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A educação e a promoção da saúde do idoso |
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Mestranda em Educação na Universidade do Estado do Rio de Janeiro |
Soyane de Azevedo Vargas
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http://www.efdeportes.com/
Revista Digital - Buenos Aires - Año 5 - N° 26 - Octubre de 2000 |
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IntroduçãoO envelhecimento populacional é mais evidente do que em meados do século XX. A cada censo realizado, constata-se um aumento do número de idosos. Por exemplo, nos Estados Unidos de 1980 à 1990 houve um acréscimo de 11,2% para 12,5% de indivíduos com 65 anos ou mais, enquanto que, ocorreu uma elevação desproporcional (3,5%) das pessoas que tinham 85 anos ou mais na década de 80 (HOUGH, BARRY, EATHORNE, In: MELLION,1997).
O Brasil, em 1997, contava com uma população de idosos(as) equivalente à 13 milhões e, a previsão do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 1998) é de que o país possa vir a contar com 36 milhões de pessoas com idade igual ou superior à 60 anos em 2020. Especialmente na região sudeste, existe uma concentração de 6.518.218 pessoas idosas, sendo que 5.826.127 destes habitam a área urbana (BRASIL, Ibid.).
Envelhecer pode ser definido como um processo conseqüente de alterações no organismo, demonstradas de forma variável em cada indivíduo e surge com a progressão do tempo da idade adulta até o fim da vida (SINGER, 1981 apud WEINECK, 1991). A expectativa de vida do homem e da mulher pode ser determinada pela capacidade de desempenho orgânico, ou pela disposição para a insuficiência de seus órgãos (WEINECK, 1991). É importante diferençar o processo de envelhecimento natural do patológico, para não incorrer no erro de considerar que o envelhecimento é uma doença.
O envelhecimento populacional vem ocorrendo em virtude dos avanços da tecnologia, da nutrição e da medicina. Além disto a melhoria das condições de higiene e saneamento básico reduziram, por exemplo, a incidência de mortes por doenças infecto-contagiosas que assolavam as populações, principalmente, até o século XVIII. Contribuíram também as reduções das “...taxas de fecundidade, a queda das taxas de mortalidade e a migração” (VERAS, 1994 apud FARIA JUNIOR, 1999, p. 11). Consequentemente, as pessoas passaram a ter uma expectativa maior de sobrevida, passando a existir um número maior de idosos(as).
No entanto, a longevidade não foi acompanhada pela melhoria da qualidade de vida1 dessa população. Segundo Fritjof Capra (1982), basear-se em parâmetros medidos como o da taxa de mortalidade não garante a verificação do tipo de qualidade de vida das pessoas.
O Brasil depara-se com um paradoxo, ou seja, consegue-se manter, num índice ainda elevado, as doenças consideradas de Terceiro Mundo, que estão relacionadas com as condições precárias de vida e com a pobreza, enquanto que eleva-se, significativamente, as doenças que estão relacionadas com a prosperidade e com a complexidade tecnológica, como as doenças crônico - degenerativas2.
Por outro lado, o conceito de saúde sofreu modificações ocorridas em escala mundial desde que a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1947, conceituou saúde não apenas como ausência de doença, mas um estado de completo bem estar físico, mental e social (FARIA JUNIOR, op. cit.). Com, o passar do tempo este conceito, também, veio recebendo inúmeras críticas,
“....seu caráter estático, a sua subjetiva e tautológica, a sua utópica
idéia de bem estar, a sua limitação a esfera individual e a não referência a
dois outros fatores que afetam a saúde como o ambiente e a transcendental propriedade da mente
humana” (FARIA JUNIOR, 1987 apud FARIA JUNIOR, op. cit., p.13).Iniciou-se, em meados dos anos oitenta, a construção de uma nova conceituação denominada de promoção da saúde. Esta idéia objetiva reconhecer a natureza multifatorial da saúde, argumentando que ela depende de fatores como alimentação, habitação, renda, emprego, entre outros (FARIA JUNIOR, op. cit.) e, “contribui para superar a visão funcionalista que ignora a influência das forças históricas, econômicas e dos modos de produção de economia capitalista, sobre a saúde das pessoas” (FARIA JUNIOR, 1991 apud FARIA JUNIOR, op. cit., p.14).
