Análise comparativa dos espaços esportivos de parques públicos de Porto Alegre Sports spaces in public parks in the town of Porto Alegre: a comparative analysis |
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*Pesquisador do CELULBRA (Centro de Estudos do Lazer da Ulbra) **Acadêmica do Curso de Educação Física da Ulbra/Canoas. (Brasil) |
Prof. Ms. Edmilson Santos dos Santos* Ac. Fernanda Miotto** profedsantos@yahoo.com.br |
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Este trabalho foi apresentado no XVI ENAREL em 2004 na cidade de Salvador/BA-Brasil.
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 92 - Enero de 2006 |
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A constituição dos Parques Públicos
O parque se constituiu ao longo da história das cidades brasileiras como o principal espaço livre urbanos, Galender (1982), onde as pessoas das mais diferentes classes sociais, etnias e idades se reúnem para aproveitar seus períodos de lazer. Infelizmente são poucos os trabalhos que se propõem a investigar o espaço, a dinâmica de ocupação e as práticas sociais construídas, disseminadas e valorizadas. Estes estudos permitiriam uma melhor compreensão do valor deste espaço na formação da sociedade. Porém, as pesquisas de base, principalmente aquelas de corte exploratório, que permitem compreender como estas realidades são constituídas, são secundarizados no debate acadêmico (Bramante, 1999).
Sabemos também que o espaço, enquanto palco de disputa de diferentes intencionalidades no âmbito do lazer, não é algo que está dado à sociedade. Diferentes projetos de ocupação do solo urbanos têm ajudado a compor quadros bastante variados no que se refere às funções, as formas e a paisagem dos espaços públicos de lazer (Bartalini, 1996). Neste sentido, os parques, enquanto componentes indispensáveis da sociedade contemporânea, foram concebidos e construídos a partir de uma pluralidade de intenções ao longo da história. Muitas vezes, estas intenções não permanecem incólumes. A forma como a comunidade utiliza estes espaços ajudam a adequá-lo as suas necessidades.
Esta diversidade de olhares e intenções também estão representadas na forma como os parques são percebidos teoricamente. Hoje as literaturas na área da urbanística e da geografia apresentam diferentes propostas conceituais de parques: Parque Paisagístico, Parque Litorâneo, Parque Urbano, Parque Infantil, Parque Recreativo, Parque de Diversões, Parque Temático, Parque Ecológico, Parque Zoológico, Parque Público, Parque de Vizinhança, Parque Regional, Parque Metropolitano e Parque Linear.
Mesmo dentro de uma mesma perspectiva há uma complexidade de fatores espaciais e funcionais que criam caracterizações e conceitos bastante particulares. Em conseqüência, cada um destes espaços públicos apresenta diferentes configurações espaciais que facilitam ou criam dificuldades numa ocupação esportivizada do recrear, foco principal de nossa análise. Apesar de quase todos eles apresentarem uma preocupação com o lazer ativo, não encontramos na literatura qualquer preocupação na formatação de um Parque Esportivo1.
Do ponto de vista histórico o Parque Paisagístico é o grande precursor deste movimento urbano de construção de áreas de recreação para acesso da população. O próprio nome já adianta uma postura contemplativa do recrear, orientada pelas elites do século XIX. A versão americana deste projeto concebida por Frederick Law Olmsted, tem como características extensos gramados, grandes massas de árvores e lagos, garantindo uma paisagem pastoral. A melhor expressão do projeto de Olmsted é o Central Park (kliass, 1993). A principal atividade de recreação desenvolvida pelas elites neste período era o footing, passeios que objetivavam contemplar aquele pedaço de natureza construída na cidade, seguido de encontros que cultuavam sociabilidades burguesa.
A versão francesa destes parques era composta por áreas projetadas com traçados retos, caminhos que se cruzam e jardins que garantiam um cenário romântico à paisagem. No Brasil este modelo ficou materializado através do Passeio Público do Rio de Janeiro2 no século XVIII.
