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Aulas de ginástica localizada no ensino médio:
auto-estima, vitalidade e modelagem do corpo em
uma escola pública do Rio de Janeiro

   
Doutor em educação física e cultura pela UGF, Rio de Janeiro
Professor Adjunto da UNISUAM e UNIMATh.
Membro do Grupo de Pesquisa "Estudos Olímpicos" do CNPq
 
 
Prof. Dr. Carlos Henrique de Vasconcellos Ribeiro
c.henriqueribeiro@ig.com.br
(Brasil)
 

 

 

 

 
    O presente trabalho tem como objetivo investigar as possibilidades de desenvolvimento de um trabalho de ginástica localizada dentro do espaço escolar. A escola escolhida foi o CETEP- Barreto da cidade de Niterói, Brasil. Esse trabalho pedagógico foi desenvolvido com turmas de ensino médio durante as aulas de educação física curricular durante os três primeiros bimestres letivos de 2004. Ao optarmos por essa atividade diferenciada, procuramos refletir também sobre os esportes com bola, freqüentemente associados ao basquetebol, handebol, futsal e voleibol, ainda tão comuns dentro da escola, e que por vezes podem limitar o trabalho pedagógico da educação física escolar.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 89 - Octubre de 2005

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Introdução

    Ao longo de 10 anos de magistério em escolas públicas do Rio de Janeiro, observo que muitos alunos vão perdendo o interesse de praticar as aulas de educação física durante seus anos de passagem pela escola. Quer dizer, de uma grande adesão na quinta-série do ensino fundamental para um baixo nível de participação no ensino médio. Diversos fatores influenciam essa realidade, mas podemos dizer que existem duas grandes idéias que justificam essa queda de interesse por parte dos alunos, notadamente quando esses chegam ao ensino médio.

    Primeiro as razões de ordem prática, ou seja, a necessidade de se dedicar às disciplinas que são consideradas mais importantes para o vestibular e a carreira profissional dos alunos, fazem com que a educação física não seja mais uma prioridade nesse momento de suas vidas. Pois se considerarmos que a educação física é essencialmente lúdica, pode existir uma dificuldade de relacionar por parte do aluno, que a participação dessa disciplina no futuro profissional/intelectual pode vir a beneficiá-lo.

    O segundo motivo seria de ordem qualitativa, ou seja, nem sempre oferecemos atividades esportivas/físicas adequadas e diferenciadas para essa faixa etária e, normalmente, o que temos como aulas são práticas dirigidas em que os "rachões" e as "partidas" acontecem sistematicamente.

    Afinal, os alunos já vivenciaram ao longo desses anos atividades esportivas que privilegiavam à aprendizagem das habilidades motoras necessárias para a execução dos gestos esportivos específicos de cada modalidade esportiva. Ou seja, se o aluno já sabe sacar, chutar e arremessar, ele agora pode ter aulas em que o jogo completo, a prática dirigida toma grande parte do tempo de aula de educação física no ensino médio.

    Se para grande parte desses alunos as aulas ainda são as mesmas durante diversos anos em que foram passando pelos ensino fundamental, dentro do ensino médio, muitos serão tratados quase como adultos e, portanto, podem ter o direito à opção de escolha quando a "matéria" é a educação física. Afinal, se existe uma disciplina que é por vezes confundida com elementos de lazer, prazer, ludicidade e de socialização, essa disciplina é a educação física.

    Somando-se à esse aspecto, podemos considerar uma baixa procura por parte das alunas em praticar, efetivamente, as aulas de educação física no ensino médio. Não quero dizer com isso que as alunas não comparecem. Muitas freqüentam, porém existe sempre a questão do ciclo menstrual como motivo/desculpa para não participarem das atividades propostas ou ainda quando existe uma prática dirigida, em que muitas preferem ficar olhando do que fazerem parte do jogos colocados pelos professores. Afinal, em aulas mistas muitas ainda sentem dificuldades de se integrarem em práticas dirigidas que os meninos demonstram mais habilidade motora/força física e onde eles dominam o território do jogo.

