Projeto 'Escola de Educadores': a fraternidade como prática pedagógica |
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* Bolsista do Projeto de Extensão Universitária e Acadêmica do curso de Pedagógica do Instituto de Biociências da UNESP/RC ** Coordenador do Projeto de Extensão *** Membros do Projeto de Extensão (Brasil) |
Juliana de Souza Silva* | Samuel de Souza Neto** escolaed@rc.unesp.br | samuauro@claretianas.com.br Larissa Cerignoni Benites*** | Ilara Bellan e Silva*** Iracema Horibe*** | José Silvio Govone*** José Firmino Corrêa Junior*** Werter de Oliveira e Silva*** |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 91 - Diciembre de 2005 |
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Introdução
O Projeto "Escola de Educadores" é a proposta de um grupo de educadores da educação básica e do ensino superior que nós últimos cinco anos procurou se encontrar em reuniões mensais para fazer uma reflexão sobre a educação em sentido amplo, dando ênfase especial para a questão da formação de professores inicial e continuada. Portanto, desenvolve-se, prioritariamente, como grupo de reflexão, tendo como práxis promover cursos de extensão voltados para temáticas de estudo gestadas sob a perspectiva do pensamento da Profa Dra Chiara Lubich. No âmbito desse processo os seus cursos destinam-se às pessoas envolvidas com o campo educativo que queiram pensar a prática pedagógica numa perspectiva de mudança.
No ano de 2004, o Projeto "Escola de Educadores" iniciou a sua vida pública com o curso de extensão "A Fraternidade como Prática Pedagógica". Esta temática foi escolhida em função do problema de violência física e simbólica encontradas em escolas de nossa região por relatos de nossos pares, perda de perspectiva para alguns da profissão docente e, talvez o principal, relativismo cultural na esfera dos valores.
Nesta estrada que foi aberta colocou-se como formatação, proposta, desse curso, a reflexão, o diálogo e a possibilidade de se resgatar a auto-estima docente numa tentativa de se valorizar o profissional da educação. Embora houvesse esta primeira meta sabia-se também que este resgate passa pelo exercício da profissionalidade docente, entendido como um corpo de conhecimento que auxilia na identificação do educador, bem como de se colocar que a Educação que queremos deverá levar necessariamente à formação da pessoa humana e transformação da sociabilidade de cada um.
No bojo dessa experiência o que se quer é compartilhar as nossas experiências com outros educadores e alargar as fronteiras dessa convivência, visando construir juntos um itinerário pedagógico que possibilite olhar a escola, a sala-de-aula e a sociedade com "outros olhos". Queremos mudar o "mundo" a partir da escola e a "escola" a partir de cada um de nós, começando pelo mundo-do-meu-eu e, num segundo momento, caminhar para o mundo-do-nós.
De forma que a proposta em curso se destina à todas as pessoas envolvidas com o campo educativo que queiram pensar a prática pedagógica numa perspectiva de mudança, tendo como condição sine qua non a abertura para o diálogo e as novas propostas.
Esta constatação foi apontada no Fórum Mundial de Educação - São Paulo, no ano de 2004, quando se assinalou que devido a complexidade dos processos, subjetivos e objetivos, envolvidos na construção das identidades singulares e culturais num mundo globalizado, exige pensar como o sujeito da atualidade, sofre, experimenta, vivencia e sintetiza a diversidade de influências culturais no qual esta imerso. Ao mesmo tempo torna-se imprescindível resgatar os diversos espaços e linguagens para que todos/as possam contribuir para a transformação de indivíduos-objetos em cidadãos-sujeitos responsáveis por sua posição no mundo.
No âmbito desse enfoque o que se quer é desenvolver e implementar um trabalho pedagógico, tendo como premissa a parceria com os mais diferentes atores sociais que perpassam os variados níveis do processo de escolarização e educação na sociedade.
Dentro da proposta do Projeto Escola de Educadores, o curso "A Fraternidade como Prática Pedagógica" terá como objetivos pensar a educação numa perspectiva de mudança; resgatar da auto-estima docente e possibilitar a produção de material didático-pedagógico.
