ISSN 1514-3465
Exergames, sobrepeso e obesidade em crianças: uma revisão de literatura
Exergames, Overweight and Obesity in Children: A Literature Review
Exergames, sobrepeso y obesidad en niños y niñas: una revisión de la literatura
Aroldo Luís Ibiapino Cantanhede*
aroldoef@ufsj.edu.br
Joel Alves Lamounier**
joel@ufsj.edu.br
*Bacharel e Licenciado em Educação Física (CEUCLAR)
Mestre em Educação (UFSJ)
Doutorando em Ciências da Saúde (UFSJ)
**Médico, Pediatria (UFMG)
Mestrado em Bioquímica e Imunologia
Instituto de Ciências Biológicas da UFMG
Doutorado em Saúde Pública e Nutrição pela Universidade da Califórnia (EUA).
Atualmente Chefe do Departamento de Medicina da UFSJ
(Brasil)
Recepção: 05/01/2022 - Aceitação: 12/08/2022
1ª Revisão: 03/07/2022 - 2ª Revisão: 27/07/2022
Documento acessível. Lei N° 26.653. WCAG 2.0
Este trabalho está sob uma licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional (CC BY-NC-ND 4.0) https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt |
Citação sugerida
: Cantanhede, A.L.I., e Lamounier, J.A. (2022). Exergames, sobrepeso e obesidade em crianças: uma revisão de literatura. Lecturas: Educación Física y Deportes, 27(294), 205-220. https://doi.org/10.46642/efd.v27i294.3330
Resumo
A saúde pública enfrenta vários desafios, entre eles o aumento na incidência e na prevalência da obesidade em crianças e adolescentes. Nessa perspectiva, o combate à obesidade e ao sobrepeso deve fazer uso das estratégias comuns ao cotidiano das crianças como é o caso dos jogos digitais permitindo maior aderência a intervenções. Este trabalho objetivou identificar, evidências no uso de Exergames (videogames ativos) para prevenir, tratar ou incentivar práticas contra a obesidade/sobrepeso de crianças. Para consecução do objetivo houve uma prospecção nas bases de dados científicos ScienceDirect, Scopus, LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), e MedLine (Sistema Online de Busca e Análise de Literatura Médica). A busca se deu utilizando os termos: “Exergames”, “Obesity”, “Children” combinados pela lógica booleana AND. Os artigos deveriam ter sidos publicados os anos de 2015 a 2020, em periódicos Qualis B3 e acima. O resultado dessa busca após serem utilizados mecanismos de elegibilidade, chegou a um número de cinco artigos, número esse incluído no trabalho. Para garantir a qualidade dos artigos foi utilizada a declaração CONSORT. Os dados apresentados pela literatura apontam para evidências bastante positivas para os Exergames como estratégia no tratamento da obesidade de crianças. Há possibilidade de perda de peso, melhora do Índice de Massa Corporal, diminuição da adiposidade subcutânea e finalmente, melhora da saúde cardiometabólica. É necessário, contudo, perceber que os dados apresentados mostrados não foram equalizados e diferem em instrumento, volume, intensidade, amostra, etc.
Unitermos
: Exergames. Obesidade. Crianças.
Abstract
Public health faces several challenges, including the increase in the incidence and prevalence of obesity in children and adolescents. From this perspective, the fight against obesity and overweight must make use of strategies common to children's daily lives, such as digital games, allowing greater adherence to interventions. This study aimed to identify evidence on the use of Exergames (active video games) to prevent, treat or encourage practices against obesity/overweight in children. To achieve the objective, there was a search in the ScienceDirect scientific databases, Scopus, LILACS (Latin American and Caribbean Literature on Health Sciences), and MedLine (Online System of Search and Analysis of Medical Literature). The search was made using the terms: “Exergames”, “Obesity”, “Children” combined by boolean AND logic. The articles should have been published between 2015 and 2020, in Qualis B3 journals and above. The result of this search, after using eligibility mechanisms, reached a number of five articles, a number included in the work. To guarantee the quality of the articles, the CONSORT declaration was used. The data presented in the literature point to very positive evidence for Exergames as a strategy in the treatment of obesity in children. There is a possibility of weight loss, improvement of the Body Mass Index, decrease of subcutaneous adiposity and finally, improvement of cardiometabolic health. It is necessary, however, to realize that the data shown were not equalized and differ in instrument, volume, intensity, sample, etc.
