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Educação Física escolar e saúde: novos olhares frente a novos contextos

Educación Física escolar y salud: nuevas miradas ante nuevos escenarios

 

*Mestre em Educação - PUCRS, docente na UNIPAMPA

**Doutorando em Educação - PUCRS, docente na UNIPAMPA

***Pós-doutor em Psicologia/Universidad Autónoma de Madrid, Espanha

Doutor em Pedagogia, livre docente em Psicologia da Educação

Professor titular da Faculdade de Educação e de Letras da PUCRS

****Pós-doutor em Psicologia/Universidad Autónoma de Madrid, Espanha

Doutor em Ciências Humanas/Educação, professor titular da Faculdade

de Educação da PUCRS e do Centro Universitário La Salle

(Brasil)

Marcio Alessandro Cossio Baez*

marciocossiobaez@hotmail.com

Adelar Aparecido Sampaio**

adelarsampaio@bol.com.br

Juan José Mouriño Mosquera***

mosquera@pucrs.br

Claus Dieter Stobäus****

stobaus@pucrs.br

 

 

 

 

Resumo

          O texto examina elementos da Educação, mormente da Educação Física escolar, através de reflexões que levam em conta as perspectivas de Psicologia Humanista-existencial, a Psicologia Positiva e a Educação para a Saúde.

          Unitermos: Educação Física. Educação para a saúde. Psicologia positiva.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 173, Octubre de 2012. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A atual realidade social apresenta uma nova ordem que se estabelece e, cotidianamente, a vemos transformar-se com extrema velocidade. Nesse contexto, como educadores, temos a responsabilidade de tentar acompanhar tais mudanças, embora reconhecendo de que essa rápida mudança é, de modo geral, uma regra no mundo contemporâneo, o que nos indica a necessidade de constantemente estarmos ajustando nossas ações. Nesse sentido, respostas adequadas a essas demandas podem incidir em ganhos reais para a Educação, pois parece que existe estreita ligação entre a educação da pessoa e os benefícios em todas as suas dimensões e empreendimentos sociais.

    Em um mundo em franco desenvolvimento tecnológico, informativo, cultural, de mudanças nas formas de aprendizagens, visualizamos uma lacuna existente entre as demandas educativas e as ações desencadeadas para superá-las. Na Educação Física, evidencia-se também uma dificuldade de conseguir ajustes entre suas ações e o atendimento de objetivos relacionados à saúde da pessoa, principalmente quando observamos que ainda suas práticas encontram-se muito mais voltadas a um ensino de esportes competitivos, em detrimento a uma ação pedagógica voltada a uma formação educacional mais ampla e efetiva, que incentive hábitos saudáveis o longo de toda a vida.

    Entendemos que a integração das áreas de Educação e de Saúde possui uma melhor probabilidade de desenvolver, de forma significativa, o atendimento desta perspectiva de consguir melhorar a qualidade de vida e promover o desenvolvimento humano mais positivo, e isto pode ser efetivado com a ação educativa do professor de Educação Física. Essa assunção de ele ter um importante papel educativo nos remete a entender que a Educação Física não pode ser uma disciplina isolada de seu contexto, mas primordialmente seria uma prática educativa social ligada a aspectos da formação da integralidade da pessoa humana, portanto deve enriquecer sua ação de modo a contemplar com mais efetividade aspectos de Educação e de Saúde, ao desenvolver competências pessoais e profissionais para (re)dimensionar seus objetivos e suas correspondentes práticas, inerentes à área da Educação Física, ao promover e valorizar a Educação para a Saúde.

    Frente a esses desafios, procuramos evidenciar alguns destes aspectos emergentes, culminando com a perspectiva de uma ação docente mais efetiva e comprometida na área da Educação Física, com o amplo apoio ao desenvolvimento de potencialidades do discente educando, valorizando-o em sua integralidade, especialmente para a formação e desenvolvimento de uma postura mais eficaz, levando em conta aspectos da Educação para sua Saúde.

