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PIERÓN & EMONTS (1988, apud ROSADO, 1990) recomendam complementar a análise dos incidentes disciplinares com o comportamento de reação dos professores.
Problemas disciplinares afetam a aprendizagem dos alunos pois percebe-se que, nas classes em que costumam ocorrer, os alunos apresentam dificuldade na aprendizagem e níveis de habilidades motoras mais baixo (DOWNING,1996). Estes problemas também afetam o processo de ensino, dentre outros fatores, por desperdiçar o tempo de aula levando o professor a utilizar cerca de 25 a 30% da mesma tentando administrá-los (RIMMER, 1989). Segundo DOWNING (1996), esta perda de tempo deve-se à falta de eficiência das ações empregadas pelos professores.
Mas como seriam estas ações?
Ao referir-se a crianças na etapa inicial do ensino fundamental, RAMOS (1960, apud NAKAYAMA, 1996) relata que o comportamento é diferenciado de acordo com o gênero. Para os meninos, o mais freqüente é inventar brincadeiras, serem agressivos e irrequietos, enquanto que o comportamento indisciplinado das meninas caracteriza-se pelo conversar durante as aulas.
A diferenciação de comportamento por gênero continua se manifestando nos níveis de escolarização subseqüentes. Na pesquisa de CLOES et alii (1998), professores de garotos relataram maior número de incidentes graves na proporção de 9,8 a 24,8% dos respondentes classificados por anos de experiência no magistério. Uma valorização social do comportamento agressivo e violento por parte dos meninos é indicada como uma provável causa para esta maior incidência comportamental neste gênero.
A pré-adolescência e a adolescência mostram-se como fases da vida em que os problemas graves envolvendo agressividade e violência aumentam em freqüência (até 26,7% das respostas dos professores) quando comparados aos relatados pelos professores que atuam no ensino elementar (9,8%). Comportamentos como agressividade, nervosismo, ausência às aulas, porte de armas, roubo, masturbação (sic) aumentam à medida em que aumenta a idade dos alunos pelo fato de tornarem-se mais independentes em relação à família, menos controlados pelos pais e mais influenciáveis pelo grupo de amigos (HARDY, 1996 apud CLOES et alii,1998)
Professores do sexo masculino, por sua vez, também fazem uso mais freqüente de intervenções físicas e recursos mais autoritários com seus alunos (normalmente do mesmo sexo) quando comparados com as professoras que costumam intervir de maneira mais verbal na proporção de 46,5 % das professoras contra 26,6% dos professores.
De uma forma geral, o comportamento dos professores pode ser categorizado pela aplicação de técnicas de controle comportamental verbal, não-verbal, punitivas, não-punitivas, autoritárias ou persuasivas na tentativa de colocar um fim à infração das regras estabelecidas pelo professor (GNAGEY, 1986 apud NAKAYAMA, 1996). Na pesquisa de CLOES et alii (1998) dos 222 professores que responderam aos seus questionários, de 26,6 a 46,5% afirmaram que a forma de controle comportamental predominante é o diálogo. No entanto, também apontam a adoção de estilos de controle diferente de acordo com o nível em que atuam, sendo que punições são utilizadas com maior freqüência por aqueles que atuam no ensino elementar (35,9%) do que por aqueles que atuam nos níveis subseqüentes (23,7% a 25,7%).
As intervenções verbais tornam-se mais freqüentes à medida em que evolui o nível escolar no qual o professor atua, sendo mencionadas por 35,9% dos que atuam nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, 36,8% dos que atuam nas quatro últimas séries do ensino fundamental e por 40% dos professores do ensino médio. Vale, no entanto, uma ressalva: na maioria das vezes estas intervenções verbais são compostas de críticas e reprimendas. Tais dados corroboram a afirmativa de CARTER (1989) de que as estratégias de ensino para lidar com problemas disciplinares devem ser diferentes de acordo com o nível de escolarização trabalhado. Em sua pesquisa assinala que o que deu certo com os alunos do ensino médio não funcionou com os do ensino elementar.
Na classe dos docentes com mais de 10 anos de experiência no magistério, a punição é apresentada como a forma predominante de controle comportamental (40,6% dos respondentes). Nos professores com menos de 10 anos de experiência, o diálogo aparece como a forma predominante (34%) apesar de ter sido detectada, também, uma alta porcentagem de professores que utilizam os recursos punitivos (25,3%).
