Aspectos psicológicos positivos e negativos de uma concentração esportiva: uma visão dos atletas |
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*Licenciado em Educação Física na UNESP. ** Professor de história e geografia *** Professor livre docente da UNESP Rio Claro - SP. Fundador e coordenador do LEPESPE (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte) desenvolve pesquisas com Estados Emocionais e Movimento. |
Rafael Castro Kocian* Walter Edurdo Kocian** Afonso Antonio Machado*** rafaelkocian@yahoo.com.br (Brasil) |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 89 - Octubre de 2005 |
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Introdução
Nos dias atuais, a atitude e postura pedagógica dos técnicos desportivos e suas respectivas relações com os atletas constantemente têm sido alvo dos estudos. O conhecimento das técnicas de ensino e aprendizagem é importante para os treinadores nos aspectos da eficácia, motivação e melhor desempenho.
Interesses pela vida atlética nos períodos de concentração são elementos de curiosidade dos pesquisadores da ciência esportiva. Fatos acontecidos nesses períodos, são conhecidos quando algo não acontece como previsto, sobrando aquela impressão de algo inusitado; assim, é necessário verificar aspectos positivos e negativos do ambiente de reclusão, partindo da visão do maior envolvido: atleta, possibilitando conhecer todo entorno esportivo.
ObjetivosOs objetivos do trabalho são:
Verificar aspectos positivos e negativos de uma concentração a partir do atleta;
Investigar níveis de interferência e intervenções cabíveis, na relação treinador-atleta.
JustificativaNo atual mundo esportivo, infelizmente ,uma das últimas partes a serem consultadas sobre um treinamento ou alguma decisão que vá interferir diretamente na rotina dos atletas, são os próprios atletas, pois, atualmente é dado atenção somente a questão do resultado e retorno para o clube ou entidade que o mesmo representa. A concentração para muitos esportes coletivos faz - se presente nos dias atuais, porém, a visão do atleta é deixada de lado. E este o que será que pensa de tudo isso?
Referencial teóricoO esporte de alto nível atualmente tem se tornado cada vez mais competitivo. Muitos técnicos buscam em seus atletas o rendimento máximo a qualquer custo, e não o rendimento ótimo, que teoricamente, e falando de atividade física e saúde, seria o mais recomendado.
O componente ideal para uma competição esportiva seria a alienação de componentes físicos, com componentes mentais e emocionais (psicológicos), este último que diretamente interessam para este trabalho.
Concentração esportivaNo contexto do esporte, existem vários "artistas" presentes em cada um dos segmentos do momento esportivo, como atletas, árbitros, torcedores, locutores, técnicos, pegadores de bola, dirigentes, etc. A "concentração" não se encaixa como um "artista", mas sim como um fator de alta importância para o desenvolvimento ou não do esporte.
Em uma linguagem popular e de senso comum verificamos quase que totalmente a utilização do termo "concentração" para designar o ambiente de reclusão que antecede um evento esportivo seja para competição ou até para exibição.
O ambiente de reclusão esportiva existe para que, teoricamente, o atleta seja preparado para entrar no jogo no seu estado de mobilização máxima. O treinamento psicofisiológico é um excelente exemplo de estratégia designada para melhorar a performance, reestruturar processos de pensamentos ineficientes e manter a mobilização máxima dos atletas durante toda a competição (ROST, 1996).
O prazer e a satisfação dos atletas na prática desportiva deve ser um dos objetivos principais a serem considerados pelo técnico. Conseqüentemente, os resultados aparecem já que o indivíduo tende a repetir experiências prazerosas e evitar uma não prazerosa.
Como já citado, a reclusão pré - evento esportivo, chamada de "concentração", supostamente são designadas como "terapias coletivas" para equilibrar o estado emocional dos jogadores, afastando - os de quaisquer outros estímulos e contatos extraesportivos (sejam sociais, e até familiares). Nessa reclusão, os jogadores permanecem basicamente se distraindo com TV, jogos de baralho e sinuca. (TOLEDO 2002)
Muitos jogadores e profissionais do esporte criticam e questionam a eficácia dessa reclusão, a partir da introdução de métodos psicológicos para alcançar o resultado.
