ISSN 1514-3465
Para onde foram? Evasão de estudantes da escola pública na Bahia
Where did they Go? Dropout of Public School Students in Bahia
¿A dónde fueron? Evasión de estudiantes de escuelas públicas en Bahía
Roberto Gondim Pires*
rgondim@uesb.edu.br
Gustavo Marques Porto Cardoso**
gustavo.cardoso@gruponobre.edu.br
Jaqueline Argolo Rebouças***
jar.quel@gmail.com
*Licenciatura Plena em Educação Física
pela Universidade Federal da Bahia
Especialista em Educação Física Escolar
Mestre Educação pela PUC-SP
Doutor em Educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Professor Pleno da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
**Licenciatura Plena em Educação Física
pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Mestrado em Estudos Interdisciplinares sobre a Universidade
pela Universidade Federal da Bahia
Atualmente pesquisador da Universidade Federal da Bahia
pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Física e Saúde (GEFIS)
Professor Nível III do Governo do Estado da Bahia
Docente do curso de Bacharelado em Educação Física
do Centro Universitário Nobre (UNIFAN).
***Licenciatura Plena em História
pela Universidade do Estado da Bahia
Licenciada em Sociologia
Especialista em Gestão Escolar pela UFBA
em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas
e o Mundo do Trabalho pela UFPI
Pós-Graduação Aperfeiçoamento em Mentoria
para Educação Profissional e Tecnológica pelo IFES
Mestra pelo Programa de Pós-Graduação
em História Regional e Local (PPGHis) da UNEB
Professora da Rede Pública de Ensino do Estado da Bahia
no Centro Territorial de Educação Profissional - CETEP do Vale do Jiquiriçá
e no Colégio Estadual Santa Bernadete - CESB (Amargosa - BA)
(Brasil)
Recepção: 05/01/2023 - Aceitação: 11/07/2023
1ª Revisão: 20/06/2023 - 2ª Revisão: 08/07/2023
Documento acessível. Lei N° 26.653. WCAG 2.0
Este trabalho está sob uma licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional (CC BY-NC-ND 4.0) https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt |
Citação sugerida
: Pires, R.G., Cardoso, G.M.P., e Rebouças, J.A. (2023). Para onde foram? Evasão de estudantes da escola pública na Bahia. Lecturas: Educación Física y Deportes, 28(303), 30-44. https://doi.org/10.46642/efd.v28i303.3816
Resumo
Este estudo objetiva avaliar no Estado da Bahia os dados do Censo Escolar da Educação Básica entre 2007 e 2019, refletindo sobre a complexidade que os dados revelam. Trata-se de uma pesquisa descritiva, onde foi combinado a sistematização das informações descritas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) com os dados informados pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). As informações foram coletadas por meio de acesso eletrônico, elegendo municípios baianos aleatoriamente para análise dos dados gerais. Os resultados revelaram uma crescente evasão/abandono de estudantes da escola pública baiana; para além disso, a desproporção entre investimentos municipais com os resultados dos indicadores educacionais e a não associação entre vencimentos dos profissionais de Educação e indicadores educacionais.
Unitermos:
Educação Pública. Matrículas. Evasão escolar.
Abstract
This study aims to evaluate data from the Basic Education School Census in the State of Bahia between 2007 and 2019, reflecting on the complexity that the data reveal. This is a descriptive research, where the systematization of information described by the National Institute of Educational Research Anísio Teixeira (INEP) was combined with data reported by the National Treasury Secretariat (STN) and the Municipal Court of Auditors (TCM). Information was collected through electronic access, randomly choosing municipalities in Bahia for analysis of general data. The results revealed a growing evasion/abandonment of public school students in Bahia; in addition, the disproportion between municipal investments and the results of educational indicators and the non-association between salaries of education professionals and educational indicators.
Keywords:
Public Education. Enrollment. School dropout.
Resumen
Este estudio tiene como objetivo evaluar los datos del Censo Escolar de Educación Básica en el Estado de Bahía entre 2007 y 2019, reflexionando sobre la complejidad que revelan los datos. Se trata de una investigación descriptiva, donde se combinó la sistematización de la información descrita por el Instituto Nacional de Investigaciones Educativas Anísio Teixeira (INEP) con los datos informados por la Secretaría del Tesoro Nacional (STN) y el Tribunal Municipal de Cuentas (TMC). La información fue recolectada a través de acceso electrónico, eligiendo aleatoriamente municipios de Bahía para el análisis de datos generales. Los resultados revelaron una creciente evasión de los estudiantes de escuelas públicas de Bahía; además, la desproporción entre las inversiones municipales y los resultados de los indicadores educativos y la no asociación entre los salarios de los profesionales de la educación y los indicadores educativos.
