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Educação ambiental e formação de professores 

de Educação Física: uma proposta tridimensional

Environmental education and Physical Education teacher formation: a three-dimensional proposal

Educación ambiental y formación de profesores de Educación Física: una propuesta tridimensional

 

*Doutor em Ciências: Ambiente e Desenvolvimento (Universidade do Vale do Taquari – Univates)

Professor e Coordenador do Curso de Educação Física Licenciatura da Univates

**Doutora em Ciências da Comunicação (UNISINOS)

Professora do Programa de Pós-Graduação em Ambiente

e Desenvolvimento da Universidade do Vale do Taquari - Univates

Derli Juliano Neuenfeldt*

derllijul@univates.br

Jane Márcia Mazzarino**

janemazzarino@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A Educação Física (E.F.), integrada à proposta pedagógica escolar, é componente curricular obrigatório da Educação Básica brasileira (Brasil, 1996). No entanto, ela tem tido dificuldade de se inserir em projetos interdisciplinares, como é o caso do tema transversal meio ambiente, proposto pelos PCN (Brasil, 1997). Parte-se do pressuposto de que a formação dos professores de Educação Física, tradicionalmente de enfoque técnico-instrumental e esportivizado, pouco tem se preocupado com a temática meio ambiente. O objetivo desse estudo bibliográfico é refletir sobre essa proposição e apresentar uma proposta tridimensional de formação de professores de E.F. que possibilite atuar na interface com o campo ambiental. A proposta tridimensional contempla as dimensões pedagógicas: alteridade, ludicidade e sensibilidade, e busca em vivências com a natureza suporte para a sua efetivação.

          Unitermos: Educação ambiental. Educação física. Formação de professores.

 

Abstract

          Physical Education (P.E.), which is integrated in the school pedagogical proposal, is a compulsory curricular component in the Brazilian Elementary Education (Brasil, 1996). However, it has met with difficulties to get inserted into interdisciplinary projects, as in the case of the environment transversal issue proposed by the PCN (Brasil, 1997). It is founded on the assumption that Physical Education teacher formation, traditionally with a technical-instrumental approach, has barely been concerned with the environment theme. The purpose of this bibliographical study is to reflect upon that proposition and present a three dimensional proposal for P.E. teacher formation that would allow to act in the environmental field interface. The three dimensional proposal includes the following pedagogical dimensions: alterity, playfulness and sensitivity, and it seeks support for becoming effective in experiences with nature.

          Keywords: Environmental education. Physical education. Teacher formation.

 

Resumen

          La Educación Física (E.F.), integrada a la propuesta pedagógica escolar, es un componente curricular obligatorio de la Educación Básica brasileña (Brasil, 1996). Sin embargo, ha tenido dificultad para insertarse en proyectos interdisciplinarios, como es el caso del tema transversal medio ambiente, propuesto por los PCN (Brasil, 1997). Se parte del supuesto de que la formación de los profesores de Educación Física, tradicionalmente de enfoque técnico-instrumental y deportivizado, poco se ha preocupado por la temática medioambiental. El objetivo de este estudio bibliográfico es reflexionar sobre esta idea y presentar una propuesta tridimensional de formación de profesores de E.F. que posibilite actuar en interrelación con el campo ambiental. La propuesta tridimensional contempla las dimensiones pedagógicas: alteridad, ludicidad y sensibilidad, y busca en vivencias con la naturaleza el sostén para su efectividad.

          Palabras clave: Educación ambiental. Educación Física. Formación de profesores.

 

Recepção: 23/05/2016 - Aceitação: 13/09/2017

 

1ª Revisão: 08/08/2017 - 2ª Revisão: 10/09/2017

 

 
Lecturas: Educación Física y Deportes (EFDeportes.com), Revista Digital. Buenos Aires, Año 22, Nº 232, Septiembre de 2017. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O reconhecimento, no contexto brasileiro, da Educação Física como componente curricular (Brasil, 1996), a coloca frente a novos desafios, tal como o de integrar-se com as demais áreas de conhecimento e com a escola em si. Destarte, no meio acadêmico tem-se questionado como a Educação Física tem se integrado à proposta pedagógica de cada escola. Passou-se o tempo da Educação Física que se justificava apenas pelo “exercitar-se”.