A educação para a fraternidade: perspectivasFraternidade, do latim fraternitas, fraternitatis nos lembra laço de parentesco entre irmãos, irmandade, "família", vinculo de solidariedade, cooperação ou como nos sugere Chiara Lubich (2001) que a fraternidade é a categoria de pensamento capaz de conjugar a unidade e a distinção a que se anseia a humanidade contemporânea.
Na visão de Souza Neto (2004) pensar na educação para a fraternidade significa caminhar na direção de uma educação a cooperação, a solidariedade; pensar num ideal de educação, projeto de educação. Porém, refletir sobre a fraternidade significa também pensar:
Na Revolução Francesa, "liberdade, igualdade, fraternidade" e na trilogia do cineasta polonês Krzysztof Kieslowki em que assinala, numa alusão às cores da bandeira da França e crítica à sociedade ocidental que... "A liberdade é branca"; "A igualdade é azul"; "A fraternidade é vermelha".
No 11 de setembro (EUA), no 11 de março (Espanha), no 7 de julho (Inglaterra), no oriente médio e nas favelas brasileiras. Mas também na perspectiva de unidade, na diversidade encontrada.
No convite ao diálogo proposto por João Sayad (1996), quando chama a atenção para o fato de que...
"os acadêmicos deveriam fazer pesquisa sabendo que são dominados pelas ideologias da época. Por dever profissional deveriam fazer grande esforço para ler e ouvir os oponentes. Marxistas deveriam tomar café da manhã com monetaristas; freudianos, com junguianos; islamitas com judeus. Talvez assim pudéssemos discutir humildemente o que os novos tempos trazem de bom e de ruim, com alguma esperança de influenciar o mundo, suave, delicada e imperceptivelmente. Ou, pelo menos, entender o que está acontecendo".
Na interdependência proposta por Norbet Elias (1992), teoria do processo civilizador, quando coloca que "a relação entre indivíduo e sociedade só pode ser esclarecida se investigarmos ambos como entidades em mutação e evolução, ou seja, como componentes de um processo" ou na Declaração de Interdependência inspirada na proposta de Benjamim Baber em que "Nós, povos de todo o mundo, aqui declaramos nossa interdependência como indivíduos e membros de diferentes comunidades e nações" por reconhecer a própria responsabilidade "pelo bem comum e pelas liberdades de todo o gênero humano" (Cívico, 2003).
Na alteridade, significando pensar no "outro", não como inimigo ou obstáculo a ser vencido ou derrotado, mas como alguém que nos completa, que nos amadurece que nos lembra que não somos competentes sozinhos, pois nos tornamos solitários quando não contamos com a companhia do outro. Da mesma forma não se consegue ser humano sozinho, pois quem me diz como sou é o outro, me descubro no olhar do outro. Assim, quando deixo de considerar o outro como alguém que me faz ser eu, passo a considerá-lo como um alienus (alheio), rompo com a alteridade e até mesmo com a minha identidade. Ao romper com o alter, de certa forma "acabo comigo", pois me torno alienado, perdendo a minha identidade e rompendo, também, com a interdependência.
Na proposta de Richard Rorty (1998) .que nos coloca que é preciso ler novamente o "Manifesto Comunista" e o "Novo Testamento", pois, ainda, têm princípios válidos, para os dias de hoje, que não foram alcançados.
Neste contexto encontramos também o pensamento de Chiara Lubich (2001) que considera a educação como o itinerário pedagógico que o educando percorre com a ajuda do educador ou dos educandos, na direção de um dever ser, de um objetivo considerado válido para o homem e para a humanidade. Em sua experiência, Lubich, como educadora, vai em busca de uma educação totalitária (interagindo entre diferentes dimensões, como a espiritual, afetiva, cognitiva etc) com vistas a uma "educação sem limites", tendo na regra da gradação do ensino um objetivo a ser atingido, pois se deve "ensinar tudo a todos". Porém, a vida não é uma planície e a "educação a dificuldade", como um compromisso que envolve educador e educando, não pode parar nas "facilidades" de uma educação que não promova a autonomia, a alteridade, a fraternidade, ou seja, a cooperação e a solidariedade.
