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ISSN 1514-3465

 

Qualidade de vida e funcionalidade em idosos: 

programa de intervenção na atenção primária

Quality of Life and Functionality in Elderly: Intervention Program in Health Primary Care

Calidad de vida y funcionalidad en la persona mayor: programa de intervención en atención primaria

 

Juliane Hochnadel da Silva*

juhochnadel@yahoo.com.br

Felipe de Souza Stigger**

stigger@ufcspa.edu.br

Adriana Torres de Lemos***

adrianatl@ufcspa.edu.br

 

*Graduada em Fisioterapia

pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA)

Pós-graduada em Fisioterapia Intensiva pela Faculdade Inspirar

**Graduado em Fisioterapia pela Centro Universitário Metodista (IPA)

Mestre em Neurociências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

Doutor em Neurociências pela UFRGS

Professor Adjunto do Departamento de Fisioterapia da UFCSPA

***Graduado em Fisioterapia pela Centro Universitário Metodista (IPA)

Mestre em Ciências do Movimento Humano pela UFRGS

Doutora em Ciências do Movimento Humano pela UFRGS

Professora Associada do Departamento de Fisioterapia da UFCSPA

(Brasil)

 

Recepção: 10/04/2023 - Aceitação: 28/06/2023

1ª Revisão: 21/05/2023 - 2ª Revisão: 25/06/2023

 

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Citação sugerida: Silva, J.H. da, Stigger, F. de S., e Lemos, A.T. de (2023). Qualidade de vida e funcionalidade em idosos: programa de intervenção na atenção primária. Lecturas: Educación Física y Deportes, 28(303), 118-134. https://doi.org/10.46642/efd.v28i303.3955

 

Resumo

    Introdução: Embora as evidências atualmente disponíveis sugiram que o exercício físico pode ser benéfico para idosos, ainda há lacunas em relação sua implementação na atenção primária. Objetivo: Avaliar e comparar o efeito de dois programas de intervenção na atenção primária em saúde sobre a qualidade de vida e a funcionalidade de idosos. Métodos: Intervenção com 17 idosos, dos dois sexos, encaminhados pelas Unidades de Saúde. Participantes foram aleatoriamente alocados em dois grupos com frequência semanal de uma (G1=9) e duas vezes (G2=8). Avaliou-se QV (SF-12), depressão geriátrica (GDS-4) e funcionalidade (TUG e TC6) pré e pós-intervenção. Para verificar a diferença entre as médias nos grupos pré e pós-teste, recorreu-se ao Teste t de Student para amostras dependentes Resultados: Os participantes, de 61 a 86 anos, eram 70% eram do sexo feminino, de baixa escolaridade e 70% referiram hipertensão arterial sistêmica. Houve aumento na mobilidade funcional em ambos os grupos, e aumento da distância percorrida no TC6 apenas no G2. Não houve diferença nas dimensões da QV pré e pós-teste. Conclusão: O grupo com frequência semanal de duas vezes apresentou melhora em ambos os testes de funcionalidade e, sendo assim, sugere-se que grupos de idosos na atenção básica que tenham como objetivo melhora da capacidade funcional ocorram, preferencialmente, duas vezes por semana.

    Palavras chave: Envelhecimento. Idosos. Educação em saúde. Exercício físico.

 

Abstract

    Introduction: Although the currently available evidence suggests that physical exercise can be beneficial for the elderly, there are still gaps regarding its implementation in primary care. Objective: To evaluate the effect of an intervention program in primary health care on quality of life (QL) and functionality of elderly. Methodology: Intervention with 17 older adults, of both sexes, referred by the Health Units. Participants were randomly allocated into two groups with weekly frequency of once (G1=9) and twice (G2=8). Quality of life (SF-12), geriatric depression (GDS-4 scale) and functionality (TUG and 6MWT) were assessed before and after intervention program. To verify the differences in pre e pos means dependent t test was used. Results: Participants were between 61-86 years, most female (70%), low education level and 70% reported hypertension. There was an increase in functional mobility in both groups, assessed by TUG, and increased covered distance on the 6MWT in G2. There was no difference in dimensions of SF-12 before and after the test. Conclusion: The group with twice a week frequency showed improvement in both functional mobility tests. Therefore, it is suggested that groups of elderly in primary care that aim to improved functional capacity must occur twice a week.

