ISSN 1514-3465
Artes Marciais e Lutas na Educação Física escolar. Revisando a literatura
Martial Arts and Fights in School Physical Education. Reviewing the Literature
Artes Marciales y Luchas en Educación Física escolar. Revisando la literatura
Luciano Uchôa Nunes Filho
nunesfilholu@gmail.com
Professor efetivo da Rede Municipal de Fortaleza
Especialista em Educação Física na Educação Básica
pela Faculdade Única
Graduado em Educação Física Bacharelado e Licenciatura
pelo Centro Universitário Estácio do Ceará
(Brasil)
Recepción: 27/10/2023 - Aceptación: 25/02/2024
1ª Revisión: 20/02/2024 - 2ª Revisión: 21/02/2024
Documento acessível. Lei N° 26.653. WCAG 2.0
Este trabalho está sob uma licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional (CC BY-NC-ND 4.0) https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt |
Cita sugerida
: Nunes Filho, L.U. (2024). Artes Marciais e Lutas na Educação Física escolar. Revisando a literatura. Lecturas: Educación Física y Deportes, 29(313), 195-206. https://doi.org/10.46642/efd.v29i313.7293
Resumo
Muito tem se discutido sobre as Artes Marciais e as Lutas como conteúdos da Educação Física. Com o tempo, e levando em consideração toda a contribuição que tais temas tiveram para a humanidade, o ensino deste passou a ser cada vez mais estimulado. Tal cenário tem evoluído lentamente e esbarra em diversas dificuldades, seja material ou pessoal, para a sua ideal implementação. O objetivo desta investigação é apresentar um apanhado da literatura mais recente que aborda a temática da utilização das Artes Marciais e Lutas nas aulas de Educação Física escolar considerando o contexto da realidade atual. O estudo caracteriza-se como uma revisão narrativa de literatura. Foram pesquisados e analisados 99 artigos e destes, 10 foram admitidos para compor a base deste estudo. Na discussão, apresentaram-se diversos pontos de vista relevantes sobre o tema e a síntese de cada obra foi relatada a fim de apresentar os fatos de maneira coerente. Ao fim deste artigo, pôde-se constatar que as Artes Marciais e as Lutas proporcionam diversos benefícios físicos, sociais e mentais aos alunos. Percebeu-se que os professores relatam dificuldades em tratar de tal tema, devido à falta de material e espaço ou de domínio do assunto, causado por uma formação acadêmica superficial. Notou-se também, que as metodologias mais citadas para a abordagem do conteúdo em questão tem sido a utilização de jogos de oposição, jogos adaptados e exposição do tema por especialistas convidados, sem deixar de lado a ludicidade.
Unitermos
: Artes Marciais. Lutas. Educação Física. Escola.
Abstract
Much has been discussed about Martial Arts and Fights as content in Physical Education. Over time, considering the significant contributions these topics have made to humanity, the teaching of this subject has been increasingly encouraged. However, this scenario has been evolving slowly and faces various difficulties, whether material or personal, in its ideal implementation. The aim of this investigation is to provide an overview of the most recent literature concerning the use of Martial Arts and Fights in school Physical Education classes, taking into account the current reality. This study is characterized as a systematic and qualitative literature review. Ninety-nine articles were researched and analyzed, and of these, 10 were included to form the basis of this study. In the discussion, various relevant perspectives on the topic were presented, and a synthesis of each work was reported to present the facts coherently. At the end of this article, it was evident that Martial Arts and Fights offer numerous physical, social, and mental benefits to students. It was observed that teachers encounter difficulties in addressing this subject due to a lack of resources, space, or expertise in the topic, often stemming from a superficial academic background. Additionally, the most commonly mentioned methodologies for approaching the subject have included the use of opposition games, adapted games, and presentations by invited experts, all while incorporating a playful aspect.
Keywords
: Martial Arts. Fights. Physical Education. School.