A Educação Física e o contexto da Saúde

    A Educação Física no Brasil, no transcorrer da história, segundo Ramos e Ferreira (2000), manteve uma constância e mostrou-se preocupada com a saúde, inicialmente mais voltada à higienização, deposi à eugenia, mais tarde à aptidão física. Nessa configuração e em virtude de estar fortemente atrelada a mementos ideológico-dominantes no país, o termo saúde foi praticamente ‘extinto’ de propostas pedagógicas mais recentes em Educação Física escolar no Brasil.

    Para Bagrichevsky e Estevão (2005) é notório que ainda são privilegiados enfoques que exploram mais os determinantes biológicos, em detrimento dos elementos sócio-culturais e econômicos intervenientes no processo saúde-doença. A dimensão exultada nessa tendência hegemônica é a da ‘atividade física associada à saúde’, compreensão esta presente em boa parte das publicações acadêmicas na área e que busca ressaltar a existência de uma relação de ‘causa e efeito’, quase exclusiva, entre ‘exercício’ e ‘saúde’. Em outras palavras, para tais estudos, a saúde poderia ser tomada, a priori, como consequência de efeitos fisiológicos (mensuráveis quantitativamente) produzidos pela prática regular de atividades físicas.

    Outro fator importante a destacar é a esportivização presente nas aulas de Educação Física. Segundo Bracht (2000), vários foram os interesses que pressionaram neste sentido, entre eles os do próprio sistema esportivo, com o objetivo de ‘socializar para consumidores’ e também produzir ‘futuros e potenciais atletas’.

    Aliado do sistema esportivo, na maioria dos casos, foram os Estados e o poder público que colocaram-se na tarefa intervir, no sentido de que a nação, o estado ou o município fossem bem representados nas disputas esportivas, em sua diferentes níveis e possibilidades.

    Nesse sentido, o esporte de rendimento, enquanto elemento da Educação Física, foi colocado sob suspeita a partir das ‘teorias da reprodução’, desenvolvidas no âmbito da Sociologia da Educação, e que enfatizavam o papel conservador do sistema educacional nas ‘sociedades capitalistas’.

    Segundo Bracht (2000), a Educação Física, ao fazer do esporte de rendimento seu objeto de ensino, e mesmo abrindo o espaço escolar para o desenvolvimento desta forma de realizar esporte, acabou por fomentar um tipo de ‘educação’ que colaborava para que os indivíduos introjetassem valores, normas de comportamento e não questionassem seu papel na sociedade. Vemos que, nessa perspectiva, o esporte não pode contribuir para uma formação efetiva em Educação para a Saúde.

    À luz de novas dimensões de práticas voltadas à saúde, os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) buscam redimensionar o enfoque exclusivamente biológico da área, buscando considerar as múltiplas influências que, conjuntamente, determinam, explicam, caracterizam, problematizam e, por fim, compõem o cenário da saúde: os aspectos socioeconômicos, culturais, e psico-afetivos.

    Segundo a Organização Mundial da Saúde, em 1946 a definição de saúde foi destacada como um completo bem-estar tanto físico, mental como social, e não mera ausência de doença ou mal-estar. Este conceito da OMS, segundo Mosquera e Stobäus (1984), embora qualitativamente razoável, não chega a definir de maneira concreta o que seja saúde. Eles enfatizam que a ideia de um completo bem-estar parece bastante utópica, em um mundo que tem vários problemas sociais, políticos e econômicos. Salientam ainda que a Educação para a Saúde é uma tentativa de chegar-se a um ser humano sadio, através da qual utilizam-se as mais variadas experiências e recursos, para levar a pessoa a atitudes e práticas que redundem em benefício de seu bem-estar, de sua família e da comunidade, ou seja, dentro de todas as áreas em que ele esteja inserido e atue.

    Guedes (1999) destaca que grande parte das ações do professor de Educação Física é de simples coadjuvante do processo educacional, responsável simplesmente por ‘entreter’ as crianças e os jovens mediante as chamadas atividades recreativas, por organizar e acompanhar atividades comemorativas, por orientar exercícios físicos, entre outras atividades, ao invés de desenvolver um conjunto de conteúdos/habilidades que possam verdadeiramente contribuir, em um contexto educacional mais amplo, para a formação do discente/educando.