    Keywords: Aging. Elderly. Health education. Exercise.

 

Resumen

    Introducción: Aunque la evidencia actualmente disponible sugiere que el ejercicio físico puede ser beneficioso para las personas mayores, aún existen lagunas en cuanto a su implementación en la atención primaria. Objetivo: Evaluar y comparar el efecto de dos programas de intervención en la atención primaria de salud sobre la calidad de vida y la funcionalidad de los ancianos. Métodos: Intervención con 17 ancianos, de ambos sexos, derivados por las Unidades de Salud. Los participantes fueron asignados al azar en dos grupos con una frecuencia semanal de una vez (G1=9) y dos veces (G2=8). Se evaluaron la calidad de vida (SF-12), la depresión geriátrica (GDS-4) y la funcionalidad (TUG y 6MWT) antes y después de la intervención. Para verificar la diferencia entre las medias en los grupos pre y post prueba se utilizó la prueba t de Student para muestras dependientes. Resultados: Los participantes, de 61 a 86 años, fueron 70% del sexo femenino, con baja escolaridad y 70% refirió hipertensión arterial sistémica. Hubo un aumento en la movilidad funcional en ambos grupos, y un aumento en la distancia recorrida en el 6MWT solo en G2. No hubo diferencia en las dimensiones de calidad de vida antes y después de la prueba. Conclusión: El grupo de dos veces por semana mostró mejoría en ambas pruebas de funcionalidad, por lo que se sugiere que los grupos de ancianos en atención primaria cuyo objetivo sea mejorar la capacidad funcional se realicen, preferentemente, dos veces por semana.

    Palabras clave: Envejecimiento. Personas mayores. Educación para la salud. Ejercicio físico.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 28, Núm. 303, Ago. (2023)


 

Introdução 

 

    O envelhecimento populacional é consequência da mudança de alguns indicadores de saúde, especialmente da diminuição das taxas de fecundidade e mortalidade e do aumento da esperança de vida (Oliveira, 2019; Azambuja et al., 2020). Este processo, antes observado de forma mais pronunciada nos países desenvolvidos, ocorre atualmente de modo acelerado nos países em desenvolvimento. De fato, de acordo com as estimativas publicadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano de 2019, a população acima de 60 anos atingiria o correspondente à 29.105.377 habitantes, ou seja 13,8% do total da população brasileira (Azambuja et al., 2020). Ainda, a expectativa de vida dos brasileiros, que em 1950 era de aproximadamente 43 anos de idade, possui projeção de atingir os 80 anos até o ano de 2025, colocando o Brasil na sexta população com maior número de idosos do mundo. (Oliveira et al., 2010)

 

    O envelhecimento humano pode ser entendido como um processo individual, universal, dinâmico e progressivo caracterizado por alterações biopsicossociais que modificam a capacidade do indivíduo de adaptar-se ao meio em que vive (Oliveira et al., 2014; Vázquez et al., 2023). Associada ao aumento da expectativa de vida, observa-se no mundo uma grande parcela da população idosa com comprometimentos funcionais e dependência (Prina et al., 2020; Shimokihara et al., 2022). Porém, apesar das altas taxas de dependência na população idosa, envelhecer não é necessariamente sinônimo de doença e inatividade (Dawalibi et al., 2013). Dessa forma, evitar ou postergar a dependência funcional, com o intuito de se obter uma melhor qualidade de vida (QV) no decorrer do processo de envelhecimento, passa a ser meta fundamental não só do governo, mas de todos os setores da sociedade. Por qualidade de vida, considera-se o conceito da Organização Mundial da Saúde (OMS, 1995) que assume como “a percepção do indivíduo de sua inserção na vida, no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. Essa definição reforça a necessidade da atenção integral à saúde, uma vez que envolve múltiplas dimensões e se relaciona a diferentes determinantes sociais.

