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A educação física na ou da escola. Uma tentativa de apresentar
parâmetros de discussão entre as práticas tradicional e nova.

Licenciada em Educação Física - Doutora em Educação
Docente da Escola de Educação Física e Esporte Universidade de São Paulo.
Laboratório de Pedagogia do Movimento do Corpo Humano

Ana Cristina Arantes
aarantes@usp.br
(Brasil)

    Resumo
    Este trabalho é uma reflexão sobre as práticas pedagógicas escolares desenvolvidas atualmente pela Educação Física escolar e uma projeção do que pode vir a ser a partir do próximo século, no Brasil. Esta estudo compara as práticas fundamentadas no ensino diretivo tradicional com um novo panorama delineado a partir das propostas sócio-construtivistas, interativas emergentes neste fim de século. A Educação Física escolar em nosso país tem sido caracterizada, muitas vezes, por uma prática exclusivamente motriz com fundamentação ora recreativa e sem objetivo ora por uma prática que, muitas vezes, exclui os alunos por pautar-se no alto rendimento. A projeção para a Educação Física escolar para o próximo milênio inclui além do desenvolvimento da motricidade, outros aspectos tais como a formação de conceitos, vivência cotidiana da cidadania, construção do conhecimento por trabalhos integrados entre professores e alunos, atividades interdisciplinares, conquista progressiva da autonomia, características vinculadas ao contexto histórico-social intrínseca da sociedade.
    Unitermos: Educação Física Escolar. Ensino.

    Abstrac:
    Physical Education in Brazilian Schools: a comparison of Traditional and New Practices
This study is a consideration on the pedagogic practices presently developed in schools concerning the practice of Physical Education and a suggestion of what it may come to be in the next century, in Brazil. The study compares the traditional practices, based on directive teaching with a new panorama, emergent during the last years resulting in a socio-constructive and interative approach to the process of learning. The Physical Education practiced in brazilian schools has in many ways been characterized as predominantly focused in the motor domain, either recreational in nature and without an objective or having the perfomance as a goal and favourizing only a minority. A suggestion for Physical Education practiced in schools in the next century includes the development of motricity as well as other aspects such as the formation of intellectual and social values. This may be achieved with activities integrating teachers and students, interdisciplinary projects and other strategies which have as a common goal the development of a self-concious notion of citizenship based on intrinsic socio-historic context of the society.
    Key Words: School Physical Education. Teaching.

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 5 - N° 25 - Setiembre de 2000

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Introdução

    A nova e vigente concepção de escola preconiza que ela deve ser um ambiente formador do conhecimento e favorecedor da obtenção da autonomia por parte do aluno. Para realizar tal gigantesca tarefa, durante oito anos de escolaridade obrigatória, cabe a esta instituição de educação formal a transmissão, a passagem ou a construção do saber acumulado pela humanidade (TYLER, 1986).

    Sendo ao mesmo tempo parte e todo da sociedade, esta instituição formal através dos seus rituais, concepções, métodos e estratégias, por um lado, reflete as características políticas, econômicas, culturais e sociais e de outro, se afirma como um espaço destinado ao crescimento intelectual, ético e profissional dos seus alunos (SE/CENP, 1992).

    Em todos os componentes curriculares, sem que se perca a especificidade que caracteriza cada um deles, torna-se necessário pensar na vida e nas experiências pregressas do aluno, nas suas expectativas, no seu nível de maturidade e nas peculiaridades do grupo ao qual pertence. Nesta perspectiva, cada profissional envolvido no processo de escolarização buscaria, em primeira instância, implementar um plano de ensino que favorecesse o auto conhecimento, o reconhecimento e a história do espaço físico que ocupamos, bem como as relações que foram estabelecidas ao longo do tempo.

    De posse destes dados que envolveriam todo projeto escolar estaríamos, em última análise, favorecendo a compreensão dos fatos, conferindo relevância e significado aos mesmos. Estaríamos, desta maneira, concorrendo para que o aluno desde a 1a. série do Ensino Fundamental, analisasse, ponderasse e valorizasse a história de uma maneira geral, sua própria história, a história da sua família, do seu bairro e do seu país.

