Disciplina em aulas de Educação Física
Sheila Aparecida Pereira dos Santos Silva
Lecturas: Educación Física y Deportes | http://www.efdeportes.com/
revista digital | Buenos Aires | Año 5 - Nº 18 - Febrero 2000

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     GRAHAM (1992), faz as seguintes recomendações aos professores no sentido de prevenirem a ocorrência ou de lidarem com os incidentes disciplinares quando ocorrem:

  1. Utilizar maneiras positivas de orientar os alunos (ou seja, evitar humilhá-los contribuindo para que eles diminuam ou destruam o respeito que têm por si mesmos);

  2. Considerar cada incidente em que a ordem é quebrada, em relação às pessoas implicadas no fato, suas necessidades e seu passado (ou seja, não punir alunos como "exemplo" para os demais, mas por algo que tenham feito considerando os antecedentes do relacionamento do professor com os alunos em questão);

  3. Promover um clima no qual o respeito e a confiança mútua sejam possíveis (as pessoas constantemente cerceadas, punidas e humilhadas tendem a desconfiar de si mesmas e dos outros);

  4. Ajudar os alunos a compreenderem a razão de ser dos regulamentos escolares (considerando sua falta de maturidade para compreenderem o mundo adulto e para decidirem a respeito de todas as regras);

  5. Ajudar os alunos a preverem as conseqüências de seus atos (às vezes permitindo que incorram em erros que podem se tornar temas para discussão e avaliação do grupo; temas que sirvam como estímulo para que pensem em formas de trabalhar de forma mais eficiente e harmoniosa com o grupo);

  6. Procurar as causas do comportamento infantil de maneira objetiva e racional, ao invés de reprimir o aluno ou forçá-lo a mudanças para as quais não está preparado;

  7. Ajudar os alunos a compreenderem as causas de seu próprio comportamento e das ações dos outros e a desenvolver meios de solucionar seus próprios conflitos (é possível pedir para que se imaginem no lugar de outra pessoa que está em dificuldades para que aprendam a ver problemas a partir de diversos ângulos).

     Passaremos, agora, à apresentação da filosofia e de algumas estratégias adotadas em programas que visam desenvolver a disciplina interior, ou seja, aqueles que visam ao desenvolvimento da responsabilidade do aluno como também ao desenvolvimento de disposições e atitudes através das quais o significado dos objetivos educacionais que lhe são propostos sejam reconhecidos.

     Na revisão bibliográfica realizada em publicações da área educacional em geral e Educação Física em especial, é possível perceber, nesta área, as orientações comportamentalistas foram incorporadas com mais facilidade e divulgadas com maior freqüência quando contrastadas com as posições pedagógicas de orientação humanista.

     Quando na década de 70 fervilhava o debate na área educacional confrontando as posições comportamentalistas e as humanistas, os defensores desta última orientação defendiam que o envolvimento do aluno com a escola e com as experiências de aprendizagem seria mais efetivo se aqueles envolvidos com a cultura escolar estivessem voltados para o objetivo de melhorar a auto-estima, a auto-confiança, o respeito próprio do aluno (MAKARENKO, 1980; MELLO, 1981; TAYLOR, 1978;) garantindo-lhe, "ainda que abstratamente (sic), a condição de ser dirigente." (GRAMSCI, 1976).

     Para estes educadores, a escola não deveria reduzir suas análises e possibilidades de intervenção apenas ao aspecto psicológico, particularmente ao aspecto afetivo, ou seja, apenas "dar afeto" aos alunos não poderia resolver o problema da indisciplina (BARRETO, 1981). As mudanças necessárias no ambiente escolar como um todo e na ideologia dos educadores deveria contemplar uma disseminação democrática do conhecimento entendendo-se esta orientação como a transmissão do mesmo conhecimento para a classe dominante e para as classes subalternas, inclusive as mesmas regras de conduta e os mesmos comportamentos disciplinados (MELLO, 1981).

     As normas disciplinares devem ser fixadas pelos próprios membros da coletividade escolar, que devem pôr-se de acordo, discutindo com a máxima tolerância e respeito (GRAMSCI, 1976).

     MAKARENKO (1980) defende que os castigos e as medidas coercitivas devem ser evitadas ao máximo; quanto a este aspecto, FRANCO (1986) recomenda que se utilize persuasão e convencimento do aluno e, raramente, a coerção.

     Para MAKARENKO (1980), o trabalho desenvolvido na escola deve ser realizado de forma coletiva de modo a proporcionar ao aluno um sentimento de felicidade e co-responsabilidade. Defende que os códigos disciplinares devem possuir significado para os alunos e, para sua elaboração e manutenção, recomenda a utilização de formas participativas de gestão pedagógica. Para este autor " a disciplina deve ser acompanhada da compreensão da sua necessidade, da sua utilidade, da sua obrigação, do seu significado de classe".

     Na época em que estas discussões estavam ocorrendo (década de 70 e início de 80), encontramos apenas um autor da área da Educação Física (TAYLOR, 1978) que defendia um programa de educação comportamental baseado no desenvolvimento da auto-estima e da inserção social do aluno.