 

Imagem 1. Muitos idosos praticam exercícios físicos pelo benefício que trazem à saúde

Imagem 1. Muitos idosos praticam exercícios físicos pelo benefício que trazem à saúde

Fonte: Gerador de imagens de Bing (#EFDeportes)

 

    O idoso apresenta aspectos particulares de saúde e necessidades diferentes de indivíduos jovens. Assim, no contexto brasileiro atual, o desafio é o de atender uma população progressivamente mais envelhecida a partir da oferta de serviços e benefícios que permita ao idoso uma vida digna e ativa favorecendo a independência e autonomia (Sociais, 2014). Nesse contexto, é fundamental o desenvolvimento de políticas públicas voltadas para a preservação da independência e da autonomia, como é o caso da Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI) (Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa, 2006). Essa política tem a finalidade de recuperar, manter e promover a autonomia e a independência dos indivíduos idosos, direcionando medidas coletivas e individuais de saúde para esse fim, em consonância com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS). (Duarte, e Moreira, 2016)

 

    Ainda, o Pacto pela Saúde (Portaria GM/MS 399/2006, Brasil, 2006), aprova as diretrizes operacionais para a consolidação do SUS, com três componentes, a ressaltar, o Pacto pela Vida, no qual três, dentre suas seis prioridades, estão diretamente relacionadas ao tema do presente estudo:saúde do idoso, promoção da saúde e o fortalecimento da atenção básica. Outra publicação relevante do Ministério da Saúde é o Caderno de Atenção Básica referente ao envelhecimento e saúde da pessoa idosa, que incentiva a prática corporal/atividade física em grupos no âmbito da atenção básica. (Secretaria de Atenção à Saúde/MS, Brasil, 2006)

 

    No panorama da atenção primária e comunitária, o fisioterapeuta possui papel fundamental em estimular a participação da comunidade nas questões relacionadas à saúde e atuar, principalmente, a partir do incentivo a prática de atividade física e de estratégias de educação em saúde focando desenvolvimento de hábitos de vida saudáveis. (Bispo Júnior, 2010)

 

    Em relação às estratégias de educação em saúde, estudos demonstram que idosos, ao se envolverem nesse tipo de atividade, passam a valorizar e privilegiar os aspectos positivos referentes à própria saúde preocupando-se com seu bem-estar físico, mental e social e a ter maior independência e autonomia (Tahan, e Carvalho, 2010). Ainda, após iniciarem atividades de promoção em saúde, idosos passam a conhecer um número maior de pessoas e sair mais de casa, formando vínculos tanto de amizade como com a equipe e os serviços de saúde.

 

    Além de estratégias de educação em saúde, a prática regular de exercício físico nessa fase da vida se torna essencial para o idoso. Sua prática favorece o envelhecimento exitoso e a manutenção da capacidade funcional (Buckinx et al., 2021), contribuindo com a prevenção de doenças cônicas não transmissíveis (DCNT), e consequente diminuindo o risco de morte (Vázquez et al., 2023). Ainda, o exercício físico possui influência em questões de origem psicológicas como a ansiedade, o estresse e a depressão impactando diretamente na qualidade de vida de idosos. (Figueira et al., 2023; Vázquez et al., 2023)

 

    Embora o Colégio Americano de Medicina do Esporte (ACSM) forneça ampla evidência sobre o papel do exercício para a otimização da saúde, funcionalidade, independência e expectativa de vida (Kraemer et al., 2002; Pollock et al., 1998), muitos programas acabam não sendo viáveis devido à baixa adesão. De fato, mais de 70% dos idosos não realiza os níveis recomendados de exercício físico (Amadasi, e Tinoboras, 2017) o que, a longo prazo, se torna um grave problema de saúde pública. Nesse sentido, a Organização Mundial da Saúde recomenda que todos os países estabeleçam diretrizes nacionais desenvolvendo e implementando políticas e programas nacionais com o objetivo de auxiliar a população a atingir as metas e manter níveis saudáveis ​​de atividade permanecendo fisicamente ativas e melhorando sua saúde. (Bull et al., 2020)