"Por esses espaços públicos passeia a nova aristocracia, tanto na corte como nas principais cidades, trajada especialmente para a ocasião, exibindo um vestuário à francesa e imitando os hábitos parisienses. Aqui, a industrialização e os operários seriam figuras do próximo século. A massa urbana estava praticamente alijada de tais espaços, cujo uso somente era permitido aos decentemente trajados, isto é, vestidos à semelhança dos pares do Império, ou seja, como europeus." (Macedo e Sakata, p.23).
A idéia de parque público para a massa no Brasil acompanhou o processo de industrialização e conseqüente modernização das cidades. Até então componente desprezível do debate da classe dirigente, o lazer passou a ser um importante componente de política pública. Muito deste movimento esteve associado aos programas que estão sendo desenvolvidos nos países industrializados e em decorrência do 4° Congresso Internacional de Arquitetura Moderna realizado em Atenas. A cidade funcional garantida na Carta de Atenas reservou uma posição de destaque para o lazer nos centros urbanos.
Como observa Niemeyer (2000):
"O debate envolvendo o incremento dos espaços livres voltados ao lazer de massa se dará não somente dentro de um cenário de crítica às condições urbanas resultantes do industrialismo, mas, sobretudo decorrente de novas concepções sociais e políticas oriundas de meios progressistas, colocados em relevo na Europa e nos EUA nos anos 20-30" (p.12).
Num primeiro momento os parques brasileiros forma projetados a partir de uma concepção arquitetônica que procurou dar sentido a uma postura passiva em termos de lazer. Macedo e Sakata (2002) classificaram esta Linha Projetual de Eclética.
Para Niemeyer (2000) o grande impulso para um novo paradigma do lazer foi dado pelo movimento americano chamado Park Movement que introduz o lazer ativo para as massas como um elemento de qualificação da vida na sociedade.
Conforme analisa o autor, este movimento só foi possível graças a laicização do tempo livre garantindo assim, o distanciamento da moral conservadora que impedia uma apropriação e experimentação pública do corpo. Neste momento, dois outros elementos irão compor o quadro de referência do parque: a recuperação das forças e da saúde, fruto da higeinização e da exigência de maior produtividade, e a reserva de oxigênio da cidade.
Aos poucos foi se constituindo um novo modelo paisagístico para os parques. Na sua perspectiva Moderna (Linha Projetual), como apresentam Macedo e Sakata (2002), não houve nenhum processo de ruptura com o modelo anterior. Linhas mais assimétricas são construídas, há a valorização das atividades recreativas ao ar livre e subdivisão dos espaços em áreas funcionais, temáticas.
A Linha Projetual Contemporânea assume uma postura mais experimental. Não há padrões rígidos quanto a sua proposta paisagística. O culto ao corpo ganha maior valor e são construídos diferentes espaços para a prática esportiva. Espaços temáticos e pisos artificiais passam a fazer parte de um contexto onde o artificial e o natural convivem de forma harmônica.(Macedo e Sakata, 2002).
Mais recentemente, preocupações contemporâneas passaram a compor outros significados aos parques urbanos. A colonização rápida do espaço urbano acabou criando um certo esgotamento ambiental. Na década de 80 este debate ganhou força exigindo da sociedade uma nova postura frente à preservação dos espaços da cidade. O impacto social da preservação do ambiente e a necessidade de ambientes qualificados para a preservação da vida deram um outro contorno a construção dos espaços públicos de lazer. Conforme Coelho (2001) não há como fazer uma separação entre impacto bio-físico e o impacto social, pois os dois se entrelaçam na qualificação da vida na cidade. A relação que o homem estabelece com a natureza irá determinar o tipo de homem e de natureza um determinado grupo social valoriza e acredita.
