O tônus muscular enquanto portador de significado: subsídios para a compreensão do tono como linguagem corporal |
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Mestrando do Programa de Mestrado em Ciência da Motricidade Humana Universidade Castelo Branco – LABESPORTE Sócio-Diretor, Coordenador Técnico e Professor da Academia da Usina Rio de Janeiro, RJ. |
Ricardo Martins Porto Lussac (Brasil) |
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Resumo O músculo, mesmo em repouso, possui um estado permanente de tensão que é conhecido como tono ou tônus muscular. O tônus muscular está presente em todas as funções motrizes do organismo. Todo movimento se realiza sobre um fundo tônico e um dos aspectos fundamentais é sua ligação com as emoções. A boa evolução da afetividade é expressa através da postura, de atitudes, das condutas e dos comportamentos, incluindo as condutas e os comportamentos motores. A atividade tônica e tônico-postural são consideradas suporte de comunicações pré-verbais. O comportamento humano, através do corpo, o qual é a sua condição de existência, presença e atuação no mundo, tem no tônus uma grande parcela de significados, de comunicações e até de um saber corporal. Compreendido estes fatores, este artigo procurou evidenciar a importância da percepção do tônus, enquanto portador de significado, para a intervenção do educador e dos educandos. Unitermos: Educação. Educação Física. Tônus muscular. Linguagem corporal. |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - Nº 128 - Enero de 2009 |
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(LE BOULCH, 1992, p. 55).“O tono muscular é a atividade primitiva e permanente do músculo;
além de traduzir a vivência emocional do organismo, é o alicerce das atividades práxicas”
Os movimentos - voluntários, reflexos e automáticos - não aparecem por acaso. Eles são controlados pelo sistema nervoso através de contrações musculares. Quando o Ser humano se movimenta, músculos se contraem, enquanto outros relaxam (OLIVEIRA, 2001). Para cada grupo muscular que se contrai e se movimenta - agonista - existe, do lado oposto, outro grupo muscular que age em sentido contrário – antagonista – proporcionando o equilíbrio entre ações.
O músculo, mesmo em repouso, possui um estado permanente de tensão que é conhecido como tono ou tônus muscular. O tônus muscular está presente em todas as funções motrizes do organismo como o equilíbrio, a coordenação, o movimento, entre outros (ibidem, 2001). Para Le Boulch (apud OLIVEIRA, 2001, p. 27): “o tônus muscular é o alicerce das atividades práticas”.
Oliveira (2001) afirma que todo movimento se realiza sobre um fundo tônico e um dos aspectos fundamentais é sua ligação com as emoções. A boa evolução da afetividade é expressa através da postura, de atitudes, das condutas e dos comportamentos, incluindo as condutas e os comportamentos motores. Podemos transmitir, sem palavras, através de uma linguagem corporal, todo o nosso estado interior, de sentimento e de pensamento. Transmitimos a dor, o medo, a alegria, a tristeza e os nossos conceitos, inclusive o conceito de nós mesmos.
Os movimentos podem ser comprometidos devidos a estados de hipertonia, com os músculos contraídos em excesso, ou hipotonia, com os músculos muito relaxados. Em se tratando de casos não muito sérios, que não precisem de uma intervenção médica, o educador pode auxiliar esta pessoa a desenvolver e ou ajustar o seu tônus muscular. O tônus muscular também depende muito da estimulação do meio (ibidem, 2001). Há um diálogo entre o meio e o Ser. Compreender este diálogo e suas interferências no próprio Ser, proporciona ao respectivo Ser a possibilidade de compreensão do estado de seu tônus, e um possível maior autoconhecimento corporal.
Nicola (2004) ratifica que a função tônica é fundamental na abordagem psicomotora do indivíduo em virtude dos diversos aspectos que ela atinge. Como define a autora:
O tono seria um fenômeno nervoso muito complexo, sendo a trama de todos os movimentos sem desaparecer na inação.
O tono investe-se em todos os níveis da personalidade psicomotora e participa das funções motrizes como equilíbrio e coordenação.
Tono atua diretamente na linguagem corporal.
Segundo Nicola (2004), a função do tono se expressa pela contração permanente da musculatura. Os neurofisiologistas evidenciaram o processo que atua em contração permanente e atua de forma modulada, permitindo atividades posturais, sustentação de membros, a estática e o equilíbrio do corpo. Neste conjunto a atuação é medular, porém existe controle das estruturas nervosas superiores. Um tono harmonioso permite gestos com qualidade e bem regulados. Edifica os esquemas sensoriomotores para as representações mentais do gestual e postural. De acordo com Nicola, podemos dividi-lo em níveis do seu próprio desenvolvimento: Hipertonia: aumento do tono que pode ocorrer em determinado ou em vários grupos musculares. Hipotonia: diminuição do tono que pode ocorrer em determinado ou em vários grupos musculares. Rigidez: acomete vários grupos musculares. Espasticidade: aumento de tono muscular em determinado grupo muscular. Espasmo: modificação rápida do tono. Distonia: tono flutuante. Contração tônica: resistência do músculo diante de uma mobilização passiva. Reflexo miotático: quanto maior o alongamento muscular maior a tensão. Laço gama: o mecanismo do laço gama (SHERRINGTON, 1916 apud NICOLA, 2004) explica o processo da contração muscular independente da influência do sistema nervoso central.