    O autor enfatiza ainda que, em razão dos jovens na idade escolar raramente apresentaremsintomas associados às doenças degenerativas, tem-se investido muito pouco em sua formação escolar quanto à adoção de hábitos de vida que possam inibir/postergar o futuro aparecimento dessas doenças.

    É nesse sentido que vemos a Educação Física como uma disciplina que possui uma relevância social, no que tange à sua responsabilidade de verdadeira formação, com a finalidade de prover condições necessárias para o ser humano conseguir atingir, pelo menos em parte, aquele (‘completo’) estado de bem-estar geral equilibrado, imprescindível para melhor desenvolver-se existencialmente.

Novos olhares sobre a relação atividade física e saúde

    O estudo revisional de Palma (2000) enuncia que as possíveis articulações entre atividade física e saúde não são dotadas de uma pressuposta correlação constante de causalidade. Ao mudar o foco da problemática de investigações afins, incluindo no curso da análise o mapeamento de parâmetros socioeconômicos e culturais pode influenciar, sobremaneira, os achados obtidos ao final das pesquisas.

    Carlos Mira (2000) também erige questões interessantes e pertinentes acerca das relações imbricadas no binômio exercício físico-saúde. Em seu estudo, argumenta que o anúncio de possíveis efeitos de prevenção e proteção adicional dos exercícios sobre a saúde de pessoas ‘ativas’ não passa de uma hipótese otimista, pois a interação entre os dois fatores não pode ser compreendida de forma linear e determinista. O autor leva a pensar que seria mais razoável considerar, grosso modo, que indivíduos ‘previamente saudáveis’ é que buscam a prática sistemática de atividade física (e não o contrário), uma vez que geralmente possuem aporte nutricional e financeiro e tempo disponível para tal.

    Para Marques e Gaya (1999), esta perspectiva contemporânea de relacionar aptidão física à saúde representa um estado multifacetado de bem-estar, resultante da participação na atividade física. Supera a tradicional perspectiva do ‘fitness’, preconizada nos anos 70 e 80, centrada no desenvolvimento da capacidade cardiorrespiratória, e procura interrelacionar as variáveis associadas à promoção da saúde. Remete, pois, segundo Neto (1999) a um novo conceito de exercício saudável, no qual os benefícios ao organismo derivariam do aumento do metabolismo (da maior produção de energia diariamente) promovido pela prática de atividades moderadas e agradáveis.

    Recentemente, a relação atividade física e saúde vem sendo gradualmente substituída pelo enfoque da melhora em qualidade de vida, o que tem sido incorporado ao discurso da Educação Física e das Ciências do Esporte. Tem, na relação positiva estabelecida entre atividade física e melhores padrões de qualidade de vida, sua maior expressão.

    Todavia, urge a tarefa de analisar-se cuidadosamente as tentativas de massificação de uma norma moralizante da aparência física utópica do ‘corpo sarado’, da ‘geração saúde’ e do ‘estilo de vida ativo’, que estão em curso na sociedade contemporânea. Sobretudo, porque encontram-se ancoradas na lógica quantificadora e positivista de estudos científicos publicados na área, corroborando os slogans de programas institucionais que propagandeiam uma imperiosa e inequívoca necessidade de exercitar-se em qualquer lugar e a qualquer tempo algumas vezes se apoios e retaguardas.

    A atividade física voltado à saúde é marcada por orientações majoritariamente individualistas, em detrimento da consideração de questões sociais mais amplas. Assim, as intervenções físicas que atuam sobre o corpo perdem o sentido mais coletivizado de outrora, como no período Higienista, que preconizava a soberania do ‘Estado-Nação’ por intermédio da ‘melhoria da raça’, e assumem, declaradamente, priorizações fundamentais com o privado. O movimento evidencia um caráter simbiôntico com diversos setores midiáticos, os quais o percebem como potencial nicho de mercadorização do consumo, como destacam Góis Jr. e Lovisolo (2003). 