    Nas próximas páginas nos deteremos em descrever e analisar a pesquisa sobre o interesse de alunas do ensino médio na prática da ginástica localizada dentro da grade escolar, em uma escola pública da rede estadual de ensino, na cidade de Niterói, Rio de Janeiro.


A particularidade da escola técnica estadual pesquisada

    A escola estadual onde se realizou o estudo mantém, como qualquer outra escola, suas particularidades. Os alunos podem nessa instituição escolher os esportes que querem praticar em determinado bimestre. Portanto, normalmente as escolhas seguem um padrão pessoal, em que o gosto por determinado professor ou atividade se torna determinante no padrão de escolha dos alunos. É possível também observar que determinadas turmas preferem ficar juntas, mantendo assim o mesmo grupo de sala de aula das outras disciplinas. Dessa forma, dificilmente um aluno escolhe o mesmo esporte durante um ano letivo inteiro, pois existe a possibilidade de se experimentar outros esportes e conhecer novos professores, se "encaixando" naqueles que detém mais habilidade, prazer e afinidade.

    As aulas de educação física são oferecidas uma vez por semana e sua duração é de 1 hora e quarenta minutos.


Desenvolvimento da pesquisa

    Desenvolvemos um questionário com perguntas abertas que pudessem privilegiar a captação dos sentidos da escolha da ginástica por parte dos alunas do ensino médio. Dessa forma, quando as alunas iam efetuar as suas inscrições nessa atividade, pedíamos que respondessem um questionário com as seguintes perguntas: a) Por que você escolheu se inscrever na ginástica; b) O que você espera dessa atividade?; c) Quais são as vantagens da ginástica?; d) Quais foram os outros esportes que você já praticou?. Distribuímos esses questionários a 20 alunas do ensino médio. A média de idade das alunas que participaram da pesquisa é de 16 anos, sendo que a mais nova tem 14 anos e a mais velha de 19 anos. Todas as alunas tinham experiências anteriores com a pratica de esportes. Sejam na escola ou fora dela e as atividades variavam de esportes com bola, tais como: basquete, futsal, futebol de campo, handebol e voleibol. As alunas também tinham praticado esportes de lutas, entre eles: capoeira, jiu-jitsu, judô e taekwondo. Na área das expressões corporais praticaram ballet clássico e jazz. Nos esportes aquáticos as alunas haviam praticado a natação.

    Após a coleta desse material tabulamos as respostas das alunas, procurando agregá-las em três categorias de análise, na medida que as respostas das alunas formavam um emaranhado de respostas que foram consideradas recorrentes e muito próximas, chegando a um ponto de saturação.


Análise dos resultados

    Os resultados obtidos a partir das respostas das alunas se concentraram em três categorias de análise, a saber: 1) Auto-estima; 2) Vitalidade; 3) Estética corporal.


1. Auto-estima

    A primeira categoria analisada é aquela que descreve a pratica da ginástica localizada como capaz de melhorar a auto-estima das alunas. As frases escritas pelas alunas que caracterizavam a ginástica como atividade física que melhoravam a auto-estima e as faziam sentirem-se mais satisfeitas como seus corpos.

    Obtemos as seguintes frases:

    "porque acho um esporte que todos querem praticar, principalmente mulheres, pois levanta nossa auto-estima e nos faz sentir bem"

    "... é uma atividade saudável que faz bem ao corpo e ao interior das pessoas".

    "porque é meio de você estar bem consigo mesmo, não só na forma física, mas também mental e espiritual". Independente da capacidade da ginástica localizada servir de fato aos objetivos esperados das alunas, compreendemos que a escolha dessa atividade física passa pela necessidade desse grupo de adolescentes em tentar, via atividade física praticada na escola, melhorar seu corpo e consequentemente sentirem-se melhores, mais felizes consigo mesmas. É preciso ainda lembrar que esse grupo de alunos do ensino médio tem em sua grade curricular as aulas de educação física apenas uma vez por semana, e portanto, temos que considerar as limitações desse trabalho, a despeito das expectativas criadas.


