidade como espaço de lazer a partir da ótica de um sociólogo que baseia seus estudos na categoria "revolução cultural e social" do lazer, sendo a cidade um dos condicionantes de tal revolução e, inversamente, espaço de lazer originado de tal revolução. No subcapítulo "Lazer e espaço: necessidade de uma política de desenvolvimento cultural no urbanismo" destaca o "fenômeno" cidade como tendo uma "função cultural de lazer", em oposição ao que o modo de vida no campo oferece:
A cidade é raramente apresentada como centro cultural que engloba ... para todos os meios sociais, a totalidade das atividades de repouso, divertimento, informação desinteressada e participação voluntária na vida cultural de todo gênero e de todo nível. O urbanismo mal começa a tomar consciência do problema geral que o lazer coloca na civilização de hoje.6
Escrito em sua tese de doutorado defendida no ano de 1973, tais idéias vislumbram o significado das cidades pelo olhar otimista de um francês filho do pós-guerra, onde a reconstrução da França sob os auspícios do Plano Marshall possibilitavam a construção de cidades sob padrões "modernos" de civilidade:
A cidade tende a tornar-se cada vez mais um centro de popularização da cultura física, técnica, artística, intelectual, da cultura individual e social, não somente graças a um sistema de telecomunicações aperfeiçoado, mas ainda a um equipamento de organização dos lazeres, a um conjunto crescente de animadores devotados e qualificados em cada um dos setores das atividades de lazer.7
Escrevendo sobre lazer e meio ambiente nas cidades, após ter citado Dumazedier, Wilheim mostra que o leu:
A paisagem urbana também pode ser considerada um espaço para o lazer passivo e contemplativo; na locomoção diária entre o local de trabalho ou estudo e o domicílio, percorrer a cidade pode ser enfadonho e desgastante ou, pelo contrário, revelar-se uma experiência altamente informativa e agradável para os sentidos.8
Citando outros autores, Wilheim afirma que a oferta de oportunidades para a vivência de atividades lúdicas é mais importante que a construção de equipamentos, sendo a cidade um espaço de lazer privilegiado: "não poderia a estrutura de toda a cidade ser adequada à atividade lúdica infanto-juvenil?" 9
Dumazedier,11 destaca ainda que a popularização da cultura nas cidades não se esgota no processo de educação escolar: "mas a escolarização não é hoje senão uma parte ... do desenvolvimento cultural de uma cidade. A função cultural de uma cidade se exprime também em vasta gama de lazeres independentes do setor escolar", tendo como conseqüência que "é mister introduzir o problema do lazer numa política geral do desenvolvimento cultural estendida ao ciclo extra-escolar: assim a ação escolar e a ação extra-escolar, cada uma com suas características próprias, seriam ao mesmo tempo melhor diferenciadas e melhor coordenadas". Como exemplo na área de Educação Física teríamos que o ensino das formas de movimento construídas culturalmente - as modalidades esportivas, as danças e folguedos etc. - seria objeto da educação escolar, enquanto que a continuidade de sua prática seria objeto das ações culturais extra-escolares após o processo de escolarização.
Subordina a construção de equipamentos de lazer a "uma política ousada de reforma da legislação, dos equipamentos e dos homens", pois inútil será o equipamento de lazer se não houver uma reforma na postura da coletividade frente à política de lazer: "tais são os problemas cuja solução o urbanista deveria tentar favorecer pela maneira de conceber, equipar, integrar um espaço apropriado: o espaço de lazer"12 ; vê a própria cidade como um espaço privilegiado de lazer!
