ISSN 1514-3465
Produção científica sobre atividades circenses
no centro-oeste do Brasil no período 2015-2020
Scientific Production on Circus Activities in
Central-West Brazil in the Period 2015-2020
Producción científica sobre actividades de circo en el
centro-oeste de Brasil en el período 2015-2020
Elias José Mendes Conceição Junior*
eliasjr12349@gmail.com
Luis Bruno de Godoy**
godoy.luisb@gmail.com
Deyvid Tenner de Souza Rizzo***
deyvidrizzo1@gmail.com
Rogério Zaim-de-Melo****
rogeriozmelo@gmail.com
*Acadêmico do curso de Educação Física do Campus do Pantanal (CPAN)
da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS)
**Bacharel em Ciências do Esporte; Mestre em Ciências Humanas e Sociais
pelo programa Interdisciplinar em Ciências Humanas e Sociais
Doutorando em Educação Física e Sociedade
pela Faculdade de Educação Física da Unicamp (FEF/Unicamp)
Membro do Laboratório de Estudos em Pedagogia do Esporte - LEPE
e Grupo de Estudos e Pesquisa em Cultura Lúdica, Circo e Educação Física - CLUCIEFE
***Doutor em Ciências do Desporto
pela Universidade de Trás os Montes e Alto Douro – UTAD
Professor do curso de Educação Física e do Programa de Pós-graduação
em Educação do Câmpus do Pantanal (CPAN)
da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Corumbá, MS
Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa
em Cultura Lúdica, Circo e Educação Física – CLUCIEFE
****Doutor em Educação Brasileira pela PUC-Rio
Professor do curso de Educação Física do Câmpus do Pantanal (CPAN)
da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Corumbá, MS
Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa
em Cultura Lúdica, Circo e Educação Física – CLUCIEFE
(Brasil)
Recepção: 08/04/2020 - Aceitação: 18/06/2020
1ª Revisão: 11/06/2020 - 2ª Revisão: 15/06/2020
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Citação sugerida:
Conceição Junior, E.J.M., Godoy, L.B., Rizzo, D.T.S., y Zaim-de-Melo, R. (2020). Produção científica sobre atividades circenses no centro-oeste do Brasil no período 2015-2020. Lecturas: Educación Física y Deportes, 25(267), 118-131. Recuperado de: https://doi.org/10.46642/efd.v25i267.2133
Resumo
Em meados dos anos 2000, as atividades circenses passaram a figurar como tema de pesquisa na Educação Física brasileira, no entanto, grande parte desses estudos está centrada na região sudeste do país. Nesse contexto, o presente artigo objetiva apresentar um levantamento das produções científicas que abordam a atividade circense na região centro-oeste do Brasil. Para isso foi realizada uma revisão sistemática em duas bases de dados, utilizando descritores em português. Como critério de inclusão, instituiu-se artigos publicados no período de 2015 a 2020, em periódicos publicados em língua portuguesa. Foram encontrados 12 artigos de relevância para essa pesquisa, separados em 5 categorias; 1) circo como ferramenta pedagógica; 2) contribuições para o desenvolvimento da criatividade e expressão corporal; 3) formação continuada de professores; 4) formação do artista circense; 5) circo como manifestação capitalista. Mesmo sendo encontradas poucas produções em relação à região delimitada, pode-se notar que já começa a haver um aumento gradativo nas produções com essa temática. Com isso, existe um avanço no que diz respeito à pesquisa na área circense na região centro-oeste, visto que se trata de uma área do conhecimento pouco investigada em relação a outras.
Unitermos
: Produção científica. Circo. Arte circense.
Abstract
In the mid-2000s, circus activities started to appear as a research theme in Brazilian Physical Education, however, most of these studies are centered in the Southeast region of the country. In this context, this article aims to present a survey of scientific productions that address circus activity in the Midwest region of Brazil. For this, a systematic review was carried out in two databases, using descriptors in Portuguese. As an inclusion criterion, articles published in the period from 2015 to 2020, in journals published in Portuguese, were instituted. 12 relevant articles were found for this research, separated into 5 categories; 1) circus as a pedagogical tool; 2) contributions to the development of creativity and body expression; 3) continuing teacher education; 4) training of the circus artist; 5) circus as a capitalist manifestation. Even though few productions are found in relation to the delimited region, it can be noted that there is already a gradual increase in productions with this theme. With this, there is an advance regarding research in the circus area in the Midwest region, since it is an area of knowledge little investigated in relation to others.