Nos anos 90, objetivando dinamizar a economia urbana, surge os Parques Temáticos. Eles são espaços privados construídos para garantir o lazer da família a partir da lógica da indústria do entretenimento. Ao incorporar este elemento econômico, alguns Parques Ecológicos acabaram por se transformar em espaços de turismo para atividades passivas e ativas. Hoje, como alternativa de recurso financeiro para a preservação dos ambientes ecológicos, há todo um movimento que estimula o acesso restrito e organizado às reservas naturais através do turismo ecológico (Barcellos, 2000). Como a maioria destes espaços está em zonas com características mais interioranas, a população da cidade, principalmente aquela mais carente, não tem acesso. Por outro lado, pouco se tem feito para aproveitar aqueles espaços que apresentam esta característica no meio urbano, como é o caso do Parque Saint-Hilaire em Porto Alegre. Sua área é de 11.800.000m2, mas apenas 2.400.000m2 (20% de sua área) é utilizada para fins de lazer. Permanece aqui, aquela mentalidade preservacionista romântica, que privilegia a natureza em detrimento da natureza humana.
Apesar de grande parte das discussões sobre parques públicos para o lazer das massas ter surgido com o debate sobre o lazer ativo, este elemento ainda não se tornou um ponto de reflexão e estudo por parte da Educação Física. A participação da Educação Física neste debate tem sido muito tímida e incipiente.
A compreensão que temos de lazer ativo está umbilicalmente relacionada ao esporte. Por ser um dos principais fenômenos culturais e sociais do final do século passado e início deste, o esporte não pode ser colocado de forma periférica neste debate. É preciso que os professores de educação física que trabalham com políticas públicas possam assumir de uma forma mais agressiva o esporte como um ingrediente indispensável na construção dos espaços públicos de lazer e de qualificação da vida na cidade.
Esta preocupação vai ao encontro de alguns estudiosos, da arquitetura à educação física, que compreendem que a construção dos parques deverá partir de uma multiplicidade de olhares. Este movimento permitiria uma melhor adequação dos projetos às necessidades dos que desejam se ver representados nesta discussão.
Diante deste hiato outras áreas, percebendo o valor positivo de uma aproximação com a educação física, tem apresentado questões significativas. Um exemplo claro disto é o trabalho de Jesus (1999) que estabelece uma relação entre a geografia e o esporte. Conforme sinaliza o autor, esta relação já está mais avançada em outros países. É o caso da University fo Birmingham, UK, que oferece um curso de graduação em Gestão e Planejamento de espaços de recreação e esportes na cidade (Geography and Sports Science).
Para o autor:
"os estudos setoriais de fenômeno esportivo não permitem visualizar sua complexidade, mas também porque o estudo da produção da demanda esportiva de determinada sociedade requer uma perspectiva contextual que envolve o espaço geográfico, suas formas e sua dinâmica" (p.56)
Conforme sugere Mota (2001), apesar do reconhecimento da necessidade da atividade física na formação da criança a arquitetura urbanística raramente contempla e responde às necessidades lúdicas e de movimento da criança (p.21).
Explorando mais o pensamento do autor é possível acrescentar que esta perspectiva basicamente se preocupa com a população economicamente ativa, que é adulta. As quadras, os campos, o mobiliário e os acessórios esportivo são construídos para garantir o acesso de apenas uma parte da sociedade. Quando o assunto é incorporar os deficientes, a criança e o velho numa atividade de lazer esportivo no parque público a desigualdade de acesso torna-se mais nítida.
Macedo e Sakata (2002) minimizam esta dificuldade, do ponto de vista da concepção, salientando que não há uma escola projetual no Brasil capaz de dar suporte a construção dos espaços públicos de forma a superar os problemas existentes. Os projetistas tornaram-se autodidatas, o que de alguma forma enfraquece os projetos do ponto de vista das aspirações dos diferentes grupos que vislumbram atuar como sujeitos esportivos no espaço público de lazer.
Uma outra questão importante a ser mais bem trabalhada diz respeito aos espaços onde estes parques são construídos. O processo desordenado de constituição das cidades brasileiras não garantiu espaço para uma ocupação planejada do solo urbano. A conseqüência deste problema aparece na forma de disfunções urbanas.