    O personal training seria um dos seus símbolos pontuais, na protagonização do individualismo exacerbado e das preocupações com o próprio corpo e do acesso apenas para quem pode pagar pelo oferecimento de tal serviço. Lovisolo (1999, p. 17) ilustra tal noção ao afirmar que:

    Os campos de intervenção têm nas sociedades ditas ocidentais, uma forte tendência a gerar quase que ininterruptamente produtos ou processos, vistos quer como ondas da moda que podem rapidamente desaparecer, quer como inovações significativas duradouras [...]. Essa dinâmica caracteriza áreas tão díspares quanto as da [...] educação física e outras. [...] Os meios de comunicação prestam especial atenção aos lançamentos que realizam promessas relacionadas à saúde e longevidade. Diversos autores têm apontado que na sociedade dita pós-moderna os valores da saúde e da longevidade [grifo do autor] aparecem como sendo quase os únicos consensuais, embora perigosamente separados das discussões sobre o significado da vida boa ou da vida plena que talvez ocupassem um lugar muito mais significativo no passado. Na área da educação física, o último produto lançado no mercado talvez seja o personal training, suscitando discussões, cursos, debates e experimentações.

    Visões acerca da atividade física, da qualidade de vida e da saúde aqui apresentadas correspondem a visões bastante disseminadas e aceitas também no domínio da Educação Física. Em comum, nestas análises, encontramos o acentuado viés biológico que as marca e as caracteriza. Estaa, historicamente, tem sido a base da formação do profissional de Educação Física.

    Segundo compreendemos, a questão não nos parece suficientemente resolvida desde este ponto de vista. A relação entre atividade física e saúde envolve uma multiplicidade de questões. Resolvê-la exclusivamente pelo paradigma naturalista é desconhecer a complexidade do tema. O ser humano não pode ser reduzido à dimensão biológica, pois é fruto de um processo e de relações sociais bem mais amplas e abrangentes.

    Neste contexto, as Ciências Sociais oferecem importante contribuição para o debate ao conceber o ser huimano segundo uma lógica distinta daquela estritamente biofisiológica. No entender dessas Ciências, a realidade não é única, mas é uma construção do e no social, que varia segundo a história, as diferentes estruturas e os diferentes processos sociais, de pessoa para pessoa

Educação Física e saúde: uma leitura frente à atual realidade

    O reconhecimento social da Educação Física na escola provavelmente ainda não seja sua base de sustentação. Esta situação pode estar associada à excessiva ênfase dada às práticas esportivas em detrimento de conhecimentos que são aplicáveis à vida do discente. Não se trata necessariamente de negar a prática pela prática, ou o fazer pelo fazer, mas de dar um incremento capaz de aumentar a importância e significado à Educação Física para a vida das pessoas.

    Ao considerarmos a Educação Física como vem sendo desenvolvida na maioria das escolas brasileiras e os dados concretos sobre mortes apresentadas pelo Ministério da Saúde, mormente de doenças crônicas não transmissíveis, podemos dizer que no aspecto de conseguir incrementar hábitos mais saudáveis de saúde ela não tem sido muito resolutiva.

    Sleap (apud MAITINO, 1998) observou que a Educação Física escolar freqüentemente se apresenta como a educação do ou através do físico, mas ela deveria ser também a educação sobre (ou para) o físico. Ou seja, a educação sobre como manter o corpo em condições ideais para melhorar a qualidade e quantidade de vida deve ser considerada tão relevante quanto os ensinamentos de habilidades dos jogos esportivos, que muitas das vezes não são mais praticados quando terminados os dias escolares.

    Guedes e Guedes (1999) apontam a existência de um fundamento lógico, racional, para atribuir-se à Educação Física escolar outro eixo de interesse, qual seja o da Educação para a promoção da saúde, em superação ao desenvolvimento de habilidades atléticas e/ou recreacionais, até porque, na sociedade atual, um grande número de pessoas adultas contribui fortemente para o aumento estatístico de doenças cardiovasculares que, de alguma forma, estão muito associadas ao sedentarismo.

    Possivelmente, a razão mais convincente para a promoção do estilo de vida mais ativo na escola é dada por Bar-Or (apud MAITINO, 1998), ao enfatizar que a escola constitui-se realmente no único lugar no qual todas as crianças, sem restrições de educação, formação, sexo, raça e passado atlético, têm a oportunidade de beneficiar-se de tais experiências. Comenta ainda que, nos Estados Unidos, professores de Educação Física têm participado efetivamente de programas de controle de peso em escolares. Nesse sentido, o ambiente escolar constitui-se como um espaço privilegiado para uma Educação e promoção da saúde, através das aulas e Educação Física.