Trata-se, portanto, da perspectiva de um trabalho unitário, respeitando-se a diversidade, visando à superação da fragmentação do conhecimento e das experiências. Nesse percurso busca na perspectiva da prática pedagógica individual, mas também cooperativa e solidária, tendo como princípio orientador a dimensão afetiva, o caminho para superar os entraves pessoais e coletivos que vão se acumulando no decorrer da vida. De modo que nesse primeiro momento o que se valoriza é a reflexão na e sobre a ação pedagógica (ORTIZ, 2003; GÓMEZ, 1992; SCHON, 1992) que cada um desenvolve em sua vida cotidiana e profissional, visando dar um colorido maior a aquilo que vem sendo desenvolvido, valorizando o educador enquanto ator social da educação.
Dentro desse contexto, seguindo a proposta do projeto civilizador de Lubich (2001), especial atenção é dado ao mundo da educação, da cultura e da escola, constituindo-se num repensar a educação e a escola na forma de um projeto voltado para à formação, o qual não exclui às contribuições filosóficas ou técnicas da pedagogia, mas as modela sob a perspectiva da espiritualidade da unidade. Neste pressuposto delineia-se com maior clareza a figura do(a) professor(a) (do profissional da educação e/ou do educador) que trabalha preocupado não só em transmitir aos seus alunos o fruto de suas competências atualizadas e qualificadas, mas que acrescenta algo novo, algo a mais como: sabe ouvir o outro; acolhe e chega a participar dos programas pessoais e familiares do aluno; o acompanha no máximo possível, mesmo fora da escola para compreendê-lo em profundidade e na sua totalidade. De modo que este professor(a) imbuído(a) desta perspectiva não se limita em ser mero informador e/ou instrutor, mas esforça-se para ser educador. Nesta nova relação elegeu-se o binômio professor-aluno, como os sujeitos que vão interferir no processo educativo escolar, mas que não exclui toda a equipe docente, o pessoal administrativo, os inspetores de alunos, os pais, a comunidade.
No âmbito dessa compreensão a "cultura" de cada um ou coletiva foram vistas como uma expressão da experiência humana, significando dizer que fazer cultura tem como premissa impregnar a nossa investigação sobre o homem contemporâneo com a nossa experiência de vida. Portanto, significa abrir espaço ao novo que percebemos entre nós, buscando promover um diálogo em todas as direções e em todos os níveis. Emblemática é a frase de Sergio Rondinara (1994) ao colocar que "Não é possível fazer cultura sem os outros", sem deixar de interrogar as suas idéias e ações, pois seria fazer uma cultura de 'gabinete', retomando aquilo que já existe sem buscar novos caminhos. Da mesma forma para Bernard Charlot "quem não reconhece a cultura do outro não conhece a sua própria cultura" (CHARLOT apud LUCCAS, 2003, p.20-23), pois conhecer, valorizar e amar a cultura do outro como a própria não é uma questão teórica, mas uma realidade que deve permear todo o processo educacional.
Nesta perspectiva as reflexões teórico-práticas que envolvam temas de estudo como Arte e educação; Educação para Todos e diversidade cultural; Espiritualidade e educação; Ética, Educação e Cultura da paz; Identidade: do educador e do educando rumo a cidade educadora ou, como foi proposto, Fraternidade e Prática Pedagógica, podem se constituir em perspectivas profícuas na ampliação de novos objetos de estudo.
MetodologiaTrata-se de um trabalho de intervenção pedagógica, pessoal e coletiva, nos valores e concepções que os professores trazem para a sala de aula e levam na sua vida cotidiana, podendo-se dizer que assume o formato da pesquisa-ação individual, sem apresentar o rigor que esta exige, pois se parte de uma educação que vem de dentro para fora, mas que não exclui as contribuições de uma educação que vem de fora para dentro..