Resumen
Mucho se ha discutido sobre las Artes Marciales y las Luchas como contenidos de Educación Física. Con el tiempo, y teniendo en cuenta el aporte que tales temas tuvieron para la humanidad, se empezó a incentivar cada vez más su enseñanza. Este escenario ha evolucionado lentamente y enfrenta varias dificultades, ya sean materiales o personales, para su ideal implementación. El objetivo de esta investigación fue presentar un panorama de la literatura más reciente que aborda el tema del uso de las Artes Marciales y la Lucha en las clases de Educación Física escolar considerando el contexto de la realidad actual. El estudio se caracterizó por ser una revisión narrativa de la literatura. Se investigaron y analizaron 99 artículos y de estos, 10 fueron aceptados para formar la base de este estudio. En la discusión se presentaron varios puntos de vista relevantes sobre el tema y se informó un resumen de cada trabajo para presentar los hechos de manera coherente. Al final de este artículo, quedó claro que las Artes Marciales y las Luchas brindan varios beneficios físicos, sociales y mentales a los estudiantes. Se observó que los docentes refieren dificultades para abordar este tema, por falta de material y espacio o falta de dominio del tema, provocado por una formación académica superficial. También se destacó que las metodologías más citadas para abordar el contenido en cuestión han sido el uso de juegos de oposición, juegos adaptados y presentación del tema por parte de expertos invitados, sin desestimar lo lúdico.
Palabras clave
: Artes Marciales. Luchas. Educación Física. Escuela.
Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 29, Núm. 313, Jun. (2024)
Introdução
Muito tem se discutido sobre as Artes Marciais e as Lutas como conteúdos das aulas de Educação Física desde a regulamentação desta profissão. Com o tempo, e levando em consideração toda a contribuição que tais temas tiveram e têm para a humanidade, o seu ensino passou a ser cada vez mais estimulado. Este cenário tem evoluído lentamente e esbarra em diversas dificuldades, seja material ou pessoal, para a sua ideal implementação. Os professores que pesquisam esse assunto, têm se envidado em apresentar propostas que buscam dar norte àqueles que procuram realizar uma abordagem integral e justa das Artes Marciais e Lutas no contexto educacional.
Sob o olhar de Ferreira, e Branco (2021), as lutas compõem uma parte indispensável da cultura humana, estando presentes desde a pré-história até os dias atuais e possuem grande relevância no desenvolvimento motor, afetivo e cognitivo dos praticantes, por estes motivos elas devem ser amplamente exploradas pelo professor de Educação Física escolar.
Diversos documentos de orientação curricular para o ensino da Educação Física vêm, ao longo do tempo, abordando o conteúdo Lutas ou as Artes Marciais, como os PCNs, Parâmetros Curriculares Nacionais, que já tratavam as Lutas como “disputas em que o(s) oponente(s) deve(m) ser subjugado(s), com técnicas e estratégias de desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão de um determinado espaço na combinação de ações de ataque e defesa [...]”. Posteriormente a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), apresentou uma organização diferente dos diversos conteúdos relacionados à Educação Física, com a definição de que as Lutas são “disputas corporais, nas quais os participantes empregam técnicas, táticas e estratégias específicas para imobilizar, desequilibrar, atingir ou excluir o oponente de um determinado espaço[...]”. (Brasil, 1998, p. 70; Brasil, 2017, p. 206)
Sob essa ótica, Rufino, e Darido (2015) relatam que apesar da seguridade curricular que o conteúdo Lutas possui atualmente, existe pouca abordagem desta temática em cursos de formação superior e tal fato repercute na intervenção docente no âmbito educacional.
Nesse contexto, a realização da presente pesquisa se justifica pela necessidade existente de analisar o estado da arte relacionada ao tema Artes Marciais e Lutas no contexto escolar, colaborando com a contextualização e trazendo novas perspectivas. O objetivo desta investigação é apresentar um apanhado da literatura mais recente que aborda tal temática nas aulas de Educação Física escolar considerando o contexto da realidade atual.
Métodos
Trata-se de uma pesquisa de revisão narrativa de literatura. As etapas do estudo foram: definição do tema, formulação da hipótese, definição dos critérios de inclusão e exclusão, investigação da literatura disponível e relacionada ao tema, exclusão dos artigos que estavam fora do perfil, análise dos estudos selecionados, interpretação dos dados obtidos, e por fim, a discussão e síntese dos resultados.
