Lecturas: Educación Física y Deportes | http://www.efdeportes.com

ISSN 1514-3465

 

Fragilidades do conceito de infância na formação 

inicial na Licenciatura em Educação Física

Weaknesses of the Concept of Childhood in the Initial 

Formation in the Degree in Physical Education

Debilidades del concepto de infancia en la formación 

inicial en la Licenciatura en Educación Física

 

Yedda Maria da Silva Caraçato*

yeddacaracato@hotmail.com

Ana Luíza Barbosa Anversa**

ana.beah@gmail.com

Bruna Solera***

brunasoleraef@gmail.com

Patric Paludett Flores****

patricflores_12@hotmail.com

Amauri Aparecido Bássoli de Oliveira*****

amauribassoli@gmail.com

Vânia de Fátima Matias de Souza******

vfmatias@gmal.com

 

*Mestranda em Educação Física pelo Programa

de Pós-Graduação Associado em Educação Física (UEM/UEL)

Licenciada e Bacharela em Educação Física. Integrante do Grupo de Estudos

e Pesquisas em Educação Física Escolar – GEEFE/UEM/CNPq

**Doutora em Educação Física pelo Programa

de Pós-Graduação Associado em Educação Física UEM/UEL

Mestre em Educação Física pelo Programa de Pós-Graduação

Associado em Educação Física UEM/UEL

Especialista em Prescrição Personalizada de Exercícios Físicos -

Personal Training pela Universidade Estadual de Maringá - UEM

***Doutoranda em Educação Física pelo Programa de Pós-graduação

Associado em Educação Física da Universidade Estadual de Maringá

e da Universidade Estadual de Londrina (PEF- UEM/UEL)

Mestre em Educação Física Programa de Pós-graduação

Associado em Educação Física UEM/UEL. Especialista em Educação Especial e 

Psicomotricidade no Contexto Escolar pelo Instituto Paranaense de Educação

****Licenciado em Educação Física pelo Centro de Educação Física

e Desportos da Universidade Federal de Santa Maria (CEFD/UFSM)

Especialista em Educação Física Escolar (CEFD/UFSM)

Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE/UFSM)

Doutor em Educação Física pelo Programa de Pós-Graduação Associado em Educação Física

da Universidade Estadual de Maringá e Universidade Estadual de Londrina (PEF/UEM-UEL)

*****Graduado em Educação Física pela Universidade do Norte do Paraná

Mestrado em Ciência do Movimento Humano

pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)

Doutorado em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)

Pós-doutorado em Educação Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

******Graduada em Pedagogia pela Faculdade Estadual

de Educação Ciências e Letras de Paranavaí

Graduada em Educação Física pela Universidade Estadual de Londrina

Mestre em Educação Física pelo Programa de Pós-Graduação Associado em 

Educação Física da Universidade Estadual de Maringá e Universidade Estadual de Londrina

Doutora em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação

Professora Adjunta do Departamento de Educação Física

Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação

da Universidade Estadual de Maringá

(Brasil)

 

Recepção: 23/07/2019 - Aceitação: 19/08/2020

1ª Revisão: 04/06/2020 - 2ª Revisão: 11/08/2020

 

Level A conformance,
            W3C WAI Web Content Accessibility Guidelines 2.0
Documento acessível. Lei N° 26.653. WCAG 2.0

 

Creative Commons

Este trabalho está sob uma licença Creative Commons

Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional (CC BY-NC-ND 4.0)

https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt

Citação sugerida: Caraçato, Y.M. da S., Anversa, A.L.B., Solera, B., Flores, P.P., Oliveira, A.AB. de, & Souza, V. de F.M. de (2020). Fragilidades do conceito de infância na formação inicial na Licenciatura em Educação Física. Lecturas: Educación Física y Deportes, 25(268), 2-13. Recuperado de: https://doi.org/10.46642/efd.v25i268.1509

 