 

    Evidências demonstram que protocolos com menores frequências semanais podem apresentar-se como uma opção viável e de maior adesão (Chin A Paw et al., 2006; DiFrancisco-Donoghue et al., 2007), além de serem mais aplicáveis no contexto da atenção primária. Assim, considerando que programas multicomponentes realizados com frequência de uma vez na semana, associados à estratégias de educação em saúde, possam ser práticos, de menor custo aos serviços de saúde e ainda consigam produzir benefícios semelhantes aos programas realizados duas vezes na semana, o objetivo do presente estudo foi avaliar e comparar o efeito de dois programas de intervenção na atenção primária em saúde sobre a qualidade de vida e a funcionalidade de idosos.

 

Métodos 

 

    Trata-se de um estudo de intervenção, realizado em um Centro de Saúde na cidade de Porto Alegre/RS. A amostra, voluntária, foi composta por 17 idosos, alocados em dois grupos de intervenção com duração de 12 semanas: G1 - grupo com frequência semanal de uma vez (12 encontros), e G2 - grupo com frequência semanal de duas vezes (24 encontros). Idosos usuários das unidades de saúde vinculadas a este Centro de Saúde foram convidados a participar do estudo através de cartazes distribuídos pelas unidades e convite realizado pelos profissionais de suas equipes de saúde. Aqueles que aceitaram participar do estudo, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Foram aplicados os seguintes instrumentos: anamnese elaborada pelos autores (contendo questionamentos sobre dados sociodemográficos, doenças pregressas e hábitos de vida), o 12-Item Short Form Health Survey (SF-12) (da Cruz et al., 2012; Boehlen et al., 2022) para avaliação da qualidade de vida, escala de depressão geriátrica na versão com quatro itens (GDS-4) (van Marwijk et al., 1995; Tavares et al., 2023), os testes Time Up and Go (TUG) (Bretan et al., 2013) e teste de caminhada de seis minutos (TC6) (Araújo et al., 2006), ambos para avaliação da funcionalidade e a ocorrência de dor. A pontuação do SF-12 foi computada para as dimensões física (PCS) e mental (MCS). Em relação à escala GDS-4, duas ou mais respostas negativas foram categorizadas como depressão (van Marwijk et al., 1995). Quanto ao TUG, foi mensurado o tempo despendido, em segundos, para realização do teste e, para o TC6, a distância, em metros, percorrida em seis minutos. Para a ocorrência de dor, os participantes eram questionados a responder sim ou não para a ocorrência de dor. Todos os testes e questionários foram reaplicados após 12 semanas.

 

    A coleta dos dados foi realizada por avaliadores previamente treinados. Foram excluídos do estudo idosos que não obtiveram frequência mínima de 75%, que apresentassem restrições físicas que limitassem o acompanhamento das atividades, aqueles que fizessem uso de dispositivos auxiliares e/ou que abandonaram o programa antes do seu término. Ainda, desconsiderou-se no tratamento dos dados, os resultados de questionários de idosos que não atingiram os pontos de corte recomendados no Mini Exame do Estado Mental (MEEM) (Lourenço, e Veras, 2006).

 

    Assim, dos 47 participantes inicialmente avaliados, 17 cumpriram os critérios de inclusão para o estudo: sendo estes divididos em G1 (9 participantes) e G2 (8 participantes).

 

    O presente estudo foi aprovado pelo comitê da instituição de ensino(CAAE: 40232414.2.0000.5345, número do parecer: 996.636) e da secretaria de saúde do município (CAAE: 40232414.2.3001.5338).