Keywords
: Exergames. Obesity. Children.
Resumen
La salud pública enfrenta varios desafíos, entre ellos el aumento de la incidencia y prevalencia de obesidad en niños y niñas y adolescentes. Desde esta perspectiva, la lucha contra la obesidad y sobrepeso debe hacer uso de estrategias comunes al cotidiano de niños y niñas, como los juegos digitales, que permitan una mayor adherencia a las intervenciones. Este estudio tuvo como objetivo identificar evidencias sobre el uso de Exergames (videojuegos activos) para prevenir, tratar o fomentar prácticas contra la obesidad/sobrepeso en niños y niñas. Para lograr el objetivo se realizó una búsqueda en bases de datos científicas ScienceDirect, Scopus, LILACS, y MedLine. La búsqueda se realizó utilizando los términos: “Exergames”, “Obesity”, “Children” combinados por la lógica AND booleana. Los artículos debían haber sido publicados entre 2015 y 2020, en revistas Qualis B3 y superior. El resultado de esta búsqueda, luego de utilizar mecanismos de elegibilidad, alcanzó un número de cinco artículos, número incluido en el trabajo. Para garantizar la calidad de los artículos se utilizó la declaración CONSORT. Los datos presentados en la literatura apuntan a una evidencia muy positiva para Exergames como estrategia en el tratamiento de la obesidad en niños y niñas. Existe la posibilidad de pérdida de peso, mejora del Índice de Masa Corporal, reduce la adiposidad subcutánea y, finalmente, mejora de la salud cardiometabólica. Es necesario, sin embargo, darse cuenta de que los datos mostrados no fueron equiparados y difieren en instrumento, volumen, intensidad, muestra, etc.
Palabras clave
: Exergames. Obesidad. Niños y Niñas.
Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 27, Núm. 294, Nov. (2022)
Introdução
Diversos desafios têm se apresentado à saúde pública, tanto no Brasil quanto internacionalmente, devido ao cenário de aumento da prevalência e incidência da obesidade nas últimas três décadas, não só em adultos, mas também em crianças e adolescentes (Reis et al., 2011; Wang et al., 2002). Buscando diminuir a obesidade, as políticas mundiais delinearam objetivos de caráter amplo e abrangente em diversas áreas da saúde no intuito de regredir o alcance dessa doença obesidade (Nilson et al., 2020). Nesse prisma, o combate à obesidade infantil deve se pautar em novas estratégias, com atenção ao cotidiano das crianças permitindo assim maior aderência, como por exemplo, os jogos digitais. (Brigden et al., 2020; Toscani, 2007)
O domínio das tecnologias já é algo bastante natural para as crianças. Os jogos, em qualquer plataforma que forem utilizados (PC, celular, videogames) já se estabeleceram como algo trivial na vida dessa população (Toscani, 2007; Savi, e Ulbricht, 2008). Outra característica das crianças na contemporaneidade é que elas não se afeiçoam a forma de ensino que ainda é feita atualmente, sendo muito mais as linguagens digitais. Assim, cada vez mais se torna necessário que o conjunto de interações para a promoção da saúde se paute por uma linguagem com características próximas ou iguais as usadas pelas crianças. Constata-se então a necessidade, cada vez maior, que a aprendizagem, em qualquer área inclusive na saúde, seja feita por meio de tecnologias (Silva, e Silva, 2017).
Os jogos eletrônicos podem produzir uma nova forma de interação e de aprendizagem possibilitando assim, que especificidades relacionadas à saúde possam ser ensinadas de forma motivacional (Machado et al., 2011). É nesse contexto que o uso dos Exergames (EXG) se torna um excelente instrumento à saúde. Os EXG é o acrônimo de “exercise” e “games” ou jogos eletrônicos, que convertem a movimentação corporal real para um “[...] ambiente virtual, permitindo que os usuários [...] pratiquem esportes virtuais, exercícios de fitness e/ou outras atividades físicas [...]” (Medeiros et al., 2017, p. 465). Com a utilização dos EXG busca-se apresentar atividades em situações problemas, que oportunizem a aprendizagem e mudanças comportamentais, e ainda, a motivação e aderência à proposta de promoção de saúde contra a obesidade. (Machado et al., 2011)
Nesse ínterim, a utilização das tecnologias pode ser um fator potencializador na busca por uma vida mais saudável (Unnithan et al., 2006). Assim, este trabalho objetivou identificar, evidências no uso de Exergames (videogames ativos) em que a literatura aponta a prevenção da obesidade e incentivo a práticas contra o sedentarismo.
