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Emocões e significados do lazer espotâneo na
comunidade rural de Cajueiro em Alcântara - MA

   
Professor Especialista em Educacão Física Escolar
Secretaria Municipal de Educacão de São Luís - MA
 
 
Heraldo Marconi da Costa Teixeira
heraldomarconi@gmail.com
(Brasil)
 

 

 

 

 
Resumo
    Este artigo trata em analisar as festas e danças nas comunidades rurais negras no município de Alcântara - Maranhão. Focaliza os meios e formas de lazer manifestados através da cultura lúdicas das festas e danças, como a festa do divino espírito santo, tambor de crioula e a dança do coco. Compreendendo as relações sociais e modo de preservação, transmissão e reelaboração dos conhecimentos produzidos de geração a geração, usados entre os membros da comunidade de Cajueiro, face as mudanças sociais e culturais após o deslocamento para agrovilas.
    Unitermos: Festas. Danças. Lazer. Cultura corporal. Transmissão.
 
Abstract
    This text attend about the important afrodescendency dance in community remanent of quilombos in city Alcântara - Maranhão, analising the transmission e elaboration of knowledge native producing of afrodescendency in Alcântara - Maranhão
    Keywords: Transmission. Party. Knowledge
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 92 - Enero de 2006

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Introdução

    A idéia do lazer na sociedade tende cada vez mais para o espírito lúdico característico do jogo, ou seja, a luz da valorização do prazer através de atividades que promovam o bem estar do homem. Esta crescente busca por tais atividades se deve, entre outros motivos, a uma diminuição das relações entre as pessoas, ocasionadas pelas exigências do trabalho, e também pela procura cada vez maior de espaços de entretenimentos nos vários segmentos sociais.

    Segundo Gomes (2004), a modernidade e a tecnologia, ao invés de contribuírem com a qualidade de vida das pessoas, diminuindo seu tempo de trabalho, fazem com que o sujeito fique alienado à necessidade do salário. Tal situação acaba provocando uma difícil relação entre trabalho e lazer, no que tange aos novos moldes da sociedade moderna.

    Dessa forma, através do entretenimento, o homem busca um estado de equilíbrio que lhe permita um afastamento de problemas ocasionados por inúmeros motivos, como pelo desemprego, exigência do mercado de trabalho etc.

    Em meio a estas mudanças, o Brasil, enquanto país multicultural, apresenta diferentes costumes, a exemplo de alguns grupos sociais que ainda preservam um modo de vida que se assemelha a seus antepassados. Dentre esses grupos, aponta-se as comunidades negras remanescentes de quilombos, que vivem da agricultura de subsistência, das suas festas e danças populares e também de crenças, características das comunidades quilombolas.

    Destaca-se neste trabalho as comunidades remanescentes de quilombos do Maranhão, mais especificamente do município de Alcântara. Por exemplo, a comunidade de Cajueiro que, embora tenham se deslocado de suas terras nativas por conta do chamado desenvolvimento, ainda mantêm fortes laços culturais, sociais e religiosos manifestados nas festas e danças, legado de seus antepassados.

    Desse modo pretende-se abordar na comunidade do Cajueiro, as formas e os meios através dos quais homens e mulheres vivenciam as festas e danças afro-maranhenses, através da comunicação não verbal expressa no lazer. Tal expressividade lhes permite diversas formas de lazer que, por sua vez, são veiculadas pelas crenças e crendices daquela comunidade.

    Nessa comunidade, as manifestações emanam do corpo negro através de impulsos rítmicos conduzidos por sentimentos contagiantes que, em geral, estão relacionados às crenças e a cultura da comunidade. Esses cenários resguardam, ao longo da história, conhecimentos fundamentais do processo civilizatório brasileiro.

    Assim, o presente estudo visa abordar o lazer, em comunidades rurais negras, expresso através da cultura corporal não verbal das festas e danças estabelecidas no ritual mítico do Tambor de Crioula, Dança do Coco e Festa do Divino, tendo como estudo de caso a comunidade de Cajueiro, em Alcântara no Maranhão.

     As comunidades remanescentes de quilombos, ainda hoje, são exemplos de resistência e luta na preservação dos seus valores culturais. Tais valores são repassados e manifestados através da história oral dessas comunidades nas quais as culturas da dança, da pesca e também da lavoura costumam ser transmitidas de geração a geração.