 

Programa de Intervenção 

 

    O programa compreendeu encontros semanais de uma (G1) ou duas vezes (G2) na semana, com duração de 12 semanas, o que totalizou 12 ou 24 encontros ao longo do protocolo do estudo, respectivamente. Cada encontro foi organizado para ocorrer em 50 minutos, iniciando com um aquecimento de dez minutos e finalizando com um alongamento/relaxamento de cinco minutos. A parte central do treinamento era composta por exercícios resistidos e isométricos, preferencialmente envolvendo membros inferiores, e aeróbicos. Cada componente do exercício teve três séries, cada uma realizada com 12-15 repetições. Nos exercícios isométricos os participantes foram instruídos a manter a posição ou a contração por 6-10 segundos. A carga dos exercícios foi gradualmente aumentada e ajustada de acordo com as habilidades/individualidade dos participantes mantendo intensidade moderada conforme a escala de percepção subjetiva de esforço com 10 itens (4-6).

 

    As ações educativas foram realizadas conforme cronograma previamente estabelecido, não ocorrendo em todos os encontros, cujos temas foram definidos em conjunto com os próprios participantes. Os temas abordados foram: hipertensão arterial sistêmica (HAS), obesidade, sexualidade e doenças sexualmente transmissíveis, posturas corretas nas atividades de vida diárias, diabetes e alimentação adequada, dores musculoesqueléticas e a importância do exercício físico. Ainda, o programa contemplou atividades recreativas e de lazer para integração entre os participantes.

 

    Para caracterização da amostra, utilizou-se valores de média e desvio padrão. Foi verificada a normalidade dos dados pelo teste de Shapiro-Wilk e medidas de assimetria e curtose. Para verificar a diferença nas variáveis de funcionalidade (TUG e TC6), idade e índice de massa corporal (IMC) no pré-teste entre os dois grupos, utilizou-se o teste U de Mann-Whitney. Para observar a diferença entre as médias nos grupos entre pré e pós-teste, recorreu-se ao Teste t de Student para amostras dependentes (TUG, TC6 e SF-12). O teste de McNemar foi utilizado para verificar as diferenças na ocorrência de dor e de depressão no pré e pós-teste. Ainda, os resultados pré e pós-teste da escala de depressão geriátrica foram apresentados em frequência de ocorrência. Para todas as análises, utilizou-se o programa SPSS 17.0 e se adotou nível de significância de 5%.

 

Resultados 

 

    As variáveis idade, IMC, TUG e TC6 apresentaram distribuição normal. Não houve diferença entre os grupos na admissão ao estudo nas variáveis mencionadas, demonstrando, assim, homogeneidade da amostra. A Tabela 1 apresenta os dados sociodemográficos, de doenças pregressas e hábitos de vida, provenientes da anamnese realizada, estratificados por grupo de estudo.

 

Tabela 1. Características Sociodemográficas, doenças 

pregressas e hábitos de vida por grupo de estudo

 

G1

G2

n

%

n

%

Profissão

Aposentados

4

44,4

3

37,5

Do lar

2

22,2

1

12,5

Em atividade

3

33,3

4

50,0

Sexo

Feminino

8

88,9

4

50

Masculino

1

11,1

4

50

Estado Civil

Solteiro

-

-

1

12,5

Casado

6

66,7

3

37,5

Divorciado

2

22,2

1

12,5

Viúvo

1

11,1

3

37,5

Escolaridade

Não alfabetizado

4

44,4

1

12,5

1º grau

5

55,6

3

37,5

2º grau

-

-

4

50

Tabagismo

Sim

-

-

1

12,5

Não

9

100

7

87,5

Diabetes

Sim

1

11,1

2

25

Não

8

88,9

6

75

Doença Respiratória

Sim

2

22,2

2

25

Não

7

77,8

6

75

Cardiopatía

Sim

2

22,2

1

12,5

Não

7

77,8

7

87,5

Hipertensão Arterial

Sim

7

77,8

5

62,5

Não

2

22,2

3

37,5

Incontinência Urinária

Sim

5

55,6

2

25

Não

4

44,4

6

75

Fonte: Elaboração própia

 

    Os dados relacionados à qualidade de vida (SF-12) e funcionalidade (TUG, TUG6), podem ser observados na Tabela 2. Em relação à qualidade de vida, não houve diferença nas médias das dimensões física e mental do SF-12(p>0,05). Já em relação à funcionalidade, foi possível observar diferença entre a avaliação inicial e ao período de intervenção no TUG para os dois grupos e no TC6 para o G2 (p<0,05). De acordo com a classificação de Cohen (1992), os programas, independente da frequência semanal, apresentaram tamanhos de efeito grande (G1: TUG r = 0,73; G2: TUG r = 0,81 e TC6 r = 0,69).

