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Velocidade crítica: estimativa de três modelos de análise

 

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

(Portugal)

Andrigo Zaar

andrigozaar@yahoo.com.br

 

 

 

Resumo

          Um aspecto que tem preocupado treinadores das provas de corrida de média e longa duração no Atletismo é o estabelecimento da intensidade dos treinos da corrida contínua. Parte deste grande interesse provêm das importantes implicações e aplicações que um índice desta natureza pode apresentar na performance dos atletas. Um índice capaz de refletir a integração que deve existir entre os sistemas cardiovascular, respiratório e muscular para auxiliar na prescrição e controle do treino definida como a máxima intensidade de exercício de carga constante onde ainda se observa equilíbrio entre a taxa de liberação e remoção do lactato sanguíneo. Para se calcular o valor correspondente a esta carga, três diferentes modelos matematicamente equivalentes foram introduzidos para descrever a relação potência-tempo ou trabalho-tempo. (1) modelo não-linear ou hiperbólico potência–tempo: tempo = CTA / (carga – PC): PC Potência (W). (2) modelo linear trabalho–tempo: trabalho = CTA + (PC · tempo). (3) modelo linear potência – 1 / tempo: carga = PC + (CTA · 1 / tempo).

          Unitermos: Performance. Atletas. Corredores

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 143 - Abril de 2010

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Introdução

    A busca por um índice capaz de refletir a perfeita integração que deve existir entre os sistemas cardiovascular, respiratório e muscular para ajustar o aumento da demanda energética que existe durante o exercício tem sido o tema central de diversos estudos (Noakes, 1988; Greco et al., 2003; Fontes et al., 2005). Parte deste grande interesse provém das importantes implicações e aplicações que um índice desta natureza pode apresentar no esporte de rendimento.


    Inicialmente, o índice que apresentou maior validade para estas aplicações e por isso foi considerado por muitos pesquisadores como padrão-ouro, foi o consumo máximo de oxigênio (VO2max) (Denadai et al., 2000). Por meio de sua aferição durante um teste incremental, é possível identificar também os limiares ventilatórios, mais precisamente o limiar ventilatório II (LV II), ou ponto de compensação respiratória, um dos mais importantes índices para a predição do desempenho aeróbio (Denadai et al., 2000). Atualmente, os estudos realizados partem da identificação e análise, das respostas do lactato sangüíneo ao exercício, um outro índice de igual relevância para a avaliação aeróbia (Denadai et al., 2000).

    A partir daí, outros parâmetros foram criados no intuito de se mensurar e/ou predizer o desempenho aeróbio dos atletas de diversas modalidades de média e longa duração. Porém, tais aferições dependem da infra-estrutura laboratorial disponível, o que dificulta o acesso para a maioria dos indivíduos (Denadai et al., 2000). Sendo assim, outros métodos de baixo custo operacional, não invasivos e de aplicabilidade prática passaram a ter importância bem como estudos comparativos foram conduzidos visando correlacionar seus resultados com os testes laboratoriais já existentes. Neste contexto, um dos principais métodos estudados para a predição da performance aeróbia tem sido o cálculo da Velocidade Crítica (VC) (Hill, 1993).

    A base para o conceito da VC provém da existência de uma relação hiperbólica entre carga de trabalho e o tempo que cada carga é sustentada (Hill, 1993). Em teoria, o cálculo da VC proporciona uma estimativa da carga que pode ser mantida por tempo prolongado sem o aparecimento de fadiga (Hill, 1993). Desde os primeiros estudos realizados na década de cinqüenta, muitas pesquisas têm sido dedicados à aplicação do conceito da VC a atividades como, corrida, ciclismo, exercícios em ciclo ergômetro, natação, remo e caiaque (Papoti et al., 2005).

    Apesar de, teoricamente, a assíntota da relação hiperbólica potência-tempo ou trabalho-tempo representar a carga sustentável por um longo período sem fadiga, estudos mostram que ao se expor um indivíduo a esta carga, a exaustão ocorre, na maioria das vezes, após cerca de 30 a 60 minutos (Hill, 1993). E ainda, uma vez que estas estimativas geralmente estão acima do limar anaeróbio e conseqüentemente com alta taxa de produção e acúmulo de lactato durante o exercício a esta intensidade (Fontes et al., 2005), parece que o exercício realizado na intensidade correspondente à VC não pode ser sustentado sem o aparecimento de fadiga (Hill, 1993). Para se calcular o valor correspondente a esta carga, três diferentes modelos matematicamente equivalentes foram introduzidos para descrever a relação potência-tempo ou trabalho-tempo:

1. Modelo não-linear ou hiperbólico potência–tempo:

tempo = CTA / (carga – PC): PC Potência (W)

 

2. Modelo linear trabalho–tempo:

trabalho = CTA + (PC · tempo)

 

3. Modelo linear potência – 1 / tempo:

carga = PC + (CTA · 1 / tempo)

Onde:

PC = Potência Crítica

CTA = Capacidade de Trabalho Anaeróbio

    HOPKINS et al (1989) elaboraram outro modelo incluindo um terceiro parâmetro no cálculo da VC, a potência máxima (Pmax). De acordo com seus relatos, este modelo exponencial seria capaz de proporcionar uma melhor descrição da relação intensidade–tempo que os modelos tradicionais de dois parâmetros para corridas em alta velocidade em esteira:

- (tempo até exaustão /τ)

carga = PC + (Pmax – PC) · (e)

Onde:

τ = constante de tempo

    MORTON (1996) também propôs, posteriormente, um modelo alternativo que incluía a potência máxima (Pmax) no cálculo da VC. Este novo modelo pode ser descrito sob duas maneiras:

  • tempo até exaustão = CTA / (carga – PC) – CTA / (Pmax – PC);

  • tempo até exaustão = (CTA / (carga – PC) + K.

    Como descrito anteriormente, o conceito da VC é baseado na relação hiperbólica entre a potência e o tempo de exaustão. Para a determinação desta relação, diferentes estudos foram realizados no intuito de se determinar o número ideal de cargas para se alcançar um resultado preciso e ao mesmo tempo proporcionar o mínimo de esforço ao avaliado (Hill, 1993; Denadai et al., 2000; Greco et al., 2003; Mello et al., 2005), já que quanto maior o número de cargas preditivas, menor será o erro associado aos parâmetros estimados de PC e CTA (Hill, 1993). Sendo assim, para um cálculo otimizado da VC, são recomendados, conforme a maioria dos estudos, de quatro a cinco cargas preditivas, separadas por um intervalo de 24h, como sendo ótimas (Hill, 1993). Por outro lado, ao se utilizar modelos lineares, em teoria, apenas duas cargas preditivas seriam necessárias para a derivação da VC (Denadai, 2000).

    HILL (1993) comparou valores de cálculos obtidos para VC e CTA por meio da utilização de modelos com dois e três parâmetros. De acordo com seus resultados, não houve diferença significativa nas estimativas, mostrando uma maior praticidade na utilização de modelos lineares que utilizam apenas duas cargas preditivas, embora o modelo de três parâmetros tenha se mostrado mais eficaz na utilização de cargas preditivas extremamente curtas, inferiores a 2 minutos (Hill 1993).

    Entretanto, Vandewalle et al (1997) mostraram que é preciso cautela na derivação da PC por meio de modelos lineares utilizando apenas duas cargas preditivas, uma vez que para corredores de elite de nível internacional, a relação velocidade-tempo para exaustão não se mostrou perfeitamente linear. Já para exercícios realizados em ciclo-ergômetro, outros fatores como a escolha do ergômetro ou da cadência de pedalada podem afetar a validade dos parâmetros estimados (Hill, 1993).

    Um outro fator de influência na estimativa da PC relaciona-se à sugestão de um tempo limite de permanência no exercício. Nos estudos em que os participantes foram orientados a permanecerem em exercício por cerca de 24 a 30 minutos, o tempo médio para exaustão foi de 24 minutos (Overend et al., 1992; Poole et al., 1988). Por outro lado, quando os participantes se dirigiram ao exercício por até 60 minutos ou a exaustão, o tempo médio de exercício foi de 33 minutos (Housh et al., 1990). Já quando o exercício foi realizado por até 90 minutos ou a exaustão, o tempo médio de permanência foi de 43 minutos, na primeira tentativa, e de 51 minutos na segunda (Scarborough et al., 1991). E, finalmente, com o exercício sendo realizado durante o maior tempo possível até a exaustão, o tempo limite foi de 51 minutos, na primeira tentativa, e de 65 minutos, na segunda. Ou seja, parece que a sugestão de um tempo limite de permanência na intensidade correspondente à VC é capaz de afetar as respostas dos avaliados. Além disso, aparentemente, o desempenho na VC está sujeito a um efeito de aprendizagem. E ainda, o desempenho dos participantes pode sofrer alterações em decorrência da fase de treinamento, do limiar anaeróbio, ou ainda devido à distribuição dos tipos de fibra muscular (Hill, 1993). Sendo assim, McLellan e Cheung (1992) notaram que é preciso padronizar a metodologia para se estimar a VC e assim, tornar possível a comparação dos dados com estudos posteriores.

