efdeportes.com
Planejamento participativo nas aulas de Educação Física no ensino noturno: um relato de experiência

   
LEEFEL- UNISUAM
(Brasil)
 
 
Elaine de Brito Carneiro
elainebcarneiro@bol.com.br
 

 

 

 

 
Resumo
    Este trabalho é um relato de experiência de aulas de Educação Física que aconteceram no primeiro semestre de 2004 em uma escola pública do estado do Rio de Janeiro junto a turmas de ensino médio noturno. Para desenvolver um trabalho que acreditava ser mais eficaz e democrático junto a esses alunos e concomitantemente aos alunos do Centro Universitário Augusto Motta que realizavam o seu primeiro período de estágio supervisionado em escola, optamos por trabalhar com o planejamento participativo. Esta escolha permitiu uma maior exploração dos alunos estagiários do universo escolar que até então parecia totalmente novo para eles. Assim como, proporcionou também aos alunos da escola uma maior possibilidade de vivenciar a Educação Física na escola.
    Unitermos: Educação Física. Escola. Ensino noturno.
 
Abstract
    This work is a report about Physical Education classes during the nocturnal periods of public school students in a High School, in São Gonçalo/RJ. Simultaneously to the Physical Education classes of those school students, some university students of Physical Education at Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM) were having their first practical probationary period semester as professors of this subject during the beginning of 2004. By one side, a group that after some years of not having Physical Education class started to had this subject introduced to their new school schedule. By the other side there were graduating students that were immersed in a new universe, the nocturnal school period. Willing to propitiate a bigger autonomy, make everybody participate in the classes and build interesting classes, I proposed to the group that we worked in a participative perspective of planning. The used methodology is a qualitative research with a participating observation. This way, it was possible to reach some good results: the participative planning allows the choice of big activity varieties, exploring all that the body posture that is possible; the participative planning can propitiate the social inclusion; the importance of dialogs in a pedagogical building that is relevant to the student; Physical Education classes can have a different meaning from the ones that prime physical enhancement preparation; they can also be a moment of leisure for the students who work and have no other choice but studying at night. In conclusion, we observed that the participative planning is an excellent instrument to work autonomy, criticism and creativity at school classes and at supervised probationary period.
    Keywords: Physical Education. School. Nocturnal periods.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 11 - N° 98 - Julio de 2006

1 / 1

Introdução

    Em estudo realizado para obtenção de título de mestre na Universidade Gama Filho investiguei onze diretores de escolas públicas estaduais de Niterói sobre a representação deste grupo sobre a inclusão da disciplina de Educação Física no ensino médio noturno. Ao final da pesquisa, entre algumas conclusões, pôde-se perceber que o que confere legitimidade a Educação Física nas escolas é a lei que regulamenta esta e outras disciplinas escolares. Até finais do ano de 2003, a Educação Física era regida pela lei 9394/96 e apresentava a seguinte redação no parágrafo terceiro do artigo 26: "A educação física, integrada à proposta pedagógica da escola é componente curricular da Educação Básica, ajustando-se às faixas etárias e as condições da população escolar, sendo facultativa nos cursos noturnos". Como disciplina facultativa, o Conselho Nacional de Educação aconselhava que caberia aos alunos participarem ou não das aulas de Educação Física e também a escola o direito de oferecerem ou não a disciplina para este turno de ensino. De onze escolas entrevistadas somente uma oferecia Educação Física para seus alunos, deixando claro que o fato da Educação Física não ser obrigatória na época influenciava na sua não inclusão no turno da noite.

    Em dezembro de 2003, o presidente da república e o congresso nacional sanciona e decreta a lei No 10.793, que altera a redação da lei anterior para a seguinte:

    "A educação Física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório da educação básica, sendo sua prática facultativa ao aluno:

  1. que cumpra jornada de trabalho igual ou superior a seis horas;

  2. maior de trinta anos de idade;

  3. que estiver prestando serviço militar inicial ou que, em situação similar, estiver obrigado à prática da educação física;

  4. amparado pelo Decreto-Lei no 1.044, de 21 de outubro de 1969;

  5. (Vetado)

  6. que tenha prole".