    Um ponto representativo dos valores culturais das comunidades remanescentes de quilombos é, sem dúvida, as festas e danças populares dessas comunidades. Tais manifestações constituem-se como parâmetros fundamentais na construção e manutenção da identidade cultural das referidas comunidades.

     Desse modo as festas e danças são símbolos que se apresentam nos rituais religiosos ou em suas relações intra e intersocial relacionadas a sua fé entre os membros do mesmo grupo ou não. A continuidade desses saberes ocorre entre os grupos informalmente prolongando-se através das gerações nas formas expressivas do corpo movimento em que sentimentos de alegria, tristeza se concretizam no cotidiano das comunidades negras.

    Nesse sentindo na ausência de registro que retrate a realidade nesses grupos sociais se faz necessários garantir a transmissão e reelaboração desses conhecimentos através desenvolvimento de práticas educacionais, viabilizando assim, a obtenção de outros saberes. Uma questão que influencia o comportamento de tais comunidades no que tange aos aspectos culturais, diz respeito à mudança de locais onde tais comunidades residem, ou residiam, caso tenham migrado para terras diferentes das suas por alguma razão. Ocorre que as comunidades negras, principalmente aquelas advindas das zonas rurais, enfrentam problemas na regularização de suas terras, conseqüentemente colocando em risco os valores culturais pertencentes a esses grupos. Embora a Constituição de 1988, no Ato das Disposições Transitórias diga que "aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos", na prática isso não vem acontecendo. Assim, enquanto a titulação das terras não se efetiva, essas comunidades vão sofrem invasões freqüentes impostas por fazendeiros, mineradores e grileiros. Por este e outros motivos, o conhecimento transmitido dos mais velhos para os mais jovens nos quilombos contemporâneos também passa por processo de transformação.

    Considerando os fatores acima mencionados, este trabalho está focado no estudo das festas e danças nas comunidades rurais negras no município de Alcântara - Maranhão. É apresentada uma análise do processo de transmissão e reelaboração dos conhecimentos produzidos nestas comunidades, de geração a geração, face as transformações sociais e culturais. Para tal, é apresentada uma comunidade rural negra de Alcântara cujo nome é, Cajueiro.

     A exemplo do que acontece nas comunidades rurais negras, esta comunidade reside em agrovilas, após a desocupação de suas terras para a implantação da base espacial de Alcântara, em 1987.

     Possuem como forma de subsistência a agricultura, através do plantio da mandioca, arroz, melancia e quiabo. A comunidade de Cajueiro ainda conserva a sua forma simples de viver, através das festas e danças que se realizam durante o ano. A riqueza da cultura do negro nessa região mistura-se aos rituais católicos, ficando, portanto, as festas ligadas ao calendário religioso. Este sincretismo religioso ainda hoje é fundamental para continuidades das tradições negras, pois permite uma reelaboração dessas culturas.


Preservação e relaboração da cultura

    A festa pode ser entendida como um conhecimento, arte, crença, moral, leis e costumes adquiridos pelo homem na sociedade a que pertence. As festas pertencentes às comunidades rurais negras preservam a riqueza e beleza nos cortejos e homenagem aos santos festejados através das gerações. Desse modo essas manifestações no âmbito social e cultural podem ser interpretadas como um saber informal, constituído de uma linguagem corporal, que expressa sentimentos como alegria, tristeza etc., ou que represente as festas pelas quais aquela comunidade se expressa através de símbolos característicos.

    Nesse contexto, as festas entendida enquanto conhecimento estão em constante mudanças atreladas reelaboração de novos valores e a produção intelectual dos grupos sociais na dinâmica de construção de novos materiais, sem perder sua forma original. Entenda-se reelaboração como sendo... (breve explicação). A este respeito (Cunha Jr, 2001, p.12) nos diz que: "A partir da reelaboração pensada sobre Steel Band se descortinou um novo horizonte para pensar o Candomblé, a Capoeira Angola e os Quilombos".

    Nesse sentido a reelaboração favorece a uma construção de conhecimentos oriundos das comunidades negras absorvendo novos elementos, seja da cultura material ou da espontânea, na construção e transmissão de novos valores culturais. A partir dessa concepção as danças afrodescendentes poderão ser estudadas levando-se em conta a reelaboração da realidade brasileira e seus valores sócio-culturais e regionais.

    Esses valores podem ser entendidos como sendo os conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade, ou ainda, um sistema de idéias, conhecimentos, técnicas e artefatos, de padrões de comportamento e atitudes que caracterizam uma determinada sociedade.