Método
No modelo adotado para este trabalho e visando encontrar achados de qualidade, sete etapas foram definidas: busca inicial; leitura de títulos; leitura de resumos; leitura do texto completo; definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados; avaliação dos estudos incluídos por meio do instrumento declaração CONSORT; interpretação dos resultados.
A busca de dados neste trabalho foi feita pelo método de revisão integrativa que é:
A revisão integrativa inclui a análise de pesquisas relevantes que dão suporte para a tomada de decisão e a melhoria da prática clínica, possibilitando a síntese do estado do conhecimento de um determinado assunto, além de apontar lacunas do conhecimento que precisam ser preenchidas com a realização de novos estudos. (Mendes et al., 2008, p. 758)
A prospecção dos artigos utilizados se deu em agosto 2021, limitando-se aos idiomas português e inglês, todos retirados de publicações científicas produzidas entre os anos de 2015 e 2020. Para inclusão, os critérios são os seguintes: 1) artigos de estudos que buscassem entender a associação entre o uso dos EXG e a diminuição da obesidade/sobrepeso infantil por meio de ensaios clínicos randomizados, preferencialmente; 2) Outras variáveis, satélites a associação primária, tais como, o gasto energético, questões psicossociais, aumento do tempo de atividade física etc., também poderiam fazer parte da inclusão de artigos. Foram excluídos da revisão: livros, teses e dissertações; artigos científicos com duplicidade; artigos e resumos provenientes de congressos e conferências; artigos com o mesmo escopo temático, mas voltados para reabilitação e população etária acima de 18 anos.
A busca pelos artigos científicos foi realizada em quatro bases de dados, quais sejam: ScienceDirect, Scopus, LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), e MedLine (Sistema Online de Busca e Análise de Literatura Médica). Essas bases foram escolhidas por possuírem uma literatura internacional ampla e de qualidade de estudos em saúde.
Visando a consecução da pesquisa nas bases de dados, utilizou-se a busca dos seguintes termos: “Exergames”; “Obesity”; “Children” combinados pela lógica booleana “AND”. Inicialmente, a seleção bibliográfica se deu pela leitura dos títulos, seguindo os critérios de inclusão e exclusão já determinados anteriormente. Ato contínuo, os autores se dedicaram a realizar a leitura minuciosa dos resumos dos artigos aprovados pelos critérios propostos. Nesse momento, excluíram‑se os artigos em que os resumos não apresentaram o foco nos pontos de elegibilidade já nomeados. Finalmente, as publicações restantes foram avaliadas de forma integral.
No que concerne à qualidade dos estudos, ela foi avaliada pelo instrumento declaração CONSORT (Consolidated Standards of Reporting Trials).
O objetivo da declaração CONSORT é auxiliar no relato dos estudos clínicos por meio de 25 critérios, distribuídos em: título e resumo, introdução, métodos, resultados, discussão e outras informações. Assim, quanto mais critérios da declaração forem encontrados no artigo mais adequado será a sua validade. Os artigos inclusos deveriam ter um percentual acima de 75% para figurarem na revisão. (Pacheco et al., 2017)
Na Tabela 1 pode ser vista a quantidade de trabalhos que foram amealhados nas bases de dados. De início, a busca levou a um total de 63 artigos que respondiam positivamente aos critérios de inclusão por meio dos critérios já apontados.
Visando tornar mais compreensível como se deu a seleção dos artigos nas bases de dados confeccionou-se um fluxograma (Figura 1) apontando as etapas que foram seguidas para se chegar aos dados que foram utilizados.
Resultados
Foram encontrados cinco artigos (Quadro 1) que atendiam aos critérios de inclusão e, com o intuito de apontar os dados pertinentes aos artigos escolhidos, uma tabela foi confeccionada apresentando os seguintes quesitos: os autores, ano de publicação e Qualis; a avaliação do artigo em relação à declaração CONSORTE; o objetivo; a amostra; o método e; o resultado dos trabalhos.