    Armstrong (apud MAITINO, 1998) diz que o primeiro objetivo da inclusão da atividade física relacionada à saúde nos currículos da Educação Física deve ser para que as crianças tornem-se independentes quanto às suas atividades. Os professores devem ajudá-las e encorajá-las a internalizar a motivação para serem mais ativas, de forma que, quando a motivação extrínseca dos seus professores diminuir, esta criança continue a manter um estilo de vida sadio e ativo. Para conseguir esta independência, a criança deve entender os princípios sobre atividades que objetivam a saúde, além de saber como tomar decisões para engajar-se em programas individuais que devem ser periodicamente redirecionados e modificados com o passar dos anos. Guedes e Guedes (1998) evidenciam essa perspectiva no sentido de tornar a pessoa a própria gestora de suas práticas voltadas à saúde.

    Bray (apud MAITINO, 1998) enfatiza alguns aspectos da escola primária que facilitam a promoção dos princípios da saúde nesta faixa etária. De modo geral, as crianças têm curiosidades sobre seus próprios corpos e são particularmente receptivas às informações sobre saúde; as professoras supervisionam todo o desenvolvimento da criança, razão pela qual é possível integrar vários elementos sobre comportamentos saudáveis como um todo, ao invés de enfatizar áreas isoladas como usualmente acontece no Ensino Médio. Finalmente, entende o autor que frequentemente ocorre estreita ligação com o ambiente familiar, o que pode ser um excelente mecanismo para influenciar os pais, se alterações forem observadas no comportamento das crianças em relação às aulas de Educação Física.

Novos olhares sobre a docência na Educação Física

    Com o avento das rápidas e constantes mudanças sociais, mais do que desenvolver seu trabalho somente centrado no ensino, em termos práticos, os professores agora precisam lidar com importantes problemas educacionais derivados das situações críticas vividas nos ambientes familiares, muitas vezes desestruturados, diz Esteve (2004). Essa realidade acarretou em novas demandas para os sistemas educacionais, trazendo novos problemas que obrigam o professor a estudar os efeitos da mudança social como uma autêntica ‘necessidade de sobrevivência’. Isso exige do docente uma gama de recursos e estratégias para potencializar uma prática adequada.

    Diversas características sobre um melhor professor são destacadas sobre como este profissional pode e deve apresentar aspectos de comportamento para uma docência efetiva e eficaz. Vários autores, dentre eles Rios (2001) e Perrenoud (2000), destacam acerca de competências necessárias para uma boa docência. Não queremos de certa forma quantificar ou elencar essas condições, mas, principalmente, refletir e apontar sobre demandas importantes na esfera da docência. Já apontávamos que Mosquera e Stobäus (1984), embasados em estudos de Worell e Stilwell, da década de 80, destacaram alguns aspectos orientativos sobre a docência que nos parecem ainda bem atuais, ressaltando os papéis de gerente, mediador e facilitador. Acerca dessas pontuações, a seguir faremos uma abordagem descritiva, utilizando também de outros autores complementarmente, assim como de nossa própria reflexão.

    O professor como gerente deve organizar, planejar, orientar, executar e avaliar. Nesse sentido, seu papel estaria relacionado ao conhecimento de terias de aprendizagem, de desenvolvimento humano e de ensino. Também deveria conhecer as pesquisas realizadas na área da aprendizagem e do desenvolvimento, porque estas experiências fornecem subsídios para uma estruturação e melhor desenvolvimento acadêmico.

    Outro aspecto que destacamos como fundamental nessa dimensão estaria relacionado a um profundo autogerenciamento (capacidade que a pessoa possui de pôr-se a si mesma e as outras a resolver seus próprios problemas). Cremos que na sociedade atual surge a importância dessa competência, de trabalhar-se, (re)construir-se, (re)inventar-se a si próprio assumindo uma postura reflexiva como agente transformador da sociedade e do ambiente em que está inserido e atua.

