efdeportes.com
Mídia impressa, comunicação e
a disseminação do lazer
Printed media, communication and leisure dissemination

   
*Área de atuação - psicologia do lazer
**Área de atuação - lazer e criatividade produtiva
***Área de atuação - lazer e envelhecimento
****Área de atuação - lazer e ensino do xadrez
*****Área de atuação - lazer e lúdico
******Membro efetivo do GESPCEO -
Grupo de Estudos em Sociologia das Práticas
Corporais e Estudos Olímpicos, UFES
(Universidade Federal do Espírito Santo). Área de atuação - sociologia do lazer
LEL - Deptº de Educação Física, I.B. UNESP - Campus de Rio Claro
 
 
Profª Drª Gisele M. Schwartz.*
schwartz@rc.unesp.br  
Mestre Fernanda H. Machado**
fmharmit@claretianas.com.br  
Mestranda Viviane K. Dias***
vivikdias@yahoo.com.br  
Danielle F. A. Christofoletti****
danichristofoletti@hotmail.com  
Mestranda Marília Freire*****
mariliafr@ig.com.br  
Profª Drª Mara Cristan******
MaraLuciaCristan@mail.telepac.pt
(Brasil)
 

 

 

 

 
Resumo
    Este estudo, de natureza qualitativa, teve como objetivo identificar, na mídia impressa, representada por revista de porte nacional, as impressões sobre o lazer, evidenciando as formas de compreensão sobre seus diversos conteúdos culturais. O estudo constou de uma pesquisa exploratória, desenvolvida por meio de análise de conteúdo temático, realizada em uma revista de porte nacional, no período de 2000 a 2003. Os resultados, analisados descritivamente, salientam a preferência por uma abordagem econômica dos temas, em que os itens Seções e Artes e espetáculos, seguidos pelos itens. Geral e Guia apresentaram maior incidência de referências aos conteúdos culturais do lazer, especialmente aos artísticos, aos intelectuais e aos virtuais.
    Unitermos: Comunicação. Mídia. Lazer.
 
Abstract
    This research, of a qualitative nature aimed to identify in press media, represented by a national magazine, the impressions about leisure, evidencing the forms of comprehension about its cultural contents. The study contains an exploratory research developed by thematic content analyses of a national magazine, from the period of 2000 to 2003. Data were descriptively analyzed and evidenced the preference for an economic approach of the themes, where the items Sessions and Art and spectacles, followed by the items General and Guide, presented major incidence of references to cultural contents of leisure, specially of artistic, intellectual and virtual ones.
    Keywords: Communication. Media. Leisure
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 88 - Setiembre de 2005

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Introdução

    Para se compreender os aspectos referentes ao desenvolvimento dos veículos de comunicação, torna-se necessário uma incursão pelas bases de sustentação da teoria da informação, não descuidando da conjuntura na qual emerge o meio de informação analisado.

    A teoria da comunicação, também chamada por teoria da informação, tem suas bases na necessidade de medir a fluência da informação que parte de uma fonte até sua captação, bem como a capacidade e a funcionalidade dos diferentes canais e meios e suas maneiras de codificação de mensagens.

    Originariamente, esta teoria foi formulada por Shannon (GOZZO, 19...), por volta dos anos 40, para a compreensão da comunicação via telefone, no entanto, expandiu-se para outros processos de comunicação, envolvendo-se em áreas que vão desde a aprendizagem, até a cibernética.

     Seus princípios estão voltados para a fonte de informação codificada e transmitida por sistemas de informação contínuos e outra aos discretos, nos quais são levados em consideração os comprimentos de onda, freqüência por um canal a um receptor que a decodifica. Esta teoria tem duas vertentes relativas aos e amplitude dos sinais de comunicação, bem como os processos estocásticos e de randomização da informação.