Quadro 1. Relação dos artigos incluídos na revisão
Autores Ano Qualis |
Avaliação do artigo pela CONSORT |
Objetivo |
Amostra |
Método |
Resultados |
Irandoust et al., 2020 A2 |
22 itens (88%) |
Investigar o efeito dos exergames (Grupo experimental 1) e de exercícios aquáticos (Grupo experimental 2) na função pulmonar de crianças obesas. |
61 crianças do sexo masculino |
Comparação entre os Grupos Experimentais que praticavam Exercícios com Exergames com os que praticavam exercícios aquáticos e o Grupo controle. |
EXG e exercícios aquáticos melhoraram a perda de peso e função pulmonar em crianças obesas. |
Liang et al., 2020 A4
|
22 itens (88%) |
Determinar os efeitos de uma intervenção de EXG feita na escola sobre o tempo de atividade física, a composição corporal e os fatores psicossociais em crianças. |
87 crianças com sobrepeso/obesidade divididas em um grupo controle e um grupo de intervenção (n=30) |
Prática de EXG durante uma hora, duas vezes na semana por 8 semanas. |
Os resultados do estudo indicaram que uma intervenção EXG para aumentar os níveis de atividade física. |
Staiano et al., 2018 A1 |
20 itens (80%) |
Testar a eficácia do EXG para reduzir a adiposidade infantil e melhorar a saúde cardiometabólica. |
46 crianças com sobrepeso / obesidade |
Intervenção por meio de EXG em casa tendo um currículo de treino a ser feito (1 hora por sessão, três vezes por semana) e treinamento em vídeo chat com um preparador físico. |
O EXG melhorou o escore z do Índice de Massa Corporal (IMC), a saúde cardiometabólica e os níveis de atividade física das crianças. |
Gao et al., 2017 B1 |
19 itens (76%) |
Examinar o efeito de EXG no comportamento sedentário de crianças e o gasto de energia em comparação com as aulas regulares de educação física. |
261 (134 meninas) (127 meninos) |
Os participantes foram divididos em 2 grupos. Grupo 1 (125 minutos semanais de EXG) e grupo 2 comparação (125 minutos semanais de aulas de educação física). |
EXG pode ter o mesmo efeito positivo no gasto de energia em crianças que participam de aulas de Educação Física de forma regular. |
Staiano et al., 2017 A2 |
21 itens (84%) |
Examinar a influência do EXG na composição corporal de meninas adolescentes e nos fatores de risco cardiovascular. |
41 adolescentes com sobrepeso/obesa. |
Estudo randomizado controlado com adolescente com sobrepeso/obesas utilizando um EXG de dança. Grupo de condição controle com cuidado autodirigido.
|
O grupo de intervenção diminuiu a gordura da perna e diminuiu a adiposidade abdominal subcutânea. O grupo de intervenção também diminuiu de modo significativo a adiposidade abdominal e aumentou a densidade mineral óssea do tronco e da coluna. |
Fonte: Autores
É válido ressaltar que, no tocante a metodologia, os artigos ultrapassaram a marca média de 83% da declaração CONSORTE. Devido a esse valor pode-se inferir que as questões de ordem qualitativa nos artigos apontados, se mostram melhor estruturada e com maior rigor científico.
Em virtude dos diversos resultados apontados pelos artigos, foi necessária a divisão dos dados coletados em duas categorias (Quadro 2), quais sejam: a categoria relacionada à obesidade (Categoria I) e; a categoria não relacionada à obesidade (Categoria II).
Quadro 2. Categorias temáticas dos resultados dos artigos
Estudos |
Categoria I Relacionada à obesidade |
Irandoust et al., 2020 Staiano et al., 2017 Staiano et al., 2018 |
Perda de peso. Melhora do Índice de Massa Corporal (IMC). Diminuição da adiposidade subcutânea. Melhora na saúde cardiometabólica. |
Liang et al., 2020 |
Dados inconclusivos quanto à obesidade. |
Estudos |
Categoria II Não relacionada à obesidade |
Staiano et al., 2017 Liang et al., 2020 Gao et al., 2017 |
Aumento da Densidade Mineral Óssea do tronco e da coluna. Aumento do tempo de atividade física. Gasto energético igual às aulas de Educação Física. |
Fonte: Autores
Discussão
Com os achados foi possível inferir que há variadas possibilidades para o uso de EXG na saúde. No que tange a análise dos dados, foi possível depreender que essas possibilidades de uso podem ser separadas em grupos distintos: um que busca promover a melhora na saúde por meio da diminuição da obesidade/sobrepeso e outro que se dedica ao incentivo à prática do exercício físico e ao aumento de hábitos mais saudáveis.