Resumo

    Esta pesquisa objetivou analisar o conceito de infância na formação inicial nos cursos de Licenciatura em Educação Física, a partir dos indicadores contidos nas ementas dos cursos das Instituições de Ensino Superior (IES) públicas do estado do Paraná. Utilizou-se dos pressupostos da pesquisa qualitativa do tipo documental, com o intuito de apresentar as interlocuções percebidas sobre o reconhecimento da infância no processo formativo. Os resultados indicam a escassez de disciplinas que tratem das questões da infância; sendo evidenciado que o conceito está sendo associado a fases e etapas de desenvolvimento motor, atrelados à perspectiva desenvolvimentista. Como resultado, pode-se desprender que os currículos de formação inicial, apresentam fragilidades nas múltiplas interjeições com os campos antropológicos e sociais, evidenciando uma lacuna conceitual no processo de formação docente dos cursos investigados.

    Unitermos: Educação Física. Currículo. Formação básica. Infância.

 

Abstract

    This research aims to analyze the concept of childhood present in initial training curricula in undergraduate Physical Education courses, based on the indicators contains in the subjects and courses of the public schools of the state of Paraná. It used the assumptions of qualitative research of documentary type, in order to present the perceived dialogues about the recognition of childhood in the formative process. Results indicate a scarcity of disciplines that address childhood issues; evidencing a concept associates with phases and stages of motor development, linked to the developmental perspective. As a result, it can be inferred that the initial education curricula present weaknesses in the multiple interjections with the anthropological and social fields, highlighting a conceptual gap in the process of the teacher education of the investigated courses.

    Keywords: Physical Education. Curriculum. Initial formation. Childhood.

 

Resumen

    Esta investigación tuvo como objetivo analizar el concepto de infancia en la formación inicial en los cursos de Licenciatura en Educación Física, a partir de los indicadores contenidos en los menús de los cursos de las Instituciones de Educación Superior (IES) públicas en el estado de Paraná. Utilizamos los supuestos de la investigación cualitativa de tipo documental, para presentar las controversias percibidas sobre el reconocimiento de la infancia en el proceso formativo. Los resultados indican la escasez de disciplinas que se ocupan de los problemas de la infancia; evidenciando que el concepto se asocia con fases y etapas del desarrollo motor, vinculadas a la perspectiva del desarrollo. Como resultado, se puede ver que los currículos de capacitación inicial muestran debilidades en las múltiples articulaciones con los campos antropológicos y sociales, evidenciando una grieta conceptual en el proceso de capacitación docente en los cursos investigados.

    Palabras clave: Educación Física. Plan de estudios. Formación básica. Infancia.

 

Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 25, Núm. 268, Sep. (2020)


 

Introdução 

 

    Discutir o conceito de infância e suas perspectivas no contexto de formação inicial suscita a compreensão de que esse tema tem sido alvo de inquietações elucidadas ao longo da história da sociedade, sendo influenciado de acordo com perspectivas econômicas e sociais, que atrelaram esse conceito a questões perceptivas motoras e afetivas acerca do ser criança. (De Oliveira, 2005)

 

    Como exemplo, pode-se mencionar o fato de que na sociedade contemporânea o conceito de infância é compreendido como uma categoria ampla, proveniente de uma construção social e cultural estabelecida a partir de constructos históricos, culturais e econômicos relacionados à figura da criança que rompe os limites biológicos e desenvolvimentistas. (Quinteiro, 2019; Bueno & Martinelli, 2019; Delgado & Müller, 2005; Demartini, 2001)

 

    Romper com a linearidade dicotômica acerca do ser criança e o repensar da infância (Oliveira, Teperino, & Sales, 2019) nos contextos de formação de professores,é romper com a exclusividade de um olhar direcionado ao campo desenvolvimentista ou psicomotor, trazendo ações pedagógicas para além das experiências e vivencias do aprendiz, o que pode possibilitar o desenvolvimento da autonomia da criança, isto porque entende-se que o processo formativo deve oportunizar a compreensão do conceito de infância em sua totalidade.