    Paralelo a este debate, está posto, desde 1997, nos Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1997), para ser desenvolvido de forma transversal, por todas as áreas de conhecimentos, o tema meio ambiente. A preocupação com a necessidade de uma Educação Ambiental já vem sendo explicitada em documentos legais desde a década de 1980 com a Lei 6.938 de 1981 (Brasil, 1981), pela Constituição da República Federativa do Brasil (Brasil, 1988), sendo reforçada na Lei n.º 9.795 de 1999 (Brasil, 1999, Brasil 2002) e norteada pelo Programa Nacional de Educação Ambiental (Brasil, 2005). Os mesmos pressupostos são mantidos no Plano Nacional de Educação, Lei n.º 13.005 de 2014 (Brasil, 2014).

    Neste trabalho entende-se, assim como Guimarães (2011), que a Educação Ambiental deve ser crítica da realidade vivenciada, formadora da cidadania, transformadora de valores e atitudes por meio da construção de novos hábitos. É uma área que desafia a sociedade a criar uma nova ética entre ser humano/sociedade/natureza e objetiva os equilíbrios local e global, como forma de obtenção da melhoria da qualidade de vida.

    Todavia, mesmo sendo uma exigência na legislação educativa brasileira, as relações estabelecidas entre a Educação Física escolar e o campo ambiental ainda são tímidas. Para González e Fraga (2012) os professores e a área da Educação Física têm tido dificuldade de se inserir em projetos interdisciplinares. Um aspecto que pode estar dificultando a aproximação da Educação Física do campo ambiental é a formação dos professores. Nesse sentido, questiona-se: quais dimensões formativas podem contribuir para que o professor de Educação Física sinta-se capacitado a participar de projetos interdisciplinares na área da Educação Ambiental e a propor ações educativas relacionadas a esse tema no contexto escolar?

    Entende-se que a aproximação da Educação Física ao campo ambiental passa pela formação do professor, não apenas técnica-científica, mas, também, pessoal. Capra (2006) ressalta a necessidade do homem se tornar ecologicamente alfabetizado ou eco-alfabetizado. É por meio da experiência que cada pessoa toma consciência de que faz parte da teia da vida, de que está inserida em um ecossistema, social e natural, que estimula a criação de vínculos emocionais com a natureza possibilitando a cidadania ambiental.

    Se a atual crise ambiental é fruto da forma como o homem tem se relacionado com o mundo, o professor de Educação Física, comprometido com a Educação Ambiental, pode auxiliar na constituição de alunos/pessoas que se compreendam como parte de um todo e de que há uma relação de interdependência entre todos os seres vivos e demais elementos da natureza. No entanto, para que isso ocorra a formação docente também deve ser repensada.

    A partir de um estudo bibliográfico, este trabalho tem como objetivo apresentar uma proposta tridimensional de formação de professores de Educação Física, dialogando-se com propostas que vislumbram em vivências com a natureza um caminho para formação de educadores engajados com a Educação Ambiental. As três dimensões pedagógicas propostas são: alteridade, ludicidade e sensibilidade.

Alteridade, ludicidade e sensibilidade: uma proposta tridimensional para formação de professores de Educação Física

    Estudos como o de Alvim (2009) evidenciam que os professores de Educação Física reconhecem a importância de se trabalhar com esta temática transversal, mas alegam que não sabem como sistematizá-la no processo de ensino-aprendizagem. Como conseqüência, a participação dos professores de Educação Física em projetos interdisciplinares é reduzida e eles não propõem e nem coordenam projetos. Entre os motivos, os docentes apontam a falta de formação continuada e falhas na formação inicial.