A pesquisa foi realizada entre os meses de agosto e outubro de 2023. Foram incluídas neste estudo as revisões de literatura publicadas no período compreendido entre 2019 e 2023, em língua portuguesa e disponíveis para leitura na íntegra. Foram excluídas as obras que não se enquadraram no perfil anteriormente descrito, as não condizentes com o tema e as que estavam duplicadas. Os descritores usados na pesquisa foram: "Artes Marciais" OR “Lutas” AND "Educação Física" AND "Metodologia". A plataforma de busca escolhida foi o Google Acadêmico. No ato da pesquisa, foi realizada uma filtragem apenas dos trabalhos do tipo revisão de literatura, sendo esta uma ferramenta da própria plataforma de busca.
Após a realização da consulta na base de dados, foram obtidos 99 resultados, dos quais 13 foram excluídos por não se enquadrarem no perfil proposto e um artigo foi excluído por estar duplicado. Na sequência foi feita a análise aprofundada de cada estudo e nesta fase foram excluídas outras 75 obras pois estas fugiam da temática: Artes Marciais e/ou Lutas no ambiente escolar. Por fim, foram admitidos para compor a base deste estudo, 10 artigos. O fluxograma abaixo ilustra o processo descrito.
Resultados
Na construção deste trabalho foi constatado que diversos autores utilizam as nomenclaturas “Artes Marciais” e “Lutas” para se referirem, de modo geral, a um tema que por vezes se confunde quando dentro do ambiente educacional. Por isso, a partir de agora “Artes Marciais e Lutas no contexto escolar” será tratado pela sigla “AMLs”. Destaca-se também, que a presente pesquisa não tem a intenção de diminuir ou ofender nenhum dos conceitos anteriormente citados. Para Curcino et al. (2023) as artes marciais e as lutas possuem diferentes aspectos: as Lutas consistem no combate direto com o adversário, já as Artes Marciais dizem respeito às técnicas de lutas desenvolvidas no intuito de defesa e que por vezes apresentam uma contextualização filosófica.
Após análise dos artigos escolhidos, foram percebidos três temas centrais, sendo que pelo menos um deles esteve presente em todos os artigos estudados. Os temas em questão foram: “benefícios da implementação das AMLs nas aulas de Educação Física”, “dificuldades apontadas pelos professores ao trabalhar esse tema” e “sugestões e/ou análise de metodologias a serem usadas nas aulas”. A tabela abaixo apresenta a relação dos artigos organizados por tema.
Tabela 1. Artigos organizados por tema principal, autor e ano de publicação.
Benefícios
da implementação das AMLs
nas aulas de Educação Física |
Dificuldades
apontadas pelos professores ao trabalhar esse tema |
Sugestões
e/ou análise de metodologias a serem usadas nas aulas |
Barros (2019). Artes marciais e Educação Física escolar: uma
revisão da literatura. |
Jamaico
et al. (2023). Lutas nas aulas de educação física escolar: revisão
sistemática. |
Silva, e Graça (2020). Possibilidades pedagógicas do ensino da
capoeira na escola. |
Curcino et al. (2023). O ensino das lutas no ambiente escolar:
uma revisão narrativa. |
Lima e Moura (2022). Reflexões sobre o desenvolvimento da
Huka-Huka nas aulas de Educação Física: uma revisão integrativa. |
Santos, Reis e Silva (2023). O professor de educação física
no ensino médio e o trato com o conteúdo lutas: uma revisão
bibliográfica. |
Lima et al. (2022). Estratégias de ensino da esgrima na educação
física escolar: uma revisão integrativa. |
Moura et al. (2019). O ensino de lutas na Educação Física
Escolar: uma revisão sistemática da literatura. |
Silva (2022). Desafios e possibilidades do ensino de lutas nos
primeiros anos do ensino fundamental: uma revisão da literatura. |
|
|
Silva et al. (2020).
Metodologias de ensino e benefícios das lutas e esportes de combate:
uma revisão integrativa de literatura. |
Fonte: Autoria própria
Pode-se perceber, através da tabela acima, que dos 3 artigos se concentraram no tema “benefícios da implementação das AMLs nas aulas de Educação Física”, outros 3 no tópico “dificuldades apontadas pelos professores ao trabalhar esse tema”, e por fim, 4 trabalhos tiveram como objeto de estudo as “sugestões e/ou análise de metodologias a serem usadas nas aulas”. É válido ressaltar que nenhum dos trabalhos analisados deixou de abordar as outras temáticas, porém deram maior ênfase em determinados assuntos, enquanto contextualizaram outros.