Keywords
: Scientific production. Circus. Circus art.
Resumen
A mediados de la década de 2000, las actividades de circo comenzaron a aparecer como un tema de investigación en la Educación Física brasileña, sin embargo, la mayoría de estos estudios se centran en la región sureste del país. En este contexto, este artículo tiene como objetivo presentar un relevamiento de producciones científicas que abordan la actividad del circo en la región del centro-oeste de Brasil. Para ello, se realizó una revisión sistemática en dos bases de datos, utilizando descriptores en portugués. Como criterio de inclusión, se instituyeron artículos publicados en el período de 2015 a 2020, en revistas publicadas en portugués. Se encontraron 12 artículos relevantes para esta investigación, separados en 5 categorías; 1) el circo como herramienta pedagógica; 2) contribuciones al desarrollo de la creatividad y la expresión corporal; 3) formación continua del profesorado; 4) formación del artista de circo; 5) el circo como manifestación capitalista. Aunque se encuentran pocas producciones en relación con la región delimitada, se puede observar que ya hay un aumento gradual de las producciones con este tema. Con esto, hay un avance con respecto a la investigación en el área de circo en la región del centro-oeste, ya que es un área de conocimiento poco investigada en relación con otras.
Palabras clave:
Producción científica. Circo. Arte circense.
Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 25, Núm. 267, Ago. (2020)
Introdução
Entre as manifestações culturais, o circo é uma das mais antigas da humanidade, apesar de não necessariamente ser aquele como conhecemos hoje – o circo de lona. No entanto, existem registros históricos diversos, que vão desde figuras manipulando objetos, personagens cômicos, poses acrobáticas, adestramento de animais e outros que compunham um cenário próximo ao que hoje entendemos por circo, hoje tão difundido e conhecido. Acredita-se que o circo tenha se originado a partir da ideia do oficial de cavalaria inglês Philip Astley (1742-1814), que utilizava animais da cavalaria em adestramentos e apresentações com cavaleiro para o público. Um dos pontos centrais que caracterizam Astley ao circo moderno está no fato de as apresentações passarem a ser apresentadas em um espaço fechado (Anfiteatro Astley), deslocando aquilo que era apresentado publicamente, para um espaço no qual a cobrança de ingresso era possível. Outro ponto a ser destacado é a arena de 13 metros de circunferência, próximo àquilo que hoje conhecemos como picadeiro. (Bolognesi, 2003; Castro, 2005)
Cada vez mais pessoas (professores, arte-educadores, recreacionistas) reproduzem o meio circense em diferentes abordagens fora das grandes apresentações, como também algumas modalidades circenses que passam a ser utilizadas isoladamente em outras áreas, como é o caso das acrobacias aéreas, solo e até mesmo a palhaçaria, utilizadas com fim de entretenimento, desenvolvimento pessoal e outros. O circo acaba sendo cooptado pelo sistema comercial que vê benefícios e possibilidade de crescimento econômico por detrás das modalidades. Para Caramês et al. (2012, p.180), o circo “representa uma parte importante da cultura humana que foi construída durante séculos desde que o homem descobriu a importância de registrar suas ideias e seus feitos”, o que reverbera até hoje e continua em constantes transformações, visto que o circo faz parte de um contexto e esse está em constantes modificações.
Dando continuidade à ideia anterior, Gonzáles, Darido e Oliveira (2014) afirmam que o circo está ligado às mudanças econômicas, estéticas, culturais e humanas. Nos picadeiros tradicionais, entre os séculos XVII e XX, eram encontradas diferentes técnicas e vestuários, outra roupagem para o espetáculo circense se comparado a hoje. Naquela época, as cenas apresentadas baseavam-se nas demonstrações de humanos e de animais. Em meados do século XIX até parte do século XX, entre as expressões artísticas o espetáculo circense mobilizava um grande número de espectadores, como destaca Silva (2017).