    Esta prática que permearia todos os componentes escolares, teria como meta a formação dos conceitos, a vivência e a prática objetiva e quotidiana da cidadania.


Características do aluno da escolaridade inicial e a formação da cidadania

    Tomando-se como referência fundamental os estudos de PIAGET (1978), e reforçando a nossa argumentação utilizando-nos da obra de FREIRE (1989), afirmamos que os alunos da 1a. série do Ensino Fundamental se encontram na passagem do período de “inteligência pré-operacional” para o denominado de “operações concretas”.

    O período de inteligência pré-operacional e o denominado operacional segundo WADSWORTH (1987), no tocante a idade entre 05-07 anos “caracteriza uma criança que não consegue resolver problemas de conservação; os julgamentos são baseados na percepção e não na lógica “ (p. 17).

    Quanto ao período subseqüente, o operacional concreto, é definido pelo autor citado no parágrafo anterior, como uma etapa na qual a criança “ atinge a fase da reversibilidade, consegue solucionar os problemas de conservação - operações lógicas desenvolvidas e aplicadas a problemas concretos”(p. 17).

    O que está envolvido nesta etapa do pensamento é basicamente a confirmação, a ampliação dos conceitos aprendidos no período anterior (sensório motor), e o início da aprendizagem de conceitos relativos à temporalidade (antigamente, naquele tempo, ontem hoje, amanhã), à espacialidade, (noção de distância, de posição dos corpos, da posição dos planetas, do sentido de rotação, por exemplo), e a introdução de uma terceira “categoria” de conceitos que se refere aos valores abstratos tais como o conceito de democracia, de casamento, de hierarquia e de lealdade, dentre outros. Entretanto, esta última categoria de conceitos é por demais difícil de ser compreendida pelos alunos neste período de vida.

    De modo a oferecer um ensino significativo, devemos desenvolver os conceitos em forma de um “novelo de lã ”. Partindo da realidade conhecida, com a anuência dos alunos, deve-se buscar ampliar, recombinar, recompor, suprimir ou adicionar novos dados tomando-se por base aquilo que o aluno conhece, que tem intimidade. Desta forma, os conceitos concretos (gato, cachorro), obtidos através da experiência quotidiana, ao que tudo indica, não exigem estratégias muito sofisticadas em termos de evocação ou de proposição da tarefa inclusive aquelas do domínio motor .

    Os outros conceitos pela sua própria natureza (a de ser abstrata), impõem ao professor a criação de recursos que os tornem mais “palatáveis” aos pequenos educandos.

    Dentre as estratégias que o professor poderia lançar mão, uma das mais adequadas seja talvez a utilização das linhas e/ou painéis do tempo onde o educando vê o seu passado, reconhece o seu ambiente físico, percebe as relações de parentesco e também pode observar as diferenças entre a sua história, a da professora e a do seus colegas .

    Nas aulas de Educação Física, dentre outras estratégias, a utilização do jogo simbólico ou “faz de conta” e do jogo de imitação tão valorizados pelos alunos especialmente aqueles cuja idade varia em torno de 7-8 anos, lhes confere a possibilidade de expressão espontânea, de contar, inventar, reconstruir à sua maneira, a vida vivida e observada .

    Uma vez explorada a capacidade de evocação, o professor (e seus alunos) ponderariam os pontos levantados, da pertinência (ou não) dos argumentos e, a partir dos dados oferecidos por eles, organizaria os conceitos estruturando-os e fazendo uma síntese daquilo que fora falado, jogado, vivido. Assim procedendo em todas as oportunidades, tanto o professor quanto os alunos, assumiriam a atitude de investigadores. Através das atividades propostas, experimentadas e analisadas, o aluno pode estabelecer ligação entre aquilo que fora vivido e sentido podendo chegar a estabelecer conceitos, suposições, relacionando as atividades motoras com os domínios afetivo, social e cognitivo.