 

    Partindo da premissa de que, mesmo havendo um conceito pré-estabelecido acerca da infância, e uma tradição consolidada de estudos tratando da relevância dessa temática para o processo de formação inicial dos professores de Educação Física (Vanzuita, Raitz & Garanhani, 2020; Garanhani, 2010), os currículos dos cursos de formação na área ainda carecem de um debate acerca do conceito da infância enquanto corpo de conhecimentos atrelado ao tempo, espaço e necessidade social. Está compreensão se dá pelo fato de que o termo infância é um conceito que rompe com a compreensão minimalista de um momento próprio da natureza humana, podendo ser explicada para além dos aspectos biológicos ou relacionais.

 

    Sarmento (2005, p.366), afirma que tratar do conceito de infância envolve compreender as questões sociais, históricas e culturais, uma vez que “a infância é historicamente construída, a partir de um processo de longa duração que lhe atribuiu um estatuto social e que elaborou as bases ideológicas, normativas e referenciais do seu lugar na sociedade”, sendo esse processo uma ação continua vinculada à prática social e as suas interações decorrentes de relações escolares e não escolares.

 

    Tratar o tema infância na formação inicial em Educação Física, compete trazer à cena o debate acerca de questões desenvolvimentistas, comportamentalistas, sociais e culturais, a partir de campos empíricos em constantes mudanças e das influências teóricas que recaem constantemente sobre a formação inicial ofertada pelos cursos de Licenciatura, sendo refletidas na construção dos currículos dos cursos de formação docente.

 

    Desse modo, o presente estudo teve por objetivo analisar o conceito de infância nos currículos de Licenciatura em Educação Física, a partir dos indicadores contidos nas ementas dos cursos das Instituições de Ensino Superior (IES) públicas do estado do Paraná.

 

Métodos 

 

    A pesquisa descritiva sustentada na análise documental buscou destacar o estabelecimento de relações entre variáveis por meio de documentos que ainda não apresentaram um tratamento analítico, ou que podem ser reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa. (Gil, 2002)

 

    Tendo delineado como se daria a busca pelo objeto, a opção procedimental relacionada à seleção dos espaços de investigação se deu, em um primeiro momento, vinculada ao interesse em entender como os cursos, em âmbito local, estruturam-se perante a temática.

 

    A partir dessa definição foram adotados os seguintes momentos: a) realizar um levantamento acerca das instituições públicas do Estado do Paraná, que ofertam os cursos de Licenciatura em Educação Física; b) encaminhar os convites aos responsáveis pelas referidas IES para o aceite na participação na pesquisa e envio dos documentos necessários; c) busca das estruturas curriculares e suas respectivas ementas, programas e objetivo das disciplinas de modo a identificar as que tratam sobre a infância; d) identificar junto ao ementário pré-selecionado as palavras-chave nos títulos e conteúdos que remetessem a Educação Física Infantil, Infância, Desenvolvimento ou Aprendizagem Motora, Políticas para a Infância, Psicologia Infantil ou Educacional ou Escolar, Psicomotricidade, Jogos, Brinquedos e Brincadeiras, de modo a agrupá-las em categorias de análise conforme indicado por Bardin (2011).

 

    Das 08 (oito) IES identificadas e qualificadas a participar da pesquisa, 06 (seis) IES atenderam os critérios apresentados e nomeados ao logo das discussões como IES 1 a IES 6.

 

    Destaca-se que, a pesquisa vincula-se ao projeto Educação Física Escolar: perspectivas e ações pedagógicas na atualidade, do grupo de estudos e pesquisas em educação física escolar (GEEFE- CNPq), sendo aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Estadual de Maringá-Pr-Br. sob o parecer nº 1.715.040.