Na maioria das cidades brasileiras há uma distribuição desigual deste bem social que é o acesso ao lazer esportivo através dos parques públicos. A pressão imobiliária fez com que grande parte dos vazios urbanos fosse ocupada por construções. Esta pressão aliada à falta de planejamento ambiental impediu que, principalmente as regiões mais populosas, tivessem acesso a áreas verdes, sejam elas praças ou parques. No caso de Porto Alegre, mais especificamente a região norte, a mais populosa, só dispõe de um parque para dar conta desta modalidade de lazer urbano. Como a maioria dos bairros da zona norte não tem ligação via transporte público, seu acesso fica restrito ao entorno. Na literatura, os parques que possuem esta característica são denominados de Parques de Vizinhança.
Diferentemente da zona norte à parte sul da cidade dispõe ainda de grandes vazios urbanos capazes de garantir um acesso mais equilibrado deste patrimônio social e cultural. Este privilégio é potencializado por uma estrutura urbana que permite que todos os bairros da zona sul tenham acesso, via transporte público, ao maior parque público de área construída para o lazer esportivo da cidade.
Esse desequilíbrio regional não pode ser compensado com áreas menores como aquelas que abrigam as praças. O tipo de prática social conferida neste espaço é muito mais restritiva. O contato com o vizinho num espaço onde há a garantia do controle através do olhar torna este ambiente mais familiar. Sem espaços maiores de um parque aquele contato que se enriquece na presença do desconhecido acaba por não acontecer.
Do ponto de vista subjetivo, a construção de um parque numa região onde o acesso é limitado ao entorno contribui para o esvaziamento do espaço público. Durante a maior parte dos dias da semana ele é subtilizado garantindo uma paisagem de pouca interação social. A circulação se torna restritiva, pois o público adulto está no trabalho e o público infantil dificilmente freqüenta espaços maiores desacompanhados. Nesse espaço mais anônimo o que se tem percebido é que sua utilização fica associada às práticas sociais que causam distanciamento e medo. Uma alternativa positiva neste caso é a elaboração de programas, por parte do poder público, para envolver a sociedade em sua ocupação.
Um outro fator que compromete sua utilização, de forma mais democrática, tem sido a garantia de acessibilidade aos deficientes. O acesso as mais variadas formas de limitações físicas não é levada em consideração no momento de sua construção. Há uma dificuldade de compor um cenário onde haja uma variedade de espaços que incentivem o encontro entre as pessoas.
Entre as práticas sociais e culturais que são possíveis de serem experimentadas nos espaços de lazer, aquela que mais garante o encontro para o desencadeamento de ações coletivas e prazerosas é o esporte. Alguns estudos realizados em parques públicos têm apontado este resultado Biondi e Mórmul (2004), Teles (1991) e Santos (2005).
Portanto, pensar em espaços multifuncionais, do ponto de vista esportivo, é condição para se ampliar o número de contatos entre as pessoas. Espaços projetados de forma a garantir diferentes práticas esportivas também contribuem para sua maior democratização. Infelizmente num país que estimula, direta e indiretamente, apenas uma prática esportiva e de aulas de educação física que não enriquecem a cultura esportiva dos alunos acaba-se construindo espaços pouco diversificados.
Para o uso da massa, as quadras esportivas que oferecerem espaços para o basquete e o voleibol, dificilmente serão aproveitadas se não houver uma preocupação do poder público em garantir sua exploração, pois o direito ao desporto, como um novo direito urbano de todo o cidadão, é um dado indiscutível da cultura das sociedades modernas Constantimo (1999, p.123).
Apesar de haver uma relação dialética entre o espaço e a dinâmica de sua ocupação, a segunda é desencadeada a partir da primeira. Somente a prática do futebol e da corrida tem permitido a utilização destas áreas sem espaços construídos. Portanto, compreender como estes espaços foram concebidos é fundamental para uma crítica precisa sobre as condições objetivas para o acesso ao lazer esportivo.
Neste sentido, este estudo de corte exploratório, se propôs a realizar uma análise comparativa dos espaços esportivos oferecido pelos cinco principais parques públicos de Porto Alegre procurando identificar sua infra-estrutura esportiva e acessórios esportivos disponíveis. Para tanto, foi elaborada uma planilha de identificação dos elementos propostos. Os dados foram coletados através de visita direta ao espaço investigado permitindo uma visualização espacial do contexto. A amostra de nosso trabalho foi composta pelos cinco principais parques públicos para o lazer de massa de Porto Alegre: Parque Farroupilha (Parque da Redenção), Parque Moinho de Ventos (Parcão), Parque Marinha do Brasil, Parque Mascarenhas de Moraes (Parque Humaitá) e Parque Chico Mendes.