     Este programa denominava-se "Educação Física Preventiva" e tinha como objetivo diminuir a ociosidade, normalmente associada à violência escolar e à formação de hábitos socialmente não-aceitáveis. Envolvia o oferecimento de atividades pouco conhecidas pelos alunos como forma de chamar-lhes a atenção. Envolvia, também, a organização de uma lista de opções de atividades motoras que poderiam ser praticadas fora da escola, elaboradas não só pelo professor de Educação Física mas contando com a participação dos professores de outras disciplinas, com o propósito de que todos pudessem assessorar o planejamento das atividades fora do horário escolar, mesmo que não estivessem presentes no momento de sua realização. Pretendia-se, inclusive, através destas atividades aumentar a participação e a convivência com os amigos e familiares do estudante. No interior da escola, o programa preconizava um acompanhamento mais individualizado, a diversificação das estratégias de ensino, bem como o encaminhamento dos alunos mais talentosos, em termos de habilidades motoras, para as equipes de treinamento.


     Sistemas melhor elaborados e baseados em recompensas intrínsecas surgem na literatura da Educação Física em meados da década de 80 com o trabalho de HELLISON (1985).

     Recompensas intrínsecas, segundo GRAHAM (1992), são aquelas internamente motivadas e que são derivadas de trabalho árduo e dedicação.

     Alguns professores preferem o auxílio das recompensas intrínsecas pois adotam a filosofia que considera que os alunos naturalmente querem fazer as coisas direito e que as recompensas extrínsecas são contraprodutivas a longo prazo.

     O sistema mais popular de motivação intrínseca em Educação Física desenvolvido por HELLISON (1985) é projetado especialmente para levar os alunos a compreenderem e praticarem a auto-responsabilidade.

     O fator motivacional neste modelo é o desejo inato de estar com os outros e ser responsável pelo seu próprio comportamento, muito mais do que a existência de um professor que os recompensa por serem bons.

     Como com outros planos disciplinares, este é explicado claramente aos alunos e estes são incentivados a aceitarem a responsabilidade por seu próprio comportamento e pelo trabalho com os outros.

     Numa tentativa de compreender a evolução do comportamento dos alunos quanto ao objetivo de desenvolver a responsabilidade por si e pelo outro, o autor apresenta cinco níveis:

     NÍVEL 0 - IRRESPONSABILIDADE. Neste nível os alunos são incapazes de assumir a responsabilidade por seu próprio comportamento e também interferem com os colegas através de brigas, intimidações, abusos verbais ou corporais.

     NÍVEL 1 - AUTO-CONTROLE. É um nível de envolvimento mínimo. Os alunos fazem o que professor solicita sem interferir com outros. Não é preciso que o professor dispense muita atenção a cada aluno, embora a maioria deles pareça executar pura e simplesmente os movimentos sem se envolver com as propostas.

     NÍVEL 2 - PARTICIPAÇÃO. Os alunos tornam-se envolvidos nas lições. Trabalham evitando perturbar os outros e demonstram um interesse genuíno em aprender e melhorar.

     NÍVEL 3 - AUTO-RESPONSABILIDADE. Neste nível os alunos são incentivados a começar a assumir a responsabilidade por sua própria aprendizagem. Isto implica que não necessitam trabalhar sobre supervisão direta do professor e que podem tomar decisões independentemente sobre o que necessitam aprender e como conduzir-se para a aprendizagem. Neste nível os alunos são solicitados a programarem seus próprios jogos, seqüências ou danças em grupos pequenos. Quando ainda não estão neste nível, o desafio de trabalhar em grupos e criar suas próprias versões de uma atividade costuma falhar e, sobretudo, gastam mais tempo falando e discutindo do que se movimentando.

     NÍVEL 4 - IMPORTAR-SE COM ou CUIDAR DO OUTRO. Neste nível, além de simplesmente trabalhar com outros, os alunos querem fornecer suporte, dar ajuda aos outros na classe. Neste nível, os alunos provavelmente se oferecerão para trabalhar por um dia com um aluno que seja impopular ou que tenha dificuldades de ajustamento ao grupo sem ser direcionado a comportar-se dessa forma pelo professor.

     Esses níveis são explicados no começo do ano e usados no decorrer do mesmo como referência como uma maneira de incentivá-los a cooperar com o professor e com seus colegas.

     Em que pesem as considerações positivas e negativas referentes a cada um dos dois tipos básicos de sistemas disciplinares apresentados até o momento, cabe reafirmar que acreditamos que o sucesso de sua adoção esteja na dependência direta do professor em identificar características individuais e relacionais de seus alunos, possuir competência técnica para selecionar as estratégias de trabalho mais eficazes para cada situação e ter controle emocional suficiente para manter-se calmo para tomar as decisões que julgar necessárias.


Características dos sistemas disciplinares eficazes
     Visando selecionar o que cada sistema disciplinar pode oferecer de positivo ao trabalho do professor, GRAHAM (1992) selecionou três características dos sistemas disciplinares que tem julgado eficazes.