 

Resultados e discussão 

 

    Para verificar como tem se dado o trato com os conhecimentos e conceitos relacionados à infância ao longo do processo de formação inicial nos cursos de Licenciatura em Educação Física, os objetivos e conteúdos programáticos foram agrupados em duas categorias: abordagem biológica e/ou interacionista.

 

    A primeira análise buscou identificar quais/quantas disciplinas ofertadas ao longo da trajetória do curso apresentam relação com a temática infância.De acordo com o quadro 1, das IES participantes do estudo, observou-se que o trato com a infância se apresenta imbricada nas representações formativas a partir dos preceitos biológicos que circunscrevem a área.

 

Quadro 1. Currículo e Disciplinas: onde está o tema da infância?

IES 1

Aprendizagem e Desenvolvimento Motor

Crescimento e desenvolvimento físico

Psicologia da educação aplicada

Comportamento Motor I

IES 2

Comportamento Motor II

IES 3

Desenvolvimento Motor

Fundamentos Psicológicos da Educação

IES 4

Aprendizagem Motora

Crescimento e desenvolvimento humano      

Fundamentos Psicológicos da Educação

IES 5

Crescimento e Desenvolvimento Motor

Fundamentos Psicológicos da Educação

IES 6

Crescimento e Desenvolvimento Humano

Fundamentos Psicológicos da Educação

Fonte: Elaborado pelos autores

 

    Os dados apresentados indicam que o conceito de infância perpassa nos currículos das seis IES de acordo com a matriz curricular que compõe o rol de disciplinas das referidas instituições, indicando concentração na área biológica com foco desenvolvimentista, apresentando-se por vezes de forma fragmentada e descontextualizada das premissas básicas da compreensão da infância enquanto constructo social, no qual são consideradas as relações entre a criança em seu ambiente social, afetivo e econômico e suas fases de desenvolvimento. Este indicativo se confirmou a partir das análises realizadas nos títulos e descrições das ementas,as quais evidenciaram o conceito de infância sustentado nos conceitos advindos das áreas da psicologia, psicomotricidade e desenvolvimento motor humano, com especial influência do campo da psicomotricidade, tendo uma escassez nos temas referentes às relações históricas e sociais, retirando os achados de Dutra (2020, p. 107), ao expor que os modelos de formação, em geral, “revelam a diversidade nos conteúdos de preparação dos professores, o que acaba comprometendo a unidade formativa entre os professores, tendo cada um sua própria concepção de ensino e uma prática dissociada do previsto pelas legislações e teorias educacionais. De acordo com Sayão (1999, p.49):

    Fortemente arraigada à psicologia do desenvolvimento, a psicomotricidade, construiu suas teorias tendo como base os aspectos evolutivos (cognitivos, afetivos, emocionais, psicomotores, sociais, etc.) da infância e da adolescência com o objetivo de observar e constatar as mudanças no comportamento dos indivíduos ao longo de sua existência [...]

    Para além das áreas vinculadas a psicologia e ao desenvolvimento das etapas motoras da criança, pode-se observar que os cursos investigados apresentam indicativos (ainda que de forma limitada), para o debate sobre a infância a partir das perspectivas pedagógicas nos campos da recreação e lazer e da saúde, conforme demonstra o Quadro 2.

 

Quadro 2. O conceito de infância diluído nas disciplinas dos cursos de Educação Física

IES 1

Educação Física Infantil

IES 2

Jogos, Brincadeiras e a Escola

IES 3

Educação Física em contextos educativos I

Atividade Física na infância e adolescência e pedagogias da EF

IES 4

Jogos e Brincadeiras

Ensino na Educação Infantil

Fonte: Elaborado pelos autores

 

    Com relação ao Quadro 2, nota-se que a relevância das disciplinas ofertadas pelas IES 1, IES 2, IES 3 e IES 4, se dá na direção de possibilitar ao estudante ampliar sua análise conceitual acerca da temática, isto porque, de acordo com ementas das disciplinas apresentadas nas figuras 1, 2, 3, 4 e 5 o foco dos conteúdos centram-se nos campos: pedagógico, do lazer e da saúde em geral, voltados à intervenção e atuação no contexto escolar, fato este que é observado no estudo realizado por Silva, Oliveira, Medeiros, Araujo & Anacleto (2019) ao afirmarem a necessidade de inserção do professor de educação física com formação no campo para atuar no campo da educação básica, uma vez que seus conhecimentos são específicos às necessidades e demandas apresentadas na realidade escolar.