 

Tabela 2. Análise comparativa, pré e pós-teste, dos valores médios nos 

testes de qualidade de vida(dimensão física - PCS e mental - MCS) e funcionalidade

 

G1

G2

Pré-teste

Média±DP

Pós-teste

Média±DP

P

Pré-teste

Média±DP

Pós-teste

Média±DP

p

SF-12

PCS

37,6±8,8

40,0±6,8

0,422

43,5±7,0

49,3±7,4

0,108

MCS

47,2±13,4

44,6±15,0

0,597

55,9±4,0

51,3±8,6

0,180

TUG

11,7±3,8

9,0±2,1

0,015

8,6±2,1

7,4±1,5

0,008

TC6

384,3±63,7

386,8±74,0

0,832

458,0±116,0

500,0±124,8

0,002

Fonte: Elaboração própia

 

    A Tabela 3 apresenta os resultados relacionados à ocorrência de sintomas depressivos (GDS-4) e dor, no início e após o período de intervenção. O estudo demonstra alteração nas ocorrências de depressão geriátrica, em ambos os grupos. Resultados do estudo ainda apontam uma diminuição nos relatos da queixa, em ambos os grupos no pós-teste, sem, no entanto, haver diferença estatisticamente significativa.

 

Tabela 3. Ocorrência de idosos com e sem depressão ou dor, 

estratificados por grupo de intervenção, no pré e pós-teste

 

G1

G2

Pré-teste

n (%)

Pós-teste

n (%)

Pré-teste

n (%)

Pós-teste

n (%)

GDS-4

Sim

2 (28,6)

-

3 (37,5)

-

Não

5 (71,4)

7 (100)

5 (62,5)

8 (100)

Dor

Sim

8(88,9)

7 (77,8)

7 (87,5)

3 (37,5)

Não

1 (11,1)

2 (22,2)

1 (12,5)

5 (62,5)

Fonte: Elaboração própia

 

Discussão 

 

    Atualmente, com crescente envelhecimento populacional apresentado no Brasil faz-se necessário a oferta de diferentes serviços e estratégias que possibilitam à pessoa idosa um envelhecer saudável e ativo de forma a prolongar seus níveis de independente e autonomia. No presente estudo foi analisado efeito de um programa de intervenção na atenção primária sobre a qualidade de vida e a funcionalidade de dois grupos de idosos.

 

    Os idosos que participaram do estudo eram predominantemente indivíduos do sexo feminino, de baixa escolaridade e que apresentavam diferentes condições crônicas associadas. Esta é uma realidade da população brasileira, a expectativa de vida de mulheres é maior quando comparada aos homens sendo ainda, grande parte delas viúva (Lebrão, e Laurenti, 2005). Outros estudos também observaram a alta prevalência de indivíduos do sexo feminino participantes de atividades em grupo (Dias, e Tavares, 2013; Ferreira et al., 2009). Sabe-se que indivíduos do sexo masculino possuem menor interesse por esse tipo de atividade quando comparados com mulheres (Martin-Moya, et al., 2022), e ainda, a maioria deles, quando participam, normalmente é em virtude de acompanhar suas esposas (Wichmann et al., 2013). Outro dado que auxilia a compreender a alta adesão de mulheres a esse tipo de atividade se refere ao fato de muitas mulheres, após a morte de seus cônjuges, se permitirem participar em atividades de lazer como as observadas em grupos de convivência ou atividade física (Doimo et al., 2008). O baixo nível de escolaridade encontrado no presente estudo também foi discutido por outros estudos. Ferreira et al. (2012) verificaram que 40% dos idosos não eram alfabetizados, enquanto 48% deles disseram ter o ensino fundamental incompleto. Essa configuração corrobora com o que tem sido observado referente à educação na população idosa nos dias de hoje (Dias, e Tavares, 2013). A baixa escolaridade encontrada em idosas em diferentes estudos talvez seja reflexo da taxa de alfabetização brasileira entre os anos 20-40, onde não havia tanta cobrança pela escolarização, e, também onde o papel das mulheres na sociedade era o de casar-se, ter filhos e cuidar das atividades de casa. (Menezes et al., 2007)