  1. O sistema é explicado com cuidado aos alunos no início do ano: a explicação é feita com a utilização de exemplos e os alunos são convidados a fazer perguntas de forma a compreenderem porque tal plano disciplinar é necessário. As regras precisam ficar claras como também as conseqüências do mau comportamento.

  2. O professor adere consistentemente aos critérios: ou seja, uma vez que as regras e rotinas foram estabelecidas o professor precisa utilizar sempre os mesmos padrões, o que nem sempre é muito fácil. No entanto é importante que os alunos saibam exatamente o que se espera deles. É comum, com o passar do tempo, uma tendência ao relaxamento ("fazer vista grossa", "hoje pode") e isto pode deixar os alunos confusos.

  3. O diretor, os professores da classe e os pais servem de suporte: ou seja, o professor de Educação Física pode apelar para outras pessoas quando os recursos utilizados em aula já não funcionam. O diretor pode ajudar estabelecendo um local na escola onde o aluno pode ficar quando está prejudicando o bom andamento das aulas; pode ser eficaz chamar os pais para conversar. Nestas conversas, no entanto, recomenda-se não permanecer apenas com as notícias más, ou seja, os pais devem ser informados, periodicamente, sobre as melhoras e progressos de seu filho. Quando se conversa com os pais é preciso especificar bem quais são as queixas, evitando generalizar a crítica para todo e qualquer comportamento do aluno. Costuma ser eficaz quando os pais podem envolver-se nas situações crônicas de mau comportamento.


     Em termos do comportamento do professor no momento em que necessita confrontar-se com os alunos devido a problemas disciplinares, GRAHAM (1992) recomenda as seguintes atitudes, num misto de sistema baseado em punições com o sistema que visa desenvolver a consciência das regras:

  1. Não tomar as questões disciplinares como questões pessoais;

  2. Às vezes é melhor reequilibrar-se emocionalmente para depois lidar com os alunos;

  3. As intervenções são mais eficazes quando se conversa com um pouco de privacidade;

  4. No momento em que o mau comportamento começar a ocorrer, andar em volta, chamar o aluno do lado e efetuar uma intervenção breve. É melhor ocupar os demais alunos para que não fiquem prestando atenção na conversa;

  5. Mais eficaz é chamar o aluno pelo nome, explicar qual regra está sendo violada e dar um intervalo; às vezes é interessante pedir que o aluno fale. Quando isto for pedido é importante ouvir com atenção e respeito e tentar compreender a visão que ele está tendo da situação. Às vezes pode ser contraproducente pedir a versão do aluno, essa decisão só pode ser tomada acertadamente quando o professor conhece seus alunos.

  6. Ao terminar a conversa o professor conclui informando ao aluno a conseqüência predeterminada para esta violação : uma anotação, um tempo-fora, uma perda de tempo-livre...

  7. Parece ser mais eficaz ainda, quando o professor consegue pensar no momento da conversa antes que ela ocorra. Professores experientes também sentem raiva, mas alguns conseguem desenvolver a capacidade de controlá-la e uma comunicação efetuada com calma surte melhores resultados.

  8. Aluno precisa perceber que o que está sendo censurado é o comportamento que violou as regras e não a sua pessoa. Mesmo que um aluno apresente mau comportamento, sua dignidade deve ser preservada.


     Em termos de atuação profissional, existem recomendações tanto no sentido de uma melhor preparação emocional do professor (CLOES et alii, 1998; GNAGEY, 1970; RIMMER, 1989;) como num melhor domínio do conteúdo que ministra e das estratégias de ensino que opta por utilizar (BOYCE, 1997; DOWNING, 1996; GNAGEY, 1970; MCDANIEL, 1986; PIERÓN & EMONTS, 1988; RAFFINI, 1980 apud KIRSCH & McBRIDE, 1987; RIMMER, 1989; SIEDENTOP, 1983; apud ROSADO, 1990; TENOSCHOK, 1985; TODOROVICH & CURTNER-SMITH, 1998) .


Comentários finais
     Tendo apresentado como o tema do comportamento disciplinado tem sido abordado na literatura, constatamos, paralelamente, que o aspecto afetivo da competência do professor tem sido pouco investigado, apesar da nossa experiência profissional no ensino da Educação Física em escolas ter coletado grande número de evidências que este aspecto apresenta tanto peso na atuação docente quanto o domínio do conteúdo e das estratégias de ensino.

     Neste sentido, julgamos que seria interessante que um maior número de pesquisas aplicadas em situações cotidianas de ensino fossem desenvolvidas, focalizando a interrelação entre estas variáveis.

     Por outro lado, o tema necessita ser repensado à luz dos paradigmas construtivistas e das orientações democráticas de ensino, pela escola como um todo e, em especial, pelos professores de Educação Física, visto que a literatura aponta um predomínio massivo de estratégias de modelagem comportamental baseadas na utilização de recompensas e punições, com questionável eficácia quando considerada a durabilidade de seus efeitos.

     Pretendemos, em futuras pesquisas, aumentar a compreensão a respeito do processo de tomada de decisões em relação à adoção de estratégias de ensino pelo docente de Educação Física quando defronta-se com incidentes disciplinares.


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