Parque FarroupilhaO Parque Farroupilha, conhecido também como Parque da Redenção3, fica localizado na região central da cidade. Sua área é de 370.000 m2. A linha projetual é Moderna e seu tratamento paisagístico é datado de 1935. Sua localização privilegiada e a diversidade de áreas de lazer fazem com que a freqüência de usuário seja ininterrupta.
Parque Moinho de VentosO Parque Moinho de Ventos, conhecido também como Parcão, fica localizado em uma zona de classe média. Sua área é de 115.000 m2. A composição de sua linha projetual também é Moderna, mesclando elementos ecléticos com lazer ativo. Sua criação é datada em 1972. Ele está dividido em duas partes, cortada por uma avenida.
Parque Marinha do BrasilÉ o maior parque destinado exclusivamente ao lazer de massa da cidade com 740.000 m2. Localiza-se na região central mais em direção a zona sul. Os principais bairros destas regiões possuem ligação com o parque através de transporte público. É uma área de aterro na orla do Rio Guaíba e foi criado em 1978.
Parque Mascarenhas de MoraesO parque Mascarenhas de Moraes, mais conhecido como Parque Humaitá, fica localizado num bairro operário chamado de Humaitá. O parque foi criado em 1984 e possui uma pequena reserva ecológica. Sua área é de 182.380 m2.
Parque Chico MendesLocalizado na zona norte da cidade é contornado por loteamentos populares e conjunto habitacionais direcionados a pessoas de baixa renda. Criado em 1991 e com uma área de 252.900 m2 foi construído para se evitar invasões, retirada de árvores e impedir que a área se transformasse em depósito de lixo. Sua principal preocupação foi a preservação ambiental.
Análise dos dados e conclusão.Para análise dos dados organizamos o trabalho com a mesmo orientação seguida na coleta das informações.
Tabela 1. Área lúdico infantil por parque.
* A área lúdico infantil foi calculada utilizando como referência 1,2 m de raio por brinquedo4.
Todos os parques visitados apresentam área lúdico infantil com cinco tipos de brinquedos: balanço, gangorra, vai-e-vem, escorregador e trepa-trepa. O diferencial está na proposta de uma das áreas do Parque Marinha do Brasil que possui dois equipamentos para brincar de subir, tratores, e um conjunto de caixas de cimento, similares aos existentes no Parque Farroupilha. Excetuando alguns brinquedos do Parque Moinho de Ventos, construídos de madeira tratada, todos os outros são de metal. No que diz respeito à manutenção, apenas um brinquedo estava danificado demonstrando que nesta área há uma preocupação em garantir pleno uso por parte da população infantil, bem como os cuidados necessários para preservar sua segurança.
Tabela 2. Caracterização dos campos de futebol por parque.
A prática do futebol constituí como a principal referência, em termos de área esportiva, dos parques públicos investigados. Acreditamos que este é o resultado de uma identidade esportiva construída ao longo da história do Brasil que identifica o futebol como o maior patrimônio esportivo da sociedade. Neste sentido, isto não representa nenhum problema a priori.
Observando a tabela 2 é possível identificar que o Parque Chico Mendes não possui uma área esportiva que dê conta da identidade anunciada. Parte deste problema pode ser justificado quando analisamos as características do terreno. Sua inclinação diminui as possibilidades esportivas. Porém, quando observamos os outros dados identificamos a falta de cuidado dos projetistas em garantir espaço qualificado para a prática de atividades esportivas de lazer daquela comunidade.
O Parque Marinha do Brasil aparece como aquele que melhor preparado para garantir acesso a um grande número de praticantes de futebol, principalmente para a prática na areia. O problema está relacionado à concentração de áreas públicas para a prática do futebol, pois o Parque Marinha do Brasil tem 45% da área destinada ao futebol. Portanto, há um desequilíbrio na cidade quanto à oferta de espaços qualificados à prática do futebol.