     Para o desenvolvimento desses processos torna-se necessário uma variedade de condutas e tecnologias, por meio das quais a informação é transmitida ou derivada, tornando-se importante considerar, tanto o meio de veiculação da informação, quanto a linguagem (escrita, falada, iconográfica), a tecnologia empregada, a mensagem, sua orientação ideológica, o público a qual se destina e a compreensão subjetiva de cada ator social, o que evidencia a extrema complexidade quanto às implicações do(s) processo(s) de comunicação.

    O termo comunicação é utilizado especialmente para descrever diversas atividades de conversação e de troca de informação, envolvendo humanos e máquinas, o que torna suas fronteiras de ação bastante difíceis de serem delimitadas, dificultando, inclusive uma dimensão universal da comunicação.

     Um dos primeiros focos de estudos sobre comunicação recaía especialmente na comunicação não-verbal, a qual inclui o comportamento interpessoal e as linguagens e suas raízes antropológicas nas sociedades. Posteriormente, com os avanços tecnológicos nas diversas áreas do conhecimento, outros elementos entram em cena, relacionando a comunicação às áreas de estudo da cibernética, da lingüística e dos diversos meios relativos às mídias e às telecomunicações.

     Em seus primórdios, a comunicação se pautava nas idéias promulgadas pelos filósofos e escritores, com base na retórica, à qual, a escola aristotélica1 atribuía o papel de fonte para todos os meios de persuasão disponíveis. Este conceito ainda perdurou por muito tempo com foco centrado no reconhecimento da matemática como linguagem universal, para descrição de sistemas e fenômenos, especulando sobre o desenvolvimento da linguagem artificial, para aprimorar a precisão da comunicação, sem modificações significativas, mas, Descartes e Leibnitz (citados por LIMA, 1997), propuseram o.

     No campo da psicologia e da antropologia notou-se a elaboração de novos modelos que enfatizavam os conteúdos da personalidade e suas variáveis como determinantes nos processos de comunicação, aprimorando o sentido dado a esta, para além dos processos matemáticos, imprimindo ao termo uma diversidade de usos e fatores.

    No âmbito social, os antropólogos focalizaram o papel central da comunicação na continuidade da sociedade, em que a preservação e a transmissão de aspectos culturais não formulados era de suma importância para esta finalidade.

    Este papel fundamental tem apoio na teoria de que uma sociedade desponta e continua a existir por meio da comunicação de seus símbolos significativos. Além deste aspecto, Sapir (citado por LIMA, 1997) evidenciou que a linguagem não se referia apenas a um modo de expressão dos diferentes itens de determinada experiência, mas, é capaz de definir a experiência em si, em função de como a linguagem impõe os padrões de pensamento na maneira de se perceber um fato. Isto pode ser explicado em razão de que o mundo é experienciado e concebido de modo diferente nas inúmeras comunidades lingüísticas, porque cada linguagem encarna e perpetua uma nova visão de mundo.

    Para o campo de estudo da antropologia, então, a comunicação é vista de maneira ampliada, como um mecanismo por meio do qual as relações humanas existem e se desenvolvem.

    Já, algumas vertentes da sociologia, enxergam na comunicação, especialmente nos conteúdos transmitidos por meio desta, uma maneira de manter coesas as redes sociais e os diferentes projetos político-sociais que cada categoria de grupo étnico, político, de classe social e status econômicos distintos possui. Todo o processo comunicacional é permeado por elementos operatórios e não temáticos, isto é, a lógica manifesta nos conteúdos oculta determinados dados, ao mesmo tempo em que exalta outros, de modo que se permite - na contra-mão - a constituição de uma força centrípeta que não envolve uma noção de "desenvolvimento", mas de conservação das idéias fundadoras de um grupo.

    Percebe-se, pois, dois lados da moeda: o processo de comunicação e os conteúdos das mensagens que ele engloba orientam-se de maneira contraditória. Isto quer dizer que, ora propicia saltos em relação à construção de novos modelos sociais, ora beneficia a conservação de um tipo particular de visão de mundo, dentro do propósito de manter unidos os grupos e a perpetuação dos mesmos.

    Mas, com o avanço e a diversidade de enfoques dos estudos no campo social, foram desenvolvidas ramificações específicas para a comunicação, e, entre elas, despontaram os meios de comunicação de massa.

