A Educacao Fisica frente a LDB 9394/93 | |||
*Professora de Educação Física. Pedagoga Coordenadora do Curso de Educação Física do Centro Universitário das Faculdades Associadas de Ensino - UNIFAE São João da Boa Vista - SP **Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP (Brasil) |
Profa. Mestre Rachel Barbosa Poltronieri Florence* rachelflorence@bol.com.br Prof. Dr. Paulo Ferreira de Araújo** paulo@fef.unicamp.br |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 86 - Julio de 2005 |
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1. Introdução
Atualmente, com o processo inclusivo nas escolas, determinado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e subseqüente pela lei 9394/96, estabeleceu-se uma nova visão sobre o modo de agir e pensar em educação. É dentro desse universo escolar encontramos a educação física como aliada ao desenvolvimento bio-psico-social do aluno.
Como forma a colaborar para um melhor esclarecimento sobre o assunto, o presente artigo pretende focalizar os aspectos da educação, educação especial e educação física dentro destas duas principais Cartas Magnas, acreditando que assim, ao resgatar um estudo das mesmas, os entendimentos educacionais são estabelecidos, carregando consigo o crescimento e dinamismo de novas atitudes mediante novos tempos.
Desta forma, iniciamos com a verificação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que foi promulgada em 05 de outubro de 1988 a qual estabelece através do Capítulo III - Da Educação, da Cultura e do Desporto, Art. 205, que, (OLIVEIRA, 1995, p.95-96):
A Educação, direito de todos e dever do estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Assim como,
"O dever do estado com a educação será efetivado mediante a garantia de", está enunciado como forma a garantir o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino ", pelo Art. 205 e Art. 208, inciso III, respectivamente do Capítulo III - Da Educação, da Cultura e do Desporto".
Neste mesmo Capítulo III, Seção III, o Art. 217, Inciso II, caracteriza como "dever do estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, e como direito de cada um e a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento". (OLIVEIRA, 1995, p. 98).
Portanto, observamos que nos respectivos artigos encontramos referências à educação como direito de todos, incluindo o portador de necessidades especiais, a indicação à Educação Física e por fim a caracterização da inclusão ao explicitar "preferencialmente na rede regular de ensino".
2. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional no. 9394/96: formaçãoCom a promulgação da Constituição considerada como nossa Carta Magna, o Brasil, encontrava-se num outro contexto político, desta forma, em outubro de 1988, o Deputado Octávio Elísio (PSDB/MG), apresentou à Câmara dos Deputados o primeiro projeto de lei1, em dezembro de 1988 que recebeu o número 1.158A para sua identificação. (CASTELLANI FILHO, 1998).
Tratava - se de um anteprojeto cuja elaboração datava anteriormente à promulgação da Constituição de 1988, com 68 artigos. Neste a educação especial estava presente no artigo 21 do Título VI, a seguir. (CARVALHO, 1997, p.19):
...os alunos portadores de deficiências físicas ou mentais e os que encontrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula deverão receber tratamento especial, de acordo com as normas fixadas pelos Conselhos de Educação competentes.
Nesta mesma versão, conforme Castellani Filho (1998, p.9 -10) não havia menção em relação à obrigatoriedade da Educação Física, e que em seu texto previa nos artigos 33, 37 e 46 que se referiam à educação escolar de 1o. 2o. , e 3o. Graus, que os currículos das escolas de 1o. Graus deveriam:
Obrigatoriamente, além da língua nacional, o estudo teórico-prático de matemática, ciências naturais e ciências sociais, para os currículos de 2o. Grau estabelecia obrigatoriamente, além da língua nacional, o estudo teórico-prático das ciências e da matemática, e por fim para o 3o. Grau fixar o currículo mínimo e a duração mínima dos cursos superiores correspondentes a profissões reguladas em lei, através do Conselho Federal de Educação.
Este anteprojeto no. 1.158-A, após reformulações e acréscimos de sugestões, resultou em uma nova versão considerada como Substitutivo, sendo o resultado da produção de um Grupo de Trabalho sob a coordenação de Florestan Fernandes (PT/SP), que tinha Jorge Hage (na época PSDB/ Ba) como seu relator.
Na visão de Saviani (1998, p.57), o Substitutivo Jorge Hage foi considerado positivo, pois "de início importa considerar que diferentemente da tradição brasileira em que as reformas educacionais resultam de projetos invariavelmente de iniciativa do Poder Executivo, neste caso a iniciativa se deu no interior da comunidade".