Palabras clave
: Educación Pública. Inscripción. Abandono escolar.
Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 28, Núm. 303, Ago. (2023)
Introdução
Será o fim do começo?
. Semente do Amanhã/Gonzaguinha (1984)“Ontem um menino / Que brincava me falou /Hoje é a semente do amanhã Para não ter medo/ Que este tempo vai passar /Não se desespere, nem pare de sonhar”
O Brasil vem sendo constantemente mobilizado a discutir a Educação no sentido de se repensar o seu Sistema Nacional e toda a complexidade que dele deriva, sobretudo, refletindo acerca dos direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento dos nossos estudantes. É fundamental registrar que, desde a Constituição Federal de 1988, existem sinalizações quanto à urgência de se estabelecer uma base mínima para a Educação do país: “Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais”. (Brasil, 1988, Art. 210)
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996) indica que a União, os Estados e os Municípios deverão organizar, em regime de colaboração os seus respectivos sistemas de ensino, asseverando também para a necessidade de constituição de uma Base Nacional Curricular Comum:
Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos. (Brasil, 1996, Art. 26)
Tais aparatos legais combinados com a participação de especialistas e militantes da Educação em fóruns específicos e, sobretudo, nas instâncias democráticas das Conferências Municipais, Territoriais, Estaduais e Nacional de Educação, propuseram em 2010 a indicação das bases epistemológicas que garantam a configuração de um currículo que contemple, ao mesmo tempo, uma base nacional demandada pelo Sistema Nacional de Educação e as especificidades regionais e locais. E, em 2014, a elaboração mediante consulta pública nacional, a proposta de direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento para os alunos do ensino fundamental e médio, nas diversas modalidades a serem atingidas nos tempos e etapas de organização destes níveis de ensino, com vistas a garantir formação básica comum, garantindo assistência técnica e financeira (Brasil, 2014).
A já conhecida Base Nacional Comum Curricular - BNCC pressupõe, então, que:
Conhecimentos, saberes e valores produzidos culturalmente, expressos nas políticas públicas e que são gerados nas instituições produtoras do conhecimento científico e tecnológico; no mundo do trabalho; no desenvolvimento das linguagens; nas atividades desportivas e corporais; na produção artística; nas formas diversas e exercício da cidadania; nos movimentos sociais. (Brasil, 2018, Art. 14)
Nesse sentido, está demonstrado que tanto do ponto de vista das normas legais, quanto das reflexões dos trabalhadores da Educação existe a necessidade de estabelecimento de “novas” diretrizes pedagógicas para a Educação Básica. Isso implica repensar todo o sistema educacional, desde os currículos, o ensino, o aprendizado, a formação docente, o material didático, enfim, a própria organização e gestão das instituições de ensino.
Após anos de lutas históricas em que muitos se dedicaram e sonharam (Lioti, e Zanatta, 2020), sobretudo por reconhecerem a Educação e a Base Nacional Curricular Comum como uma conquista social, inclusive por propor um conjunto de aprendizagens essenciais para todos os alunos ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica, toda sociedade foi surpreendida com a quebra democrática no Brasil, com a destituição de uma presidenta sem crime de responsabilidade e a consequente eleição de um chefe do Executivo Federal que já demonstrou sua aversão a tudo que é científico e formativo. Isso resultou na diminuição das instâncias de diálogo, aumento das incertezas de investimentos e ampliação das dúvidas nas políticas públicas para a Educação. Todo esse universo pedagógico tem acontecido em meio a um cenário bastante confuso no que se refere à legitimidade do que está acontecendo, e pior, do que está sendo proposto, sem dúvida isso gera um grande complicador na prática docente, e em tudo que diga respeito ao processo educativo.