    Um outro questionamento importante surge em relação à duração das cargas preditivas. Como a relação potência-tempo trata-se de uma relação hiperbólica, os valores extremos desta relação tendem a ser infinitos, ou seja, subentende-se que na carga correspondente à VC, o tempo de permanência seria infinito e, durante intervalos de tempo extremamente curtos, a potência capaz de ser suportada também seria infinita, o que não acontece na prática em ambas as situações (Hill, 1993). Neste caso, para se diminuir o erro associado às cargas preditivas extremamente curtas ou longas, deve-se evitar a utilização de cargas com tempo de exaustão inferiores a 2 minutos. Um outro motivo para esta medida encontra-se no fato de que em cargas com durações extremamente curtas, a via aeróbia não está completamente ativada, o que resulta numa superestimativa dos resultados (Hill, 1993). Já em relação à cargas extremamente longas, fatores como desidratação, depleção de glicogênio, fadiga e queda motivacional também são capazes de alterar os resultados. Sendo assim, por convenção, a maioria dos pesquisadores recomenda cargas preditivas variando entre 2 e 10 minutos como sendo ótimas, visando assim minimizar o erro associado às estimativas. Portanto, para se conseguir resultados adequados e com alto grau de precisão, a escolha cuidadosa das cargas preditivas parece ser fundamental (Hill, 1993).

Conclusão

    Apesar do conceito de VC ser ainda motivo de discussões acerca das metodologias e da precisão em suas estimativas, este conceito tem se mostrado bastante eficaz e altamente correlacionado a indicadores tradicionais de desempenho aeróbio como VO2max, Limiar Anaeróbio e Limiar de Lactato, além de ganhar importância como método não invasivo e de baixo custo (Denadai et al., 2000; Greco et al., 2003). Ou seja, com apenas um cronômetro e um ergômetro é possível sua determinação, permitindo uma ótima adequação à modalidade em questão.

    De qualquer modo, são necessários mais estudos que analisem a relação entre a VC e a resposta de lactato sanguíneo, envolvendo atletas em diferentes fases e/ou tipo de treinamento, para determinar a máxima intensidade de exercício de carga constante onde ainda se observa equilíbrio entre a taxa de liberação e remoção do lactato sanguíneo, para que possamos obter informações mais definitivas. Com base na revisão bibliográfica realizada neste estudo, podemos concluir que a validade da VC para estimar o LAn, determinado com concentração fixa de lactato (4mM), pode ser dependente do período e/ou tipo de treinamento realizado pelos corredores especialistas em provas de média e longa duração.

Referências bibliográficas

  • Denadai, BS e colaboradores. Avaliação Aeróbia – Determinação Indireta da Resposta do Lactato Sangüíneo. Rio Claro: Motrix; 2000.

  • Fontes, E. B.; Nakamura, F. Y. Gobbo, L. A. Altimari, L. R.; Melo, J. C.; Carvalho, F. O.; Okano, A. H.; Borges, T. O. Silva, S. G. Cyrino, E. S.; A velocidade crítica representa a máxima fase estável de lactato sanguíneo na canoagem? fiep bulletin, foz do iguaçu, v.75, n. spec. ed., p. 427-430, 2005.

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  • Overend TJ, Cunningham DA, Paterson DH, Smith WDF. Physiological responses of young and elderly men to prolonged exercise at critical power. European Journal of Applied Physiology and Occupational Physiology 1992;64:187-93.

  • Poole DC, Ward SA, Gardner GW, Whipp BJ. A metabolic and respiratory profile of the upper limit for prolonged exercise in man. Ergonomics 1988;31:1265-79.

  • Scarborough PA, Smith JC, Talbert SM, Hill DW. Time to exhaustion at the power asymptote in men and women.Abstract. Medicine and Science in Sports and Exercise 1991;23:S12.

  • Vandewalle H, Vautier JF, Kachouri M, Lechevalier JM, Monod H. Work-exhaustion time relationships and the critical power concept. A critical review. J Sports Med Phys Fitness 1997;37:89-102.

  • Papoti, M.; Zagatto, A. M.; Júnior, P. B. F.; Cunha, S. A.; Martins, L. P. B.; Gobatto, C. A.; Critical velocity, lactate concentration and rowing performanceacre, brazil. Rev. Bras. Cineantropometria. Desempenho Humano, 2005; 7(2):14-19.

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