A partir de meados do século XVIII, no Leste Europeu, várias “famílias circenses” e artistas de rua resolveram sair de suas nações, migrando para outros países, já que a Europa pouco aceitava essas pessoas (os artistas), vistas como uma desordem ao meio social, marginalizando-as (Silva, 1996). Isso acarretou em uma distribuição da arte circense para outros lugares do mundo, como o Brasil.
Datam do século XIX os primeiros apontamentos desses artistas circenses em terras brasileiras, percorrendo várias regiões e se apresentando em pequenos espetáculos, convidando músicos e artistas locais para fazerem parte da atração (Silva, 1996), processo que fundiu a cultura circense europeia com a brasileira.Apenas no século XIX, com a formação do “circo tradicional”, formado por famílias, as crianças passam a viver em meio aos artistas circenses e começam a ser ensinadas pelos seus pais, fazendo com que a transmissão desses saberes transforme o circo em um tipo de escola. (Silva, 1996)
Somando a essa mixórdia as influências do Circo Moderno Europeu, despontam as primeiras características do que viria a ser um novo Circo no Brasil, que perdurou ao longo do século XX e percorreu as mais longínquas comunidades do território nacional carregado de traços da cultura popular, da música, da literatura e muita diversão: o Circo-Teatro. (Kronbauer; Nascimento, 2013, p.239)
Na década de 1970, houve um constante crescimento das empresas de entretenimento no país, que buscavam novas atrações para seus shows. Por conta disso, muitas famílias tradicionais do circo, para se adaptarem ao mercado de trabalho, afastaram-se da lona, tentando novas perspectivas através dos estudos, rompendo a tradição da transmissão dos saberes circenses. Os vínculos que ligam os meios de produção com divisão do trabalho tentaram procurar formas de criar artistas de circo desvinculados ao circo tradicional, distante, portanto, da transmissão de geração em geração, surgindo a necessidade de artistas já preparados. Nesse contexto, surgiram as primeiras escolas de circo no Brasil. A estreante foi a Academia Piolin, em 1978, que encerrou suas atividades em 1983, em São Paulo, e com o tempo foram surgindo novas, como a Escola Nacional de Circo, na cidade do Rio de Janeiro, institucionalizada pelo próprio governo federal. (Kronbauer; Nascimento, 2013)
Duprat e Bortoleto (2007) apontam o novo circo como consequência de recorrentes rupturas na cultura circense tradicional e da inserção de outros segmentos artísticos, como música, dança e teatro em seus espetáculos, propiciando o advento de centros de ensino especializados e partícipes de origens distintas. Devido a essas mudanças, o circo que conhecemos hoje carrega traços de culturas e períodos históricos distintos, que se fundem no fazer artístico. Frente a isso, o circo “absorveu as mais diferentes tendências, criando um vínculo muito forte com a sociedade e com o povo que dele fazem parte”. (Duprat; Bortoleto, 2007, p. 1)
Essa multiplicidade presente nas artes circenses, fez com que outros aspectos fossem explorados e trabalhados, levando a questionamentos diversos, que chamaram a atenção de artistas e pesquisadores com interesse, quer seja, no campo artístico, educacional, social ou filosófico.Esses estudos não só embasam a arte, como fortalecem, permitem seu avanço e valorização para além da própria arte circense. Hoje, parte desses estudos provém do Sudeste do Brasil e se constituem como forte referência para outros pesquisadores e artistas.
Neste cenário, buscamos compreender como estão os estudos acadêmicos em torno do circo nas outras regiões brasileiras, mais especificamente na região Centro-Oeste, se existem tais produções, e quais aspectos são trabalhados. Diante disso, com o presente artigo temos o objetivo de fazer um levantamento das produções científicas que abordam a atividade circense na região Centro-Oeste do Brasil, analisando os temas tratados nessas produções.