No atual debate educacional, os estudiosos do campo da educação e os formuladores de políticas educacionais parecem concordar em uma questão. O acesso à educação básica foi amplamente resolvido na maioria dos países em desenvolvimento, e o atual desafio da política educacional é melhorar a qualidade da educação. Embora a política educacional atribua grande importância à avaliação do desempenho escolar, entendido como um indicador-chave da qualidade educacional, este novo acordo tem implicações para a educação não apenas nos países em desenvolvimento e emergentes, mas também em todo o mundo, impacto da política. (Andrews, e Vries, 2012)
Necessita-se entender que as discussões no campo da educação envolvem a necessidade de renovar o discurso crítico que examine a relação entre educação e condições sociais de forma que as práticas sociais e educativas não possam ser dissociadas. E, nesse sentido, a prática educativa não pode ser dissociada da prática social. É impensável acelerar a educação sem desenvolver uma política de investimentos para o planejamento da carreira dos profissionais da educação na infraestrutura física e humana das instituições de ensino. No entanto, é por meio das relações sociais que o processo ensino-aprendizagem é unificado e, portanto, orgânico. (Costa, e Coutinho, 2018)
Assim, o plano nacional, a Educação, como política pública, apresenta complexidades imensuráveis. Defende-se, neste estudo, que as políticas públicas servem, ou deveriam servir para direcionar a aplicação e alocação de recursos com vistas ao uso racional destes recursos e implementação de ações e programas que resultem na melhoria da qualidade educacional. Segundo Hill (2006), o modelo de análise da implementação de política de cima para baixo separando a formulação da implementação de ações tem se revelado ineficientes e ineficazes. Para Höfling (2001), a relação entre Governo, Estado e políticas públicas deve ser considerada, uma vez que esta implica, na formulação das políticas, conflitos de interesse, arranjos realizados nas três esferas de poder que permeiam as instituições do Estado e da sociedade em geral.
De maneira geral, o sistema de ensino brasileiro possui dois órgãos superiores dirigentes da administração educacional estadual, a Secretaria de Educação (SEDUC) e o Conselho Estadual Educação (CEE), que em tese deveriam atuar explicitamente. A primeira estrutura, essencialmente administrativa, tem como funções coordenar, acompanhar, formular e implementar políticas e atividades educativas. O segundo maior órgão regulador tem poderes consultivos e atua tanto na fiscalização e controle quanto na iniciação da política educacional local. (Oliveira, Souza, e Câmara, 2018)
Assim, nos planos locais essa complexidade se acentua, principalmente, no caso específico do Estado da Bahia que obteve no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) de 2017 um significativo decréscimo em relação ao índice de 2015. Importante lembrar, que as altas taxas de repetência contribuíram mais diretamente para a elevação da evasão escolar do que para o incremento da aprendizagem (Ribeiro, 2009), por isso, em 2007 foi criado o IDEB, ao qual coube combinar, no cálculo da pontuação, o desempenho na Prova Brasil, que avalia o conhecimento nas disciplinas de matemática e língua portuguesa, às taxas de aprovação escolar por meio da multiplicação entre a nota média padronizada e a taxa de aprovação.
O Estado da Bahia, obteve um IDEB, em 2017, de 5,1 (4ª série/5º ano), 3,7 (8ª série/9º ano) e 3,0 (3ª série EM), estando bem abaixo da média nacional e entre os estados do Nordeste. E ainda, em termos de equiparação de achados dos indicadores, percebem-se as disparidades entres os escores a depender das regiões no território baiano e mesmo dentro deles mais iniquidades, demonstrando as peculiaridades e particularidades de cada município. (Brasil, 2017)
A Bahia se constitui, no cenário nacional, como o sétimo estado brasileiro com os piores resultados no IDEB 2017 dos anos iniciais do Ensino Fundamental. O fato é que de 2007 para 2017 houve um crescimento de 1,5, como apresentado na Figura 1, no entanto, esse número não representa um avanço significativo se comparado à meta 6,0 que precisaria ser atingido até 2021.
Assim, os autores se debruçaram sobre alguns pontos que são merecedores de uma avaliação mais criteriosa para que se possa, posteriormente, discutir alternativas que garantam uma Educação pública gratuita, de qualidade e socialmente referenciada. Tendo este estudo como objetivo discutir aspectos e variáveis que por certo contribuem com a evasão de estudantes das escolas públicas na Bahia. Falar em qualidade social da educação é falar de uma nova qualidade, onde se acentua o aspecto social, cultural e ambiental da educação, em que se valoriza não só o conhecimento simbólico, mas também o sensível e o técnico. (Gadotti, 2013)
Assim tem-se como objetivo geral de estudo, avaliar no Estado da Bahia os dados do Censo Escolar da Educação Básica entre 2007 e 2019, refletindo sobre a complexidade que os dados revelam.