    Pode-se compreender por mídia um meio propício para o envio de mensagens, sendo que a comunicação de massa possui quatro categorias, incluindo mídia impressa, caracterizada pelos jornais, revistas e livros; mídia gravada, representada pelo videocassete, videodiscos e fitas; mídia filmada, em que o cinema é a base e, por último, mídia televisiva e de rádio, com a televisão e o rádio, respectivamente, como elementos principais.

     Historicamente, a invenção da imprensa, por volta de 1830, marcou o início da era da comunicação de massa, especialmente com a edição dos primeiros jornais impressos a circularem regularmente. Com os avanços tecnológicos, os jornais evoluíram para o que se tem hoje, a partir do final do século dezenove, quando também se iniciou a confecção em larga escala de livros e revistas.

     Desde sua criação em 1830, o jornal dominou os meios de comunicação, mas, com a virada do século, outros tipos de mídia competiam pela atenção popular.

     Os filmes mudos eram uma forma de entretenimento que surgiu nos primórdios do século vinte, tornando-se rapidamente a principal forma de entretenimento. Em seguida veio o fonógrafo, tornando-se popular de audição de música e as estações de rádio, formando, inclusive, redes.

     Com o surgimento da televisão emerge um novo e dominante meio de comunicação, com impacto sobre os outros meios, forçando-os a se adaptarem e produzirem programas específicos, para uma audiência menor e com interesses centrados (LIMA, 1997).

     Porém, novas tecnologias continuaram a transformar os meios de comunicação de massa, principalmente com o surgimento da comunicação global via satélite (SODRÉ, 2002).

     Com a revolução neste âmbito, iniciada no século dezenove, muitos outros meios foram substituídos pela eletrônica, ou pela computação gráfica, ou, ainda, pelas técnicas digitais, controlados por companhias internacionais, em forma de corporações que dominam mundialmente este campo.

     A propaganda também tomou vulto nesta esfera (CARMO, et. al., 19...), contribuindo nos conteúdos da mídia e, ao mesmo tempo, sustentando-os, com a venda de espaços ou tempo para a veiculação das mesmas. A dependência desses meios de comunicação da propaganda pode forçá-los a se preocupar mais em atrair audiência do que com a própria qualidade da informação gerada.

    Ela também tem influência sobre a definição do conteúdo expresso em jornais e revistas, tendo em vista que, por exemplo, não haverá interesse destes meios em promoverem campanhas antitabagismo, quando o patrocinador é uma companhia de cigarros.

    Os profissionais da área de propaganda também desenvolveram estratégias que permitem mesclar o produto da propaganda em meio a artigos, filmes, programas televisivos e, até mesmo, na escola.

    Na sociedade contemporânea, um outro tipo de mídia tem se estabelecido, a mídia virtual, representando mais uma fase dos avanços tecnológicos da atualidade.

    Estes diversos tipos de meios de comunicação de massa necessitam profissionais especializados para selecionarem e organizarem a forma complexa de envio e recepção das mensagens.

    Os produtos da comunicação de massa são elaborados e disseminados rapidamente, com um número elevado de cópias, atingindo o público alvo, quase no mesmo instante em que a mensagem é produzida.

    Uma das características marcantes dos meios de comunicação de massa é que estes, com raras exceções, representam uma via de mão única, em que a audiência nem sempre tem a oportunidade de interagir e o feedback é indireto e não freqüente. Há também outra característica marcante que é a distância que separa fisicamente os comunicadores de sua audiência.

    Ainda assim, o poder dos meios de comunicação de massa se processa, pelo fato de que os indivíduos selecionam e interpretam as mensagens e são por elas influenciados. É, justamente esta capacidade de influenciar que fez dos meios de comunicação de massa um objeto de estudo intensamente pesquisado, criticado e debatido no mundo todo.