O método de trabalho escolhido foi o dialógico, tendo como referência o diálogo operativo proposto por Lubich que nada mais é do que descobrirmos juntos o melhor caminho, visando à transformação, práxis. Neste processo que tem como ponto de partida a reflexão individual, bem como mudança de atitude até chegar a uma prática coletiva, ou que envolve pelo menos duas pessoas no exercício de reciprocidade, foi proposto como atividade o jogo do dado do amor.
Como se sabe um dado contém seis faces, representando cada uma um tipo de numeração. Neste caso, específico, este dado também contém seis figuras e cada uma com uma frase (slogan).
A proposta consiste, então, em jogar o dado. A frase contemplada, no jogo, se torna o programa do dia ou da semana. Por exemplo: Amar a todos; Ser os primeiros a amar; Amar o inimigo; Amar-se reciprocamente e assim por diante...
No geral, essas frases nos convidam a sair do nosso individualismo, a acolher o diferente, a ser solidário. Portanto, o que caracteriza este jogo é a interdependência, convidando professore e alunos, pais e filhos, enfim todos os grupos sociais a uma nova relação pedagógica.
O trabalho proposto foi desenvolvido no período de 30 de julho a 11 de dezembro de 2004, na forma de um curso de extensão com 125 horas, tendo como conteúdo programático...
A Educação para a Fraternidade;
O Projeto Civilizador de Chiara Lubich;
Profissionalidade Docente, Cultura Escolar e Prática Pedagógica;
Produção de Material Didático-Pedagógico.
Estas atividades se desenvolveram na forma de encontros temáticos (oito), bem como na organização de um work shop, visando a apresentação da produção do material didático-pedagógico desenvolvido. No âmbito deste processo foi proposto também resenha da leitura dos textos programados e um estágio de 35 horas, envolvendo as seguintes atividades (ou modalidades):
participação em congresso proposto para este fim, enquanto trabalho de laboratório - máximo de 35 horas;
divulgação (vivência) de textos e/ou da própria proposta do curso em reuniões pedagógicas - máximo de 10 horas;
aplicação do dado do amor em ambiente de trabalho e/ou em outros ambientes educativos - máximo de 10 horas;
divulgação (vivência) da semana mundo unido por uma cultura de paz (agendinha) - máximo de 10 horas;
participação em reuniões de estudo com membros do curso - máximo de 5 horas;
participação em trabalhos afetos ao curso de extensão (relatos de experiência, relator de grupos de trabalho, participação em número artístico/curso) - máximo de 5 horas;
participação em campanhas humanitárias, visando o bem comum - máximo de 5 horas.
Enfim, para que o estágio, na proposta apresentada, fosse validado havia necessidade de que toda atividade fosse comprovada, trazendo subjacente a ela o relato da experiênica desenvolvida.
Como fechamento, os participantes deveriam, na atividade de produção de material didático-pedagógico, apresentar no work shop o trabalho desenvolvido e entregá-lo na forma de texto. Entre os resultados aguardados esperava-se o resgate da auto-estima docente e a possibilidade de produção de material didático-pedagógico.
ResultadosO primeiro resultado significativo foi a procura pelo curso em função de que foram oferecidas 50 vagas e compareceram 134 interessados, mas considerando as trocas se chegou a 150, tendo sido selecionados 125 e concluído 101 pessoas de nove cidades: Brotas, Ipeúna, Iracemápolis, Limeira, Rio Claro, Piracicaba, Santa Bárbara, Santa Gertrudes, Torrinha.