    Em relação à formação inicial de professores de Educação Física, Domingues, Kunz e Araújo (2011) apontam duas particularidades, que se tornam limitadoras ao trabalho pedagógico relacionado à Educação Ambiental. A primeira diz respeito à fragmentação do conhecimento. As Diretrizes de Educação Ambiental propõem que o processo de Educação Ambiental seja feito de forma transversal e interdisciplinar. No entanto, os currículos dos cursos de Educação Física continuam organizados em disciplinas isoladas, com horas e espaços predeterminados, fragmentadas e distintas.

    A segunda particularidade refere-se aos conteúdos desenvolvidos ao longo da formação inicial, destacando-se a hegemonia do esporte. Um dos princípios que a Educação Ambiental apresenta é a valorização da diversidade e da produção cultural da vida cotidiana, buscando sentido e significado em cada momento, em cada ato. Esse é um “aspecto que contradiz a própria lógica acadêmica formal de organização na formação de professores burocrática, conteudista e fragmentada” (Domingues; Kunz; Araújo, 2011, p. 564).

    A partir disso, a proposição de uma formação de professores de Educação Física que se engajem com a Educação Ambiental é um desafio. Logo, elaborou-se apresenta-se uma proposta tridimensional norteada em três dimensões1 pedagógicas, as quais são: a) aprender com a natureza: por uma relação de alteridade; b) a ludicidade é uma dimensão do humano e; c) a educação corporal requer sensibilidade: a exploração dos sentidos. Entende-se que essas dimensões são interdependentes, ou seja, permeiam umas as outras e se complementam (Figura 1).

    Essas dimensões surgiram-nos a partir do estudo de teóricos da Educação, da Educação Física e da Educação Ambiental. Dentre os quais se identificou várias propostas de vivências com a natureza que se relacionam com a Educação Ambiental, tais como: Atividades Físicas de Aventura na Natureza (Afan) (Schwartz, 2006; Campagna, 2006; Bruhns, 2006), Trilhas da Vida (Matarezi, 2006) e método Aprendizado Sequencial (Cornell, 2008a, 2008b).

Figura 1. Proposta formativa tridimensional

Fonte: autores

    Estas dimensões formativas visa transcender os aspectos formativos do professor de Educação Física restritos aos aspectos técnico-instrumentais e esportivizados, buscando-se a interface com a Educação Ambiental. A seguir o detalhamento das três dimensões pedagógicas que sustentam a proposta formativa tridimensional.

Primeira Dimensão - Aprender com a natureza: por uma relação de alteridade

    Esta dimensão advoga a natureza como educadora. Entende-se que é com ela e não nela que o processo de ensino aprendizagem deve-se dar. Esta diferenciação linguística é fundamental para a compreensão de que o que se está propondo é uma relação de troca. Para que isso aconteça, o ponto de partida é o homem reconhecer-se como parte constituinte da natureza, opondo-se à perspectiva de objetificação da natureza advinda da Idade Moderna.

    Na epistemologia moderna (cartesiana), o observador vê a natureza como se olhasse para uma fotografia, explica Grün (2005). Não há um "eu" que pensa e aquilo que é pensado, o mundo se tornou objeto. O sujeito autônomo, ideal da modernidade, é alguém de fora da natureza. Este processo de separação resulta na objetivação da natureza. É justamente esta divisão entre o sujeito cognoscente e objeto que precisa ser repensada para tratar da crise ambiental, diz o autor.

    As vivências com a natureza possibilitam contato com o Outro, natural e social, portanto, explora a dimensão da alteridade como elemento formativo dos professores de Educação Física para a atuação na Educação Ambiental. A proposta das Afan (Schwartz, 2006), Trilhas da Vida (Matarezi, 2006) e o método Aprendizado Sequencial (Cornell, 2008a; 2008b) sinalizam a necessidade do reencontro do homem consigo mesmo, com o outro e com a natureza. A relação com a natureza a ser estabelecida precisa ir para além do simples local onde as vivências ocorrem, reconhecendo-a como educadora, um legítimo Outro.