Métodos
Trata-se de uma pesquisa com abordagem mista de cunho descritivo. Os estudos descritivos indicam fatos e fenômenos de determinada realidade. A maioria das análises realizadas no campo da Educação é descritiva, tendo como foco essencial o desejo de conhecer as escolas, as reformas curriculares, os métodos de ensino, os professores, a Educação para o trabalho e os problemas escolares (Triviños, 1987). A abordagem mista, visa conectar tanto uma abordagem qualitativa como uma quantitativa no desenvolvimento de uma pesquisa que se complementam.
Para Creswell et al. (2003) um método misto ou mixed method é definido como método de coleta e análise de dados, que combina técnicas quantitativas e qualitativas em um mesmo desenho de pesquisa, enriquecendo possíveis conclusões por meio de triangulação e interação entre os achados.
O Censo Escolar, instrumento de coleta de dados produzido anualmente pelo INEP, apresentou-se como fonte privilegiada de informação desta pesquisa. Portanto, foram incluídos os dados de matrícula em suas respectivas unidades federativas distribuídos por dependências administrativas. Posteriormente, objetivando qualificar as informações presentes no referido Censo, buscou-se dados relativos a investimentos educacionais nos municípios baianos nos portais da Secretaria do Tesouro Nacional e no Tribunal de Contas dos Municípios.
As informações foram coletadas por meio de um guia de indicadores estruturado, o qual foi construído, especificamente, para este estudo e a partir de referencial empírico, servindo ao objetivo proposto. A coleta de dados foi realizada entre os meses de junho de 2019 a abril de 2020.
Resultados e discussão
A Educação na Terra de Anísio Teixeira
Segundo dados do INEP (Tabela 1), em 2007 foram matriculados na rede estadual de educação da Bahia 1.355.945 alunos e em 2019, apenas 771.344, uma redução de 584.601 alunos (43%). Na rede municipal havia, em 2007, um total de 2.671.684 alunos e em 2019 um total de 2.117.484, representando uma redução de 554.200 (21%). Ou seja, entre 2007 e 2019 houve uma redução nas redes estadual e municipal de um total de 1.138.801 alunos.
Tabela 1. Comparativo de matrículas na Bahia: 2007 a 2019
Número |
Estadual |
Federal |
||||||
Matrículas |
2007 |
2019 |
Diferença |
% |
2007 |
2019 |
Diferença |
% |
Infantil |
1.822 |
860 |
- 972 |
- 5,3% |
- |
- |
- |
0% |
Fundamental |
492.285 |
136.234 |
- 356.051 |
- 72% |
472 |
358 |
- 114 |
- 2,4% |
Médio |
584.970 |
417.632 |
- 167.338 |
- 29% |
4.526 |
664 |
- 3.862 |
- 85% |
Profissional |
4.466 |
91.095 |
86.629 |
1940% |
2.669 |
20.519 |
16.850 |
459% |
EJA |
268.830 |
112.597 |
- 156.233 |
- 58% |
300 |
156 |
- 144 |
- 48% |
Especial |
3.572 |
12.926 |
9.354 |
262% |
8 |
238 |
230 |
2.875% |
Total |
1.355.945 |
771.344 |
- 584.601 |
- 43% |
8.975 |
21.935 |
21.935 |
144% |
Número |
Municipal |
Privada |
||||||
Matrículas |
2007 |
2019 |
Diferença |
% |
2007 |
2019 |
Diferença |
% |
Infantil |
402.785 |
404.615 |
1.830 |
0% |
90.921 |
139.909 |
48.988 |
54% |
Fundamental |
1.975.265 |
1.440.209 |
- 535.056 |
- 27% |
155.462 |
341.443 |
185.981 |
120% |
Médio |
30.291 |
3.447 |
- 26.844 |
- 89% |
34.956 |
47.791 |
12.835 |
37% |
Profissional |
891 |
321 |
- 570 |
- 64% |
5.096 |
31.719 |
26.623 |
522% |
EJA |
245.206 |
190.189 |
- 55.017 |
- 22% |
1.798 |
6.434 |
4.636 |
258% |
Especial |
17.246 |
78.703 |
61.457 |
356% |
7.441 |
7.572 |
131 |
2% |
Total |
2.671.684 |
2.117.484 |
- 554.200 |
- 21% |
295.674 |
574.878 |
279.194 |
94% |