A proposta principal do curso era resgatar a auto-estima dos professores/educadores e produzir material didático-pedagógico. Sobre a produção deste material foram entregues 14 trabalhos com os seguintes títulos: - "Fraternidade na escola: como praticá-la?"; - "Praticando a fraternidade brincando"; - "As relações humanas na escola"; - "O desafio de integrar: o terceiro saber, a educação infantil e o saber brincar"; - "Os quadros pilares da educação e a educação infantil"; - "Segurança no lar: conscientização e prevenção, o primeiro passo rumo a fraternidade entre alunos e professores"; - "Entre no clima, recreio é hora de alegria!"; - "A fraternidade no EJA"; - "A busca pela arte em direção a fraternidade"; - "Fraternidade que acolhe o diferente, forma, une, educa valores e inclui a todos numa ação pedagógica"; - "A importância das inteligências"; - "Diversidade cultural x fraternidade: um estudo de caso do Caruru no Município de Piracicaba-SP"; - "Diversidade cultural x fraternidade: um estudo de caso sobre a imigração japonesa no Município de Piracicaba-SP"
Em relação ao resgate da auto-estima, alguns dados foram obtidos numa avaliação não formal sobre o curso em que os participantes foram convidados a apresentarem a sua apreciação em relação a expectativas, descobertas, perspectivas e questões pendentes (que o curso deixou em aberto), tendo respondido 64 participantes (63,36%) de 101 e no que diz respeito a justificativa para continuar no curso - responderam 51 (50,49%) do mesmo número de participantes.
As respostas dadas foram classificadas em categorias (capacitação, comprometimento, educação integral, fraternidade, humanização, informação, reflexão, prática pedagógica, socialização, transformação, nenhuma resposta), indicando ora o posicionamento, ora o significado e ora o que se buscou e/ou esperava do curso. Pode-se dizer que o conjunto das descrições apresentou um resultado muito promissor.
No que diz respeito às expectativas, a maioria veio em busca de: - Humanização (20), - Capacitação (15), - Prática pedagógica (13) ou Socialização (8), entre outros;
Com relação às descobertas, a predominância foi da possibilidade de: - Transformação (19), seguida de - Reflexão (18), - Humanização (10) e - Socialização (8), além de outras respostas.
Sobre as perspectivas que foram projetadas prevaleceu o empenho de: - Comprometimento (21), seguida da possibilidade de - Transformação (17), - Reflexão (10), - Capacitação (6), - Socialização (5) e - Humanização (5).
Porém, no diz respeito às questões pendentes não foi arrolado nada de significativo, a não ser sugestões para se melhorar a questão do microfone, cantina, entre outros.
Com relação às justificativas para se continuar no curso, o que se coletou foi o desejo de: - Comprometimento (20), - Capacitação (11), - Socialização (6) e assim por diante.
Outro dado muito importante foi a realização de estágios em que se procurava colocar em prática a proposta do curso, levando os textos veiculados em reuniões de professores ou mesmo desenvolvendo atividades de fraternidade na família, na escola e em outros ambientes, provocando nos participantes pequenas pesquisa-ação, pois se trabalhava com uma concepção de educação que vinha de dentro para fora ou seja o processo de transformação começa comigo, pois não posso mudar o meu ambiente se eu não me modificar e começar pelas pequenas coisas. Por exemplo:
Relatório de Estágio referente ao curso "Fraternidade como prática pedagógica"De acordo com a proposta do curso Fraternidade como Pratica Pedagógica um dos objetivos era a divulgação em reuniões escolares e trabalhos humanitários, ou seja, transmitir o amor de maneira fraterna para auxiliar na formação de cidadãos autônomos, críticos e principalmente felizes, para não reduzir as pessoas, que nos rodeiam, há meros produtos.
Dessa forma decidi iniciar o meu estágio com o dado do amor. Pois penso que deveria iniciar uma reflexão interna para só depois tentar refletir em conjunto. Embora entusiasmada não foi nada fácil.
Dia 18/08/04: Joguei o dado logo que acordei e caiu "amar o inimigo". Achei uma piada, pois acreditava que não tinha inimigo, pensei até em jogar o dado outra vez, mas decidi esperar para ver o que iria acontecer durante o dia. Pode até parecer absurdo mas naquele mesmo dia tive uma reunião com o pessoal da direção e outra professora do pré III para decidi detalhes da formatura. Durante a reunião percebi que eu estava sendo extremamente egoísta e autoritária, não queria abrir mão de nenhuma das minhas vontades e resolvi me policiar para não agir daquela maneira.