    O homem é o interprete, o transformador ou o criador das experiências que, como indivíduo, recebe do grupo social a que pertence representado nos símbolos, abstrações e generalizações, cujo campo genérico se pode distinguir dois campos particularizados, a saber: o material e o espiritual.

    Neste contexto a cultura corporal manifestado nas festas que por sua vez se constitui uma ampla área de conhecimentos, ao guardar valores morais, crenças, artes e costumes expressados na festa do divino espírito santo, no tambor de crioula, no cacuriá, na dança do caroço, na dança do lelê, a dança do baião, a dança do coco, no bambae de caixa, no Bumba meu boi de Matraca, de orquestra, Zabumba e Costa de mão, os blocos afros e no carnaval de rua.

    Essas danças guardam diferentes estilos, sotaques, grupos sociais estreitando laços de afinidades entre os membros do mesmo grupo. É o que acontece com as comunidades remanescentes de quilombos se considerarmos que através delas se construiu e transmitiu de geração a geração os conhecimentos expressos na alegria e manifestados, seja na música ou nos movimentos corporais.


Quilombos e saberes informais

    As danças e as festas aparecem como um saber tradicional guardado pelas comunidades remanescentes de quilombo que ao longo do tempo vêm perdendo suas raízes em decorrência do progresso e das invasões às suas terras. Compreende-se como dificuldade maior para a preservação dos saberes informais, aprendidos através da cultura da festa e dança, as dificuldades na titulação das terras. Estas ocasionam perdas históricas em relação à identidade cultural e aos valores transmitidos de pais para filhos, que nas palavras de Moura, nos diz:

"a vivência da identidade contrativa, elaborada e aprendida através da cultura da festa, faz com que quilombos afirmem vigorosamente sua diferença e a reivindiquem enquanto direito, vivendo do seu trabalho no campo, cantando, dançando e vivenciando sua fé" ( Moura, 2000, p.147).

    Neste sentido é fundamental a preservação da terra para as comunidades quilombolas na garantia de sobrevivência de seus valores culturais através de metodologias que possam facilitar a aproximação das riquezas culturais existentes nas comunidades remanescentes de quilombos com a educação formal, através das manifestações culturais. As danças existentes nessa comunidade compreendem um processo de construção e reelaboração que passa pela origem histórica, a estética e a sua representação na sociedade. A pesquisa aponta possíveis relações entre os conhecimentos oriundos das danças afrodescendentes e o processo educativo entre escola e a comunidade no que se refere à preservação dos valores culturais. Para Brandão (1981, p.10), "a educação é uma fração do modo de vida dos grupos sociais que criam e recriam, entre tantas outras invenções de sua cultura, em sociedade". Assim, as riquezas culturais nas comunidades quilombolas, frente à rapidez das transformações sociais, precisam se protegidas a fim de garantir e fortalecer a preservação desses conhecimentos e, conseqüentemente, aproximar os jovens para a continuidade dessa cultura.


O processo de deslocamento das comunidades negras para as agrovilas

    Conforme já mencionado anteriormente, elegeu-se a comunidade remanescente de quilombo de Cajueiro, no município de Alcântara - Maranhão para esta pesquisa. Isto se deve ao fato da referida comunidade estar sofrendo com a perda da terra, após o deslocamento de 312 famílias para agrovilas. Tal deslocamento ocorreu para a implantação da base de Alcântara.

    O município de Alcântara, cidade histórica localizada a cerca de 22 quilômetros de São Luís, é um dos principais pólos turísticos do Maranhão, vem passando pelo processo de reestruturação social no que diz respeito à titulação das terras e dos valores culturais pertencentes às comunidades remanescentes de quilombos. Tais mudanças iniciaram no ano de 1980 quando o governo do Estado do Maranhão editou um decreto nº 7820 declarando de utilidade pública, para fins de desapropriação, uma área de 52.000 ha de terras no município de Alcântara, para instalação do Centro de Lançamentos de Alcântara (CLA). A área desapropriada compreendia duas mil famílias e cerca de dez mil pessoas, segundo o Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Choairy(2000).

    De acordo com Choairy (2000) nesse processo de relocação das famílias, vários povoados foram aglutinados em uma só agrovila. Tal fato gerou profundas mudanças nas relações sociais historicamente construídas e cristalizadas pelos laços de parentesco, vizinhança e amizade. Nessas agrovilas os grupos de famílias que conviviam juntos há muito tempo juntaram-se a novos grupos, ocasionando um processo um tanto traumático para eles.