    No âmbito do entretenimento, os meios de comunicação são bastante eficazes na disseminação da informação para um grande número de pessoas ao mesmo tempo, mas, para tanto, muitas vezes, a mídia banaliza o conteúdo das informações, ou diminui a qualidade gerada (GUTIERREZ, 1978).

    Este aspecto é de suma importância, uma vez que todas as formas de informação e de entretenimento contribuem para o aprendizado social. Este representa uma maneira eficaz de assimilação da cultura, das regras sociais e da absorção de valores e crenças, podendo, inclusive, influenciar no modo como as pessoas enxergam o mundo, afetando diretamente atitudes e condutas.


Desenvolvimento

A revista em revista

    Adentrando, agora, no foco central deste estudo, a mídia impressa representada pelas revistas, observam-se algumas características peculiares referentes à periodicidade, à regularidade, às maneiras de disposição das informações e das propagandas.

    A palavra revista é derivada do francês - magasin - tendo sido utilizado pela primeira vez em 1731. O primeiro periódico de que se tem notícia foi veiculado na França, por volta de 1665, contendo uma periodicidade semanal, tendo sido imitado em diversos outros países.

    No início, porém, os primeiros exemplares não tiveram muita aceitação, por diversos motivos, entre eles, problemas na produção, no financiamento dos produtos e na forma primitiva do sistema de distribuição. O baixo interesse dos anunciantes e o número reduzido de propagandas fizeram com que muitas revistas não sobrevivessem. No entanto, algumas delas se mantiveram e se expandiram, por imprimirem um ar de sentimentalismo, de ficção, de poesia, incluindo ensaios de escritores famosos e a moda.

    Após a Guerra civil ampliou-se o número de revistas publicadas, uma vez que as reportagens serviam a grande variedade de interesses, ainda que fossem endereçadas a uma elite educacional e a quem possuía poder aquisitivo melhor.

    Porém, no século dezenove, com o avanço da indústria, a qual produzia já um marketing com logomarcas, conseqüentemente, ampliando a propaganda, a popularização e a ampliação da distribuição foram elementos decisivos e responsáveis pelo crescimento das revistas, em que se aumentou o potencial de leitores, de compradores de serviços e de difusão da educação e da literatura.

    Sendo assim, as revistas passaram a ter um preço mais acessível, a atingir um maior número de leitores e os anunciantes tiveram que pagar mais para atingirem seus objetivos.

    Os periódicos com propósitos especializados surgiram em torno de 1830. Ao longo de todo o século vinte, as revistas representaram uma fonte de diversidade de opiniões e matérias, tendo em vista agradarem cada vez mais públicos seletos, que buscavam ver lá expressos seus interesses.

    O período entre as duas grandes guerras foi bastante profícuo para os editores, em função da diversidade de temas que puderam ser veiculados, surgindo inúmeros periódicos internacionalmente aceitos.

    Antes do advento da televisão, algumas revistas funcionavam como fotojornais, suprindo os leitores com recortes visuais dos eventos. Como a televisão se tornou um dos mais importantes meios de entretenimento, as revistas passaram a disseminar informações relacionadas com a TV, para ganharem espaços entre o público consumidor e, também, foram se especializando em determinados assuntos, criando subdivisões no foco dos editoriais.

    As alterações no âmbito social fizeram ocorrer mudanças também no nível das publicações (GITLIN, 2003), inclusive, surgindo os interesses pelos assuntos da mulher, da homossexualidade, da própria sexualidade e de assuntos esportivos.

    Com o avanço dos correios, as revistas começaram a explorar outros leitores, e a distribuição também se ampliou para redes de supermercados, farmácias e outros locais, atingindo um público ainda maior.

    Uma série de alterações foi feita em relação às revistas, com a ajuda, agora, da tecnologia do computador, finalmente possibilitando uma especificidade, capaz de atrair anunciantes e público. Este tipo de mídia passou a ter uma aceitação comercial garantida, em que os usuários, mediante assinaturas anuais, ou outros recursos interessantes de distribuição, podem manter a fidelidade e o interesse.