No tocante à obesidade, três artigos da Categoria I apontam que os EXG podem ser considerados como uma ferramenta de combate a essa afecção. Essa é a percepção de Maddison et al. (2014) que mostram uma associação positiva do EXG e a composição corporal. O trabalho verificou a redução do IMC e da gordura em um Grupo Experimental enquanto o Grupo Controle teve aumento do IMC quando do início do estudo. Concordando também com os resultados apresentados, Ni Mhurchu et al. (2008) em estudo piloto, observaram a diminuição do peso corporal e da circunferência de cintura em crianças que faziam uso de EXG em comparação ao grupo controle. Essa percepção é a mesma apresentada por Staiano et al. (2017) que ao promoverem um estudo com 54 adolescentes com obesidade/sobrepeso durante 20 semanas, com atividades de EXG entre 30-60 minutos por dia, constataram a sua eficácia na diminuição do sobrepeso da amostra e nos contextos cardiometabólicos.
Já a tese de Pinto (2020) objetivou avaliar os efeitos de um EXG, que era jogado duas vezes por semana, por 12 semanas consecutivas por uma amostra de 67 crianças de 6 a 11 anos. O estudo analisou diversas variáveis antropométricas (massa corporal, estatura, IMC, circunferência de tórax, circunferência de cintura, circunferência de quadril, relação cintura/quadril, dobra cutânea do tríceps e dobra cutânea subescapular), força explosiva e marcadores bioquímicos em crianças com sobrepeso e obesidade. A tese concluiu que o uso dos EXG se mostrou benéfico para a melhora dos itens citados produzindo efeito que podem provocar diminuição do sobrepeso e obesidade.
Contrariamente a visão de diminuição da obesidade/sobrepeso por EXG, o trabalho de revisão de Kracht et al. (2020) mostram evidências ambíguas sobre até que ponto o EXG pode ser uma ferramenta para redução e atenuação do ganho de peso. Já Madsen et al. (2007) e Graves et al. (2008) discorrem que não encontraram benefícios que demonstrassem mudança na composição corporal na utilização de EXG. Somado a isso há também a percepção, por meio dos relatos das crianças em uma intervenção que, os EXG se tornaram monótonos, fazendo com que seu tempo de uso diminuísse gerando assim, implicações de longo prazo. (Madsen et al., 2007)
Valeriani et al. (2021) em uma revisão de literatura na qual buscaram entender se os EXG são eficazes como ferramenta de combate a obesidade e sobrepeso, concluíram que mais pesquisas ainda são necessárias para definir se os EXG podem ser usados com eficácia no tratamento da obesidade infantil e qual pode ser a abordagem para seu uso no tratamento. No entanto, o estudo também deixou claro que os resultados sugerem efeito positivo sobre o peso em crianças e adolescentes obesos.
Liang et al. (2020) ao estudarem o EXG e sua relação na diminuição da obesidade de 87 crianças (grupo de intervenção n=30), apontaram que, após oito semanas de prática diária de EXG, não foi encontrada nenhuma diferença significativa quanto à composição corporal.
Na Categoria 2, os dados encontrados nos artigos incluídos remetem a outras variáveis que sofreram ação dos EXG, mas que não estavam relacionadas a obesidade. Nessa perspectiva, Staiano et al. (2018) concluíram que a prática dos EXG melhora a DMO. Essa conclusão coaduna com percepção de que exercícios físicos moderados a vigorosos tendem a fortalecer a DMO impedindo influência adversa à massa óssea do de crianças (Hui et al. 1988). Esse também é o entendimento de Pollock et al. (2003) que mostram que o pico de massa óssea pode apresentar maior incremento, em virtude do estresse mecânico imposto aos ossos pelo exercício físico praticado.
Liang et al. (2020) constataram que o uso de EXG permitiu o aumento do tempo de atividade física, condição importante para evitar o ganho de peso. Na esteira dessa percepção, McDonough et al. (2021) ao analisarem a ação dos EXG em 47 adolescentes em aulas de Educação Física perceberam que os níveis de atividade física e prazer aumentavam quando os exercícios com EXG eram feitos em pequenos grupos. Esse resultado também é similar ao de Gomes et al. (2015) em uma revisão de literatura, que objetivou entender se os EXG são ferramentas para o aumento dos níveis de atividade física. Para os autores, os EXG podem sim ser uma alternativa de aumento se for bem desenvolvido e delineado.