    O deslocamento das 312 famílias distribuídas em 7 agrovilas para implantação do CLA causou mudanças consideráveis, ao longo de 20 anos nas comunidades, pois ao deixarem para trás suas antigas histórias e laços de amizades teve como conseqüência o rompimento no processo de transmissão, preservação e reelaboracão dos conhecimentos advindos das manifestações culturais lúdicas expressadas através das festas entre adultos, jovens e crianças.

    Nesse contexto, Aguiar (1994) esclarece que a importância da tradição oral é um instrumento de preservação, transmissão e aquisição dos conhecimentos, realizados através da educação informal cujo o cotidiano de uma comunidade é estabelecido através da história, da forma de organização social e cultural, da ocupação do espaço físico e de suas casas; da alimentação e da agricultura; do artesanato e das práticas religiosas.

     Desse modo o projeto do CLA promoveu a relocação das famílias. O plano de relocação da aeronáutica compreendia uma mudança das atividades agrícolas do município de cultura temporária (arroz, milho, mandioca, feijão) para a hortigranjeira. Assim, em 1986, deu-se início o processo relocação das comunidades remanescentes de quilombos. Foram então criadas as 7 (sete) agrovilas correspondentes ao número de comunidades relocadas, denominadas de: Marudá, Cajueiro, Peru, Espera, Só Assim, Pepital e Ponta Seca. Essas agrovilas são núcleos residenciais que contam com casa de alvenaria, quintal, posto médico, lavanderia comunitária, casa de farinha comunitária, salão de festa, igreja, escola, poço artesiano e 15 ha de lotes para cada família. Muitas famílias no entanto, optaram em não permanecer nas agrovilas e mudaram-se para a cidade de São Luís levando consigo conhecimentos advindos das manifestações culturais da comunidade.

    Dessa forma as comunidades tiveram que se adaptar as novas mudanças reelaborando ou reconstruindo os antigos costumes através da convivência entre pessoas que pertenciam ou que se identificavam com o grupo social. Entre os conhecimentos espontâneos e informais que ainda são preservados de acordo com a tradição na comunidade de Cajueiro como herança cultural, merecem destaque a festa de São Sebastião e a Dança do Coco. Estas manifestações culturais estão ligada a religião católica no pagamento de promessa presentes no cotidiano da comunidade e mesmo passando por um processo de mudança, elas são fundamentais na preservação dos valores de solidariedade, respeito e amizade.

    Desse modo, a presente investigação se torna relevante, na medida que busca analisar como as comunidades remanescentes de quilombos, a exemplo de Cajueiro, vêm se comportando frente às transformações educacionais, culturais e sociais, decorridos vinte anos de moradia nas agrovilas. Especificamente propõe-se analisar os processos de transmissão, construção e reelaboração dos conhecimentos oriundos dos afrodescendentes produzidos na comunidade remanescente de quilombo de Cajueiro através do papel social das festas. Dessa maneira a compreensão das inter-relações estabelecidas na comunidade pode ser entendida através da memória oral preservadas nas festas, danças e nas antigas historias contadas dos mais velhos para os jovens e crianças. De acordo com Freire apud Mc Laren (1998, p.59) "a história que as crianças contam são baseadas em suas experiências, o que pode refletir o espírito da comunidade."


Espaço Vital das Festas na comunidade de Cajueiro

    A comunidade de Cajueiro possui 400 pessoas distribuídas em 76 famílias, em pequenas moradia de alvenaria com um quarto, uma sala em que vive em media 5 pessoas. As evidencias de mudanças no modo de vida das comunidades podem ser percebidas nas recordações dos moradores sobre suas antigas moradias no Cajueiro Velho. De acordo com Cardoso (2004) Cajueiro Velho era uma comunidade quilombola que residia no local onde hoje está a atual Base de Alcântara. Abaixo segue o relato de um morador:

"As nossas raízes ficaram no Cajueiro Velho; ainda existe muita recordação nossa lá, como nossas plantações, nosso campo de futebol. Ah! Eu tenho muitas lembranças! ... lá tá o antigo cemitério de nossa gente e nós nem visitamos, até mesmo porque não temos permissão."

    Desse modo com a perda da terra espaço vital para a continuidade da preservação, transmissão dos valores e costumes, os indivíduos passaram estabelecer novas relações intracultural e extracultural após as mundanças e aproximação de diversas comunidades ocupando mesmo espaço.