    Este bios midiático passou a abordar uma diversidade de interesses, os quais, porém, podem ser resumidos em quatro grandes categorias, sendo uma relacionada com os consumidores, para o segmento do púbico em geral; a segunda relativa a mercado e elementos técnicos, contendo informações especializadas para negócios, indústrias e governo; a terceira relacionando-se ao agro-negócio e a quarta aos assuntos de baixa circulação e que demandam pouco comércio.

    No Brasil, a cada uma destas linguagens midiáticas e internamente a elas) correspondem distintas formas de sociabilidade e de conformação da identidade cultural. Isto resvala no modo como tais linguagens foram absorvidas pela população e o poder discursivo que cada veículo conferiu e confere aos diferentes extratos sociais (CRISTAN, 1995).

    A introdução de determinados veículos e a transformação e/ou conservação de habitus social e autoridade discursiva no Brasil sempre estiveram relacionadas à criação e inclusão de um "público" fundado no universo de consumo de bens materiais e simbólicos, de projetos e expectativas os mais diversos. Estreitando estes elementos, aponta-se o estudo desenvolvido por Lattman-Weltman (2003) o qual salienta reflexões importantes acerca do processo de democratização pelo qual passaram todos os meios de comunicação de massa no Brasil.

    Também corroborado por Abreu (2002), o foco colocado sobre as telecomunicações e a paralela constituição de diferentes linguagens midiáticas no Brasil, colocou alguns indicadores como fortes impactantes sobre acesso a determinados veículos de comunicação.

    Portanto, se ao alvorecer da era do rádio correspondeu a ascensão da TV no Brasil do regime militar, tornando-se esta a grande construtora da "aldeia global" no país, problemas conjunturais, como o analfabetismo, limitaram o consumo e a inclusão de camadas inteiras da população aos veículos de informação escrita.

    O declínio do rádio e a febre da TV - dois veículos cuja linguagem não requer outras habilidades senão ver e ouvir - trouxeram consigo uma transformação paralela nos meios de comunicação escritos: jornais e revistas.

    Os jornais derivaram para a distinção político-partidária e pelas veredas do embate em prol da competência e autoridade discursiva de certos grupos. Já, as revistas também passaram por uma pauta de mudanças.

    No mercado nacional entraram em decadência grandes títulos ilustrados como "O Cruzeiro" e "Manchete", havendo a ascensão de revistas informativas no modelo das americanas "Time" e "Newsweek". Esta nova mídia surgiu no final dos anos 60, com o lançamento da Revista "Veja", pela Editora Abril. Na mesma senda vieram outras representantes, como a "Isto è", "Senhor" e "Época". Para a delimitação deste estudo, aponta-se a revista "Veja" como foco de atenção, a qual, parece ter sido a pioneira desta geração.

    Fazendo seu 37º aniversário, a revista "Veja" soube captar targets mais informados da população, agregando consumidores cujo perfil demonstra necessidade de informação condensada, porém mais aprofundada do que aquelas oferecidas pelos telejornais. A capacidade de síntese das informações - especialmente as de atualidade política, bem como, a publicidade apresentada em suas páginas, dão pistas do tipo de público cativado pela revista e dos conteúdos veiculados.

    De modo que, dadas às características assumidas por esta revista em especial, entende-se que a análise de conteúdo temático dos conteúdos culturais do lazer nas mensagens transladadas por ela, trazem como substrato um tipo correspondente da difusão de autoridade discursiva e a visão que grupos de maior poder aquisitivo e detenção de (in)formação educacional possuem no país, tornando-se instigante o desenvolvimento da pesquisa exploratória, a qual sustentou esta reflexão.


O lazer em revista

     Com o intuito de ilustrar as discussões aventadas foi desenvolvida uma pesquisa de natureza qualitativa, a qual procurou identificar, na mídia impressa, representada por revista de porte nacional, as impressões sobre o lazer, evidenciando as formas de compreensão sobre seus diversos conteúdos culturais.