 

Figura 1. O foco das Disciplinas IES 1

Figura 1. O foco das Disciplinas IES 1

Fonte: os autores

 

    Ao analisar a IES 1 (Figura 1) e IES 2 (Figura 2) a partir do currículo disponibilizado de 2017, observou-se a evidência das perspectivas oriundas das abordagens desenvolvimentistas, conforme apontado nas Figuras 1 e 2. As disciplinas do currículo vigente da IES 1 indicam a preocupação com o desempenho e desenvolvimento das habilidades infantis, em detrimento aos aspectos sociais e culturais que envolvem esse momento da criança.

 

Figura 2. O foco das Disciplinas IES 2

Figura 2. O foco das Disciplinas IES 2

Fonte: os autores

 

    Observa-se que na Figura 2, a IES 2 apresenta a busca pelo diálogo com as questões sociais por meio da disciplina Jogos, Brincadeiras e a Escola, cujo cerne, de acordo com os documentos disponibilizados, se dá no sentido de trabalhar o jogo e a sua dimensão social, o jogo como um dos recursos para se ensinar, mas ainda sem trazer em cena as discussões e compreensões conceituais acerca do que se tem como infância.

 

    As disciplinas ofertadas nas IES 1 e 2, suscitam para o estudo com foco no desenvolvimento da criança e não em entender quem ela é, a infância em si. Fato este, que se difere ao investigarmos a IES 3, que acena para possíveis ilações entre campo desenvolvimentista e as compreensões sociais da infância, conforme aponta Figura 3.

 

Figura 3. O foco das Disciplinas IES 3

Figura 3. O foco das Disciplinas IES 3

Fonte: os autores

 

    O destaque para o currículo da IES 3, se dá nos direcionamentos das disciplinas buscando atrelar as questões específicas da área, saberes e conhecimentos advindos do campo pedagógico, dando especial atenção aos processos educativos para diferentes grupos sociais relacionado a cultura corporal, conforme destaque nas Figuras 4 e 5.

 

Figura 4. O foco das Disciplinas IES 4

Figura 4. O foco das Disciplinas IES 4

Fonte: os autores

 

Figura 5. O foco das Disciplinas IES 5

Figura 5. O foco das Disciplinas IES 5

Fonte: os autores

 

    As disciplinas em destaque, nas Figuras 1, 2, 3, 4 e 5, acenam de forma sutil a busca pela inserção dos campos de intervenção presentes na atuação profissional como possibilidade de campo de trabalho. Esse fato pode se dar segundo Neira (2015), pois na atualidade os currículos de educação física refletem o contexto e os pressupostos da sociedade contemporânea.

 

Figura 6. O foco das Disciplinas IES 6

Figura 6. O foco das Disciplinas IES 6

Fonte: os autores

 

    Ao analisarmos as Figuras 1 e 5, referentes às disciplinas ofertadas pelas IES investigadas, evidenciou-se a carência de saberes relacionados à infância, considerando os constructos sociais, isto porque de acordo com Sayão (2002, p.59) é preciso considerar a criança “como sujeito social que possui múltiplas dimensões, as quais precisam ser evidenciadas nos espaços educativos voltados para a infância”.