Metodologia
A metodologia empregada tem um caráter qualitativo que não se atém apenas à representatividade numérica, mas também à compreensão das linhas de estudos que estão sendo desenvolvidas, seu caráter interdisciplinar, a amplitude desses estudos no que diz respeito às áreas, entre outros aspectos. Para Minayo (2001), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que equivale a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.Por estarmos tratando de um fenômeno social, olhar para além daquilo que é quantificável dentro desse trabalho tem uma significância social.Precisamos compreender os aspectos sociais por detrás dessas produções, observando o que elas trazem das particularidades da própria região Centro-Oeste.
A pesquisa utilizou-se do estudo bibliográfico, por meio do qual “busca dar resposta ao problema formulado a partir da análise de produções de outros autores” (Medeiros, 2006, p. 54). As amostras foram analisadas utilizando da revisão sistemática, cuja eleição apoiou-se em um método aplicado uniformemente com uma avaliação criteriosa, reunindo os artigos estudados e procurando suas relações com outras pesquisas criadas, que tenham alguma comparação ou distintas manifestações sobre o tema em destaque, o Circo.
A investigação foi realizada por meio de busca nas bases de dados eletrônicas Google Scholar e SciELO, utilizando para as buscas as seguintes palavras-chaves: “circo”, “arte circense”, “prática circense” e “Centro-Oeste”. Como critérios de seleção, foram selecionadas publicações entre 2015 e 2020; artigos com enfoque na atividade circense, circo e arte circense; voltada apenas para produções oriundas do Centro-Oeste brasileiro.
Após o processo de análise dos textos com base nos critérios estabelecidos para seleção, foram selecionados os artigos que tratavam sobre “a arte circense na região Centro-Oeste”. Estes foram lidos, agrupados e classificados, utilizando uma organização seguindo as categorias temáticas em relação aos estudos encontrados.
Resultados
O processo de pesquisa realizado neste estudo identificou, inicialmente, por meio dos descritores e palavras-chave combinados, 43 artigos. Em seguida, houve uma separação, utilizando-se os critérios de inclusão, como filtros de pesquisa, tais como: 1) estudos publicados entre 2015 e 2020; 2) artigos com enfoque na atividade circense/circo/arte circense; 3) produções realizadas apenas no Centro-Oeste brasileiro. Após a aplicação dos filtros, 12 produções compuseram a amostra dessa revisão, tendo em vista que abordavam fatores com a temática proposta. As propostas foram agrupadas em cinco categorias: 1) circo como ferramenta pedagógica; 2) contribuições para o desenvolvimento da criatividade e expressão corporal; 3) formação continuada de professores; 4) formação do artista circense e 5) a arte circense na rua.
Quadro 1. Classificação das publicações
Categoria |
Produção |
1 |
Hungria,
Heloá Tavares et al. (2017). Matemática
no circo: aprimorando o conhecimento por meio da ludicidade. Encontro
Goiano de Educação Matemática, (6) 6, p;
430-437, |
Oliveira
Torres, Tallyta Gabriella de; Dantas, Renata Aparecida Elias (2017). Artes
circenses: acrobacia coletiva como conteúdo da educação física
escolar.Universitas: Ciências da Saúde,
15 (1) p. 1-7. |
|
Mota,
Mauro Palmeira; Duque, Tiago (2018). Corpo
e questões de gênero e sexualidade nas atividades circenses em uma
escola de Corumbá-MS, BRASIL. Educação Online.
13 (28), p. 39-59, 2018. |
|
Santos Munhões,
Luan Christian et al. (2019). Atividades
circenses no contraturno escolar: um estudo com estudantes do ensino médio.
Lecturas: Educación Física y Deportes. 24 (255), p. 2-12. |
|
2 |
Ramos,
Bruno Amaral (2016).As artes
circenses nas aulas de educação física do IFG-Formosa: contribuições
para o desenvolvimento da expressão corporal e criatividade. Ciclo Revista. 1
(2). |
Yogui,
Bianca Arantes Martins; De Toledo, Eliana; Bortoleto, Marco Antonio
Coelho (2017). A inclusão do
aluno com deficiência visual nas atividades circenses sob a perspectiva
dos profissionais da área.Corpoconsciência.