O espaço de lazer na cidadeDumazedier propõe que a distribuição dos espaços de lazer na cidade se dê pela aglutinação dos equipamentos em conformidade com a especificidade das categorias de interesses físicos, manuais, artísticos, intelectuais e sociais do lazer a que se fundamentam, o que ele chama de "divisões funcionais, isto é, ... zonas coerentes de atividades com dominantes físicas, artesanais, artísticas, intelectuais e sociais". Em seu entender isto trará melhores possibilidades de coordenação de um sistema de lazer, economia nos custos e otimização das atividades, possibilitando "melhor realizar a polivalência de um mesmo espaço de lazer ou o equilíbrio entre zonas de atividades geograficamente dispersas".13
Ao contrário de Dumazedier, Prado propõe na conclusão de sua dissertação, a partir da opinião fundamentada de diferentes profissionais de lazer, que os equipamentos de lazer integrem os diferentes interesses do lazer:
os equipamentos/instalações destinados a programas integrando várias atividades de lazer e recreação (interesses físico-esportivos, interesses sócio-culturais, etc.) e aqueles diretamente relacionados aos meios naturais, foram indicados como os de maior tendência de desenvolvimento. 14
Voltando a Dumazedier, o espaço de lazer deve simultaneamente reduzir os desequilíbrios sociais como preservar as diferenças culturais, com sua utilização sendo otimizada nos diferentes tempos de lazer: "de fim do dia, de fim de semana, de fim de ano (férias), de fim de vida (aposentadoria)"...15
Ainda Dumazedier:
O espaço de lazer é um espaço diferente dos outros - os da família, da escola, do trabalho, da igreja, etc. É um espaço vivencial, onde o objetivo precípuo é o viver pelo viver, é ter oportunidade de ocupar o tempo livre para exprimir as necessidades individuais, físicas, sociais, artísticas, etc. 16
A classificação dos equipamentos de lazer
Preocupando-me com a classificação dos equipamentos de lazer, verifiquei que, ao contrário do que alguns Autores afirmam (Bruhns)17 , não é de Camargo (1984, p.159) a classificação dos equipamentos de lazer em específicos e não-específicos, seja porque em 1980 Requixa18 já a utiliza, seja porque o livro de Camargo é19 de 1986 e não de 1984, seja porque não tem 159 páginas. Requixa considera fundamental uma boa distribuição geográfica dos tipos de equipamentos conforme o ritmo temporal de sua utilização: "Do ponto de vista genérico, salientamos a importância da localização estratégica dos equipamentos de lazer, para que esse dado posa servir de estímulo a sua utilização". 20 Seus tempos seriam: o diário, o semanal, o de férias ou fim-de-ano e o da aposentadoria. Equipamentos específicos são aqueles construídos, na origem, para a prática de atividades de lazer e equipamentos não-específicos, obviamente, não.
Sob o termo genérico de equipamento de Esporte & Lazer pode-se abranger desde o escorregador a um complexo esportivo com múltiplas instalações para ginástica, futebol, natação etc. No sentido de possibilitar a distinção entre um e outro, já foi criado o conceito de macroequipamentos, os "equipamentos polivalentes de lazer existentes ..., isto é, os clubes e centros sociais que têm várias funções recreativas".21
Para Requixa, como equipamentos específicos temos os "microequipamentos", os de "dimensão média" (médioequipamentos?), os "macroequipamentos" e os equipamentos em espaços extra-urbanos. Vincula os dois primeiros ao lazer diário, o terceiro ao lazer de fim de semana e o quarto ao lazer de férias.22
Os microequipamentos caracterizam-se pela oferta de atividades específicas, dirigidas a usuários de interesses bem definidos, parecendo indicar que o Autor os vincula a somente uma categoria dos interesses do lazer, devendo ser instalados próximos ao local de moradia ou trabalho dos usuários. Como exemplo cita "os centros infantis, os cineclubes, os clubes de fotografia, os ateliês de artesanato, as instituições de ioga e outros". Requixa afirma que podem ser criados com relativa facilidade pela liberação de áreas livres em concentrações residenciais urbanas e administrados pela população do entorno.23
Os equipamentos de dimensão média (médioequipamentos?) caracterizam-se por "atender aos diferentes interesses no lazer (físicos, manuais, artísticos, intelectuais e sociais). Permitem ao indivíduo despertar para outros interesses que não os específicos ... Sua implantação requer estudo mais aprofundado, com a previsão de acesso fácil". Como exemplo cita equipamentos que possuam "cinema, teatro, piscina, quadras de esportes, salas para cursos, áreas de criatividade, etc.". Embora seja construído preferentemente para o lazer diário, também tem uso no lazer de fim de semana.24
Lecturas: Educación Física y Deportes · http://www.efdeportes.com · Año 5 · Nº 27 sigue Ü