 

    Outra evidência dessa fragmentação do processo formativo é a escassez do enfoque com o trato com a infância nos cursos de formação inicial, conforme observado nas Figuras 1 a 6, podendo ser justificado pelas afirmativas de Velozo (2010, p.88), em razão de uma historicidade da área de formação fragmentada, isto segundo o autor ocorre porque a educação física,

    Filha da modernidade incorporou em sua prática acadêmica o processo de fragmentação e especialização característico da ciência moderna. Do mesmo modo que esse processo se constitui como certo avanço para o conhecimento humano, ele divide a realidade em partes independentes e desconexas provocando uma dificuldade para a apreensão do real em sua totalidade. (Velozo, 2010, p. 88)

    Para explicitar as disciplinas ofertadas, a Figura 7 apresenta um panorama geral das IES investigadas.

 

Figura 7. Panorama de disciplinas com enfoque nos conteúdos que acenam para os conhecimentos da Infância nas Instituições de Ensino Superior Público do Estado do Paraná

Figura 7. Panorama de disciplinas com enfoque nos conteúdos que acenam para os conhecimentos da Infância nas Instituições de Ensino Superior Público do Estado do Paraná

Fonte: os autores com base nos currículos dos cursos

 

    Conforme esquema apresentado nota-se que às disciplinas constantes nos currículos ofertados pelas IES, evidenciam em sua maioria, o enfoque no campo do desenvolvimento humano, com escassez de disciplinas voltadas aos aspectos cognitivo/psicológico e o pedagógico. Esses indicadores apontam para o fato de que os conteúdos e ações pedagógicas desenvolvidas centram-se na área biológica/desenvolvimentista, utilizando-se das ações lúdicas para o desenvolvimento e estímulo ao movimentar-se, explicitando uma carência em abordagens que fomente discussões acerca da infância em suas diferentes relações com o processo de ensino e aprendizagem escolar.

 

    Os dados coletados a partir das ementas das disciplinas dos cursos de formação inicial indicam fragilidades a partir dos componentes curriculares que tratam da infância em seu aspecto histórico e social, identificando as possibilidades do movimento e do corpo para além das fases motoras, tendo como enfoque a formação integral da criança com foco na autonomia e nos aspectos formativos, possibilitando que a formação inicial dos cursos viabilize aos futuros professores a elaboração de um conceito ampliado e não fragmentado de infância e criança.

 

Conclusões 

 

    As análises das disciplinas e ementas dos cursos de formação inicial em Educação Física das IES do estado Paraná apontam a predominância do conceito de infância trazido da área biológica, centrada na perspectiva desenvolvimentista, entendida como uma abordagem relevante e significativa para o processo de intervenção pedagógica escolar. Contudo, essas abordagens podem ser frágeis em relação aos aspectos de formação integral com foco na autonomia da criança, uma vez que é preciso transitar por outras abordagens e perspectivas no processo de formação inicial. Nesse sentido, os conhecimentos produzidos pela neurociência, no campo dos estudos culturais e das políticas sociais se colocam como muito importantes para que o futuro professor tenha uma compreensão da totalidade da infância, rompendo com a linearidade de uma única abordagem.

 

    Das 06 IES investigadas, apenas os currículos das IES 2 e 4, apresentaram as disciplinas Jogos e Brincadeiras (IES 4). Jogos, Brincadeiras e a Escola (IES 2), cujas ementas indicam a busca por ampliar os conhecimentos em relação à infância a partir das suas relações culturais, afetivas e sociais de forma contextualizada e não meramente fragmentada.

 

    Por fim, os achados nesta pesquisa apontam para a necessidade de que os cursos de formação se atentem para a ampliação e diversificação das abordagens sobre a infância, de forma a possibilitar futuras intervenções contextualizadas e síncronas ao tempo histórico e a representatividade pedagógica relacionada à infância.

 

Referências 

 

Bardin, l. (2011). Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 225.