21 (1), p. 70-79. |
|
Zaim-De-Melo, R. (2020). Vai,
vai, vai começar a brincadeira: as atividades circenses na extensão
universitária. Em
Extensão. 18 (2), p. 178-185. |
|
3 |
Tiaen,
Marcos Sergio; Nascimento Sambugari, Marcia Regina (2019). Perspectivas e desafios da formação continuada em atividades
circenses no contexto escolar. Itinerarius
Reflectionis, 15 (2), p. 1-20. |
Zaim-De-Melo, R. et al.
(2019).A influência das
atividades circenses na formação de professores de educação física:
um estudo a partir de projetos de extensão. Revista
Cocar. 13 (27) p. 1064-1079. |
|
4 |
Anunciato,
Isis Beatriz (2018). Preparando
a mochila: início da subida a montanha da palhaça. Anais
ABRACE (19) 1. |
5 |
Santos,
Juliano Batista et al. (2017).
Arte circense en los semáforos
de Cuiabá, MT: trabajo informal que realiza y sustenta el
artista. Revista Corpo-grafías,
Estudios críticos de y desde los cuerpos, 4, (4), p.
184-197. |
Espiríto
Santo, Anderson Luis; Nascimento, Rainne Feitoza; Almeida, Rosa de
Barros Ferreira (2016). Malabares:
um olhar sobre a fronteira Brasil/Bolívia. Perspectiva Geográfica
11 (15), p. 13-22. |
Fonte: Elaboração própria.
Em relação ao tipo de estudo, predominou a utilização do circo como ferramenta pedagógica na educação física e em outras matérias do ensino base. Em quatro pesquisas (Hungria, 2017; Mota; Duque, 2018; Santos Munhões et al., 2019; Oliveira Torres; Dantas, 2017) percebe-se que a correlação significativa entre a atividade circense juntamente com a educação física ocasiona uma melhor compreensão do conteúdo proposto para o aluno (categoria 1). Entre as quatro pesquisas listadas, uma correlaciona o ambiente circo com saberes matemáticos, obtendo êxito em sua amostra (Hungria, 2017). Isso evidencia a pluralidade da temática circo e sua abertura para dialogar com áreas do conhecimento distintas.
Três artigos da amostra (Ramos, 2016; Yogui, 2017; Zaim-de-Melo, 2019) evidenciam as contribuições para o desenvolvimento da expressão corporal e criatividade, buscando compreender como o circo estimula o desenvolvimento da cultura corporal do aluno e como isso pode ampliar seus conceitos motor e cognitivo (categoria 2).
Após averiguação constatou-se que entre as pesquisas encontradas, um estudo (Anunciato, 2018) busca compreender a formação do artista, destacando como é a preparação do artista circense, as performances do circo (categoria 4). Com isso, o circo se difunde por várias vertentes, ampliando o leque de possibilidades para sua utilização como ferramenta de produção de conhecimento.
Entre as 12 pesquisas, duas (Tiaen, Sambugari, 2019; Zaim-de-Melo et al., 2019) abordam a formação continuada de professores de educação física (categoria 3) da cidade de Corumbá, que se localiza ao extremo oeste de Mato Grosso do Sul, com isso faz uma observação sobre a necessidade da formação continuada em relação à atividade circense, pois crê que a atividade circense é de grande valia para os alunos que ainda estão em fase de desenvolvimento social, motor e cognitivo.
Finalizando a análise das 12: duas (Espírito Santo; Nascimento; Almeida, 2016; Santos, 2017), abordam a arte circense na rua (categoria 5), retratando o cotidiano de quem vive da arte em sinaleiros.
Após esse processo, foi feito um gráfico com as 12 publicações encontradas, mostrando a distribuição delas pelos estados do Centro-Oeste, nos quais foram produzidas.
Discussão
Para facilitar a compreensão, a análise foi feita em cinco vertentes, tendo em vista a difusão das pesquisas, e os estudos foram agrupados por linha metodológica, área de atuação e contextualização. A análise é composta pelas temáticas: circo como ferramenta pedagógica; contribuições para o desenvolvimento da criatividade e expressão corporal; formação continuada de professores; formação do artista circense; e, por fim, a arte circense na rua.