Outra preocupação é com a desmedicalização, que repensa a hegemonia da medicina sobre outras profissões e leva a obscurecer as causas econômicas, sociais e culturais, que influenciam diretamente na qualidade de vida da pessoa; enfatiza o envolvimento comunitário e, sobretudo, valoriza a interface educação e saúde(ibid.).
Pode-se observar que a longevidade não é apenas uma questão de saúde, por extensão é um problema social. O idoso vive situações que o discrimina e o exclui socialmente, Nanci Boutique e Rosa de Lourdes Santos (In: PAPALEO NETO, 1996 p. 82) acreditam que não exista apenas um envelhecer,
“...mas processos de envelhecimento - de gênero, etnia, de classe social, de cultura - determinados
socialmente. As desigualdades do processo do envelhecimento se devem, basicamente, às condições
desiguais de vida e de trabalho a que estiveram submetidas as pessoas idosas.”Este trabalho identifica alguns aspectos responsáveis por essa mudança no tempo de vida das pessoas, mas, também, pontua a relação existente com a qualidade de vida do idoso, através das intermitentes que atuam de maneira negativa na aquisição da promoção da saúde. Ressaltando a importância de uma educação gerontológica para o envelhecimento e no envelhecimento, por acreditar que isto possa, entre outras coisas, contribuir para a melhoria da qualidade de vida dessas pessoas.
Acredita-se também que a prática regular de atividade física seja muito importante para a promoção da saúde. Todavia demonstra-se que fatores como algumas contradições existentes na própria legislação; além da condição econômica, que possui íntima relação com o nível de escolaridade, estabelecem a condição de bem estar, de saúde e do exercício pleno da cidadania das pessoas idosas.
A atividade físicaA importância da atividade física, especialmente para o idoso3, sob o enfoque biológico, está na melhoria do débito cardíaco, diminuição da freqüência cardíaca em repouso, redução do colesterol, queda da pressão sangüínea, maior aptidão cardiovascular, melhor ventilação por minuto e da capacidade vital; além da elevação da densidade óssea, força muscular, flexibilidade, coordenação; também, da melhoria da auto-estima, reduzindo a ansiedade e a depressão (HOUGH, BARRY, EATHORNE In: MELLION, op. cit.).
Segundo Paulo Fernando Leite (1996), a atividade física pode ser fonte de juventude se praticada regularmente, associada a uma dieta e aos hábitos saudáveis; ele também defende que, quando realizada por toda vida, pode retardar a lentidão no tempo de reação, acarretado pelo envelhecimento; estimula o controle do peso, aumentando o gasto calórico e diminuindo o apetite.
Atualmente muitos estudiosos estão preocupados com a questão da inatividade física que leva ao sedentarismo e, algumas vezes, ao aparecimento de graves doenças, principalmente com o avançar da idade. Um dos objetivos da prática regular de atividade física seria a melhoria da qualidade e da quantidade4 de vida das pessoas. Todavia, atribuir tanta responsabilidade para as atividades físicas pode contribuir para desvincular a saúde das questões sociais, político-econômicas e psicológicas. Pois, sendo a adesão a essa prática uma atitude voluntária, pode-se considerar que cada um seja o maior responsável pela sua própria saúde, ocorrendo geralmente a culpabilização da vítima pelos outros e pela própria pessoa.
Sabe-se que além da vida sedentária, existem outros fatores que prejudicam a saúde como dietas hipercalóricas, atitudes estressantes, abuso de drogas e a poluição ambiental. (CAPRA, op. cit.). Para Maria Cecília Minayo (1992) a saúde no Brasil, acima de tudo, é uma questão social que envolve, entre outras coisas, padrão de vida, meio ambiente, saneamento básico, deixando de ser responsabilidade única do indivíduo para uma preocupação coletiva, que engloba a necessidade de participação do Estado.