 

Bueno, D. A., & Martinelli, A. C. (2019). Infância e mídia: primeiras reflexões. Revista Caribeña de Ciencias Sociales, Junho. Recuperado de: https://www.eumed.net/rev/caribe/2019/06/infancia-midia.html

 

De Oliveira, N. R. C. (2005). Concepção de infância na educação física brasileira: primeiras aproximações. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, 26(3), 95-109. Recuperado de: https://www.redalyc.org/pdf/4013/401338510007.pdf

 

Delgado, A. C., & Müller, F. (2005). Sociologia da infância: pesquisa com crianças.Educ. Soc., 26(91), 351-360. Recuperado de: https://www.scielo.br/pdf/es/v26n91/a02v2691

 

Demartini, P. (2001). Contribuições da sociologia da infância: focando o olhar. Florianópolis: UFSC.

 

Dutra, R. M. M. (2020). A formação continuada de professores na educação infantil:as políticas para as escolas em São Luís-MA (2002-2012). Revista Multidebates, 4(1), 106-123. Recuperado de: http://revista.faculdadeitop.edu.br/index.php/revista/article/view/190

 

Garanhani, M. C. (2010). Docência da Educação Infantil. In G. Souza (Org.), Educar na Infância: perspectivas histórico-sociais. pp.187-200. São Paulo: Contexto.

 

Gil, A. C. (2002). Como Elaborar Projetos de Pesquisa (4ª ed.). São Paulo: Atlas.

 

Neira, M. G. (2015). O currículo cultural da Educação Física: uma resposta aos dilemas da contemporaneidade. Revista Linhas. Florianópolis, 16(31), 276–304. Recuperado de: http://periodicos.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723816312015276

 

Oliveira, A. P. S., Teperino, J. B., & Sales, L. F. (2019). Sobre infância e filosofia: suspensão, profanação e atenção na experiência de formação. Praxis & Saber, 10(23), 97-115. Recuperado de: https://revistas.uptc.edu.co/index.php/praxis_saber/article/view/9724

 

Quinteiro, J. (2019). Educação, infância e escola: a civilização da criança. Perspectiva, 37(3), 728-747. Recuperado de: https://doi.org/10.5007/2175-795X.2019.e54108

 

Sarmento, M. J. (2003). Imaginário e culturas da infância. Cadernos de Educação, 12(21), 51-69. Recuperado de: https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/caduc/article/view/1467

 

Sayão, D. T. A. (1999). Disciplinarização do Corpo na Infância: Educação Física, Psicomotricidade e o Trabalho Pedagógico. In D. T. Sayão, M. R. A. Mota, & O. Miranda (Org.). Educação Infantil em Debate: idéias, invenções e achados. Rio Grande: Fundação Universidade Federal do Rio Grande.

 

Sayão, D. T. (2002). Corpo e movimento: notas para problematizar algumas questões relacionadas à educação infantil e à educação física. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, 23(2). Recuperado de: http://www.rbce.cbce.org.br/index.php/RBCE/article/view/270

 

Silva, G. C. S., Oliveira, N. C. R., Medeiros, B. L., Araujo, F. G. C., & Anacleto, F. N. A. (2019). Educação Infantil na BNCC: análise e contextualização do componente curricular educação física. Temas em educação física escolar, Rio de Janeiro, 4(1), 97-116. Recuperado de: http://cp2.g12.br/ojs/index.php/temasemedfisicaescolar/article/view/1938

 

Vanzuita, A., Raitz, T. R., & Garanhani, M. C. (2020). Experiências de inserção profissional na construção de identidades profissionais de formandos em Educação Física. Bol. Téc. Senac, 46(1), 57-81. Recuperado de: https://doi.org/10.26849/bts.v46i1.768

 

Velozo, Emerson Luís (2010). Educação física, ciência e cultura. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, 31(3), 79-93. Recuperado de: https://doi.org/10.1590/S0101-32892010000300006


Lecturas: Educación Física y Deportes, Vol. 25, Núm. 268, Sep. (2020)