Estratégias de trabalho visando minimizar problemas com a disciplina
Mesmo com professores experientes ocorrem problemas de disciplina. Mesmo que a maioria dos alunos sempre esteja envolvida com as tarefas, haverá sempre aqueles que "marcham num ritmo diferente". As técnicas são necessárias para lidar com esta minoria (GRAHAM, 1992).PILETTI (1990), por sua vez, afirma que os recursos tradicionalmente utilizados nas escolas envolvem, basicamente, o uso da força, a chantagem afetiva ou a busca do desenvolvimento da responsabilidade do aluno atribuindo-lhe tarefas de acordo com seus limites e maturidade.
Neste trabalho de revisão encontramos uma situação semelhante, ou seja, os programas mencionados poderiam ser agrupados em dois tipos básicos:
aqueles baseados no "behaviorismo" cujas estratégias de controle comportamental envolvem o estabelecimento e o controle de contingências de reforço, utilizando recompensas, punições e, às vezes, ignorando o comportamento indisciplinado com a intenção de levá-lo à extinção (CANTER, 1976; CARTER, 1989; DOWNING, 1996; GNAGEY,1970; KIRSCH & McBRIDE, 1987; KOUNIN, 1970; McDANIEL, 1986; PIERÓN & EMONTS, 1988; RIMMER, 1989; SIEDENTOP, 1983; TENOSCHOK, 1985; WESTCOTT, 1979)
aqueles que poderíamos denominar de "humanistas" visto que apresentam como princípio a crença de que o caminho para atingir os comportamentos dito disciplinados é através do desenvolvimento da consciência de cada indivíduo para a necessidade das regras e do desenvolvimento da sua responsabilidade para com elas (BERNSTEIN, 1977; FRANCO, 1986; GRAMSCI, 1976; HELLISON , 1985; HOWE & HOWE, 1977; KOHN, 1996; MAKARENKO, 1980; MELLO, 1981; TAYLOR, 1978). De acordo com ROGERS (1978, p. 79), " a disciplina necessária para alcançar os objetivos dos alunos é a autodisciplina, que será reconhecida e aceita pelo estudante como sendo de sua própria responsabilidade."
Há quem rotule os objetivos destas duas formas pedagógicas como:
aquelas que buscam desenvolver a disciplina exterior, entendida como um processo pelo qual um indivíduo se amolda ou consente com um código imposto de fora, um código que não foi elaborado por ele; ou
aquelas que visam desenvolver a disciplina interior, ou seja, visam o desenvolvimento de disposições e atitudes no indivíduo em que o mesmo reconheça o significado dos objetivos educacionais que lhe são propostos. Um indivíduo "disciplinado interiormente" seria aquele capaz de direcionar seus esforços para a aquisição de determinadas aprendizagens mesmo que não esteja constantemente sendo vigiado ou cobrado para isso (PILETTI, 1990).
"O aluno bem comportado pode sê-lo por medo do castigo, por conformismo. Pouco importa: seu comportamento é tranqüilo. Ele é disciplinado (...)" (DE LA TAILLE, 1996, p.10)
Aos educadores cabe a decisão, portanto, sobre que tipo de disciplina e que tipo de comportamento se deseja desenvolver nos alunos.
No entanto, a literatura pedagógica nos alerta para o fato da não existência de um sistema disciplinar infalível e nem de permanente sucesso. Percebemos, também, que na literatura predomina a discussão sobre as causas e definições de questões disciplinares, a apresentação de propostas no sentido de prevenir e solucionar problemas de indisciplina, mas poucos relatos de resultados de programas realmente implementados e avaliados. Tal percepção confirma a afirmação de ESTRELA (1994), segundo a qual
"(...) a carência de modelos de intervenção disciplinar bem alicerçados na investigação experimental reforça a necessidade de incentivar uma atitude científica que leve o professor a procurar as soluções adequadas às diferentes situações de indisciplina, através da análise objectiva dos elementos da situação e que o leve a avaliar as conseqüências da intervenção" (p.101)
É preciso, portanto, que o professor vá desenvolvendo habilidade para analisar as situações em que a indisciplina ocorre, analisar seus determinantes e suas implicações, que tenha controle emocional e que domine estratégias de intervenção que possam ser eficazes em cada caso.
Para que fique melhor ilustrada a característica dos dois tipos básicos de planos e programas de intervenção, preventivos ou não, em incidentes disciplinares, detalharemos, a seguir, alguns deles.