    O que diferencia esta nova Educação Física daquela praticada anteriormente é por certo a filosofia socio-construtivista que preconiza a construção do conhecimento (nos três domínios) e a conquista gradual e progressiva da autonomia. Estas metas guiam a estruturação dos objetivos, do conteúdo, propõe as estratégias a serem utilizadas e indica critérios para a avaliação.

    A Educação Física atual deve desenvolver o aluno de forma integral e não restringir a sua prática ao ato motor desvinculado da vida, do pensar, do sentir e do contexto histórico-social no qual está inserido.

    O que estamos propondo, parte do pressuposto que o aluno é um ser que pensa, que sente, que se expressa através de linguagem oral, grafada e da linguagem corporal.


O aluno da escolaridade inicial e as práticas motoras orientadas

    Quanto mais novo for o aluno, maior importância deverá ser conferida as tarefas motoras. Se à escola cabe a função de construir, de apontar caminhos, de desenvolver os domínios cognitivo, afetivo social e motor, a Educação Física, na qualidade de um componente curricular, deve ser inserida neste processo. A criança de escolaridade elementar muitas vezes só compreende aquilo que vive, e esta compreensão está intimamente ligada às experiências motoras que o professor planejou e implementou para e com os seus alunos.


Os elementos da Educação Física

    De acordo com a Portaria MEC nº 148/67 a Educação Física nos anos iniciais de escolarização, deve constituir-se em um conjunto de ginástica, dança, recreação e jogos.

    Como encontram-se no período de alfabetização motora (FREIRE, 1989), também denominado fase dos movimentos fundamentais, (GALLAHUE, 1982), ao aluno das 1as. séries de escolarização, são indicadas tarefas motoras que tenham como objetivo a ampla exploração do próprio corpo e do meio físico que o rodeia. Portanto o professor quando implementar o plano de ensino, não deve dar às suas aulas um caráter rígido ou de algo pronto imutável e fechado.

    Embora o professor deva ter “a priori“ uma linha, esta estrutura inicial deve ser permanentemente avaliada e replanejada segundo os comportamentos exibidos pelos alunos. O plano de aula deve considerar as observações informais (durante a execução das tarefas) e os momentos formais de análise e de síntese.

    Os gestos refinados que exigem do educando um grande conhecimento sobre o funcionamento das partes do seu corpo envolvidas nas tarefas motoras, as seqüências pedagógicas, cujos passos são previamente estabelecidos e estruturados, os esportes competitivos ( individuais e ou coletivos), devem ser implementados em séries posteriores. Esta recomendação nos parecer ser algo que mereça reflexão.

    Sob o ponto de vista afetivo, a possibilidade de vivenciarem atividades muito acima da sua capacidade física, motora, afetiva, social e intelectual, pode gerar no educando das primeiras séries do Ensino Fundamental, sentimentos de inadequação, de incapacidade, de frustração por não corresponder às expectativas dos adultos. Sob o ponto de vista físico a solicitação dos exercícios feita de maneira repetitiva (reforço e treinamento) pode levá-lo a lesões musculares e articulares.

    Quando o educando não possui o necessário auto-conhecimento, ainda não incorporou de forma relativamente segura a noção de tempo, de espaço, de distância, não domina o implemento (bola, raquete), não coordena a ação corporal com os gestos executados com o material (que muitos esportes requerem), quando a aluno é ainda um ser que não possui a noção de equipe que as atividades coletivas impõem, pode auto-excluir-se das atividades que à princípio lhes parecia tão interessantes e prazeirosas.

    Quando um programa de Educação Física vai de encontro ao nível da clientela, quando privilegia os naturalmente mais hábeis deixa, ao meu ver, de cumprir a importante tarefa de construir o conhecimento nos domínios motor, afetivo, social e cognitivo. Alija o educando da preconizada formação integral de todos os educandos.


Parâmetros de discussão entre as práticas tradicional e nova

    Neste item , buscaremos caracterizar a abordagem atualmente preconizada com a tradicionalmente praticada no que se refere a três tópicos : estratégias e estilos de ensino, atuação do professor, resultados esperados.

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