Os trabalhos que tinham como tema central os “benefícios da implementação das AMLs nas aulas de Educação Física” focaram em apresentar os diversos benefícios que estão relacionados à prática das AMLs no ambiente escolar e em alguns momentos buscaram justificar, com esses fatos, a presença deste tema em tal ambiente. A ideia principal das pesquisas que abordaram as “dificuldades apontadas pelos professores ao trabalhar esse tema” focaram nas queixas dos professores e em diversas barreiras que por vezes tornam árdua a tarefa de abordar de maneira efetiva, construtiva e crítica as AMLs. Já os achados que foram direcionado as “sugestões e/ou análise de metodologias a serem usadas nas aulas” tiveram como meta apresentar, analisar e sugerir maneiras mais eficientes e confiáveis de se implementar o tema AMLs, corroborando com a tendência de afastamento das metodologias tradicionais relacionadas ao treino.
Discussão
É consenso dos autores investigados que existem diversos obstáculos em se trabalhar AMLs na escola. Silva et al. (2020) destaca que mesmo sendo conhecidas as contribuições positivas das modalidades de Lutas aos seus praticantes, muitos professores relatam dificuldade em abordar tal conteúdo nas aulas de Educação Física escolar.
Curcino et al. (2023) verificou pouca difusão do conteúdo em questão nas escolas e que a própria formação dos professores de Educação Física carece de uma abordagem mais aprofundada sobre o tema. O mesmo autor apontou como fator a ser considerado, que a existência de concepções incorretas que relacionam as AMLs com violência e vandalismo prejudicam a aplicabilidade destas modalidades no ambiente escolar. Moura et al. (2019) descreve o tema Lutas como um produto de intensa veiculação midiática que por vezes tem sua imagem deturpada, causando a ideia de similaridade com a violência e acrescenta que é papel da escola problematizar esses casos.
Para Silva (2022) a formação acadêmica do professor de Educação Física escolar é falha, não sendo capaz de proporcionar aos mesmos, vivência satisfatória no tema AMLs. Lima e Moura (2022) relatam que a formação inicial deficiente influencia de maneira negativa a aplicação do conteúdo Lutas nas aulas de Educação Física. Em contrapartida Moura et al. (2019) afirma que a realidade social em que o professor está inserido influencia fortemente a escolha, ou não, das AMLs como tema a ser ministrado e conclui que a busca do professor por cursos de capacitação que abordem metodologias de ensino das AMLs pode auxiliar o processo didático, porém não garante a sua real inserção nas aulas.
Outro apontamento bastante presente nos achados desta investigação foi a falta de materiais ou espaços apropriados que possibilitem a adequada vivência das AMLs na escola, como dito por Curcino et al. (2023), que relatou também haver considerável insegurança por parte dos docente em conduzirem aulas sobre uma temática que eles não dominam. Em consonância, Moura et al. (2019), alega que esta insegurança dos docentes em trabalhar AMLs resulta na pouca inclusão deste tema nas aulas e sugere que haja uma reestruturação na formação inicial dos professores que possa assegurar a contemplação necessária desse conteúdo.
Jamaico et al. (2023) e Moura et al. (2019) apontam que há real necessidade de melhorar o processo de formação e aumentar o acesso dos docentes ao conteúdo Lutas na formação inicial ou na continuada, proporcionando mais segurança para o professor ao tratar das AMLs nas aulas, ressignificando o ensino desta temática e desvinculando o processo educacional à experiência do professor como possível atleta. Tal processo precisa, também, apresentar abordagem próxima da realidade educacional e afastar-se do ensino apenas técnico.
Tais declarações vão ao encontro do que é dito por Barros, Gabriel, e Darido (2011) que consideram como a maior dificuldade dos professores de Educação Física a ideia equivocada de que é necessário ter vasta vivência pessoal em AMLs para poder ministrar aulas sobre elas. Ademais, a investigação realizada por Hardt (2014), indica que a principal problemática das escolas, no que concerne ao tema AMLs, é a falta de capacitação dos professores devido à falta de experiência ou conhecimento sobre o assunto.