De uma forma geral, estes sistemas são elaborados para ser ensinados aos alunos no início do ano e utilizados quando for necessário.
Segundo GRAHAM (1992), a vantagem de se adotar um sistema disciplinar reside em fornecer ao professor uma estrutura de tomada de decisões, protegendo-o de chegar a impasses. Quando a escola como um todo possui um sistema disciplinar o professor não precisa perder tempo ensinando um sistema próprio aos alunos. Da mesma forma, garante-se na escola uma atmosfera mais consistente para os alunos.
O fato da escola possuir um código disciplinar não garante que todos os professores o sigam igualmente; cada um dá sua interpretação pessoal. O importante é que os alunos aprendam o que esperar de diferentes professores.
A teoria comportamental na qual se baseiam possui como elementos-chave os conceitos de reforço positivo, reforço negativo, extinção, punição, modelação e desensibilização que ROSADO (1990) define como:
REFORÇO POSITIVO. Estímulo agradável e gratificante que informa o aluno ou o grupo que sua resposta comportamental é adequada.
REFORÇO NEGATIVO. Estímulo desagradável que informa o aluno ou o grupo que sua resposta comportamental é inadequada. Podem provocar efeitos secundários como fuga e compensação; consolidação de outros comportamentos nao desejados. EXTINÇÃO= não-reforço do comportamento que se deseja suprimir, ignorar o comportamento é uma forma de não recompensá-lo.
PUNIÇÃO. Comportamento dirigido ao aluno, em conseqüência da quebra de determinadas regras, com o intuito de provocar dor ou um sentimento desagradável, imposto por alguém com autoridade e no sentido de permitir a extinção deste comportamento.
MODELAÇÃO. Emprego sistemático dos princípios de imitação para a aquisição de condutas apropriadas.
DESENSIBILIZAÇÃO. Associação entre objeto fóbico (apresentado de forma real ou simbólica) e estímulos agradáveis, de forma a obter da parte do sujeito atividades incompatíveis com as respostas emocionais provocadas habitualmente pelo agente ansiogênico.
Os sistemas de modificação comportamental podem ser esquematizados da seguinte forma:
Etapa 1. identificação e descrição operacional dos comportamentos de desvio, sua duração e freqüência das circunstâncias em que se manifestam, com o fim de determinar os elementos que exercem uma ação de reforço;
Etapa 2. Planificação da estratégia de eliminação do comportamento desviante (determinação de padrões, de etapas a elaborar, de técnicas a adotar);
Etapa 3. Reforço dos comportamentos desejados;
Etapa 4. Avaliação dos resultados.
Iniciaremos por um dos mais populares e divulgados sistemas disciplinares norte-americano: o Sistema Assertivo de CANTER (1976). Este sistema baseia-se no uso de recompensas e punições extrínsecas.Os preceitos principais do modelo de Canter são os seguintes:
Todos os alunos podem se comportar responsavelmente.
O controle firme (não passivo ou hostil) é justo.
Expectativas razoáveis (regras, comportamento apropriado) devem ser comunicadas claramente.
Os professores devem esperar o comportamento apropriado dos alunos e receber sustentação administrativa e parental para estimulá-lo.
O comportamento apropriado deve ser reforçado enquanto o comportamento impróprio deve ser confrontado com suas conseqüências lógicas.
As conseqüências lógicas por apresentar os comportamentos esperados devem ser claramente comunicadas.
As conseqüências devem ser consistentemente reforçadas sem tendenciosidades ou desvios.
Toda a comunicação verbal e não verbal deve ser firme, com contato visual direto definido entre o aluno e o professor.
Os professores devem praticar mentalmente as expectativas e conseqüências para um uso consistente com os alunos.
Neste sistema disciplinar, o não cumprimento das regras implica em punições. Um exemplo de conseqüências constantes de um sistema disciplinar assertivo é apresentado a seguir:
1ª vez que um aluno quebra uma regra: é advertido
2ª vez que um aluno quebra uma regra: fica 5 minutos fora
3ª vez que um aluno quebra uma regra: fica 10 minutos fora
4ª vez que um aluno quebra uma regra: o professor chama os pais
5ª vez que um aluno quebra uma regra: é levado ao diretor.
Cabe assinalar que nem todos professores adotam um sistema disciplinar. O mais comum é deixar o aluno de fora de uma atividade quando esta é prazerosa pois o afastamento dela é aversivo (punição).
Alguns costumam fazer anotações (em cadernos ou nas paredes) registrando quem foi mandado fora da aula para ter um controle do comportamento do aluno.