Gao et al. (2017) indicam que, quanto ao gasto de energia, o uso de EXG proporcionou um gasto igual a uma aula de Educação Física. Esses achados mantêm uma similaridade com a conclusão de Graf et al. (2009) ao utilizarem o EXG Dance Revolution em um estudo com 23 crianças. Os autores entenderam que os EXG parecem ser um meio seguro, divertido e valioso de promover o gasto energético.
Pereira et al. (2012, p. 338) realizaram uma revisão de literatura tendo como foco de análise o gasto energético (GE), a frequência cardíaca (FC) e o nível de atividade física durante a prática de exergames. Os autores concluíram que, os EXG são uma opção para o aumento dos níveis diários de GE, FC e o nível de atividade física de crianças e adolescentes. No entanto, os autores também afirmam que os EXG devem ser utilizados como complementos de outras intervenções. Os autores acusam ainda em sua revisão que, é preferível que a prática de EXG seja feita com jogos que tenham movimento global, possibilitando que todo o corpo dispenda energia.
Acompanhando o tema gasto energético, Graves et al. (2008) e Ni Mhurchu et al. (2008) denotam que, embora os EXG aumentem o gasto energético de crianças sedentárias, eles não devem substituir a prática esportiva real, tendo em vista que, essa última possui maiores amplitudes de movimentos, maior necessidade de coordenação motora e benefícios de ordem psicossocial que não podem ser deixados de lado.
Ao contrário dos resultados apresentados White et al. (2011) por usa vez, concluíram que os EXG não são intensos o suficiente para contribuir com o tempo predito de atividades físicas diárias para crianças, sejam elas moderadas ou vigorosas. No entanto, todos os estudos apresentados não podem ser comparados de forma equalizada devido os diferentes jogos utilizados o que pode redundar em diferença na observação do gasto energético.
Como visto na presente discussão, os EXG são uma tecnologia que tem sido aproveitada em diversos campos e nesse sentido, não poderia deixar de ser pesquisado pelas áreas de saúde como a Educação Física. Sua utilização parece que ainda causa algumas divergências, apontando então para a necessidade de novas descobertas, as quais poderão manifestar maior clareza sobre o uso de EXG no contexto aqui apontado.
A presente revisão pode conter algumas limitações por conta de: incluir apenas trabalhos de 2015 a 2020; não ter incluído e discutido artigos pagos e ainda, utilizar artigos publicados apenas nas línguas inglesa e portuguesa.
Conclusão
A presente revisão objetivou identificar, evidências positivas de estratégias com EXG que visassem prevenir, tratar a obesidade/sobrepeso de crianças ou incentivar práticas contra a obesidade utilizando esse instrumento tecnológico.
Os dados apresentados pela literatura apontam para evidências bastante positivas para o EXG como estratégia no tratamento da obesidade. Os estudos mostram que há possibilidade de perda de peso, melhora do IMC, diminuição da adiposidade subcutânea e finalmente, melhora da saúde cardiometabólica.
É necessário, contudo, perceber que os dados mostrados não estão todos equalizados de forma a diferirem em instrumento, volume, intensidade, amostra etc. Essa condição pode fazer com que as comparações se tornem menos efetivas, podendo-se no mínimo, fazer uma comparação de resultados, os quais podem mostrar se o EXG serviu ao objetivo de prevenir, tratar a obesidade/sobrepeso de crianças e/ou incentivar práticas contra a obesidade.
A presente revisão pode servir de ponto de partida para que, pesquisadores da área das Ciências da Saúde possam se interessar pelos EXG. Com isso, mais uma ferramenta poderá ser posta às mãos dos profissionais de Educação Física visando assim, combater a obesidade/sobrepeso.