Conforme relata Castellani Filho (1998, p.10) nesta formatação, a educação física aparece no artigo 36, com a influência bio-psicologizante que marcou época na segunda metade da década de 70, a saber:
A Educação Física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório na Educação Básica, ajustando - se às faixas etárias e às condições da população escolar, de modo a contribuir para o desenvolvimento do organismo e da personalidade do educando.
Enfim, outra referência também feita por Castellani Filho (1998, p.10), na qual:
...os sistemas de ensino promoverão, em todos os níveis (Art.37) o desporto educacional e as práticas desportivas não formais, tendo como objetivo a formação integral para a cidadania e o lazer, evitadas as características de seletividade e competitividade de outras manifestações desportivas (Inciso I).
A utilização do termo desporto se deve a sua referência contida na Constituição vigente em seu artigo 217, conforme já citado.
Mesmo sendo considerado como democrático, o Substitutivo sofreu outras alterações até que fora aprovado na Comissão de Educação, Cultura e Desporto, Câmara presidida pelo Deputado Carlos Sant'Ana (RJ) em 28 de junho de 1990, limitando - se a um texto de 172 artigos.
No que se refere à educação especial, o Substitutivo Jorge Hage proporcionava um avanço segundo Carvalho, (1997, p. 22-23) visto que de um artigo, passava - se a um Capítulo XIX - da Educação especial, contendo três artigos.
Apesar de efetuada a sua aprovação pela Câmara, o Substitutivo Jorge Hage enfrentaria um caminho com obstáculos pela frente até a sua aprovação final pela Câmara.
Este fato ocorria, pois o sistema do Parlamento Brasileiro é bicameral, ou seja, quando um projeto se inicia na Câmara dos Deputados, a sua revisão ocorre no Senado e conforme a sua aprovação ou alteração, o mesmo retorna à Câmara dos Deputados, que, somente após a sua aprovação é encaminhado ao parecer do Presidente da República para a sua sanção ou veto.
O mesmo procedimento é inverso caso o projeto se inicie no Senado. Nesta situação, o papel de revisor passa a ser da Câmara dos Deputados.
É possível a presença de projetos referentes ao mesmo assunto tramitando simultaneamente nas duas casas. Sendo assim, a palavra final fica com a casa que primeiramente encerrar seu trabalho. "Em conseqüência destas disposições regimentais, verifica - se, hoje, uma verdadeira corrida contra o tempo entre a Câmara dos Deputados e o Senado Federal".(ABREU, 1992, p.375).
Mas o que ocorreu é que enquanto o Substitutivo Jorge Hage tramitava na Câmara, outras iniciativas caminhavam paralelamente ao Senado.
Mesmo com o empenho do Senador Marco Maciel em se comprometer com a promessa de que qualquer projeto que chegasse ao Senado não seria discutido enquanto o projeto da LDB estivesse em tramite na Câmara, foi dada a entrada do projeto de Darcy Ribeiro na Comissão do Senado em maio de 1992. Ou seja, dois anos após a aprovação unânime do Substitutivo Jorge Hage na Câmara dos Deputados que quando chegou à Câmara era identificado como PLC 1258C/88 e passando então a uma nova identificação, como PLC 101/93, tendo como relator o Senador Cid Sabóia. (PMDB/Ce).
Mediante outro momento político, o projeto de Darcy Ribeiro era assinado pelos Senadores Marco Maciel (PFL - Pe) e Maurício Correa (PDT - DF) e como relator o Senador Fernando Henrique Cardoso.
Em relação aos textos de ambos os projetos os mesmos se diferenciavam na concepção e conteúdo.
O projeto de Darcy Ribeiro identificado como PLS 67/92, foi aprovado na Comissão de Educação do Senado em fevereiro de 1993, e indicado como relator o Senador Cid Sabóia de Carvalho. (PMDB - Ce).
Enquanto isso o Substitutivo continuava sua tramitação pela Câmara dos Deputados. Cabe aqui a ressalva de que o projeto de Darcy Ribeiro foi elaborado em consonância com o governo do Presidente Fernando Collor de Mello e sua assessoria do primeiro escalão do Ministério da Educação, os quais não eram favoráveis ao projeto da LDB que tramitava na Câmara.
Mas em 29 de setembro de 1992, com o impedimento de Fernando Collor de Mello da Presidência da República pela Câmara dos Deputados, a situação favorecia o projeto cuja tramite encontrava - se na Câmara, pois assumia a Presidência da República o Vice - Presidente Itamar Franco, nomeando como Ministro da Educação o Professor Murílio Hingel, que simpatizava com as causas do projeto da Câmara. Mas com muita habilidade, o Senador Darcy Ribeiro tenta realizar uma manobra regimental, entrando com um pedido de urgência na pauta para a reunião do dia 18 de fevereiro de 1993, data considerada como inadequada e inoportuna, pois tratava-se de véspera de carnaval e tal assunto exigia certa importância.