É inegável que a presença da temática abordada nesta pesquisa dentro do ambiente escolar é legítima, porém ainda é necessário reafirmar tal legitimidade. Uma possível maneira de tentar fazer isso é destacar os benefícios que o trato deste tema pode gerar aos alunos. Sob tal ótica, Barros (2019) afirma existir um movimento que objetiva modificar a visão pedagógica sobre as AMLs na Educação Física escolar e que de maneira gradual este processo vem reconhecendo os diversos benefícios da sua implementação. Em consonância, Ferreira (2006, p. 36) assevera que “o ato de lutar deve ser incluído dentro do contexto histórico-sócio-cultural do homem, já que o ser humano luta, desde a pré-história, pela sua sobrevivência”.
Curcino et al. (2023) elenca alguns desses benefícios quanto ao aspecto físico e menciona que no controle e desenvolvimento motor, as lutas possuem grande relevância, principalmente na aquisição deste repertório, por trabalhar com movimentos multiarticulares como saltar, chutar e agarrar. O autor deixa claro, também, que os aspectos mental e social evoluem tanto quanto o físico devido à característica histórica, filosófica e cultural que acompanha as AMLs e que são indissociáveis. Barros (2019) defende que o respeito, tolerância e disciplina, são valores que podem ser construídos através da implementação da AMLs das aulas de Educação Física.
De maneira similar, Silva et al. (2020) retrata a vasta gama de benefícios que são acarretados com a prática das AMLs na Educação Física escolar, tais como: emancipação, autonomia, desenvolvimento emocional integral, além de melhorar a memória, raciocínio e criticidade. Do ponto de vista social podem ser citados a formação cidadã, o respeito, a disciplina, a ética e a não violência. O autor acrescenta que nos achados de sua pesquisa, o fator positivo mais relatado foi o respeito ao próximo e o respeito às regras. Em consonância, Silva, e Graça (2020) concluíram que trabalhar nas aulas de Educação Física AMLs como a Capoeira, que possui grande potencial adaptativo, torna viável a construção de interdisciplinares em toda a educação básica.
Foi percebido durante a realização desta pesquisa que diversos artigos retratam a necessidade das AMLs estarem presentes no contexto educacional ou tratam das diversas queixas dos professores sobre a realidade atual deste tema, entretanto poucas sugestões foram encontradas de como as aulas sobre AMLs podem, de fato, ser ministradas. Santos, Reis, e Silva (2023) puderam observar um fato semelhante e constataram poucas propostas de intervenção relacionadas ao ensino do conteúdo AMLs. Para Santos, e Brandão (2019), a própria produção acadêmica existente muitas vezes se volta apenas para métodos de ensino que não abordam o lado pedagógico, tão necessário no contexto escolar, e acaba constituindo uma discussão isolada dos outros conteúdos da Educação Física.
Para Jamaico et al. (2023) a responsabilidade de buscar as melhores estratégias para o ensino das AMLs é do professor, que deve considerar nesse processo, a coerência, a motivação e a ludicidade. Moura et al. (2019) também propõe ser uma das atribuições do professor a busca pelo distanciamento do tema AMLs da ideia de violência através do debate e da adequada prática pedagógica. Dias, Alencar, e Nunes Filho (2020) destacam a importância da adaptação das AMLs para o contexto educacional e a necessidade de evitar o uso de metodologias de treino como metodologias educacionais.
A busca sobre o “como ensinar” se mostra como mais um desafio da carreira do docente, que precisa buscar em fontes literárias, ou em outros meios, inspirações para sanar tal demanda. É proposto por Curcino et al. (2023) o exemplo do “mini sumô” como possibilidade de atividade prática para o ensino das Lutas. Lima et al. (2022) aponta algumas estratégias que podem ser utilizadas durante o planejamento de uma aula sobre AMLs, como a exposição conceitual e histórica, produção de materiais pelos alunos, jogos que enfatizam as características da modalidade e por fim o tratamento atitudinal, dando ênfase ao respeito e ao cuidado. Essas falas reforçam a de Darido, e Souza Júnior (2015) que apresentam atividades como sumô, cabo de guerra, briga de galo e queda de braço como possibilidades práticas para o ensino das AMLs e destacam, também, a importância do pensamento contra a violência.
Outra preocupação dos professores, percebida durante a realização desta pesquisa, é a necessidade de cativar o interesse dos alunos na atividade que está sendo proposta e isso recai na necessidade de explorar a ludicidade. Nesse sentido, foi revelado por Santos, Reis, e Silva (2023, p. 74), que uma excelente maneira de tratar o conteúdo Lutas “é através de jogos de combate, utilizando o lúdico como veículo para a educação, podendo também utilizar-se de textos, vídeos, imagens, videogames [...]”. É acrescido pelos autores que uma maneira válida de enriquecer a experiência dos discentes é convidar pessoas experientes nesta temática.