     Como foco de atenção do estudo foi selecionada a revista "Veja", em função de sua importância em nível nacional, de sua grande tiragem e de sua periodicidade. A amostra intencional foi formada pelos periódicos de 2000 a 2003, da revista, em que foram selecionadas as primeiras e terceiras semanas de cada mês, durante os meses de Janeiro, Abril, Julho e Outubro, dos respectivos anos citados, para a composição da amostra intencional representativa.

     A revista apresenta, neste período, divisão do índice em itens, os quais permaneceram constantes e padronizados, são eles: Seções; Brasil; Internacional; Geral; Economia e Negócios; Guia e Artes Plásticas e Espetáculos. Para efeito de padronização da coleta de dados, o estudo centra sua investigação nessa subdivisão proposta de itens.

     Como critérios de avaliação e análise, foram estabelecidos padrões indicadores observados na investigação, quais sejam: 1) avaliação da reportagem de capa, com relação à temática do lazer; 2) levantamento da quantidade de reportagens e propagandas referentes ao tema "lazer" na revista como um todo; 3) apontamento dos itens da subdivisão do índice, nos quais foi encontrado o maior número de referências ao lazer, seja em forma de reportagens ou de propagandas; 4) identificação das reportagens ou propagandas que tratam do lazer em plano principal; 5) identificação dos modelos de práticas vivenciadas no âmbito do lazer, baseados nos conteúdos culturais do lazer (DUMAZEDIER, 1979). Segundo este autor, pode-se fazer uma classificação dessas atividades segundo categorização proposta, onde cada modelo de atividade corresponde a um conteúdo cultural do lazer, tais como: o conteúdo Físico-Esportivo; o Manual; o Intelectual; o Social e o Artístico.

    Apesar desta classificação ser motivo constante de críticas na literatura específica da área do lazer, por não garantir precisão de interpretação, ela tem sido, também, utilizada largamente para propósitos didáticos, como maneira de facilitar a visualização da amplitude do significado do termo "lazer". Além dos cinco conteúdos inicialmente propostos por Dumazedier, Camargo (1992) acrescenta o conteúdo cultural Turístico e Schwartz (2003) amplia esta categorização, propondo o conteúdo cultural Virtual do lazer, como uma forma de atualização sazonal dos mesmos.

     Para os propósitos desse estudo os conteúdos abordados foram tratados e caracterizados da seguinte forma: conteúdo Físico-Esportivo (esporte e atividade física em geral), Manual (artesanato), Intelectual (palestras, cursos e livros), Social (eventos e festas), Artísticos (teatro, cinema, televisão, dança, espetáculos, exposições de arte, shows), Turístico (viagens, parques temáticos, guias de viagem, roteiros) e Virtual (sites, jogos de computador, informática em geral). As propagandas foram consideradas em uma oitava categoria, à qual deu-se o nome de Outros.

     Os dados analisados de forma descritiva, por meio da técnica de análise de conteúdo temático, evidenciam como resultados que os itens Seções e Artes e espetáculos, seguidos pelos itens Geral e Guia apresentaram maior incidência de referências aos conteúdos culturais do lazer, sendo que esses dois últimos, sem grande diferenciação quantitativa de incidências. Os demais itens apresentados no índice das revistas não foram considerados relevantes para os resultados do estudo, devido à rara incidência de propagandas e reportagens relacionadas à temática do lazer.

     Considerando a revista como um todo, os conteúdos culturais que mais apareceram foram o conteúdo cultural Artístico, com predominância nos itens Artes e espetáculos e Seções; o Intelectual, que apareceu, predominantemente, nos itens Guia e Artes e espetáculos; o Virtual, nos itens Seções, Guia e Artes e espetáculos e a categoria Outros, que apresentou, principalmente, propagandas relacionadas aos conteúdos Turístico e Virtual.

     Dessa forma, pode-se observar coerência de abordagem da revista Veja, no sentido de manter um padrão, considerando que não foram encontradas discrepâncias no período pesquisado, de 2000 a 2003.