Circo como ferramenta pedagógica
A atividade circense, quando utilizada em âmbito escolar pode gerar impactos significativos para os processos educativos. Diante disso, diversos autores e estudiosos da educação e do circo acreditam que sua implementação nas aulas de educação física possui um potencial pedagógico:
Defendemos, aqui, a possibilidade de inclusão do circo na educação formal, um conhecimento legítimo que apresenta fatos históricos, influencia modos de vida e a própria sociedade como um todo, uma arte em constante desenvolvimento. Uma possibilidade de esse conhecimento estar presente na escola é vinculá-lo à Educação Física, que em nosso entendimento tem como premissa a transmissão dos conhecimentos relativos à cultura corporal universalmente construídos em um espaço humano de convivência social. (Duprat; Gallardo, 2010, p. 16)
Pode parecer que para se trabalhar com as artes circenses seja necessária uma estrutura grandiosa, como a dos circos de lona, no entanto, a atividade circense em si pode não demandar um grande espaço físico e nem materiais específicos. Recursos alternativos e recicláveis podem ser utilizados a fim de desenvolver as atividades sem que se perca a qualidade.Um exemplo disso são as claves de jornal e garrafa, as bolas feitas com bexiga e painço. Isso faz com que a arte circense possa ser utilizada como ferramenta pedagógica, contribuindo com o ensino. Também é importante considerar que as várias modalidades circenses proporcionam aos alunos vivenciarem atividades diferentes das convencionais, permitindo trabalhar com o corpo em toda sua amplitude, tendo em vista suas inúmeras possibilidades. (Ayala, 2008)
As atividades voltadas ao equilíbrio, acrobacias em solo, malabares, esquetes cênicas, entre outras que requeiram pouco ou nenhum equipamento específico, facilitam sua aplicação em nível escolar. Essa inserção contribui para o repertório motor e cognitivo do aluno, proporcionando outras concepções com relação às ações desenvolvidas.
Portanto, a educação física relacionada à atividade circense proporciona e desenvolve:
[...] uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da história, exteriorizadas pela expressão corporal [...] que podem ser identificados como formas de representação simbólica de realidades vividas pelo homem, historicamente criadas e culturalmente desenvolvidas. (Coletivo de Autores, 2009, p. 39)
Contribuições para o desenvolvimento da criatividade e expressão corporal
A criatividade potencializa novas interpretações e rompe com padrões preestabelecidos para alcançar novos objetivos. Para Bauman (1998), a arte está para além de uma simples criadora de imagens, ela também cria significados e identidade para aquilo que, em outros momentos, não havia nenhum, podendo até mesmo dizer que ela desconstrói aqueles significados já definidos. Não são poucos os pensadores que tratam sobre a criatividade e o artista enquanto um sujeito do criar, aquele que se coloca a experimentar e conceber novos olhares torna-se artista, dão novos sentidos para os objetos, coisas, pensamentos, etc. (Godoy, 2019)
Outros autores, como Sadi (2010), destacam os processos neurocientíficos presentes nesse criar, no qual ideias novas possibilitam outras estruturas e táticas para resolver problemas, fugindo das formas convencionais. Por sua vez, essas novas maneiras de constituir o pensamento são criações novas. Segundo o autor: “O cérebro humano, na busca de rompimento com padrões e modelos já conhecidos, procura identificar novos objetos e informações” (p. 53).
Combinado com a educação física, o circo pode ser uma ferramenta para ampliar a expressividade dos alunos. A inserção do circo com as aulas de educação física pode trazer inúmeros benefícios para criatividade, expressão e consciência corporal, dicção e tantas outras. Compreendendo que a criatividade e a expressão corporal devem ser trabalhadas, e que essas vão sendo adquiridas em processos constantes de trocas e comunicação, o professor de educação física tem papel de mediador para estimular a criatividade e a expressão corporal, assim como o senso crítico do aluno no que diz respeito ao próprio movimento.