     Percebe-se, portanto, que a diferença desta lei para a antiga está na reserva de mercado criada para o profissional de Educação Física que agora retorna ao ensino noturno, mas que não modifica muito o quadro quando o que está em questão é a participação dos alunos nas aulas de Educação Física. Pois, a grande maioria dos alunos são trabalhadores com carga horária igual ou superior as seis horas, o que permite que sejam dispensados das aulas. Com isto, observa-se que a Educação Física continua sendo vista como uma disciplina que exigirá o esforço físico de seu aluno e nada mais. E sendo assim, muitos optam por não participarem das aulas de Educação Física.


A experiência

    No primeiro semestre de 2004, atuando em uma escola pública estadual no município de São Gonçalo e recebendo alunos estagiários do curso de Educação Física da UNISUAM (Centro Universitário Augusto Motta) para estagiarem nas aulas desta disciplina, observamos que muitos dos alunos do ensino médio ficavam de fora das aulas sem participarem. Este fato causava um certo constrangimento já deveria fazer com que os alunos estagiassem com a disciplina na escola. Desta forma, resolvemos optar mais pelo diálogo. Conversamos muito com os alunos, a ponto dos estagiários também se expressarem e exporem o objetivo de estarem ali, justamente naquela escola que oferecia aulas de Educação Física, mesmo já sendo a disciplina obrigatória por lei. Foi quando percebemos que se quiséssemos a participação dos alunos em nossas aulas, deveríamos manter um canal aberto para o diálogo. Vimos então, que as aulas não poderiam vir prontas, acabadas simplesmente. Era necessário a participação de todos. Pois, só assim conseguiríamos fazer com que os alunos optassem por participar das aulas por conta própria, por sentirem prazer em que estavam fazendo.

    Aquela era uma situação nova. Atuar com estagiários de Educação Física que deveriam assistir as aulas planejadas, ter acesso a um plano de aula, serem analisados e "corrigidos" e ao mesmo tempo estar a frente das aulas da disciplina ministrada por mim, agora de forma bastante diferente que acontecia nos últimos dez anos.

    Bom, iniciamos perguntando aos alunos do segundo ano do ensino fundamental a experiência que eles tinham das aulas de Educação Física, que na grande maioria não havia sido positiva. Em seguida perguntamos sobre a infância, sobre coisas, brincadeiras que faziam na infância e que gostaram. Muitos dos alunos relembraram a infância neste momento. Perguntamos, então, para os alunos qual o objetivo que eles gostariam que as aulas de Educação Física tivessem para as suas vidas e muitos falaram das aulas proporcionarem um momento de bem estar buscando desenvolver hábitos saudáveis. Alguns alunos mais novos falaram que sentiam falta de jogar futebol, voleibol, ou seja, praticar os esportes com bola, principalmente o futebol. Outras viam nas aulas de Educação Física um momento para a prática da ginástica, já que trabalhavam o dia todo e não tinham tempo para a prática desta atividade física. Depois, de ouvir todos os alunos e anotarmos os objetivos destes com as aulas de Educação Física resolvemos que iríamos planejar as nossas aulas por mês e que todos iriam participar sugerindo o tema, ou melhor a atividade que seria trabalhada em cada dia. E desta forma, iniciamos o nosso planejamento. No início foi difícil! Acredito que devido ao fato de não ser algo muito comum os alunos participarem do planejamento das aulas junto ao professor, e neste caso em particular, havia também os estagiários. Quando os alunos do ensino médio ficavam em dúvida quanto ao que escolher, os alunos estagiários intervinham apresentando suas sugestões. Ou, até mesmo sugerindo que as aulas que não ficassem definidas por eles seriam aulas surpresas e ficariam a cargo dos estagiários.