Não foi fácil, mas passei a jogar o dado todos os dias, só que percebi que no final do dia não tinha para quem prestar contas então muitas coisas passavam despercebidas, era como se eu estivesse tentando me enganar ou apenas jogando por jogar.
Dia 30/08/04: Decidi levar o dado para a sala de aula, para a minha turma do pré III. Em minha sala de aula já tenho como rotina uma avaliação no fim do dia e nesta as crianças escolhem "carinhas" de cores diferentes ( Verde: bom; Amarelo: neutro e Roxa: ruim) para dizer a respeito da aula. Levei o dado como sugestão: seria jogado todos os dias e serviria como meta para a avaliação.
Fizemos um novo dado com frases compreendidas pelos alunos e figuras recortadas de jornal que ficou da seguinte forma:
A nomenclatura do último quadradinho foi alterada devido aos conflitos religiosos existentes: um aluno dizia que Jesus não era bom porque tinha levado a sua mãe, dois outros diziam que não era Jesus e sim Jeová e um outro aluno dizia que Jesus, Papai Noel e Coelhinho da Páscoa não existem. Então achei conveniente não usar a palavra Jesus, mas continuar com uma idéia semelhante.
Dia 23/09/04: A mãe de um aluno pediu para a direção da escola para falar comigo. Fiquei preocupada, pois era a mãe de um dos alunos que disseram que não devíamos dizer Jesus e sim Jeová (este aluno é uma criança bastante reprimida e todos os dias ele só utiliza a "carinha Amarela"). A diretora solicitou uma monitora para ficar com a minha sala , para eu poder conversar com aquela mãe.
A mãe me disse que tinha uma confissão a fazer: ela era contra a vinda dos filhos para a escola (seus filhos só entraram no segundo semestre) pois tinha medo de que seus filhos fossem contaminados pelas coisas ruins do mundo, já que provavelmente a professora não teria a mesma crença que eles. Ela queria saber o que era o dado do amor e como ele era utilizado. Eu expliquei. Ela disse, entre lágrimas, que seu grande medo era que as pessoas descobrissem o seu segredo e que seus filhos se revoltassem com o pai, pois embora temessem a Deus e a Bíblia fosse utilizada diariamente, o seu marido passava pelo drama do alcoolismo.
O pai era alcoólatra e extremamente autoritário. Os filhos ainda temiam o pai, pelo mandamento de Deus, mas de um tempo para cá a relação deles tinha melhorado muito. E desta forma ela estava feliz, pois Deus tinha colocado em seu caminho alguém que tocou o coração de seus filhos independente da religião. Agradeceu-me e foi embora.
Neste dia fui embora bastante satisfeita, realizada e criei coragem para começar a transmitir o trabalho de fraternidade para os demais professores.
Pedi autorização para a direção para apresentar os textos do curso para a equipe de professores. Eles autorizaram e forneceram dois dias para que eu pudesse desenvolver a atividade (27 e 28/10//04). Infelizmente no primeiro dia pude perceber que nossa equipe não focou muito contente com a atividade e estes dois dias resumiram-se a uma simples apresentação do projeto.
No geral o pensamento dos professores era de que não poderia haver educação voltada para o amor sem que tentasse converter as pessoas para alguma religião. Não critico, pois até iniciar o dado em minha sala pensava da mesma forma.
Então resolvi aplicar o dado na reunião de pais do dia 18/11/04. Só recebi 4 responsáveis mas já foi um trabalho bastante proveitoso, pois o dado além de quebrar o gelo serviu para ter certeza de que o trabalho terá continuidade na casa dos alunos. (RIO CLARO, 2004)
No bojo destes resultados os 101 participantes, como multiplicadores, envolveram em suas atividades 24 instituições de ensino da educação básica, entre outras instituições laicas ou religiosas, abrangendo projetos e grupos sociais vinculados a (ao): Casa da Criança; Grupo Ginástico, Centro Cultural, Pastoral da Saúde, Centro Espírita, Centro Cultural, UNESP/Campus de Rio Claro, Nosso Lar, Projeto Pai, Livraria Eureka, Pedagogia Cidadã, Projeto Presença Esperança, Logradouros Públicos, Casa de Família etc, num total de 330 atividades desenvolvidas, envolvendo diretamente 3.230 pessoas e não diretamente (co-relacionadas) 19.528 pessoas.