     A revista dá preferência a uma abordagem econômica da temática, uma vez que, em grande parte, refere-se ao lazer em propagandas Turísticas ou de sites e produtos de informática. Mesmo quando em formato de reportagens, as abordagens sobre a temática do lazer, apresentadas na revista, mantém o caráter de divulgação, com intenção, implícita ou explícita de vender serviços e produtos. Da mesma forma ocorreu com os conteúdos Artístico e Intelectual.

    Nesse sentido, segundo Camargo (1998), o lazer vem sendo veiculado nos comerciais com o intuito de divulgar outros produtos utilizados dentro do conteúdo cultural escolhido, em que, usualmente o cenário utilizado nas reportagens traz imagens de tranqüilidade, de praias, de desertos, entre outros, porém, o foco nem é o próprio pacote turístico, ou o local em si, mas, uma sandália, um carro ou outro produto qualquer. Isto foi comprovado, segundo o autor, numa pesquisa realizada pela Universidade de Porto Rico, trazendo como resultado o seguinte: "... mais de 60% da publicidade comercial diz respeito a produtos e instrumentos de diversão" (p 40).

    Ainda segundo esse mesmo autor, muitos se apegam à televisão como forma de vivência no lazer, assistindo a um bom filme, seriado ou, até, programas humorísticos, o que leva a revista Veja e outros periódicos a veicular diversas propagandas voltadas para a programação televisiva ou para assuntos a ela relacionados.

    No que tange ao uso do computador como forma de vivência de lazer, é interessante salientar que este é visto, também, como um instrumento de trabalho, dependendo da ocasião e da maneira como é utilizado, mostrando-se, inclusive, como um bom investimento e merecendo destaque nos dias atuais neste tipo de periódico, os quais exploram as novidades e tendências mundiais, ainda que as mesmas só sejam comercializadas em alguns países com a defasagem de anos. No que se refere ao lazer, novos jogos e programas são elementos fortemente explorados nas reportagens e propagandas da revista.

    A respeito da inclusão do conteúdo virtual no âmbito do lazer contemporâneo, Schwartz (2003) salienta a necessidade de consideração desta inegável perspectiva no contexto do usufruto do lazer na atualidade, tendo em vista as alterações nos usos e costumes.

    Sobre a possibilidade de existir referência ao lazer na capa da revista, foram encontradas, entre as 32 revistas pesquisadas, no período entre 2000 e 2003, 7 capas que faziam alusão ao tema, mais especificamente sobre os conteúdos culturais do lazer: Artístico, Turístico, Físico-esportivo, bem como, uma chamada ao lazer como temática ampla, na revista de 05 de Abril de 2000, de título: "Mais Lazer e menos trabalho? Esquece", o que evidencia a importância e a preocupação sobre o lazer, como elemento sociocultural, ainda que tomado de maneira limitada e com distorções de seus conteúdos, pela tendência consumista apresentada por este tipo de mídia.


Considerações finais

    Nas sociedades ocidentais contemporâneas, nota-se uma forte preocupação com os valores relacionados ao status, a estar na moda (ou in), à aparência física, à imagem visual, entre outros, constituindo-se elemento axiológico impulsionador da cultura de consumo. Em nenhuma outra época da história as sociedades produziram e disseminaram tal volume de imagens e textos sobre todos os aspectos da vida urbana.

    Vários desses aspectos, especialmente aqueles relacionados ao lazer, representam motivos estimulantes para reportagens, propagandas e disseminação de modelos culturais atualizados, os quais são veiculados nos mais diversos bios midiáticos, como a televisão, os filmes, os jornais e as revistas, esta última sendo o foco de interesse do presente estudo.

    As paisagens físicas das grandes cidades, dos lugares nos quais se pode visitar e adquirir produtos das mais diversas ordens e as mais diferentes formas de divertimento e dos aspectos relacionados ao usufruto do lazer, os quais representam imagens e réplicas do viver significativo humano, estão sendo utilizadas, muitas vezes, apenas para vender mercadorias com promessas de experiências altamente prazerosas, por meio da propagação de estilos, de juventude, de saúde e de beleza, promovendo a moda, a indústria de cosméticos, a estética corporal, o turismo e o consumo, elementos estes que acabam, conseqüentemente, ditando os ideais de estilos que deveriam ser atingidos e moldados.