     Dentre as atividades desenvolvidas pode-se citar: aulas de ginástica, dança contemporânea, aero boxe, street dance, forró, gincana, futebol, voleibol, cama elástica, ioga, expressão corporal e finalizamos o semestre com uma grande festa junina, com direito a brincadeiras populares.

    Observamos com isto que a medida que os alunos se viam responsáveis e participantes do planejamento, não tinham desculpas para não participarem das aulas de Educação Física. Afinal de contas, havia diálogo. Todos eram ouvidos e respeitados em suas escolhas. E, as aulas de Educação Física que não tinham a participação de todos os alunos no início do semestre, a partir de então, passaram a ser atração da escola, já que nem todas as turmas tinham aulas desta disciplina. As aulas desta turma, em particular, despertava o interesse pelos outros alunos da escola, já que a forma de funcionar era diferente das outras aulas onde predominava o futebol e nem todos os alunos participavam das aulas.

    Ao final de todas as aulas fazíamos um círculo, onde os alunos se colocavam, falavam sobre as aulas e pontos observados, realizando assim a avaliação como é previsto no planejamento participativo. Muitas das vezes, a conversa transcorria para outras questões, como por exemplo, o dia em que tivemos aula de futebol com a participação de meninos e meninas juntos. Ao final da aula falou-se sobre o papel da mulher na sociedade, a difícil manutenção da relação matrimonial, a conciliação com o trabalho e a família.


Conclusão

    Enfim, ao longo desses 10 anos ministrando aulas de Educação Física em escolas da rede pública pude perceber o quanto foram significativas as aulas de Educação Física para os alunos de uma das turmas do segundo ano do ensino médio do Colégio Estadual Paulino Pinheiro Baptista. Sendo assim, enumerarei algumas das conclusões que pude tirar com o trabalho que foi desenvolvido no município de São Gonçalo:

  1. A quantidade de atividades que foi trabalhada ao longo de um semestre, explorando assim o grande acervo que a cultura corporal possibilita a nosso aluno em termos de conhecimentos;

  2. O planejamento participativo como forma de proporcionar a inclusão social;

  3. O quanto é importante a relação dialógica na construção de uma pedagogia que tenha significado para o aluno;

  4. As aulas de Educação Física podem ter um significado diferente daquele que defende a idéia de ser uma disciplina que prima pela aptidão física;

  5. As aulas de Educação Física podem ser um momento de lazer para os alunos trabalhadores que não possuem outras opções;

  6. O planejamento participativo como mais uma proposta para o estágio supervisionado.


Referências bibliográficas

  • ALVES, N. e VILLARDI, R. Lei nº 9.394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Múltiplas leituras da nova lei. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1997.

  • ANTUNES, R. O sentido do trabalho. 4ª ed. São Paulo: Boitempo Editorial, 2001.

  • BRACHT, V. Educação física e ciência: cenas de um casamento (in)feliz. Ijuí: Ed. Unijuí, 1999.

  • CAPARROZ, F. E. A educação física como componente curricular: entre a educação física na escola e a educação física da escola. Dissertação (Mestrado em Educação), São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1996.

  • CARNEIRO, E. B. A representação social de diretores de escolas públicas estaduais de Niterói sobre a inclusão da Educação Física no ensino médio noturno. Dissertação (Mestrado em Educação Física). Rio de Janeiro: Universidade Gama Filho, 2002.

  • CARVALHO, C. P. de. Ensino noturno: realidade e ilusão. 7ª ed. São Paulo:Cortez. 120p.

  • CASTELLANI Filho, L. Política educacional e educação física. São Paulo: Autores Associados, 1998.

  • COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.

  • GANDIN, D. Planejamento como prática educativa. São Paulo: Loyola, 1983.

Outro artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
http://www.efdeportes.com/ · FreeFind
   

revista digital · Año 11 · N° 98 | Buenos Aires, Julio 2006  
© 1997-2006 Derechos reservados