    No caminho da (re)descoberta da natureza e do (re)conhecimento do homem como integrado a ela, Campagna (2006) defende que a relação homem-natureza deve ser de parceria, de complementaridade e de interdependência, ou seja, uma relação de simbiose. O praticante, ao mover-se junto à natureza, ao invés de competir com ela, experimenta o próprio corpo como espaço ecológico, deixa fluir a sensibilidade e consegue ver a natureza na sua multiplicidade.

    É nessa proposta de parceria com a natureza que se busca suporte para esta dimensão, que se baseia no reconhecimento do outro como legítimo outro, em uma relação de alteridade. Aqui cabe remeter novamente à compreensão de experiência de Larrosa (2011), como “é isso que me passa”. O isso que o autor trata diz respeito a outra coisa que não sou eu, do que eu digo, do que sei, do que sinto, do que penso, portanto, é da ordem da alteridade. “Se lhe chamo de ‘princípio de alteridade’ é porque isso que me passa tem que ser outra coisa que eu. Não outro eu, ou outro como eu, mas outra coisa que eu. Quer dizer, algo outro, algo completamente outro, radicalmente outro” (Larrosa, 2011, p. 06).

    Para se pensar a alteridade da relação homem-natureza o amor é uma emoção fundamental, pois “amar é abrir um espaço de interações recorrentes com o outro, no qual a sua presença é legítima, sem exigências” (Maturana, 2002, p. 67). Na medida em que a racionalidade que sustenta a educação tradicional nega o amor (emoção) promove a negação do outro por meio da competição.

    Cornell (2008b), ao propor vivências com a natureza, busca conduzir as pessoas a um contato amoroso com a natureza e uma coerência entre o que sentimos e o que fazemos. Sentir o que nos une e o que é comum a todos os seres vivos ao nosso redor ajuda a tornas nossas ações mais harmoniosas e espontâneas, em prol do bem-estar de todos os seres vivos. As Trilhas da Vida também são um exemplo, de acordo com Matarezi (2006), de possibilidade de se trabalhar relações “Eu-meio ambiente”, “Eu–O Outro” e “Eu–Comigo Mesmo”, de forma vivencial e reflexiva.

Segunda Dimensão - A ludicidade como dimensão do humano

    A ludicidade tem sido relegada a um segundo plano em nossa sociedade e na Educação Física. Supervalorizam-se as práticas corporais competitivas, deteriorando-se o sentido da ludicidade. Mesmo quando as atividades são realizadas na natureza, se o espírito competitivo do esporte moderno se fizer presente, o lúdico tente a ser corrompido.

    Huizinga (1996) questiona a pouca importância dada na sociedade moderna para o fator lúdico: “Em que medida a cultura atual continua se manifestado através de formas lúdicas? Até que ponto a vida dos homens que participam dessa cultura é dominada pelo espírito lúdico?” (Huizinga, 1996, p. 217). Também Santin (1990) afirma que o brincar não faz parte do mundo da ciência e da técnica, do pensamento racional e dos parâmetros do trabalho produtivo. Brincar, em nossa sociedade, foi relegado ao mundo infantil e, mesmo esse, é afetado pela indústria de brinquedos.

    A ludicidade se aproxima do comportamento do gosto, do valor estético, da sensibilidade e da inconsistência das emoções, só sendo compreendida no seu acontecer. Conforme Santin (1996, p. 87) “O lúdico se parece a uma sinfonia: ela precisa ser executada para ser vivida [...]. O ato lúdico coloca-se na mesma esteira e, ainda, com uma grande diferença. Ele não precisa de partitura. Cada ato lúdico é novo e original, jamais repetido”

    Mendonça (2008) defende que a formação docente deve desenvolver a dimensão lúdica do professor. A ludicidade não pode ser entendida apenas como técnicas instrumentais destinadas a crianças, as quais o professor utiliza-se para alcançar seus objetivos didático-pedagógicos. Ela é um modo de ser e de relacionar-se, uma característica da existência humana, criadora e construtora de novas situações entre pessoas e das pessoas com o ambiente ao seu redor. Não se trata, para o professor, de reviver a infância novamente, mas de dar-se o direito de viver emoções atribuídas injustamente como sendo próprias e restritas à infância, tais como: a alegria, o canto, o movimento, a suavidade, a competição, o exibicionismo, a disputa, o grito, o encontro, os encontros, o sorrir e o gargalhar.