De acordo com Nicola (2004), o tono muscular é um fenômeno de natureza reflexa que tem sua origem no músculo, mas cuja regulação está submetida ao cerebelo. Existe ao nível do fuso neuromuscular, que está presente em todos os músculos estriados, uma estrutura sensorial muito complexa que dá ao músculo este sistema de regulação autônoma, que é o laço gama (o sistema). Nicola lembra que para Wallon, a função tônica também é influenciada pelo psiquismo. A autora diz que as características do laço gama são:
O reforço antes da execução dos atos motores, preparando-os.
Existe um limiar, por um lado, para o estiramento passivo e, por outro, para atividade gama a fim de que a resposta tônica do músculo se produza de maneira adequada.
A excitação nocioceptiva (estado doloroso) aumenta a atividade gama (estado de alerta). (ibidem, 2004).
Segundo Nicola (2004), a atividade tônica e tônico-postural são consideradas suporte de comunicações pré-verbais. São as atividades tônicas de mímicas, gestos faciais, corporais, acrescidas de significações afetivas e sociais adquiridas. Para Nicola, o movimento humano, sob todas as suas formas, inclusive a de sua ausência (relaxamento), elabora-se sobre fundo tônico, que é simultaneamente o seu abstrato e a sua matéria. Indiferenciado no começo e mal definido na criança pequena, que não concluiu sua maturação, ele ganha características precisas, refina-se e afirma-se progressivamente. Especifica-se em cada um dos nossos movimentos voluntários ou não, em cada uma de nossas atitudes, posturas e até mesmo em nosso repouso. O sono e o repouso em geral não são paralisações da atividade, pois na distensão mais profunda a inatividade muscular é apenas relativa e muito variável. O total relaxamento muscular é passageiro e acompanha o início rápido e profundo do sono; passado este momento, o relaxamento do sono passa a sofrer influências tônicas.
Neto (2002) afirma que a atividade tônica refere-se às atitudes e às posturas, e a atividade cinética está orientada para o mundo exterior. Essas duas orientações da atividade motriz (tônica e cinética), com a incessante reciprocidade das atitudes, da sensibilidade e da acomodação perceptiva e mental, correspondem aos aspectos fundamentais da função muscular, a qual deve assegurar a relação com o mundo exterior graças aos deslocamentos e aos movimentos do corpo - mobilidade - e assegurar a conservação do equilíbrio, a infra-estrutura de toda a ação diferenciada, tono.
“No diálogo corporal que o indivíduo estabelece com o mundo, o tônus integra toda a história dialética das informações exteriores, e inter-relaciona-as para dar origem à fenomenologia do comportamento humano” (FONSECA, 1998, p. 233). Portanto, pode-se dizer que o comportamento humano, através do corpo, o qual é a sua condição de existência, presença e atuação no mundo, tem no tônus uma grande parcela de significados, de comunicações e até de um saber corporal. A percepção ao próprio tônus e ao tônus representado nos corpos dos outros, é um passo significativo para compreender que o tônus emite importantes mensagens, que devem ser encaradas inclusive sob a perspectiva de um diálogo corporal. Neste sentido, os educadores devem apurar sua sensibilidade de percepção do tônus, enquanto portador de significado, no intuito de uma melhor possibilidade de comunicação e intervenção e, respectivamente, apurar a de seus educandos.
Referências bibliográficas
ALVES, Fátima. Psicomotricidade: corpo, ação e emoção. Rio de Janeiro: Wak, 2003.
FONSECA, Vítor da. Psicomotricidade: filogênese, ontogênese e retrogênese. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
LE BOULCH, Jean. O desenvolvimento psicomotor: do nascimento aos 6 anos. Trad. Por Ana Guardiola Brizolara. 7ª edição. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.
LUSSAC, Ricardo Martins Porto (Mestre Teco). Desenvolvimento psicomotor fundamentado na prática da capoeira e baseado na experiência e vivência de um mestre da capoeiragem graduado em educação física. Universidade Cândido Mendes, Pós-Graduação “Lato Sensu”, Projeto A vez do Mestre. Rio de Janeiro: 2004.
NETO, Francisco Rosa. Manual de avaliação motora. Porto Alegre: Artmed Editora, 2002.
NICOLA, Mônica. Psicomotricidade – Manual Básico. Rio de Janeiro: Revinter, 2004.
OLIVEIRA, Gislene de Campos. Psicomotricidade: Educação e Reeducação num enfoque Psicopedagógico. 5ª edição. Petrópolis: Editora Vozes, 2001.
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