Impõe-se assim uma tarefa importante aos profissionais em educação física, através da prática e do desenvolvimento de estudos sérios, a relevância da educação física para a formação integral da pessoa. E este desafio profissional exigirá o empenho de todos. Empenho no sentido de contribuir para o desenvolvimento de consciências crítica [...]. (Taffarel, 1985, p. 14).
Nessa linha de raciocínio, Bortoleto (2008) considera que a atividade circense cria um ambiente que favorece a experimentação, além de poder contribuir com outros aspectos importantes para a formação do aluno: cooperação, trabalho em equipe e integração entre grupos.
Formação continuada dos professores
A formação continuada dos professores é de grande importância, tanto para o professor quanto para o aluno.Para que isso ocorra é necessário um ambiente saudável, no qual aluno e professor possam se beneficiar desse processo. Para Imbernón (2010, p. 108), na formação continuada é necessário: “gerar uma motivação intrínseca relacionada à tarefa de ‘ser professor ou professora’, ação que é muito mais difícil, se os docentes se encontram imersos em um ambiente de desmotivação e passividade, educacional ou ideológica”.
Existem centenas de modalidades circenses, no entanto, poucas são trabalhadas e, na maioria das vezes, trata-se apenas do básico da arte circense. Para Bortoleto (2011, p. 47) essa contribuição acaba sendo:
[...] no mínimo contestável para o entendimento (e não rendimento) por parte de nossos alunos, os quais têm vivenciado apenas fragmentos das artes do circo, dispersos entre si, o que dificulta o dimensionamento da importância e abrangência desta linguagem corporal.
A formação continuada com esse viés ainda não é muito presente nos tempos atuais.Com isso, há uma dificuldade ao transpor esses conteúdos dentro de sala de aula, sabe-se que a atividade circense tem muito a oferecer aos seus praticantes, tanto no repertório motor, como no cognitivo.Com isso, é necessária a utilização da arte circense não só dentro das aulas de educação física, explorando todo o seu aspecto interdisciplinar.
Formação do artista circense
Até o século passado, para ser artista de circo havia dois caminhos: ser de uma família de artistas desse ambiente ou se juntar a uma e cair na estrada, passando pelas incertezas do mundo circense (Silva, 1996). Com o passar do tempo o circo foi se renovando e conquistando outros espaços de atuação.Das lonas o circo ganhou as escolas, shoppings, acadêmicas e espaço na mídia. Ampliando seu espaço na rua, grandes empresas de entretenimento surgiram e, diante disso, o circo foi se ressignificando e conquistando novos adeptos.
Um dos princípios de maior valia dentro do circo é a segurança, posta sempre em questão, com o sucesso ou fracasso do espetáculo. Trata-se de algo de suma importância até nos ensaios, sendo a principal responsável pela magnitude do espetáculo.Exigindo o domínio do artista,
[...] toda ação realizada no âmbito circense – seja uma instalação, montagem, a aprendizagem de uma nova acrobacia, a preparação de um novo número ou mesmo uma aula regular – contém riscos, isto é, pode resultar de modo favorável, representado pelo sucesso, ou, ao contrário, ter um desfecho desfavorável, como no caso de um acidente. (Ferreira; Bortoleto; Silva, 2015, p. 31)
Mesmo com todas as medidas de segurança postas, durante a formação do artista circense, ele se submete a inúmeros desafios, colocando sua integridade física em questão.Entretanto, para que haja uma experiência de cunho positivo, é importante o querer do aluno, seu bem-estar. Com isso, o aluno precisa exercer seu livre arbítrio, “a liberdade de pensar, desejar e decidir”. (Dewey, 1976, p. 59)
Levando em consideração a longevidade do circo e a propagação das atividades circenses, a criação de redes interligadas é trivial. Através delas a formação do artista circense será intermitente e, com isso, essa manifestação cultural atinge um público maior.