 

    Já em relação às diferentes condições crônicas apresentadas pelos participantes, sabe-se que nesta faixa etária há um aumento da prevalência de doenças crônicas. Aproximadamente entre 70% a 90% dos idosos referem pelo menos uma doença crônica não transmissível. Entre essas doenças destaca-se a hipertensão arterial (HAS) (Ramos, 2003; Alemán Fernandez, 2023) o que, de fato, foi apontado pela maioria dos participantes do estudo, em ambos os grupos.

 

    Muitos idosos buscam o exercício físico, primeiramente, na perspectiva dos benefícios encontrados na saúde física (Martín-Moya et al., 2022). E de fato, um dos principais resultados do presente estudo foi relacionado aos índices de mobilidade funcional. Resultados obtidos através do TUG demostraram uma redução do tempo necessário para sua execução após o período de treinamento, indiferente da frequência semanal. Mesmo apresentando resultados positivos relacionados ao desempenho no TUG, não foi possível observar alterações na classificação de risco de quedas proposta por Podsiadlo, e Richardson (1991) devido a grande maioria dos participantes já se encontrarem categorizados como indivíduos de baixo risco. Mesmo não sendo possível observar alterações na classificação de risco, sabe-se que a redução do tempo na execução do TUG possui relação com a força, o equilíbrio, a propriocepção e a velocidade da marcha estando associada à melhor independência e mobilidade funcional em idosos (Rojas-Diaz et al., 2022). Assim, propostas de atividade física regular que contemplem tais quesitos, como a observada no presente estudo, são essenciais e indicadas para a prevenção de quedas em idosos. (Fernandes et al., 2012; Prevettoni et al., 2021)

 

    Ainda em relação à saúde física, outro importante resultado do presente estudo é relacionado à capacidade funcional. Os dados obtidos demostram um aumento na distância percorrida no TC6 após o programa de intervenção apenas no grupo com a frequência semanal de duas vezes por semana (G2). Estudos já demostraram que resultados positivos na capacidade funcional de idosos, avaliada pelo TC6, podem ser observados após a participação em programas que envolvem o treinamento aeróbico, exercícios resistidos ou até mesmo treinamento multicomponente (Aguayo, e Flores, 2016). O grupo que realizava exercício apenas uma vez por semana (G1) não apresentou resultados significativos no TC6. Possivelmente, a frequência semanal de uma vez não foi suficiente para melhora dessa variável. No entanto, é importante ressaltar que esse grupo foi composto por indivíduos idade mais elevada e, sabe-se que quanto maior a idade, menor distância percorrida no TC6. (Pires et al., 2007)

    

    Como uma de suas consequências, o envelhecimento traz a diminuição gradual da capacidade funcional, despertando o sentimento de incapacidade (Ferreira et al., 2009). Consequentemente, os benefícios relacionados à saúde mental também são apontados como motivadores para o engajamento em atividades de grupo (Martín-Moya et al., 2022). Após o período de intervenção, cinco idosos classificados com sintomas depressivos no pré-teste, passaram para a categoria não depressiva. Tais resultados corroboram com a literatura ressaltando a importância da atividade física em grupo para reduzir a chance de transtornos psicossociais em idosos. (Brunoni et al., 2015; Cavalli et al., 2022)

 

    Sabe-se que a capacidade funcional e a depressão interferem diretamente na qualidade de vida de idosos (de Oliveira et al., 2022; Silva et al., 2012). A práticas de atividade física é importante para o idoso elevando sua autoestima, autoconfiança e interação social que impacta diretamente na qualidade de vida (Petyk et al., 2011). Apesar de um protocolo de exercício similar ao proposto por este estudo demonstrar efeitos positivos na qualidade de vida de idosas (Petyk et al., 2011), tais achados não foram observados. Uma possível explicação para a ausência de efeitos sobre a qualidade de vida nos dois grupos experimentais pode ser relacionada ao “efeito-teto”, ou seja, os participantes do estudo não sofreram efeitos da intervenção, uma vez que grande parte deles encontravam-se com pontuações elevadas em relação ao SF-12 no início do estudo.