Número |
Total geral |
Dados gerais |
||||||
Matrículas |
2007 |
2019 |
Diferença |
% |
Dependência |
2007 |
2019 |
DIF |
Infantil |
495.528 |
545.394 |
49.856 |
10% |
Estadual |
31.3% |
21,1% |
- 9,2% |
Fundamental |
2.623.484 |
1.918.244 |
- 705.240 |
- 27% |
Federal |
0,2% |
0,6% |
0,4% |
Médio |
654.743 |
469.534 |
-185.240 |
- 28% |
Municipal |
61,7% |
60,7% |
- 0,9% |
Profissional |
14.122 |
143.654 |
129.532 |
917% |
Privada |
6,8% |
16,5% |
9,7% |
EJA |
516.134 |
309.376 |
- 206.758 |
- 40% |
|
|||
Especial |
28.267 |
99.439 |
71.172 |
252% |
%População |
31,10% |
23,50% |
- 7,6% |
Total |
4.332.278 |
3.485.631 |
- 846.647 |
- 20% |
*Dados INEP/IBGE |
Fonte: Elaborada pelos autores, com base em INEP (2020)
A Rede Federal nesse mesmo período teve um aumento significativo em percentuais (144%), contudo com redução no Ensino Fundamental, Médio e na EJA (Educação de Jovens e Adultos), mas com significativo aumento na Educação Profissional e na Educação Especial. No total, saiu de 8.975, em 2017, para 21.935 em 2019, porém ainda com números tímidos em relação ao total das matrículas na Bahia. Vale o registro que o fenômeno do crescimento dos Institutos Federais de Educação (IFES) durante o período estudado, que hoje já somam vinte e cinco campi no Estado da Bahia, foi a principal causa para este resultado.
A rede privada nesses treze anos analisados aumentou suas matrículas em 94% de 295.674, em 2007, para 574.868 em 2019. Destaque para o aumento na Educação Profissional em 522%, seguido da EJA com 258% e no Ensino Fundamental em 120%, sendo que a Educação Infantil, o Ensino Médio e a Educação Especial obtiveram inexpressivo aumento. No período estudado, em termos percentuais, a rede privada saiu de 7% do total de matrículas na Bahia para em 2019 chegar a 16%.
Importante sublinhar que o Estado da Bahia se encontra entre os piores IDEB do Brasil. A proficiência média das escolas municipais e estaduais foi de apenas 24% em 2017. Na rede estadual a distorção idade/ano em 2018 era de 32% nos anos iniciais do Ensino Fundamental (EF), 50% nos anos finais (EF) e 48% no Ensino Médio (EM). Na rede municipal os números também não são animadores, 25% nos anos iniciais (EF), 44% nos anos finais (EF) e 48% no EM. Em 2018, o abandono médio na rede estadual foi de 5,6% e na rede municipal de 7,1%.
Os dados acima demonstram claramente que nos treze anos pesquisados as duas redes (municipal e estadual) perderam mais de 28% das matrículas. Os números por si só, são dramáticos. Não intenta-se por ora, estabelecer um debate conceitual entre o que venha ser abandono e evasão, assim como não se desconsidera possíveis inconsistências lançadas no Censo Escolar, sejam elas fruto de incompetência dos gestores escolares e gestor do Censo das redes municipal e estadual, ou por motivos alheios à percepção em tela, pois, é importante deixar claro que é a partir do quantitativo de estudantes que se definem as políticas educacionais e, sobretudo, os valores repassados para as redes e para as unidades escolares, como ainda a definição do porte das escolas.
Os dados da educação especial apresentam inexpressivo acréscimo da sua oferta na rede privada (2%) e um aumento considerável nas redes públicas de ensino Municipal (356%), Estadual (262%) e Federal (2.875%). Tem-se hoje mais de 99.339 alunos na Educação Especial, desses 91.867 nas redes públicas do estado da Bahia, para o Estado e os municípios, o crescimento foi significativo, saiu de 20.818 (2007) para 91.629 (2019) alunos.