    Diante das possibilidades de compreender o estado atual dessas mudanças no que se refere aos valores da cultura social e corporal, as festas configura-se como o campo de pesquisa que ainda preserva os rituais, símbolos e significados da cultura na comunidade de Cajueiro.

     Nesse contexto passamos a analisar os acontecimentos, os preparativos, a participação dos moradores de Cajueiro na Festa de São Sebastião, descrevendo o significado de cada fase dessa festa. A festa acontece no dia 20 de Janeiro no festejo de São Sebastião, com o ritual do levantamento do mastro, cuja tradição e simbologia é enfeitá-lo com murta, bananas, coco, tapioca, frutas, bolos e bebidas; acima, é colocado no mastro uma bandeira em oferecimento ao santo protetor.

     O ritual de tirada desse mastro acontece no dia de Reis, os homens entram na mata para tirar o melhor mastro que encontrarem, ou seja, reto, sem curvas e sem furos. Segundo a tradição, a derrubada do mastro é feita pelo promotor da festa do próximo ano, no último dia do festejo ( lava prato) consiste que o casal de juízes ( crianças) e o festeiro terão como atribuição administrar financeiramente as jóias dos mordomos ( doações em dinheiro); jóias do santo ( esmola recolhida de porta em porta) e a receita resultante da venda do carvão e do azeite, produzidos pelos moradores, durante1 ou 2 meses, para garantir os recursos financeiros necessários para a realização da festa.


Jóias do modormos

    É a contribuição em dinheiro feita pela comunidade ao festeiro. Com a receita dessas doações ( jóias ), o festeiro compra um boi que deverá ser distribuído entre os moradores de acordo com o valor da jóia, doada. Dessa maneira o mordomo torna-se um sócio do festeiro, no dia da festa ele tem o direito em comer com a sua família.


Mestre sala, regente e cozinheira

    O promotor da festa ou festeiro cabe a função de administrar as finanças e realizar as compras até chegar a semana de início da festa. O material adquirido nesse período são mais variados possíveis, como: Loucas, bebidas, tapioca, farinha, café, chocolate e acucarque são entregues ao cuidado do mestre sala que guardará, distribuirá os mantimentos e coordenará uma equipe de auxiliares: regente, chefe das cozinheiras.

    Desse modo o mestre sala e regente montam guarda, dia e noite, junto a despensa e geralmente são as pessoas mais velhas e respeitadas na comunidade para exercer essa função. O ritual da festa garante a continuidade e preservação dessa tradição na comunidade de Cajueiro seguidos de quatro dias que correspondem respectivamente a antevéspera, véspera, dia do santo e lava prato.

    Dessa forma no primeiro dia de festa se confecciona o bolo, se torra o café e serve os licores para as pessoas presente. As mulheres de outros povoados que vêem prestigiar a festa , se confraternizam no clima de alegria e solidariedade enquanto cozinham, brincam e contam histórias aproveitam para saber notícias de parentes e amigo. Na confecção do bolo participam principalmente as mulheres, para as crianças e homens fica a tarefa de assar o bolo, retirar e transportar o tabuleiro do forno, descascar o coco da praia. As mulheres passam toda a noite, fazendo bolos para serem consumidos no dia seguinte.


Véspera da festa

    Compete aos homens sacrificarem os animais que irão alimentar a comunidade local. O animal abatido é destinado ao mordomo e para venda, pois nesse período é costume fazer matanças de boi apenas nesse período. Na manhã ou a tarde os homens vão buscar o mastro em um ritual marcado pelo cortejo de adultos; crianças e músicos que tocam as marchas e hinos.

    O cortejo percorre toda a comunidade parando de vez em quanto na casa do mordomo e do juiz. Em seguida se enfeita o mastro e colocando no topo a imagem do santo festejado, então é erguido com auxilio de cordas e homens, regado a muito foguetes, gritos de alegria é colocado em um buraco feito próximo a tribuna ou lugar estabelecido. A noite rezam a ladainha capela em homenagem a São Sebastião agradecendo as graças alcançadas e em seguida começa a festa dançante ate o dia do lava prato.


Dia do Santo

    No amanhecer do dia 20 de janeiro, as radiolas param de tocar para volta da 5 horas, para dar início a programação de homenagem ao santo. Dessa maneira todos param para ouvir a valsa que marca a alvorada. Após a valsa continuam as festas dançantes até o final da tarde, quando tem início a procissão, com pagamento de promessa. Os juízes são representados pelas crianças que vem a frente do cortejo vestido a moda da nobreza imperial.