Temos diversas associações, cooperativas, coletivos de artistas, instituições e escolas de circo, como a ASFACI e a ABRACIRCO, entre outras, que buscam, a partir de suas representatividades, aumentar o âmbito de atuação do circo [...]. (Duprat, 2014, p. 115)
Para a durabilidade dessa cultura é importe trazer e fazer com que o circo, o picadeiro, a experiência circense, seja algo fantástico tanto para quem aprende quanto para quem aprecia o espetáculo.Artista ou espectador necessitam se extasiar em seus respectivos lugares. Lugar onde os homens crêem no inacreditável, o circo acentua o fascínio de todos. Independentemente do número que está ocorrendo, quem está no palco não é apenas o artista, o público se equilibra junto com o homem na corda bamba, com o trapezista que se balança no ritmo próprio. O público é tudo.
Arte circense na rua
Segundo Bergamasco (2006), a arte do malabarismo consiste na manipulação de objetos com precisão, criatividade, agilidade e harmonia; pode ser feita com bolinhas, claves, aros, tochas, facas, caixas, entre outros objetos. É uma modalidade popular no circo, que extrapolou a “lona”, sendo comum encontrar malabaristas demonstrando sua arte nos semáforos, praças e demais espaços urbanos, e, ao final, fazem aquilo que é comum ao circo mambembe: “passam o chapéu”. No entanto, muitas vezes essa arte é confundida com um pedido de caridade, e os artistas como pessoas sem ocupação, pedintes, maltrapilhos.Entretanto esses artistas mambembes estão presentes no entretenimento das pessoas há milhares de anos, nas feiras, palcos e picadeiros. (Bergamasco, 2006)
O artista de rua, assim como tantos outros, tem uma base de estudo.Seja esta formal ou informal, provém de horas de dedicação e uma busca constante por superar a si mesmo. Bortoleto (2008) afirma que o malabarismo é uma modalidade que sempre está se renovando, assim, o artista deve buscar sempre novas habilidades, renovar constantemente aquilo que desenvolve, um estudo que não cessa, e depende muito da paixão de quem o faz.
Seu estilo de vida viajante – ou em outras palavras: mambembe – perpassa os séculos resistindo todas as adversidades, mantendo e sustentando uma arte que subverte os padrões estabelecidos e, na maioria das vezes, hegemônicos. Apesar dos preconceitos com o artista de rua, ainda assim esse cumpre com uma função de extrema importância no que diz respeito à “formação de plateia”.O artista na rua é um disseminador de tal arte, mesmo que por hora esta seja vista como marginal.
Um ponto que não podemos rejeitar é certo elitismo por detrás desse olhar do público para com o artista de rua brasileiro. O que aqui é marginal, na Europa se torna uma “atividade intelectualizada” por esses mesmos brasileiros que menosprezam a arte de rua no Brasil. Em certa medida, um “viralatismo” comumente presente no Brasil (infelizmente). Para Jessé Souza (2017), esse viralatismo, está impregnado em nossa cultura e foi uma construção das elites culturais e intelectuais americana e europeia, sendo fruto também de um paradigma racista/culturalista que os próprios países sul-americanos acabam validando, o que inferioriza, invalida e tira a autoconfiança daquilo que produzimos e criamos, seja na arte ou na ciência. Esse é um dos motivos pelo qual a arte de rua é tão importante para resistir e mostrar o valor da nossa cultura.
Conclusão
Foram encontradas 12 pesquisas relacionadas à temática de circo, suas práticas e atividades, classificadas em 5 categorias, sendo sua utilização na prática educacional a mais propensa a ser investigada. Mesmo sendo encontradas poucas produções em relação ao recorte proposto, pode-se notar que já se começa a apresentar um aumento gradativo das produções científicas que tratam da temática “circo” na região Centro-Oeste do Brasil, e isso se mostra um ponto positivo, pois se trata de um assunto pouco pesquisado em comparação a outros temas e áreas, mas que pode ter o mesmo nível de enriquecimento para a academia.
Com isso, espera-se que no futuro haja um arcabouço teórico maior no que diz respeito à pesquisa sobre a arte circense, tanto em âmbito mundial, nacional e regional, como no caso da região Centro-Oeste, pois é um tema que pode ser manifestado em vários aspectos sociais, culturais e educacionais.
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