    Outro aspecto que destacam está ligado à habilidade de questionar-se constantemente e saber delegar responsabilidades. Planejar cuidadosamente sua ação para obter resultados precisos e abrangentes está relacionado à capacidade de sber gerir o processo de desenvolvimento das aprendizagens de seus alunos e administrá-las, o que, conforme Perrenoud (2001), está ligado ao conhecimento dos conteúdos a serem ensinados, ajustando-os ao nível e possibilidades de desenvolvimento de seus alunos.

    Toda e qualquer ação do professor de Educação Física estará diretamente regulada pela própria gestão de sua formação continuada. Nenhum profissional será capaz de acompanhar as novas demandas se não estiver afinado com a sua formação permanente. Continuadamente existe a necessidade de atualização de seus recursos cognitivos, adaptados a novas situações de trabalho, mudanças do meio social e aprendizagem em evolução.

    O seu desempenho na sua formação contínua é uma competência salientada por Perrenoud (2000) como base de uma autoformação. O autor enfatiza que formar-se não é apenas cumprir obrigações burocráticas de participação em cursos; é aprender, é mudar a partir de diversos procedimentos pessoais e coletivos. Entre esses procedimentos, destaca-se, por exemplo: a leitura, a experimentação, a inovação, o trabalho em equipe, a participação em um projeto de instituição, a reflexão pessoal regular, dentre outros. Nessa linha de ação, Schon (apud PERRENOUD, 2000) deixa claro que o mecanismo fundamental é a prática reflexiva, em que o sujeito reflete para agir e posteriormente estabelece uma reflexão sobre a ação realizada.

    Tardif (2000) salienta que os conhecimentos profissionais são evolutivos e progressivos e necessitam de uma formação continuada e permanente e sugere que os profissionais devem auto-formar-se, reciclar-se, através de diferentes meios, após seus estudos universitários.

    O professor como mediador deve estabelecer relações diádicas, calorosas e profundas, em uma díade com seu educando, estabelecendo um estilo pessoal. Segundo Worell e Stillwell (apud MOSQUERA e STOBÄUS, 1984), este está relacionado com aspectos de intercâmbio humanístico na relação com seus próprios alunos. Como mediador das relações humanas deve ser um especialista em conhecimentos de como as pessoas interagem e comunicam-se. Sua meta principal deve ser a capacidade de maximizar a qualidade do ambiente sócio-interativo.

    Vemos que uma das suas funções, nesse sentido, seria de encorajar comportamentos pró-sociais, no sentido de ajudar as pessoas a serem mais cooperativas entre si, a compartilhar ideias e recursos, a aprender a escutar os outros, a saber aceitar opiniões conflitantes, a assumir suas responsabilidades e resolver problemas interpessoais de forma produtiva, a exercer seu papel de liderança de grupo de forma efetiva.

    É tarefa do professor procurar envolver seus alunos nos processos de ensino e de aprendizagem e tornar sua docência relevante, estando atento para possibilitar espaços e momentos para novas experiências, troca de diálogos, buscas de conhecimentos e, sobretudo, que esteja sempre aberto para atender e compreender os interesses dos alunos, promovendo aulas mais interessantes e criativas. Desse modo, é dever do professor, através da sua mediação, estimular situações de aprendizagem para que sejam mais proveitosas e relevantes, utilizando estratégias inovadoras e diferenciadas.

    A aprendizagem significativa, na perspectiva de Ausubel (2003), é entendida como um processo em que as novas informações, para serem assimiladas de maneira estável e útil, devem interagir com ideias (aprendidas anteriormente) relevantes, por isto previamente existentes na estrutura cognitiva da pessoa, denominadas subsunçores, e formar com eles âncoras, em um conjunto novo de conhecimentos, agora com novo significado.

    Essa concepção de aprendizagem para Moreira e Masini (2006) foi colocada em oposição à aprendizagem mecânica, em que as novas informações seriam armazenadas na mente de forma arbitrária, ou seja, com pouca ou nenhuma ligação com conceitos prévios.

    O professor de Educação Física deve ser um facilitador, capaz de utilizar habilidades específicas com aqueles estudantes que requerem cuidado e atenção ‘especial’, observando as diferenças individuais, agindo de forma que seus educandos adaptem-se em diferentes momentos do próprio desempenho, constituindo-se em professor formador de opinião e modelo de identidade aos mais jovens.