 

    Já com relação à dor, embora não tenham sido observadas diferenças estatisticamente significativas, os dois grupos de exercício do presente estudo apresentaram resultados positivos após tempo de intervenção.Ainda, o grupo com maior frequência semanal apresentou o maior número de participantes que deixaram de referir tal desconforto. Estudos prévios demostram que mulheres idosas sedentárias ou insuficientemente ativas referem maior intensidade de dor do que idosas ativas e/ou muito ativas (Ferretti et al., 2019) enfatizando que o planejamento de intervenções destinadas ao alívio de dor e desconforto musculoesquelético devem envolver a prática de atividade física. (Niederstrasser, e Attridge, 2022)

 

    O presente estudo possui algumas limitações. Primeiramente, o tamanho amostral foi reduzido, pois muitos participantes não foram reavaliados devido ao excesso de faltas. Tal achado foi mais frequente no G2. Sugere-se que idosos participantes de grupos apenas uma vez na semana, tendem a ser mais assíduos do que aqueles que ocorrem duas vezes na semana. Uma hipótese para essa maior adesão dos participantes do G1, é que ao faltarem, um longo período passará até o próximo encontro. Já os participantes do G2, não se importam com as faltas devido a proximidade entre os encontros. Ainda, a baixa adesão a protocolos de exercício já foi relatada previamente pelo estudo de Fernandes et al. (2012) que atribuiu a perda amostral à duração da proposta de intervenção e ao difícil acesso ao local de realização das atividades. Tais colocações se relacionam à duração e localização do presente estudo. O período de 12 semanas pode ser considerado longo. Ainda, o Centro de Saúde onde foram realizadas as atividades se encontra em uma área de alta vulnerabilidade e baixa acessibilidade a transporte público. Outra limitação é com relação à disparidade do número de homens e mulheres nos dois grupos, mas como citado anteriormente, faz parte da realidade de estudos que envolvem atividade física em idosos.

 

Conclusões 

 

    Após intervenção, pôde-se verificar melhora na mobilidade funcional, avaliada pelo TUG, de ambos os grupos e aumento da distância percorrida no TC6 no G2. Ressalta-se a importância de idosos participarem de grupos de promoção da saúde em unidades de atenção básica, integrando-se a uma rede social e saliente-se a relevância de ser o exercício físico incluído, a fim de evitar consequências deletérias do envelhecimento. Assim, de forma geral, os dois grupos apresentaram melhora na capacidade funcional, diminuição na ocorrência de dor e de depressão geriátrica. Tal resultado vai ao encontro das diretrizes da OMS lançadas em 2020 que reafirmam a mensagens de que “alguma atividade física é melhor do que nenhuma”. (Bull et al., 2020)

 

    No entanto, o G2 apresentou melhora tanto no TUG, quanto no TC6. Já, o G1 melhorou apenas no TUG. Assim, sugere-se que, preferencialmente, os grupos de promoção da saúde para idosos tenham frequência semanal de duas vezes na semana com o objetivo de potencializar os benefícios da prática de exercício físico para idosos da comunidade. Ainda, ressaltamos a necessidade dos profissionais da atenção primária compreenderem tais resultados e usá-los para o desenvolvimento de programas viáveis às suas realidades e para o aconselhamento de seus usuários sobre os benefícios e a necessidade de atividade física regular. Consideramos a necessidade da realização de novos estudos em diferentes contextos e com um número amostral mais elevado.

 

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Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 28, Núm. 303, Ago. (2023)