Indicando-se, pois, ao interesse inicial que é saber o que aconteceu com os 1.125.841 estudantes da Bahia que não estão mais na Escola pública, entre 2007 e 2019, conforme indicam os dados do INEP. Sabe-se que, em contrapartida, houve um acréscimo de 279.194 alunos na rede privada e um crescimento demográfico inexpressivo na Bahia no mesmo período, mas isso não justifica o decréscimo de estudantes na rede pública de ensino, devido à grande fenda social existente no país onde a maioria destes alunos de escolas públicas carecem de atenção e cuidados, não podendo arcar com o alto custos das mensalidades em tais instituições. Imperioso é ainda encontrar as raízes, razões e respostas para tamanho fenômeno. Olhar esses dados com naturalidade talvez seja condenar mais adolescentes, jovens, adultos e idosos ao mesmo destino. As questões que ficam são: para onde eles foram? Por que evadiram/abandonaram? Quais são as estratégias necessárias para modificar essa realidade? Que modelo de escola seria necessário para garantir a sua continuidade?
Instabilidades e incertezas
Historicamente o senso comum apresentava e ainda apresenta argumentos capazes de convencer os desavisados sobre a baixa qualidade da Educação na Bahia e, talvez, naturalizar as raízes da evasão/abandono das escolas públicas baianas. Argumentar que o baixo nível dos estudantes que ingressam nas universidades era/é em razão do péssimo ensino básico cursado não se sustenta mais. Vários municípios têm nos seus quadros um percentual significativo de professores egressos das universidades, muitos deles com qualificação de especialistas, mestres e até doutores, isso nos instiga a fazer a seguinte reflexão: com mais especialistas, mestres, doutores por que não se consegue melhorar a qualidade da educação?
Por evasão, este estudo entende por um problema social que está diretamente relacionado aos alunos que não concluem seus estudos. Abandono da escola por outros motivos que não a graduação. É um fenômeno complexo relacionado com expectativas não satisfeitas, refletindo várias razões relacionadas com fatores e variáveis objetivas e subjetivas, devendo ser compreendido no contexto socioeconômico, político e cultural do sistema educativo e da educação. (Silva, e Alves, 2023)
Neste contexto, a expansão de cursos de Licenciatura no processo de interiorização do Ensino Superior na Bahia, seja pelas universidades estaduais ou através das universidades federais, além de programas especiais como a Plataforma Freire, produziu outra realidade na formação de professores neste Estado, cuja pergunta e resposta se dá ao mesmo tempo: Qual a qualidade dos professores que estas instituições estão formando? Na apresentação do livro, “País Mal-educado” de autoria de Daniel Barros (2019), o autor, crava a sua interpretação que segundo ele tem a força de um axioma: “a qualidade da educação em qualquer lugar do mundo não pode superar a qualidade de seus professores”.
As iniciativas formalizadas para a formação inicial e continuada de professores no Estado da Bahia, cumpriram muitas ações. A Lei Estadual nº 13.559, de 12 de maio de 2016, trata do Plano Estadual da Educação (2016-2026), constituído de vinte seções, e busca contemplar todos os níveis e modalidade da Educação formal, Educação infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio, Educação Profissional, Educação Especial/Inclusiva, Educação Integral, Alfabetização, da Educação de Jovens e Adultos e o Ensino Superior. Importa aqui a seção intitulada “Da formação de professores”, pois a mesma tem como meta (nº 15) que todos os professores da Educação Básica tenham formação específica de nível superior, através da articulação da continuidade do Plano Nacional de Formação de Professores (PARFOR) e do Plano Estratégico de Formação de Profissionais do Magistério da Rede Pública da Educação Básica, até o último ano de vigência do plano, ou seja, 2026. Chamando a atenção para a meta 15.5 que pretende: “criar um banco de dados referente à necessidade de formação docente e não docente, por nível de ensino, etapas e modalidades da educação, até o fim do primeiro ano de vigência desse PEE”. (Bahia, 2016, p. 35)
Neste contexto, pode-se observar que a formação inicial de professores realizada pelo PARFOR consiste em uma política vital para melhorar a educação pública. Do ponto de vista, da sua capilaridade conseguir atingir todas as regiões e estados do país, a valorização dos profissionais especialistas da educação. (Nascimento, Santos, Silva, e Menezes, 2022).