Referências
Baptista, I., e Lima, R. (2006). Educação Alimentar em Meio Escolar. Referencial para uma Oferta Alimentar Saudável. Ministério da Educação. https://www.dge.mec.pt/sites/default/files/Esaude/educacao_alimentar_em_meio_escolar.pdf
Brigden, A., Anderson, E., Linney, C., Morris, R., Parslow, R., Serafimova, T., Smith, L., Briggs, E., Loades, M., e Crawley, E. (2020). Digital Behavior Change Interventions for Younger Children With Chronic Health Conditions: Systematic Review. Journal of Medical Internet Research, 22(7), e16924. https://doi.org/10.2196/16924
Gao, Z., Pope, Z., Lee, JE, Stodden, D., Roncesvalles, N., Pasco, D., Huang, CC, e Feng, D. (2017). Impact of exergaming on young children’s school day energy expenditure and moderate-to-vigorous physical activity levels. Journal of Sport and Health Science, 6(1), 11-16. https://doi.org/10.1016/j.jshs.2016.11.008
Gomes, J., Melo, R., Oliveira, S., e Costa, M. (2015). Exergames podem ser uma ferramenta para acréscimo de atividade física e melhora do condicionamento físico? Revista Brasileira de Atividade Física & Saúde, 20(3), 232. https://doi.org/10.12820/rbafs.v.20n3p232
Graf, D.L., Pratt, L.V., Hester, C.N., e Short, K.R. (2009). Playing Active Video Games Increases Energy Expenditure in Children. Pediatrics, 124(2), 534-540. https://doi.org/10.1542/peds.2008-2851
Graves, L.E.F., Ridgers, N.D., e Stratton, G. (2008). The contribution of upper limb and total body movement to adolescents’ energy expenditure whilst playing Nintendo Wii. European Journal of Applied Physiology, 104(4), 617-623. https://doi.org/10.1007/s00421-008-0813-8
Hui, S.L., Slemenda, C.W., e Johnston, C.C. (1988). Age and bone mass as predictors of fracture in a prospective study. Journal of Clinical Investigation, 81(6), 1804-1809. https://doi.org/10.1172/jci113523
Irandoust, K., Taheri, M., H’mida, C., Neto, GR, Trabelsi, K., Ammar, A., Souissi, N., Chtourou, H., Nikolaidis, PT, Rosemann, T., e Knechtle, B. (2020). Exergaming and Aquatic Exercises Affect Lung Function and Weight Loss in Obese Children. International Journal of Sports Medicine, 42(06), 566-572. https://doi.org/10.1055/a-1289-9307
Kracht, C.L., Joseph, E.D., e Staiano, A.E. (2020). Video Games, Obesity, and Children. Current Obesity Reports, 9(1), 1-14. https://doi.org/10.1007/s13679-020-00368-z
Liang, Y., Lau, P.W.C., Jiang, Y., e Maddison, R. (2020). Getting Active with Active Video Games: A Quasi-Experimental Study. International Journal of Environmental Research and Public Health, 17(21), 7984. https://doi.org/10.3390/ijerph17217984
Maddison, R., Marsh, S., Foley, L., Epstein, LH, Olds, T., Dewes, O., Heke, I., Carter, K., Jiang, Y., e Mhurchu, CN (2014). Screen-Time Weight-loss Intervention Targeting Children at Home (SWITCH): a randomized controlled trial. International Journal of Behavioral Nutrition and Physical Activity, 11(1). https://doi.org/10.1186/s12966-014-0111-2
Madsen, K.A, Yen, S., Wlasiuk, L. Newman, B., e Lustig, R. (2007). Feasibility of a Dance Videogame to Promote Weight Loss Among Overweight Children and Adolescents. Archives of Pediatrics and Adolescent Medicine, 161 (1), 105-107. https://doi.org/10.1001/archpedi.161.1.105-c
McDonough, D.J., Liu, W., Su, X., e Gao, Z. (2021). Small-Groups Versus Full-Class Exergaming on Urban Minority Adolescents’ Physical Activity, Enjoyment, and Self-Efficacy. Journal of Physical Activity and Health, 18(2), 192-198. https://doi.org/10.1123/jpah.2020-0348
Medeiros, P., Capistrano, R., Zequinão, M.A., Silva, S.A., Beltrame, T.S., e Cardoso, F.L. (2017). Exergames como ferramenta de aquisição e desenvolvimento de habilidades e capacidades motoras: uma revisão sistemática. Revista. Paulista de Pediatria, 35(4), 464-471. https://doi.org/10.1590/0104-4060.66038
Mendes, K.D.S., Silveira, R.C. de C.P., e Galvão, C.M. (2008). Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto & Contexto - Enfermagem, 17(4), 758-764. https://doi.org/10.1590/s0104-07072008000400018