    Assim, consideramos que é imprescindível uma atuação de estreita relação com a família do educando e com sua comunidade escolar, em ações de diversas ordens, especialmente as voltadas à promoção da saúde nos ambientes citados. Esteve (2004) nos lembra a respeito das mudanças sociais que acarretaram um significativo aumento das responsabilidades aos professores e reforça que os professores e a escola não serão capazes de dar uma resposta adequada a essas novas demandas enquanto estiverem sozinhos nessa tarefa. Nesse sentido, existe a necessidade de construir uma sociedade que encare a educação das novas gerações de forma compartilhada.

    Partindo desse pressuposto, pensamos que a questão da Saúde deve ser desenvolvida transversalmente na escola, entre todas as áreas do conhecimento, e nesse contexto, reforçamos novamente a presença do professor de Educação Física, que possui uma enorme capacidade de motivar, ao trabalhar com o corpo e dada sua atuação de forma direta com atividades específicas da cultura de movimento. Assim, ele atende objetivos educacionais, com compromisso profissional, identificado com o discente, e tem um papel primordial no envolvimento da sua família no processo de Educação para Saúde, favorecendo e motivando para posturas mais saudáveis e positivas.

    O papel de facilitador é importante no sentido de dar conta das diferenças individuais e das dificuldades de cada um, bem como tentar adaptar sua maneira de agir, ajustando-se às necessidades dos seus alunos.

    Yus (2002) retrata bem esse educador em consonância com uma prática voltada a uma Educação que vise a integralidade do educando, considerando suas diferenças, individualidade e ritmos de aprendizagem.

    Outra habilidade do professor como facilitador estaria na possibilidade de integrar equipes interdisciplinares, estando mais inclinado em ajudar alunos-problemas, dinamizando suas habilidades específicas voltadas a estudantes especiais.

    Esses papéis, analisados aqui separadamente apenas por conveniência, na prática entrecruzam-se a todo momento, embora sejam dependentes do estilo individual do docente.

    É desta forma que visualizamos um melhor professor de Educação Física, inserido de forma direta em Educação para Saúde na escola.

    Pensamos que ele deve possuir peculiaridades muito importantes, entre as quais a de ter um papel relevante no desenvolvimento humano, especificamente através do incentivo e cuidado na área física, ou seja, na cultura corporal de movimento, assim como pelo fato de ser um dos maiores dinamizadores de grupo, no caso de seus alunos, mas também de colegas professores, além da comunidade. Isto nos leva a crer que ele seja peça fundamental em uma equipe multidisciplinar, que trabalhe na perspectiva de uma efetiva Educação para Saúde.

    Ainda deve intervir e proporcionar dinâmicas para o desenvolvimento de uma vida ativa fisicamente. A literatura dispõe de vários argumentos que enfatizam as vantagens de uma vida ativa fisicamente, sendo primordial no combate às doenças relacionadas com o sedentarismo. De fato, reforçamos a ideia de que o educando, no ambiente escolar, encontra-se em uma fase bastante propícia para impregnar-se de princípios de vida ativa que embasarão práticas mais voltadas para manutenção de uma aptidão física saudável, servido para todas as demais fases da vida. Conforme destaca Guedes e Guedes (1999) os professores de Educação Física devem incorporar uma nova postura frente à estrutura educacional, procurando proporcionar em suas aulas, não mais uma visão exclusiva à prática de atividades esportivas e recreativas, mas também, alcançarem metas voltadas à educação para a saúde, mediante seleção, organização e desenvolvimento de experiências que possam propiciar aos alunos não apenas situações que os tornem crianças e adolescentes ativos fisicamente, mas, sobretudo, que os conduzam a optarem por um estilo de vida saudável ao longo de toda a vida.