Uma outra forma adotada pela Secretaria de Educação do Estado da Bahia para garantir a formação inicial dos professores é por meio da Universidade Aberta do Brasil (UAB), que se constitui em um sistema integrado por universidades públicas que oferecem cursos de nível superior para camadas da população com dificuldades de acesso à formação universitária, por meio do uso da metodologia da Educação a Distância - EAD.
A saber, instituído pelo Decreto 5.800/2006, o sistema UAB visa ampliar os cursos gratuitos de graduação a distância e programas educacionais em todo o Brasil, baseados no princípio de operar em locais de difícil acesso. Sob a tese da democratização da educação a UAB tem expandido sua atuação em áreas isoladas ou com poucas ofertas de cursos de qualidade e gratuito. (Souza, e Lima, 2021)
Outro paradigma que historicamente foi e em certa medida ainda é usado como argumento para justificar a baixa qualidade da educação, está na generalização em torno das médias salários recebidos pelos professores efetivos, que indicam sempre a suposta baixa remuneração dos professores. É evidente ainda a existência de municípios com baixos salários. No entanto, observa-se outros tantos exemplos em que professores efetivos superam os valores do piso nacional (o que inclui os valores correspondentes às férias, 13º salário, licença prêmio e encargos previdenciários), causando uma discrepância entre o maior e o menor salário entre os docentes dentro de um mesmo município.
A realidade apontada até aqui, têm levado para argumentações que atribuem a uma suposta ineficiência e ineficácia das redes públicas de Educação. Tal situação, considerando o total investido anualmente em relação aos números de alunos matriculados, subsidia o discurso e a prática neoliberal de oferecimento de vagas na iniciativa privada como solução para esse grave problema. Destaca-se que o antigo Ministro da Economia, Paulo Guedes, aventou, ainda no início do ano de 2019, a possibilidade de introduzir um sistema de voucher na educação brasileira, experiência já vivenciada em outros países com destaque para o Chile. Nesse modelo, estados e municípios, em vez de investirem com os alunos que estudam em escolas públicas, repassariam um voucher para as famílias com filhos em idade escolar para realização de matrícula em escolas de sua preferência (públicas ou privadas), no mesmo valor da despesa de alunos em sua rede de ensino. Dessa forma, as escolas públicas só receberiam verbas conforme o número de alunos matriculados. (Menezes Filho, 2019)
Proposta como essa, acabam induzindo práticas políticas, como no caso específico do município de Salvador, quando, em 2019, o prefeito sancionou uma lei criando 10 mil vagas em parceria com a iniciativa privada. Avaliando de forma direta os números do município encontra-se um gasto na Educação, em 2017, segundo o STN, de precisamente R$ 1.098.958.758,16 para atender um público de 141.853 alunos com dependência administrativa municipal (INEP, 2017), correspondendo a um custo anual per capita de R$ 7.747,17 (R$ 645,60 por mês). Conforme será apontado na sequência, problemas na gestão não justifica a proposta de privatização da Educação, considerando os valores gastos e os respectivos resultados, o que é necessário é uma revolução na gestão educacional.
O município de Salvador, que possui o IDEB 5,3 para os estudantes dos anos iniciais e 3,9 para os estudantes dos anos finais, investe quase o dobro de recursos do município de Nova Itarana, que possui 5,4 para anos iniciais e 4,1 para anos finais. Licínio de Almeida investiu R$ 417,76 por estudante e alcançou média do IDEB de 6,8 e 6,0 (anos iniciais e finais, respectivamente), já o município de Jequié, investiu R$ 627,93 para uma média de 4,4 e 3,4.
As informações da Tabela 2, no que diz respeito aos dados divulgados do IDEB observa-se, no total, que a Bahia no Ensino Médio regular alcançou a média de apenas 3 pontos, posicionando-se nos últimos lugares entre os Estados brasileiros. Vale considerar que a pontuação da rede estadual ainda foi mais baixa, 2,7. Pondera-se a mudança da metodologia, da avaliação de larga escala, que, a rigor valeu para todos os Estados, considerando as particularidades de um país de tamanho continental.