Para a Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte (CARVALHO et. al., 1996.), as transformações naturais do organismo humano e a ameaça das ‘doenças da civilização’5 podem ser atenuadas com a prática regular de atividade física, prolongando o tempo de funcionamento dos órgãos vitais, “a saúde e a qualidade de vida do homem podem ser preservadas e aprimoradas pela prática regular de atividade física. O sedentarismo é condição indesejável e representa risco para a saúde” (ibid., p.79).
De acordo com todas essas considerações, no entanto, precisa-se ter cautela na associação direta entre atividade física e promoção da saúde, para não reproduzir acriticamente a idéia de que a melhoria da qualidade de vida é um problema de cada pessoa em particular e, principalmente, não acreditar que o status de saúde depende somente de um fator. Talvez haja uma disseminação exacerbada da concepção de que a prática regular de atividades físicas promovem saúde.
“...a morbidade é percebida como um problema exclusivamente individual. O modelo
funcionalista não possibilita o questionamento do desajuste ou insanidade da própria
sociedade por supor antecipadamente que ela é harmônica e sadia” (FONTE e LOUREIRO, 1997, p.127) .Esses autores alertam para o tratamento de cunho funcionalista que o Estado dá a saúde. Entretanto eles admitem que, “realmente o stress social e psicológico, assim como o sedentarismo, podem estar associados ao desenvolvimento de várias doenças, principalmente as crônicas e degenerativas” (ibid., p. 128). Sendo assim, pode-se inferir que a atividade física por si só não é capaz de promover saúde. Contudo, ter uma vida mais ativa com a prática regular de atividade física pode auxiliar significativamente.
Numa revisão preliminar da literatura, observou-se que muitas pesquisas realizadas nas últimas décadas, destinam-se aos benefícios trazidos pela atividade física regular à melhoria funcional daqueles(as) que apresentam algum tipo de problema, como cardiopatias, prevenção de quedas, perda óssea, entre outros (BARRY, RICH, CARLSON, 1993; KRALL, HUGHES, 1994; SPINA, 1993 apud LEITE, 1996; BUTLER et al., 1998). Alguns autores, como por exemplo o professor Alfredo Faria Junior (1999), enfatizam a prática da atividade física num contexto mais amplo, incluindo como uma das metas o exercício pleno da cidadania,
“...pensamos em atividades físicas para toda a população incluída em um
projeto histórico, entendido como a delimitação do tipo de sociedade (ou de organização
social) que se deseja construir e os modos de luta a empregar para a consecução,
a partir das condições atuais... aquele projeto histórico construir-se-ia sobre outra
base social por todos os excluídos...” (FARIA JUNIOR, op. cit., p.30 - 31).Nesse contexto, Alfredo Faria Junior (FARIA JUNIOR, FARIA In: FARIA JUNIOR et al., 1999) acredita numa proposta de programa de atividade física que não se preocupe apenas com o aspecto biológico, mas que inclua as dimensões políticas e sócio-culturais.
A exclusão socialA condição de exclusão social do idoso na atualidade está muito ligada também a sua história de vida. Para uma abordagem mais aprofundada, faz-se necessário analisar os mecanismos responsáveis pela materialização desse processo. Fundamentalmente, pensando no processo histórico no qual o idoso esteve inserido. Assim, observou-se que a condição atual desse grupo se relaciona com as condições de trabalho a que foram submetidos.
O idoso de hoje viveu inserido no mercado de trabalho, numa época de consolidação do modelo capitalista, na fase da industrialização e do início da dependência do capital internacional. Neste período, também, incorporam-se algumas mulheres no mercado de trabalho, em atividades que exigiam pouca qualificação e, nos períodos de guerra mundial, supriam as crises que a própria guerra causava. Além disto, foram influenciados, em sua formação como trabalhadores, pelo populismo de Vargas.
No início do processo de industrialização chegam ao Brasil muitos imigrantes, a utilização de estrangeiros nas indústrias semi-artesanais contribui para transmissão de experiência acumulada pela classe operária européia, mas demonstra, também, uma grande diferença em termos de qualificação, condenando um grande número de analfabetos a preencherem cargos inferiores, de pouca remuneração. O que ampliou a desigualdade social entre os brasileiros.