2. Vitalidade

    A segunda categoria identificada na escrita das alunas foi a questão da vitalidade que a prática da ginástica localizada pode oferecer. Compreendemos que as questões relacionadas à vitalidade parecem ser cruciais para esse grupo pesquisado. Como passam grande parte de um dia inteiro na escola, de segunda a sexta-feira, sobram-lhes pouco tempo livre para praticarem atividade física. Seu tempo de lazer fica, portanto, comprometido e é na escola, via obrigatoriedade (com suas notas e graus), que existe a oportunidade de se praticar esportes.

    No entendimento das alunas, a ginástica localizada pode lhes lhe ajudar a:

    "ter mais disposição"

    "ter mais ânimo"

    "sinto meu corpo melhor, tenho mais disposição e força"

    Consideramos que o fato dessa atividade física ajudar às alunas a obterem mais disposição e ânimo quando ainda são adolescentes, é um fato significativo. Talvez a grade curricular extensa, o excesso de material de estudo e o tempo gasto com o deslocamentos (até onde sabemos, a maioria dos alunos chega e sai da escola usando o ônibus) faça com que já aos 16 anos de idade esse grupo sinta a necessidade de algo que lhes possa dar vitalidade para as atividades do cotidiano. E esse algo é a educação física escolar.


3. Modelagem do corpo

    Em nossa terceira categoria, identificamos a necessidade por parte das alunas de modelarem seus corpo. Obtemos como respostas frases que mostravam que a ginástica localizada pode ajudar fortalecer e enrijecer seus corpos. A auto-estima e a vitalidade, categorias anteriormente analisadas, somam-se aqui, pois é no corpo que os resultado efetivamente irão aparecer.

    Segundo as alunas,

    "... o corpo fica mais bonito, a disposição melhora, você adquire mais força e sua auto-estima fica no alto"

    "... com minha colaboração, vai melhorar a resistência do meu corpo e me deixar 'saradinha'. Além de melhorar a postura. OBS: vamos para 'Itacoatiara'"

    "... moldar o corpo"

    A modelagem do corpo obtida como resposta demonstra que é a partir desses resultados esperados a ginástica localizada se transforma em uma atividade física desejada. Se considerarmos que o Rio de Janeiro com suas praias propicia um desfile de corpos, essas adolescentes demonstram também a necessidade de obterem um corpo esteticamente melhor.


Conclusão

    Estudos posteriores podem indicar a necessidade de se ajustar as atividades físicas comumente oferecidas no espaço escolar aos reais interesses dos alunos do ensino médio. Ao levantarmos questões acerca desse grupo de alunas procuramos oferecer subsídios para as discussões que envolvem a perda de interesse na prática de esportes que envolvem os alunos que chegam ao ensino médio. Criar objetivos, metas visíveis e compreender pela fase que passam suas vidas sejam os passos que tenhamos que trilhar como profissionais de educação física para que seja possível oferecermos aulas mais adequadas e satisfatórias. Se limitarmos nossas atividades aos esportes com bola, poderemos cair no erro de que a educação física pode oferecer pouco aos alunos do ensino médio, a não ser atividades lúdicas.


Referência bibliográfica

  • BRASIL, Secretaria de Ensino Fundamental. (1998). Parâmetros curriculares nacionais: educação física. Brasília: MEC.

  • COLETIVO DE AUTORES (1993). Metodologia de ensino da educação física. São Paulo: Cortez.

  • FREIRE, João Batista. (1989). Educação de corpo inteiro: teoria e prática da educação física. São Paulo: Scipione.

  • GOLDENBERG, Mirian. (org.) (2002). Nu e vestido: dez antropólogos revelam a cultura do corpo carioca Rio de Janeiro: Record.

  • LOVISOLO, Hugo. (1997). Estética, esporte e educação física. Rio de Janeiro: Sprint.

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