Tabela 2. Resultado da Bahia no IDEB 2017 - Ensino Médio Regular
Ensino Médio Regular |
|||||||||||
Unidade da Federação |
Rede |
Taxa de Aprovação
- 2017 |
Nota SAEB - 2017 |
IDEB 2017 (N x P) |
|||||||
Total |
1ª |
2ª |
3ª |
4ª |
Indicação de
Rendimento (P) |
Matemática |
Língua Portuguesa |
Nota Média
Padronizada |
|||
Bahia |
Total* |
64.7 |
65,6 |
77,8 |
84,5 |
78,8 |
0,76 |
251,31 |
249,57 |
3,96 |
3,0 |
Bahia |
Privada |
94,3 |
91,1 |
94,9 |
97,6 |
96,8 |
0,95 |
320,89 |
311,54 |
5,86 |
5,6 |
Bahia |
Estadual |
72,6 |
63,1 |
75,8 |
82,8 |
75,2 |
0,74 |
243,15 |
242,34 |
3,73 |
2,7 |
*Média SAEB 2011 e IDEB 2011 calculados sem as escolas federais. Fonte: INEP (2019)
Transformações estão ocorrendo no âmbito da Educação Estadual, dentre elas a implementação crescente da Educação em Tempo Integral, processos de municipalização de escolas de Ensino Fundamental, ampliação da carga horária de vice-diretores, entre outros. Contudo, ainda persistem problemas físicos nas escolas e carência de recursos humanos, pedagógicos e administrativos, o que também pode influenciar no desempenho escolar e, inclusive, no resultado obtido nas provas externas. Daniel Barros (2019, p. 9), é rigoroso no diagnóstico:
fala-se da disciplina do estudante, do uniforme, do cardápio da merenda, da quadra poliesportiva coberta, do uso de computadores na escola, de uma suposta doutrinação ideológica, ou das inúmeras propostas de novas matérias. Estes temas podem até ser importantes e de fato orbitam o cotidiano das escolas, mas não têm diretamente a ver com aquela que deve ser sempre a questão central de qualquer sistema educacional: as crianças e adolescentes estão aprendendo?
Mesmo entendendo as especificidades da Educação, os dados acima apresentados devem servir de parâmetro para qualificar as discussões sobre o momento atual que se vive na Bahia. Paulo Gabriel Nacif, ex-Secretário Municipal de Educação de Lauro de Freitas, ex-reitor da UFRB e atual presidente do Conselho Estadual de Educação da Bahia, tem defendido, de forma sistemática, a necessidade de retomada dos princípios legais e constitucionais do regime de colaboração entre os entes, como instrumento norteador para novas ações e discussões.
Conclusão
À guisa de conclusão ou a necessidade de lutar juntos?
Conclui-se este estudo, com um ar que mais parece uma denúncia, que mais perguntou-se do que se apontou, e talvez, seja esse mesmo o propósito dos achados, sem necessidade de encontrar culpados, julga-se que todos são responsáveis por esse quadro, assim, precisa-se todos desestabilizados por essa “radiografia” encontrar caminhos que apontem para a reversão e superação de tal realidade.
Para além dos baixos índices apresentados no Estado da Bahia, como sendo o pior IDEB do Brasil (Ensino Médio), dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD do IBGE, que tem como referência o segundo trimestre de 2016, apresentam a Bahia com a taxa de analfabetismo de 13%. Tais informações indicam a necessidade de mudanças e de busca de soluções para a evasão/abandono dos alunos de escolas públicas, mudando a perspectiva apresentada.
Assim, precisa-se de uma “nova” Educação para o estado. Ficar restritos a alguns cursos, escolas e municípios como ilhas de excelência e a eterna busca na culpabilidade do outro, não levará a lugar algum. É necessário que - Estado, Universidades, Municípios, comunidades escolares e famílias construam uma educação que garanta aos baianos efetivamente uma escola pública, gratuita e de qualidade, com professores motivados, alunos interessados e escolas devidamente equipadas.
É imprescindível ainda a busca ativa por aqueles alunos que não estão frequentando as escolas, incluindo uma maior atenção para aqueles que se encontram em distorção idade/ano e aos que necessitam de uma educação inclusiva e especial.
Precisa-se por fim, perseguir um caminho que nos ajudará a vislumbrar uma realidade para nossos estudantes cantarem como Gilberto Gil “A Bahia já me deu régua e compasso”.
Referências
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