Tabela 3. Área de ginástica por parque.
Nas áreas de ginástica a diferença entre os parques aparece de maneira mais nítida. O Parque Moinho de Ventos, que é um Parque Regional, e o Parque Marinha do Brasil são os que mais reservam espaço para esta modalidade de exercitação. O dado preocupante é o fato do Parque Chico Mendes não apresentar nenhuma área disponível para ginástica. Este fator desestimula que um determinado seguimento da população possa utilizar o parque na perspectiva de qualificar sua aptidão física.
Quando analisamos somente o parque regional e os parques de vizinhança nós temos mais clareza do grau de concentração dos equipamentos de ginástica. O Parque Moinho de Ventos tem 77% dos equipamentos de ginástica. Os parques de vizinhança possuem apenas 9% destas áreas. Mais uma vez a concentração das áreas compromete a democratização desta prática, pois são as comunidades mais carentes que acabam sendo excluídas. Portanto, vez o poder público opera com uma equação que socializa as despesas, todos investimos na cidade, e concentra qualidade de serviços para apenas determinadas comunidades.
Tabela 4. Canchas de bocha por parque público.
Historicamente as canchas de bocha têm se constituído como um espaço que reserva uma identidade muito forte com o público masculino de terceira idade. Neste sentido, abrigar este espaço em um parque público é um elemento que valoriza um público bastante esquecido das políticas públicas na área do lazer esportivo. Como podemos observar na tabela 4, apenas um parque não permite a exploração desta modalidade esportiva.
Tabela 5. Quadras esportivas de cimento por parque.
Excetuando o Parque Farroupilha há uma boa distribuição de quadras nos parques. Se interpretarmos este dado à luz da idéia de parques de vizinhança, regional e metropolitano, que tem uma preocupação com a escala de visita, o Parque Farroupilha não responde a esta expectativa. Quando comparado com sua dimensão, ele apresenta apenas 0.23% de área disponível do parque para o esporte de quadra. Apesar de serem parques metropolitanos e estarem localizados próximos, não há como compensar este déficit, pois o sistema viário do Parque Farroupilha e do Parque Marinha do Brasil atendem a populações diferentes.
Dois parques apresentam apenas acessórios completos para a prática de um esporte. O Parque Chico Mendes tem quatro quadras e apenas três possuem acessórios completos e são para prática do futebol. O Parque Farroupilha possui acessórios apenas para o basquetebol. Somente dois parques apresentam quadras poli-esportivas: Parque Mascarenhas de Moraes e Parque Moinho de Ventos com duas quadras cada.
O Parque Marinha do Brasil apresenta quadras mais funcionais. Somente uma quadra possui acessórios completos para a prática de dois esportes, futebol e basquete. São três quadras para o futebol, uma para o basquete e seis para o voleibol, sendo que cinco para a prática na areia. Ao observarmos as marcações constatamos que as quadras se tornaram funcionais em função da característica de público que passou a freqüentar. Este dado vai ao encontro da observação realizada por Romero (2003): Os espaços públicos devem se adequar às necessidades de seus usuários.
No que diz respeito a outras opções esportivas constatamos que:
Parque Marinha do Brasil: 2 pistas de skate (2.580 m2) de área plana, pois as pistas apresentam diferentes profundidade (uma delas é a maior pista de concreto do mundo), 1 pista fechada para bicicleta (3.360 m2), 1 pista de patinação (803 m2), 1 pista de atletismo (4.000 m2). Parque Farroupilha: 1 pista de atletismo (4.000 m2). Parque Moinho de Ventos: 2 pista de patinação, uma para crianças e a outra para jovens (75 m2)
Tabela 6. Total de área esportiva por parque.
Um elemento que torna difícil a comparação é a característica de cada um dos parques em função de sua abrangência. Em nosso estudo temos dois parques metropolitanos, Parque Marinha do Brasil e Parque Farroupilha, um parque regional, Parque Moinho de Ventos, e dois parques de vizinhança, Parque Chico Mendes e Parque Mascarenhas de Moraes.