    Para o autor, é preciso reconhecer que o professor é, enquanto professor, sua própria encarnação de tudo que vive, viveu, conhece, experimentou, sentiu. “Na medida em que os professores investem nas próprias experiências lúdicas, investem no próprio ‘eu’ enquanto uma oportunidade de ensino próprio; eles podem também conceber uma prática profissional lúdica” (Mendonça, 2008, p. 356).

    A ludicidade é um dos pilares da proposta do método Aprendizado Sequencial. Para Cornell (2008a) vivências lúdicas com a natureza, experiências alegres e divertidas, podem ampliar a percepção das pessoas em relação a sim próprias e as do mundo ao seu redor. O autor propõe que o contato com natureza desperta entusiasmo, já que pressupõe que sem entusiasmo não é possível que se tenha uma experiência significativa com a natureza. Esse entusiasmo caracteriza-se como um interesse crescente, intenso, calmo, sutil e alerta.

    Em outras palavras, reconhecer a ludicidade como parte constituinte de uma nova relação homem-natureza é valorizar o estar com. Esta dimensão que privilegia o brincar por meio de vivências com a natureza contribui para que o professor contemple e compreenda o mundo que o cerca, reconhecendo que a aprendizagem dá-se no e corpo.

Terceira Dimensão - Educação corporal requer sensibilidade: a exploração dos sentidos

    Esta dimensão baseia-se no pressuposto de que o homem não é um ser que se define apenas pela racionalidade, mas, também, por sua sensibilidade, a qual pode ser desenvolvida a partir da exploração dos sentidos corporais. A aprendizagem que se dá no corpo ocorre pelo tato, olfato, paladar, visão e audição. Todos esses sentidos se complementam e possibilitam a apreensão do mundo.

    A questão da exploração dos sentidos está presente em diversas propostas de vivências com a natureza (Schwartz, 2006; Matarezi, 2006, Bruhns, 2006; 2009, Cornell, 2008a, 2008b) quando ressaltam a relação de interdependência entre homem-natureza e da importância de “sentir”, mais do que saber.

    As vivências com a natureza como elemento sensibilizador reconhecem que é através do corpo que o sujeito articula-se com o mundo. Essa compreensão contrapõe-se ao pensamento científico clássico que o vê como objeto. O corpo é o modo próprio de ser-no-mundo, nos diz Merleau-Ponty (1999). Para o autor, buscar a essência do mundo não é buscar aquilo que ele é em ideia, mas é buscar aquilo que de fato ele é para nós antes de qualquer tematização. O mundo não é aquilo que eu penso, mas aquilo que eu vivo, que eu sinto.

    O saber sensível/corporal é fundador dos demais, é corporal. Reconhecer a existência de um saber sensível é entender que “o mundo, antes de ser tomado como matéria inteligível, surge a nós como objeto sensível” (Duarte Júnior, 2010, p. 13).

    A caminhada/passeio é proposta por Bruhns (2006) como uma forma de aproximação do homem com a natureza, pois possibilita desenvolver os sentidos ao longo do percurso. Na caminhada a experiência sensível mostra-se pessoal, combinando prazer estético e desejo de conhecimento. O corpo move-se e a liberdade possibilita perceber, sentir e toca o meio ambiente.

    Também nas Trilhas da Vida as pessoas experimentem diferentes situações de olhos vendadas e descalças, explorando os sentidos corporais através de vivências em grupo, em ambientes de floresta, diferentes ecossistemas ou ambientes simulados de biomas brasileiros. Vedando-se os olhos dos participantes, busca-se despertar os demais sentidos (tato, olfato, paladar, audição), que se encontram adormecidos, potencializando-os na construção do conhecimento (Matarezi, 2006).