Alguns usam relógio para controlar o tempo que o aluno é deixado fora.
Outros dão papel e lápis para que o aluno escreva porque foi tirado da aula e, só depois de escrita esta resposta, é que pode voltar para a aula.
Outros, ainda, pedem para que o aluno dê essa resposta verbalmente antes de poder voltar para a aula. Nos sistemas baseados em recompensas e punições existe uma regra fundamental que os professores devem seguir ao elaborar seus sistemas disciplinares:
"Recompensas devem ser desejáveis e as conseqüências indesejáveis."
Quando o professor opta por um sistema baseado em recompensas extrínsecas é importante que elas sejam desejáveis e as conseqüências do mau comportamento sejam indesejáveis.
Exemplificando tal uso, encontramos referência a professores que concedem bônus diários ou semanais de "tempo livre" para os alunos bem comportados, enquanto aqueles que não se comportaram devem realizar tarefas estabelecidas ou ao comando do professor (GRAHAM, 1992).
Consideramos, no entanto, que esta opção por concessão de "tempo livre", é questionável considerando que as aulas de Educação Física duram tão pouco e talvez quem esteja sendo "recompensado" com a diminuição da sua duração seja o professor.
Outra forma melhor sucedida e muito comum mesmo em escolas brasileiras, é impedir de participar de atividades que realmente apreciem, seja nas aulas de Educação Física ou fora delas (como excursões, por exemplo), aqueles alunos que receberam qualquer anotação por mau comportamento.
Neste sistema é preciso atualizar frequentemente as recompensas pois a mesma recompensa se desgasta com o tempo.
Alguns símbolos como prêmios ou honrarias podem ser eficazes (medalhas, broches, troféus velhos de posse transitória, material esportivo velho que pode ser descartado acompanhados de dizeres como "Super aluno"; "Super criança"; "Bom trabalho"). Neste caso a recompensa é maior do que o valor do objeto. Há quem carimbe o dorso das mãos dos alunos com tinta não tóxica ou que coloque crachás com os dizeres acima.
Dos poucos programas que relatam resultados positivos como um aumento do entusiasmo pelas aulas de Educação Física, menor depredação e pixação dos prédios escolares, melhoria no desempenho motor (apesar de não estatisticamente comprovada), podemos mencionar o implementado por CARTER (1989) intitulado Programa "Champions". Tal programa, aplicado numa escola elementar, consiste na acumulação de pontos pelo desempenho demonstrado durante as aulas. O professor avalia a freqüência do comportamento apropriado, o decréscimo dos inapropriados e o aumento dos níveis de aptidão física e habilidades motoras.
O professor preocupa-se em fornecer conhecimento de resultados aos alunos a todo final de aula e organizar as aulas de maneira que as experiências possam ser bem sucedidas pois adequadas ao nível de compreensão e habilidades dos mesmos, sendo solicitadas em níveis progressivos. Ao atingir um certo nível de pontos, os alunos ganham faixas de campeões havendo cores diferentes de acordo com o nível de pontuação atingido. O professor também oferece como recompensa materiais esportivos conseguidos com algumas empresas patrocinadoras do programa.
Para selecionar as recompensas que serão oferecidas aos alunos, o professor possui dois critérios:
- a recompensa deve ser desejável pelos alunos;
- deve ter baixo custo;
GNAGEY (1970), por outro lado, destaca o que as escolas costumam fazer e que não dão bons resultados: as ameaças e os castigos. Em suas observações, registrou que, após receberem ameaças, alunos começam a roer as unhas, a chupar o lápis, a mexer-se nas cadeiras e a olhar para os lados. Como conseqüências dos castigos, assinala que os alunos aprendem a temer as pessoas e os objetos que estão perto deles no momento em que são castigados. Quando estes castigos são severos, o aluno pode vir a associar este temor com o professor, com a classe ou com a matéria estudada.
Menciona, também, outros erros que professores cometem na tentativa de manter a disciplina em suas aulas: dar ordens genéricas e pouco claras, não indicar claramente que falta foi cometida e quem a cometeu, falta de firmeza quando adverte aos alunos, falta de aproximação física do aluno infrator, utilização de técnicas de controle que enfatizam as qualidades do aluno e não se referem à tarefa que deveria ser realizada, deixar que os alunos percebam que não domina o conteúdo do que está ensinando.
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Año 5 · Nº 18 |
Buenos Aires, febrero 2000
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