De certo modo as desigualdades promovem a exclusão (FITUSSI, ROSANVALON, 1997 p. 76). Segundo Ausonia Donato e Cilene Canôas (1996), os próprios direitos sociais se tornam motivo de exclusão, quando se dirigem apenas aos cidadãos que possuem contrato de trabalho, por exemplo.
Esta é a nova questão social6 que se intensifica a partir dos anos 80 e preocupa alguns teóricos que tratam dos problemas sociais. A pessoa idosa ‘economicamente frágil’ (CASTEL, 1997 p. 27) está inserida nos grupos que comumente são considerados excluídos.
Como pensar em promoção da saúde diante dessas condições?
A legislação, o nível de escolaridade e a condição econômicaA legislação brasileira determina que são pessoas idosas aquelas com 60 anos ou mais, entretanto na prática os direitos adquiridos, como filas especiais, gratuidade em ônibus, etc. seguem a média dos países desenvolvidos que é de 65 anos. Este dado representa uma contradição, num país em desenvolvimento, que mantém uma considerável precariedade nos modos de vida, muitas pessoas possuem sua saúde debilitada mesmo antes desse período da vida. Além de que após a aposentadoria a condição econômica tende a ser inferior (FITUSSI, ROSANVALON, 1997).
Esse corte etário leva em consideração os tipos de acesso às condições básicas para se viver mais e melhor, como: assistência à saúde, moradia, saneamento básico, higiene, alimentação adequada, entre outros. De modo geral, não se pode comparar o nível de vida da maioria dos idosos norte - americanos e europeus com a maioria dos idosos brasileiros e africanos por exemplo. Ainda assim, não se pode nem mesmo comparar as condições de vida que têm os habitantes de uma cidade como Curitiba com a população do interior do Piauí.
O IBGE (BRASIL, 1980) fez um levantamento quanto ao nível de escolaridade do idoso: 50,6% eram analfabetos, no ano de 1997 este percentual reduziu para 37,2%, mas ainda é um número significativo (BRASIL, IBGE, 1998). O nível médio educacional é de 1,5 ano, aproximadamente, e a maioria são consideradas analfabetos funcionais por atingir, no máximo, 3 anos de estudo (BRASIL,IBGE, 1999).
Mesmo que a Lei N° 8.842 de 4 de janeiro de 1994, garanta o direito à educação do idoso, em contrapartida, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da educação, que lhe é posterior, não faz nenhum tipo de menção a este assunto.
Estas formas de exclusão a que o idoso é submetido se traduzem em práticas sociais subjetivas e concretas, que ele próprio incorpora em seu dia-a-dia como algo natural e que as próprias instituições as ratificam, não respeitando as próprias leis que foram conquistadas.
A Associação Nacional de Pós-graduação em Educação (ANPED, Caxambu, 1999), considerado encontro de referência de pesquisa em educação, com o tema ‘Diversidade e Desigualdade. Desafios para a Educação na Fronteira do Século’, não apresentou nenhum trabalho que se destinasse à educação do(a) idoso(a) em seu programa.
Em relação a condição econômica, o IBGE (1980) demonstra que 34,6% das pessoas com idade de 50 anos ou mais ganhavam até um salário mínimo, 55,8% ganhavam no máximo três salários mínimos e 28,5% não tinham nenhum tipo de rendimento próprio.
Em 1990, 5% das pessoas com 61 anos ou mais tinham vínculo com a previdência social, que é responsável pelo pagamento dos aposentados, fornecimento de atendimento médico e internações hospitalares. No país como um todo, 40,2% das pessoas com idade igual ou superior à 60 anos recebem até 1 salário mínimo mensal, sendo que 12,15 destes vivem com até meio salário mínimo, caracterizando-os como absolutamente pobres (BRASIL, IBGE, 1999). Numa análise transversal, pode-se relacionar o baixo nível de escolaridade com a precária condição econômica.
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