    Contudo, esta estratégia ignora a necessidade de uma reeducação da visão, que pode ser evidenciada no método Aprendizado Sequencial de Cornell (2008a, 2008b), no qual a observação do meio, com um olhar atento, é fundamental. O método de Cornell (2008a, 2008b) nos traz que sentir o que nos une e o que é comum a todos os seres vivos ao nosso redor ajuda a tornar nossas ações mais harmoniosas e espontâneas, tornando-nos mais conscientes das necessidades e proporcionando o bem-estar de todos os seres vivos.

    Portanto, a dimensão da sensibilidade reconhece que o homem conhece o mundo pelo corpo. Há necessidade de se retomar a dimensão da sensibilidade, adormecida pela racionalidade moderna. A Educação Física, que se caracteriza por atuar com práticas corporais, pode contribuir com esse processo e estabelecer um elo com a Educação Ambiental, contribuindo na formação de professores que ao sentirem-se corpo poderão atuar como sensibilizadores dos sentidos.

Conclusões

    Um aspecto central para aproximar a Educação Física à Educação Ambiental é repensar a formação dos professores. Os cursos de formação de professores, inicial e continuada, precisam construir novos saberes, para além de uma formação restrita à matriz técnico-instrumental e esportivizada. Propõe-se o corpo como lugar para a construção de um docente que se compreenda parte da natureza.

    Nessa perspectiva, considera-se que vivências com a natureza, orientadas a partir das dimensões pedagógicas da alteridade, da ludicidade e da sensibilidade, podem contribuir na formação de professores de Educação Física auxiliando-os a engajarem-se na atuação com a Educação Ambiental na escola.

    A dimensão da alteridade propõe que se reconheça o Outro como legítimo Outro. Essa mudança tem que começar no próprio educador e ter o amor como fundamento. O Outro é o aluno, as pessoas com quem convivemos, o meio em que se vive. Ter o amor como base das nossas relações com o Outro permite repensar o que se ensina. É abrir espaço para outras aprendizagens corporais, para além das esportivizadas, em que as relações de solidariedade, o sentimento de coletividade e de interdependência estejam presentes.

    Já o brincar como elemento formativo quer destacar a relevância de o professor ser um “ser brincante”, ou seja, que consiga perceber cada momento de sua vida e de suas aulas como únicos, rompendo com concepções de ensino utilitaristas. Isso permite contemplar a natureza, perceber o seu esplendor nas coisas simples e na sua complexidade. Além disso, a ludicidade estimula o aprendizado pela relação prazerosa que estabelece.

    O princípio da sensibilidade lembra que o homem é um ser que sente. Dessa forma, a formação do professor precisa contemplar a exploração dos sentidos e não educar apenas a razão. Propõe-se explorar todos os sentidos e para isso o contato com a natureza é fundamental. Sentir, viver, estar com, perceber por conta própria, construir as próprias opiniões sobre o mundo que nos cerca, livres de respostas prontas, pré-estabelecidas por especialistas, está é a proposta da exploração dos sentidos. A exploração da sensibilidade visa estimular os professores a refletirem sobre suas próprias concepções e vivências anteriores com a natureza.

    Por fim, que professor de Educação Física é esse que se quer, capaz de atuar com a Educação Ambiental? É um professor que se compreende, reconhece o Outro, é capaz de brincar, aprender e ensinar pelos sentidos. O seu ensino pauta-se no reconhecimento da diversidade que constitui o nosso planeta e das diferenças individuais. É capaz de educar a partir do amor, passando aos alunos a necessidade de se saber escutar, observar, dialogar e compreender o Outro.

Nota

  1. Por dimensão entende-se todo plano, grau ou direção no qual se possa efetuar uma investigação ou realizar uma ação (Abbagnano, 1999).

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