O ex - jogador Sócrates faz dura crítica ao ambiente de reclusão pré - esportiva no jornal Lance de 12/03/1998.
"Nada é mais banal e letárgico que este tipo de aprisionamento a que os jogadores estão submetidos. Quais os motivos para a existência das concentrações? Evitar que os atletas se excedam nas bebedeiras e nas noitadas, ou mesmo nas relações sexuais? Na verdade, é mais uma conduta paternalista que persiste, levando, ao contrário que se pensa, uma perda de concentração e de motivação, porque, estando os jogadores distantes de seu habitát natural, o sentimento corrente é de sonolência, mau - humor e relaxamento, que em nada favorecem suas performances [...] com esta prática, estamos reforçando a mentalidade juvenil, tornando nossos ociosos atletas especialistas em jogos de carta e diminuindo a força anímica fundamental para este esporte".
Em entrevista a revista Veja, em janeiro de 2004, Romário faz várias citações sobre o fato de estar ou não em um ambiente de reclusão pré-evento esportivo. Em uma delas ele diz:
"a concentração, por exemplo, é inútil. O objetivo alegado é de unir o grupo, mas na prática não funciona. Você encontra os outros jogadores na hora da refeição e na preleção. (...) a concentração só serve pra impedir que o atleta caia na farra".(p.2)
Se por uma lado temos essa má impressão, de uma "prisão", por outro lado, temos um número de atividades que se somam às rotinas dos treinos, e , são considerados fundamentais para a preparação do atleta para o evento esportivo, visando "moldar" o "espírito" do atleta para a competição. (TOLEDO 2002)
MetodologiaTrabalhamos com pesquisa qualitativa de campo, seguindo roteiros preestabelecidos e buscando coletar dados através da pesquisa ação, utilizando questionários junto a atletas de clubes profissionais do campeonato da federação paulista de futebol.
Resultados e discussãoForam utilizados dez sujeitos, sendo todos do sexo masculino e jogadores profissionais de futebol, na faixa etária entre 17 e 19 anos. Nosso questionário continha quatro questões abertas, havendo também, antes das mesmas, um cabeçalho de identificação dos sujeitos, contendo idade, sexo, clube, uma breve questão para saber se o jogador disputa ou não campeonato atualmente e, caso dispute, qual campeonato esta sendo disputado.
Questão 01 - O que você pensa sobre concentração?
Nessa questão encontramos diversas respostas, e nenhuma foi ponto forte e consenso entre todos os entrevistados. Um ponto interessante foi encontrado, pois três respostas, poderiam caminhar para a mesma direção, mas com pequenas diferenças. As repostas no caso apresentado seriam, manter o grupo focado no mesmo objetivo, unir o grupo e traçar um objetivo comum.
Quando os sujeitos dizem em manter o grupo focado no mesmo objetivo e, depois traçar um objetivo comum, eles estão querendo dizer a mesma coisa, sendo a diferença é que no primeiro caso o objetivo já é o mesmo, basta apenas mantê-lo, e no segundo os jogadores ainda precisam traçar o seu objetivo.
Outro ponto interessante a ser levantado é como alguns jogadores vêem a importância da concentração para o trabalho a ser desempenhado, por exemplo, respostas de controle de alimentação, preparo psicológico e descanso dos atletas, tudo isso nos mostra um preparo para a partida, diferente do primeiro aspecto apontado que foi o de planejamento do objetivo.
Questão 02 - Quando a concentração é positiva?
Novamente não obtivemos uma resposta unânime entre os jogadores, e sim, obtivemos novamente o embate entre concentração na pré - temporada, e na véspera de jogos. Obtivemos quatro respostas que acreditam que a concentração é positiva na pré - temporada, isso representa aproximadamente 30% das respostas.
Outro ponto interessante é o de respostas que caminham na mesma direção, mas que são diferentes como a de unir pensamentos (04) e traçar objetivos (02), juntas teríamos aproximadamente 50% das respostas.
Sobre a preparação direta para o jogo tivemos a citação do descanso, trabalhar pensamentos negativos e, também, traçar objetivos podemos interpretar como objetivos diretos da equipe para determinada partida.