Por atividades co-relacionadas se entendeu a participação no Congresso de Humanidade Nova - Fraternidade: Uma Exigência, Um Desafio; Agenda Semana Mundo Unido e o jogo do Dado do Amor, sem contar, a divulgação dos textos veiculados por integrantes nas reuniões pedagógicas que depois eram repassados para outros colegas por estas pessoas.
Entre as reivindicações que chegaram até nós veio a sugestão para a ampliação do curso, em 2005, para outras cidades (como Poços de Calda, Ribeirão Preto, São Sebastião, São Paulo), bem como a continuidade do mesmo na cidade de Rio Claro. Outra solicitação foi a sugestão de se rever a concepção original do jogo o dado do amor numa de suas faces em função da pluralidade cultural.
ConclusãoO trabalho ora desenvolvido atingiu os objetivos arrolados nos levando a ampliar o enfoque proposto e redimensionar a proposta apresentada em termos de sua implementação. No âmbito da proposta desenvolvida trabalhou-se com a perspectiva do paradigma da unidade, visando à superação da fragmentação do conhecimento e das experiências em diferentes autores. Nesse percurso buscou-se na perspectiva da prática pedagógica individual, mas também cooperativa e solidária, tendo como princípio orientador a dimensão afetiva, o caminho para superar os entraves pessoais e coletivos que vão se acumulando no decorrer da vida. De modo que nesse primeiro momento o que se valorizou foi a reflexão na e sobre a ação pedagógica que cada um desenvolve em sua vida cotidiana e profissional, visando dar um maior significado à aquilo que vem sendo desenvolvido, valorizando-se o educador.
Esta reflexão proposta foi atingida quando se observa na avaliação dos participantes, em termos de descobertas, perspectivas ou mesmo em suas expectativas, o desejo de mudança quando se assinala para o processo de humanização, comprometimento ou transformação que foi assinalado por uma parte desses educadores.
Dessa forma, a fundação teórica, pautada, principalmente, nos textos da Profa Dra Chiara Lubich atingiram o objetivo esperado por se entender que os mesmos valorizaram a dimensão afetiva do educador, ao mesmo tempo em que se sugeriu, como propósito, que este deveria ter um "projeto de vida" visando a sua emancipação, bem como de quem esta ao se redor.
Referências
CÍVICO, A. A saída está na interdependência. Revista Cidade Nova, XLV, n. 8, agosto, 2003, p. 11
ELIAS, N. O processo civilizador. Rio de Janeiro, RJ: Zahar, 1992.
GÓMEZ, A. P. O pensamento prático do professor - A formação do professor como profissional reflexivo. In: NÓVOA, A. - Os professores e a sua formação. Lisboa: Don Quixote, 1992, pp. 78-93
LUBICH, C Aula magna para o doutorado honoris causa em Pedagogia. Universidade Católica de Washington, EUA, 2001.
RIO CLARO (UNESP). Relatório de Estágio. Rio Claro, UNESP/RC - Projeto Escola de Educadores - Curso: A Fraternidade como Prática Pedagógica, 2004, s/n.
RONDINARA, S. Mundo da Cultura, Escola e Educação. Escola Internacional de Humanidade Nova. Castelgandolfo, Roma-Itália, Centro Mariápolis, 1994 (texto impresso).
RORTY, R. Duas Profecias. Folha de São Paulo, Caderno MAIS, 24 de maio de 1998, pp 5-7.
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SCHÖN, D. A.. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, A. (Org.) Os professores e a sua formação. Lisboa: Don Quixote, 1992. pp. 77-92.
revista
digital · Año 10 · N° 91 | Buenos Aires, Diciembre 2005 |