Ni Mhurchu, C., Maddison, R., Jiang, Y., Jull, A., Prapavessis, H., e Rodgers, A. (2008). Couch potatoes to jumping beans: A pilot study of the effect of active video games on physical activity in children. International Journal of Behavioral Nutrition and Physical Activity, 5(1), 8. https://doi.org/10.1186/1479-5868-5-8
Machado, A.F., Zanetti, M.C., e Moioli, A. (2011). O corpo, o desenvolvimento humano e as tecnologias. Motriz, (17), 728-737. https://doi.org/10.1590/S1980-65742011000400018
Pacheco, R.L., Martimbianco, A.L.C., Garcia, C.M., Logullo, P., e Riera, R. (2017). Guidelines para publicação de estudos científicos. Parte 3: Como publicar ensaios clínicos. Diagnóstico e Tratamento, 22(4), 169-75. https://search.bvsalud.org/gim/resource/pt/biblio-848018
Pereira, J.C., Rodrigues, M.E., Campos, H.O., e Amorim, P. (2012). Exergames como alternativa para o aumento do dispêndio energético: uma revisão sistemática. Revista Brasileira de Atividade Física & Saúde, 17(5), 332-340. https://doi.org/10.12820/2317-1634.2012v17n5p332
Pinto, R.P. (2020). Efeitos dos jogos eletrônicos de mídia interativa (Exergames) na composição corporal de crianças e adolescentes com sobrepeso e obesidade [Tese de doutorado. USP]. https://doi.org/10.11606/T.17.2020.tde-05102020-113624
Pollock, N.K., Bernard, P.J., Gutin, B., Davis, C.L., Zhu, H., e Dong, Y. (2011). Adolescent Obesity, Bone Mass, and Cardiometabolic Risk Factors. The Journal of Pediatrics, 158(5), 727-734. https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2010.11.052
Reis, C.E.G., Vasconcelos, I.A.L., e Barros, J.F. de N. (2011). Políticas públicas de nutrição para o controle da obesidade infantil. Revista Paulista de Pediatria, 29(4), 625-633. https://doi.org/10.1590/s0103-05822011000400024
Savi, R., e Ulbricht, V.R. (2008). Jogos digitais educacionais: benefícios e desafios. Renote, 6(1). https://doi.org/10.22456/1679-1916.14405
Silva, T.O., e Silva, L.T.G. (2017). Os impactos sociais, cognitivos e afetivos sobre a geração de adolescentes conectados às tecnologias digitais. Revista de Psicopedagogia, 103(34), 87-97. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-84862017000100009
Staiano, A.E., Beyl, R.A., Guan, W., Hendrick, C.A., Hsia, D.S., e Newton, R.L. (2018). Home-based exergaming among children with overweight and obesity: a randomized clinical trial. Pediatric Obesity, 13(11), 724-733. https://doi.org/10.1111/ijpo.12438
Staiano, A.E., Marker, A.M., Beyl, R.A., Hsia, D.S., Katzmarzyk, P.T., e Newton, R.L. (2017). A randomized controlled trial of dance exergaming for exercise training in overweight and obese adolescent girls. Pediatric Obesity, 12(2), 120-128. https://doi.org/10.1111/ijpo.12117
Toscani, NV, Santos, AJDS, Silva, LLM, Tonial, CT, Chazan, M., Wiebbelling, AMP, e Mezzari, A. (2007). Desenvolvimento e análise de jogo educativo para crianças visando à prevenção de doenças parasitológicas. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, 11(22), 281-294. https://doi.org/10.1590/s1414-32832007000200008
Unnithan, V., Houser, W., e Fernhall, B. (2006). Evaluation of the Energy Cost of Playing a Dance Simulation Video Game in Overweight and Non-Overweight Children and Adolescents. International Journal of Sports Medicine, 27(10), 804-809. https://doi.org/10.1055/s-2005-872964
Valeriani, F., Protano, C., Marotta, D., Liguori, G., Romano Spica, V., Valerio, G., e Gallè, F. (2021). Exergames in Childhood Obesity Treatment: A Systematic Review. International Journal of Environmental Research and Public Health, 18(9), 4938. https://doi.org/10.3390/ijerph18094938
Wang, Y., Monteiro, C., e Popkin, B.M. (2002). Trends of obesity and underweight in older children and adolescents in the United States, Brazil, China, and Russia. The American Journal of Clinical Nutrition, 75(6), 971-977. https://doi.org/10.1093/ajcn/75.6.971
White, K., Schofield, G., e Kilding, A.E. (2011). Energy expended by boys playing active video games. Journal of Science and Medicine in Sport, 14(2), 130-134. https://doi.org/10.1016/j.jsams.2010.07.005
Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 27, Núm. 294, Nov. (2022)