Novamente aparece uma resposta com relação a normas e regras, e segundo nosso sujeito a concentração só funciona com o cumprimento de regras, além disso esse sujeito não citou o que mais é positivo na concentração, o que mais dá certo quando as regras são cumpridas.
Observando os dados coletados, poderíamos em uma análise primária agrupar as respostas "bagunça" e, "não levar a sério as regras", porém em uma análise mais detalhada das respostas conseguimos interpretar bagunça como baderna e como "zueira", já as respostas de não cumprimento de regras variam desde regras de comportamento pessoal como horário de dormir e horário de alimentação, como regras da concentração como não usar telefone celular.
Questão 03 - Quando a concentração é negativa?
Houveram duas respostas em que nunca a concentração é negativa, trazendo apenas efeitos positivos para os atletas. Nenhum dos atletas que mencionou isso, especificou algum detalhe sobre a resposta. "Para mim nunca." (sujeito 08), e " É sempre positiva." ( sujeito 09).
Questão 04 - Quando a concentração se torna necessária?
Uma questão que chama atenção logo de início é uma resposta apresentada, a de que a concentração é necessário quando o técnico da equipe não tem confiança sobre os jogadores, isso vai de encontro com a declaração de Romário contida nesse trabalho em que "...a concentração só serve pra impedir que o atleta caia na farra...", ou seja, o técnico não possui confiança de que o atleta siga as regras citadas por muitos na questão anterior, como descansar, alimentar -se bem, etc. Por isso pede aos atletas para que fiquem concentrados.
Segundo o sujeito 10, "Quando o técnico não apresenta confiança nos jogadores que sai para a balada antes do jogo.".
A proximidade a jogos e campeonatos são indicados por alguns atletas, bem como novamente a união do grupo e o foco de objetivos pela equipe ou por apenas um jogador, assim como na maioria das questões anteriores.
ConclusõesNos resultados encontramos: apontamentos positivos de trabalhos possíveis: união do grupo, preparo psicológico e traçar objetivos, como fatores positivos: unir pensamentos, trabalhar pensamentos negativos e metas que ajudem no trabalho como descanso e cumprir regras e nos aspectos negativos, verificamos citações de bagunça, descumprimento das regras, brigas, muito tempo concentrado e desunião; verificamos que a concentração é necessária próximo a jogos, para unir o grupo, quando há comprometimento e quando o técnico não confia nos atletas. Vale ressaltar a idade média dos jogadores (18,2), afeta no sentido de que eles estarão no início da carreira preocupando-se em seguir todo "script" esportivo. Podemos concluir, que os jogadores sabem da importância da concentração para o trabalho, sendo que existem muitos pontos positivos principalmente os relativos a união do grupo e metas. Existem pontos negativos, que são causados pelos jogadores. Existe um ponto importantíssimo: o tempo da concentração, pois se esse for grande, será um ponto negativo. Por esse motivos, os jogadores acreditam que a concentração é necessária, porém é de suma importância, que técnicos saibam como trabalhar e o que trabalhar, sendo indispensável um planejamento do tempo e do trabalho.
Referências bibliográficas
BETTI, M. Violência em campo: dinheiro, mídia e transgressão às regras no futebol espetáculo. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 1997.
MACHADO, A.A. Psicologia do Esporte: temas emergentes I. Jundiaí: Ápice, 1997.
MIRANDA, R. Estado Psicológico do Atleta. Juiz de Fora, UFJF (mimeo), 1996.
MIRANDA, R; BARA FILHO, M.G. Estudos psicológicos do atleta competitivo. Treinamento desportivo, Lisboa, v.4, n 3, p.61-68, 1999.
PEREIRA, F.M. Dialética da cultura física: introdução à crítica da educação física, do esporte e da recreação. São Paulo: Ícone, 1988.
ROST, K. As Competições no Desporto Juvenil. Treino Desportivo. 3-10, 1996.
SAMULSKI, D. Psicologia do Esporte. São Paulo: Ed. Manole, 2002.
THOMAS, A. Psicologia del deporte. Barcelona: Editorial Helder, 1981.
TOLEDO, L.H. Lógicas no Futebol. Editora Hucitec, São Paulo: 2002.
revista
digital · Año 10 · N° 89 | Buenos Aires, Octubre 2005 |