Na revisão realizada por Silva (2022, p. 28) constatou-se que os “jogos de oposição/luta/combate são apontados por quase todos os autores como a melhor alternativa de se vivenciar as lutas na escola [...]”. Do mesmo modo, Ferreira, e Branco (2021, p. 256), concluíram que “os métodos para o ensino das lutas na atualidade, nas aulas de Educação Física escolar, se voltam para a utilização dos jogos de luta/combate”. Tais estratégias possibilitam o correto entendimento da lógica interna das lutas apoiado na ludicidade.
Os descritos acima vão ao encontro do que é desenvolvido por Ferreira (2006, p. 40)
“[...] as lutas devem fazer parte dos conteúdos a serem ministrados nas aulas de educação física, seja na educação infantil, ensino fundamental ou médio, ressaltando-se que as lutas não são somente as técnicas sistematizadas como Caratê e Judô. O braço de ferro, o cabo de guerra, as técnicas recreativas de empurrar, de puxar, de deslocar o parceiro do local, as lutas representativas como a luta do sapo (alunos agachados, um tentando derrubar o outro), a luta do saci (alunos de mãos dadas, somente com um pé no chão, tentando provocar o desequilíbrio do parceiro, forçando o colega a tocar com o pé que estava elevado no chão), são apenas alguns exemplos de como se trabalhar as lutas de forma estimulante e desafiadora na aula de educação física. Pode-se levar, em visitas às escolas, especialistas, promovendo palestras, ministrando pequenos cursos ou fazendo demonstrações específicas. Os alunos podem visitar academias de lutas, assistir a filmes e documentários ou, ainda, realizar pesquisas sobre o tema”.
Assim como o componente curricular Educação Física foi aos poucos sendo reconhecido como integrante indispensável do processo de formação do cidadão crítico, o seguimento das AMLs tem sido cada vez mais adaptado de maneira apropriada dentro deste contexto. De acordo com Moura et al. (2019) nota-se uma aproximação do conteúdo AMLs da linguagem pedagógica e da ludicidade com cada vez menos ênfase no ensino da técnica, porém a sistematização deste tema ainda é apontada como um desafio. Além disso, Curcino et al. (2023) esclarece que o ensino das Lutas deve fazer sentido para os alunos, com clareza nos objetivos atribuídos e buscando desenvolver autonomia e senso crítico. Correia (2015) defende que os temas AMLs devem ser tratados de forma responsável pelos professores, considerando sua relevância no contexto do desenvolvimento integral do aluno, de maneira a desmistificar o senso comum negativo que permeia este assunto.
Conclusão
O objetivo desta investigação foi analisar a atual literatura acerca da temática Artes Marciais e Lutas quando inserida no contexto educacional. Pôde-se perceber que diversas obras buscaram apresentar os vários benefícios físicos, mentais e sociais, advindos da implementação desses conteúdos. Outro ponto bastante recorrente foi a necessidade do professor reforçar em sua prática educacional a ideia da não violência, além de buscar reformular a imagem, já alterada pelas mídias, sobre esses conteúdos.
As muitas dificuldades relacionadas ao ensino das AMLs foi tema presente nesta investigação. Foi apresentado de várias formas, as dores dos professores referente à falta de material ou espaço adequado, insegurança causada pelo pouco domínio sobre o tema em questão e principalmente a deficiência na formação acadêmica inicial.
Como propostas de intervenção esta pesquisa constatou que as principais sugestões se ancoram na utilização de jogos de oposição e jogos adaptados, produção de materiais didáticos pelos alunos e exposição do tema por parte do professor ou de um convidado com experiência prática. Destaca-se que a ludicidade é fator de grande relevância que não deve ser deixado de lado e que o procedimento de ensino deve se distanciar da instrução puramente técnica almejando desenvolver senso de criticidade no alunado.
Espera-se que com as contribuições aqui apresentadas possam servir como parâmetro de orientação para os profissionais da Educação Física atuantes na área educacional e que possam inspirar maiores produções acadêmicas sobre este tema tão rico e relevante.
Referências
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