O acesso, que permite interpretar o público usuário, é um fator que irá determinar as formas e as funções que o parque irá exercer. Neste sentido, os parque metropolitanos são preparados para receber um público maior, com maior diversidade de interesses, e o parque de vizinhança está relacionado a um público do entorno a práticas sociais de uma parcela da população. E aqui já surge a primeira questão que é até que ponto os arquitetos e urbanistas têm condições ou estão preparados para, sozinhos, elaborarem este tipo de perfil. A própria literatura tem apontado este fator como um dos elementos limitadores na construção dos espaços públicos de lazer mais qualificados.
Observando os dados não é possível estabelecer uma diferença, em termos de acesso a espaços esportivos, entre as diferentes modalidades de parques. Temos um parque de vizinhança com uma menor capacidade de ofertas de espaços de lazer esportivo, mas, por outro lado, um parque de vizinhança possui uma área útil igual a um dos parques metropolitanos. E um parque regional com uma maior percentagem de área esportiva útil.
Não sendo possível estabelecer relações com a variável m2, temos que recorrer a outros elementos para compreender melhor este quadro. Neste sentido temos que avaliar os dois extremos da tabela 6. A própria justificativa para construção do Parque Chico Mendes não está associada a levar atividades de lazer a uma população carente da cidade. Sua preocupação inicial foi preservar uma reserva natural que compromete a qualidade de vida da cidade. O poder público não foi capaz de ofertar condições de lazer esportivo capaz de qualificar a vida de seus moradores.
O Parque Moinho de Ventos, localizado numa área nobre da cidade, possui uma área útil superior a dos parques metropolitanos. Levando em consideração o mobiliário esportivo em quase todos os itens investigados o Parque Marinha do Brasil oferece uma maior variedade e quantidade de espaços. Porém, por estarem numa região privilegiada o poder público ao oferecer um espaço mais qualificado na região com maior poder aquisitivo ele simplesmente transferiu renda através do estado. Por ser um espaço mais qualificado, do ponto de vista das opções esportivas e dos recursos paisagísticos, ele acaba agregando valor patrimonial a uma pequena parcela da população que se enriqueceu culturalmente com esta política de estado.
Este discurso não pode ser tomado como uma crítica contra uma determinada região da cidade ou contra um determinado grupo de contribuintes. O que está em jogo é qual o papel do estado no momento de distribuir opções de lazer esportiva a partir do critério econômico, discriminando populações e desqualificando suas condições de vida.
Se compararmos os dois parques de vizinhança a diferença que se expressa nas opções de lazer esportivo e área esportiva útil iremos perceber que a região que ficou mais desfavorecida é a que possui uma menor condição financeira. O Bairro Humaitá, apesar de ser vizinho de uma das áreas mais pobres da cidade, ele foi construído num conjunto habitacional formado por prédios e casas que abrigam trabalhadores inscritos no mercado formal. O Parque Chico Mendes está localizado numa região com poucas opções de lazer e com muitas carências do ponto de vista social. O que torna mais problemático este quadro é que o estado diminuiu a oferta de espaços esportivos de lazer justamente para aquela população mais carente.
Se levarmos em consideração a diversidade de espaços esportivos o Parque Marinha do Brasil apresenta condições satisfatórias para atender diferentes públicos, grupos. O diferencial do parque está nos campos de futebol de areia, nas pistas de skate, sendo que uma delas é a maior do mundo no gênero, uma pista para bicicletas, que é sub utilizada, e uma grande variedade de quadras esportivas específicas para determinados esportes. Porem, este diferencial, quando correlacionado com a área esportiva útil de outros parques, não apresenta ganho em termos do espaço total à prática do esporte.