    Sugerimos que é de suma importância observar e estar atento às dinâmicas de comportamento e posturas em decorrência das inovações tecnológicas e suas implicações em relação à saúde. Como exemplo, estaria desenvolver ou propor formas de ócio e lazer ativo, além de atuar na perspectiva de uma atuação preventiva de doenças, em benefício da saúde. Por outro lado, a atuação do professor de Educação Física deve estar diretamente articulada para aprofundar reflexões na sua prática pedagógica sobre as abordagens veiculadas pela mídia e suas possíveis implicações para a saúde.

    Saber relacionar-se de forma afetiva, positiva e saudável é destacado por Mosquera e Stobäus (2004), quando nos chamam a atenção de que os estudos pedagógicos das últimas décadas estão voltados com grande força para orientar melhor a Educação de professores, na tentativa de alcançar um maior significado e profundidade na dinâmica interpessoal, em ambientes de ensino, tanto para professores como seus alunos. A promoção de uma relação interpessoal mais saudável e positiva deve ser a base de uma postura que concilie afetividade e bem-estar, desenvolvendo auto-imagem e auto-estima mais realistas, fator importantíssimo no auxilio da organização pessoal do próprio docente, tanto de forma real como subjetiva, assim como na compreensão do meio em que vive. Os autores ressaltam que, na abordagem sobre as crises, transformações e modificações que ocorrem na vida adulta, maior etapa do desenvolvimento humano, as mesmas são importantes e evidenciam a necessidade de uma reestruturação constante e consciente.

    O professor de Educação Física, quando ensina atividades da cultura corporal, deve utilizar e integrar distintas fontes de conhecimento, situação imprescindível para que os mesmos sejam relacionados em seu contexto. Menestrina (1993) sugere uma perspectiva em direção à Educação para a Saúde faria com que a Educação Física, deixando de atuar isoladamente, se voltasse para uma atuação mais conjugada com as demais disciplinas curriculares, em função de finalidades mais abrangentes do sistema educacional. Essa iniciativa determinaria o progresso da Educação Física como atividade sócio-educativa-cultural, desencadeando a possibilidade uma colaboração mais efetiva, com vistas à melhoria do nível de qualidade de vida na vida em sociedade.

    Ao apontarmos essas reflexões para uma ação educativa eficaz em direção à Educação para a Saúde, reconhecemos que não as esgotamos aqui. Porém, consideramos (MOSQUERA E STOBAÜS, 1984) que a docência não se realiza apenas pela simples transmissão de conhecimentos e seu armazenamento nas estruturas mentais do educando, mas na possibilidade de transferência do saber adquirido para as práticas efetivas para dentro da própria vida, durando muitos anos.

    Desta forma, uma pedagogia eficaz em termos de Educação Física, aliada a uma concepção de Educação para a Saúde, deve ter por finalidade primordial uma educação da consciência humana, para assegurar práticas de saúde entendidas de forma geral, como atributo individual e com novos valores de âmbito mais em direção à Educação Social.

Considerações finais

    Já há bons indícios entre os docentes de que a Educação, mormente a Educação Física, esteja dando mostras de seu amadurecimento como campo científico e de intervenção, inclusive quando questionada se seria seu papel majoritário o de promotor de atividades físicas, cuja gênese advém do ideário mais de disciplinamento e controle corporal.

    Entendemos que, para poder reconhecer-se, efetivamente, como área promotora da saúde, a Educação Física, precisa incorporar a mudança do próprio conceito de saúde, ressaltando antes de tudo, as interelações com a equidade social, postura que, de forma alguma a fará ampliar sua ação, sem perder sua especificidade e legitimidade frente às questões do movimento humano. Parece sensato entender que, para ocorrer tal avanço, a área precise rever a postura de simpelsmente ‘combater o sedentarismo’, ideia que e se tornou tão conhecida e divulgada na área nas últimas décadas.

    Reiteramos aqui, para finalizar, que propomos uma cuidadosa releitura da própria identidade do profissional de Educação Física, e que o mesmo estruture-se como um (trans)formador em seu âmbito social, caracterizando-se como promotor de uma nova pedagogia, voltada para o ‘saber ser’, ‘saber viver’, ‘saber fazer’’, propiciando meios efetivos visando a construção de um homem sadio e uma cultura social renovada, lembrando de temas como a Psicologia Humanista-existencial, a Psicologia Positiva e a Educação para a Saúde.

Bibliografia

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