    A noite segue o ritual com jantar dos mordomos que serão servidos após a mesa dos juizes, de acordo com a ordem de valores das jóias doadas para a festa. A segunda mesa participam os trabalhadores que fizeram a matança dos animais, cortou a lenha , tirou o carvão ou prestaram serviço durante o festejo. Os últimos a serem servidos são aqueles que foram apenas participar da festa.


O Lava Prato

    No último dia da festa, acontece a cerimônia de pelouro e o derrubamento do mastro por volta das 9:00 as 11 horas da manhã, com a distribuição de bolos e bebidas. Apartir daí serão escolhidos juizes e festeiros para o proximo ano, as pessoas se apresentam espontaneamente se oferecendo como mordomos. Depois faz-se a derrubada do mastro e as pessoas começam a retirar-se.

    Dessa forma as festas na comunidades rural negra de Cajueiro ainda se mantém embora as mudanças pelas quais sofreram ao longo dos anos acarretaram alguns problemas de ordem social e cultural. Percebe-se que durante a festa, os bailes dançantes tem influência consideradas das radiolas de raggae ou de forró o que atrai um número considerado de pessoas de outras cidades.


Procedimentos metodológicos

    Para o desenvolvimento da pesquisa se faz necessário um estudo de natureza qualitativa e exploratória, que possibilitará descrever, analisar, compreender e classificar o espaço construído da comunidade de Cajueiro nas áreas de maioria afrodescendentes , divididos em quatro etapas:

    Na primeira etapa, examinaremos os trabalhos das atividades cotidianas dessas comunidades no que se refere ao espaço de lazer, trabalho e as relações familiares. Analisando como ocorre o processo de construção e transmissão dos saberes das festas e danças, como são registrados ou explicados através da memória imediata.

    Na segunda etapa, registraremos os períodos das festas relacionando com o pagamento de promessas e homenagem aos santos, repetiremos o processo de resgate da memória oral passada, de como devem ser a transmissão dos conhecimentos dos mais velhos para os mais novos. Na terceira etapa registraremos as danças, as musicas, instrumentos musicais, as dançarinas do Tambor de Crioula, Os cantadores, bem como, os rituais míticos estabelecidos através do movimento das danças; dos contadores de histórias, os contadores de casos, as histórias coletivas através das suas festas e as histórias individuais dos mais velhos, realizando entrevistas sobre fatos, períodos e manifestações da comunidade.

        Na quarta etapa, passamos a analisar, procurando dar sentido sociológico e histórico do movimento das danças nas comunidades rurais.


Conclusões

    O estudo possibilita compreender a importância social da festa na preservação das tradições passadas de geração a geração, bem como, estas manifestações apresentam-se como lazer na comunidade de Cajueiro. O modo simples de vida nessas comunidades permite ainda hoje que os laços de amizade se mantenham através da culturas das festas e danças, considerando que ao longo de vinte anos de moradia em agrovilas as comunidades no município de Alcantâra, a exemplo de Cajueiro ainda enfrentam o problema da regularização das terras colocando em risco a continuidade dessas culturas.

    A pesquisa constatou que até o momento o processo de aglomeração de várias comunidades remanescente de quilombo em agrovilas já mostra o fim de algumas da festas que eram realizadas em decorrência do aglutinamento das famílias em agrovilas. As poucas pesquisas realizadas nesse campo depara com a falta de material bibliográfico em especial a área de conhecimento da Educação Física.

    Nesse sentido acredita-se a pesquisa em questão contribuirá para o campo da cultura corporal no que diz respeito ao lazer como alternativa de manutenção das tradições das festas, compreendendo a história social do corpo, ou seja, da natureza social do corpo das festas e danças na comunidades tradicionais. Nesse sentido o estudo em questão propõe analisar o processo cultural da festa apartir representações e significados na cultura social e corporal. Segundo Laraya ( 1986) "O modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos sociais e mesmo as posturas corporais são assim produto de uma herança cultural, ou seja, o resultado da operação de uma determinada cultura".


Nota

    1. Esta investigação utilizou até o momento como campo de pesquisa a comunidade de Cajueiro. Além destas, pretende-se investigar também outras comunidades no município de Alcântara a fim de se documentar as principais festas e danças características das agrovilas.


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