O debate não pode ser deslocado para as dificuldades econômicas enfrentadas pelo estado brasileiro. O Parque Chico Mendes, diferentemente dos outros parques, não apresenta nenhuma área para ginástica. Dentre o mobiliário esportivo existente nos parque este é o mais barato. Sua ausência desnuda uma forma de compreender o lazer para comunidades carentes que ajuda a desqualificar ainda mais suas vidas. Pois como ressalta Barcellos (2000): "o surgimento de novos parques públicos, em muitos casos, ao invés de representarem uma maior democratização das oportunidades de lazer e recreação, tem contribuído para agravar os desequilíbrios na distribuição de bens e serviços que marcam as cidades brasileiras." (p.12).
Outro detalhe importante é que os recursos financeiros não podem servir de justificativa para não garantir uma maior qualidade em termos de opções esportivas. O futebol de areia, que acaba sendo uma opção mais barata que o futebol de campo, tem em apenas um parque. Esta seria uma solução economicamente viável que ajudaria na diversificação dos espaços. Mesmo o campo de futebol sete, que possuem piso de areião e é uma opção mais barata, não foi projetado para o Parque Chico Mendes. Outra opção com baixo custo são as quadras para voleibol de areia.
A perspectiva econômica não pode balizar todas as ações nesta área. Entendemos que a prática do skateboard não pode ser desconsiderada, principalmente quando se pretende atingir um público jovem que necessita ter um atendimento, do ponto de vista das políticas públicas, mais qualificado e voltado para seus interesses. Neste caso, a construção de pistas para as diferentes modalidades deve ser estimulada.
No caso de Porto Alegre, que tem uma trajetória de construção de políticas públicas inovadoras, o lazer esportivo não pode ser secundarizado no momento de construção dos parques públicos de lazer. Esta incapacidade de articular profissionais da área no momento de pensar estes espaços desqualifica a qualidade de vida da cidade e principalmente daqueles mais necessitados, como é o caso da comunidade do entorno do Parque Chico Mendes.
Por outro lado, precisamos salientar também que necessitamos aprender mais com as experiências proporcionadas pelos parques já existentes. Estudos de corte etnográfico, como o realizado por Stiger (2002), tornam-se importantes para compreender um pouco melhor a lógica de ocupação dos espaços públicos de lazer. Esta aprendizagem permitirá construirmos espaços que dêem conta das necessidades da população e não de um pequeno corpo de arquitetos e urbanistas.
Conclusão
Mesmo para aqueles parques construídos dentro de uma mesma linha projetual não há um modelo na implementação do mobiliário esportivo. O Parque Chico Mendes possui o percentual mais baixo de área para os espaços lúdico-infantil, campos de futebol e área de ginástica. Por estar localizado numa área mais carente da cidade esta deficiência acaba por comprometer as possibilidades esportivas desta comunidade. O parque Moinho de Ventos, que está localizado numa área nobre da cidade, apresenta um dos melhores índices quanto ao mobiliário esportivo.
A construção dos parques dentro de uma escala temporal, não permitiu que o gestor público ofertasse uma melhor qualidade esportiva ao parque que foi construído por último, Parque Chico Mendes. Isto demonstra que falta aos arquitetos e administradores uma visão mais moderna do lazer ativo, especialmente no que diz respeito ao esporte, no sentido de garantir à população uma melhor qualidade em possibilidades esportivas e número de espaços.
É fundamental a constituição de indicadores esportivos para a construção de novos parques. Portanto, aprimorar o debate sobre área esportiva útil, variabilidade de espaços em função do público que pretende atingir e políticas de acesso tornam-se fundamentais para o fortalecimento do esporte na sociedade.
Notas
Parece haver uma certa secundarização do corpo à medida que, enquanto contemplação do espírito o Parque Paisagístico se justifica sem necessariamente buscar espaço para a exercitação do corpo.
Este parque foi reformado por Glaziou, francês que fez parte da equipe que construiu diversos parques em Paris, entre os anos cinqüenta e sessenta do século XVIII. (Macedo e Sakata, 2002).
Porto Alegre, em 1884, foi a primeira cidade brasileira a abolir a escravatura. Em comemoração aquela área foi denominado de Campo da Redenção
Como não há critérios para este tipo de análise estabelecemos 1.2m2 de raio para poder operar a comparação.
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digital · Año 10 · N° 92 | Buenos Aires, Enero 2006 |