    Não se pode, ingenuamente, negar que as atividades desenvolvidas no contexto do lazer também são práticas de consumo, conforme já salientou Bruhns (2000). No entanto, considerar o lazer apenas por esta ótica pode forjar as experiências, conduzindo-as a uma massificação, em que os indivíduos envolvidos precisam estar in, para poderem ter a sensação de pertencimento, tão necessária à satisfação das necessidades humanas.

     Arantes (1993, p. 21) propõe considerar o lazer como consumo, quando este tem o sentido do "acesso (social), aquisição (material) e uso (prático e simbólico) diferenciado de recursos no contexto de sistemas de relações sociais e ordem moral", possibilitando um entendimento desse consumo como sendo uma prática, na qual é permitido experimentar outras realidades, que podem ou não estar inseridas no cotidiano da vida social, contrapondo-se ao "reforço ideológico das formas dominantes de diferenciação social", mas, inclusive, segundo este autor, com a "... tematização e experiência temporária de possibilidades imaginadas, que se vislumbra ou se deseja".

     Segundo Gutierrez (2000, p.71), a importância do lazer cresce a olhos vistos e pode vir a ser o centro da atenção, tanto da população em geral, como de pesquisadores nas mais diversas áreas do conhecimento, como já tem sido observado, uma vez que se evidencia "... o crescimento vertiginoso de um enorme mercado de produtos e serviços voltados para o lazer, atendido por organizações onde se confundem fábricas de computadores, turismo, show-biz, olimpíadas e campeonatos mundiais de futebol".

     Ainda segundo este mesmo autor, o lazer contemporâneo ou pós-moderno agrega à sua definição tradicional, "... enquanto busca pessoal e não produtiva do prazer no tempo livre, todas as características do mundo atual, como, por exemplo, a ênfase na competição e no personalismo, a sobrevalorização da aparência, a intranscendentalidade dos valores e a falência dos meta-relatos e de qualquer princípio de natureza ética..." (p. 71), entre outros elementos, somados à utilização intensiva e à crescente evolução do aparato tecnológico, envolvendo as diversas formas de comunicação.

     As artes plásticas, as cênicas, o turismo e as diversas formas de veiculação de imagens e textos representam algumas das formas de expressão e linguagens, capazes de transmitir conhecimento e conteúdo, conforme evidencia Carvalho (2000, p. 146), podendo, também, ser um caminho para estabelecer melhor a relação entre o homem e seu entorno, tendo em vista que o espectador está sempre "... 'reconhecendo' e 'rememorando' por meio das imagens" e por outras formas de expressões, como a escrita.

    Cabe, portanto, vencer interesses, ampliar as reflexões e buscar a inserção de valores tais, capazes de dinamizar a apreensão do lazer com um elemento plural, para que estas mídias favoreçam a divulgação e a disseminação dos diversos conteúdos culturais, para além da vertente apenas econômica, o que poderia contribuir sobremaneira para a difusão de estilos de vida mais ativos, gerando maior nível de saúde e qualidade existencial.


Nota

  1. Na época, as obras não eram creditadas a um só autor - Aristóteles- mas a uma geração de pensadores que mantinham afinidades e continuavam a obra iniciada. Com a queima da Biblioteca de Alexandria e o sumiço das obras do grego clássico - além das transformações autorais trazidas pelo surgimento da imprensa - foi relegado a um plano secundário este modo coletivo de pensar. O que vem escrito sobre a denominação de Aristóteles é um bom exemplo, pois sua obra completa, transita da baixa à média e à alta escolástica....o que se supõe impossível para uma só pessoa - dentro de sua cronologia - realizar. Deste modo explica-se a utilização do termo escola aristotélica.


Referências

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revista digital · Año 10 · N° 88 | Buenos Aires, Setiembre 2005  
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