Mas graças à intervenção do Ministro Professor Murílio Hingel e ao senador Pedro Simon (líder do governo no Senado), o assunto não foi considerado pauta daquela reunião.
Segundo a proposta de Darcy Ribeiro, a educação especial deixaria de ser um Capítulo e voltaria novamente restrita a um Artigo, o qual estaria inserido no Capítulo III do Título V, que se refere aos níveis e modalidades da educação e ensino. Tratava - se do Artigo 30, a saber,
Os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que encontrem atraso significativo quanto à idade regular de matrícula e os superdotados recebem tratamento especial, conforme as normas específicas dos respectivos sistemas de ensino. (CARVALHO, 1997, p.26).
Finalmente o projeto da Câmara é aprovado, ou seja, o Substitutivo Jorge Hage, é encaminhado ao Senado em 13 de maio de 1993, como PLC (Projeto de Lei da Câmara) 101/93 e designado como relatora a Deputada Ângela Amim. Conforme analisa Saviani (1998) um clima de insegurança retorna aos que eram favoráveis ao projeto.
Até então o quadro estava propício ao Substitutivo Jorge Hage: com o impedimento de Collor, a posse de Itamar Franco e com ele a nomeação do Professor Murílio Hingel como Ministro da Educação. A insegurança decorria do fato de que o Senador Cid Sabóia também havia sido o relator do projeto de Darcy Ribeiro. Assim como o PLC passou por diversos caminhos na Câmara, o mesmo deveria ocorrer no Senado.
Nesta casa "foi objeto de debates públicos e de consulta a representantes de governo, de entidades não governamentais e do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública". (CARVALHO, 1997, p. 26).
Neste PLC 101/93, Castellani Filho (1998, p.14), nos aponta a situação em que se encontrava a educação física. Segundo este autor, a mesma estava expressa no artigo 34 em que...
...a Educação Física, integrada à proposta pedagógica da Escola, é componente curricular da Educação Básica, ajustando - se às faixas etárias e às condições da população escolar, sendo facultativa nos cursos noturnos . O autor acredita que este artigo caracterizava a educação física associada à capacitação física.
Deste momento, resultou - se um outro substitutivo ao PLS 67/92 do Senador Darcy Ribeiro e ao PLC 101/93, era o Substitutivo Cid Sabóia.
Neste Substitutivo, também encontramos referências à educação física, através do artigo 26 (...) §1o. "A educação Física, integrada à proposta pedagógica da escola, é atividade obrigatória no ensino fundamental e médio, sendo oferecidas progressivamente oportunidades apropriadas para alunos excepcionais". (CASTELLANI FILHO, 1998, p.14).
Conforme esclarece Saviani (1998), Substitutivo Cid Sabóia deu entrada ao Plenário do Senado em dezembro de 1994. Mas, ao retornarem aos trabalhos em fevereiro de 1995, o quadro político encontrava - se sensivelmente2 modificado: um novo Presidente da República, novos Ministros e um novo Congresso Nacional. Mesmo porque, as dimensões do assunto se ampliavam, pois Darcy Ribeiro torna-se a relator do projeto e apresenta seu parecer em março de 1995. Como sempre, sua manobra regimental novamente entra em cena. Alega inconstitucionalidades tanto no PLC 101/63 como no Substitutivo Sabóia.
Aproveitando - se da oportunidade, o Relator apresenta seu projeto, gestado no MEC, posto que conseguiria a sua aprovação pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. O mesmo é aprovado no Senado e encaminhado à Câmara dos Deputados como Substitutivo Darcy Ribeiro. Neste se refere à educação física no artigo 24 da seguinte forma: "Os currículos valorizarão as Artes e a Educação Física de forma a promover o desenvolvimento físico e cultural dos alunos".
Desta forma desobriga o Estado a manter a educação física nas escolas, deixando por conta das mesmas a manutenção ou não da disciplina e sua organização.
Por fim, o Substitutivo sofre modificações, mas acaba por resultar na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que após a sanção do Presidente da República, sem vetos, é promulgada em 20 de dezembro de 1996.
Este novo texto apresentava outras diretrizes norteadoras da educação em relação ao projeto original da Câmara, que se diferenciam basicamente em dois pontos: o primeiro é que observa - se uma diminuição das responsabilidades do Estado com relação à educação e o segundo refere-se à restrição do papel da sociedade civil na participação das decisões sobre o ensino, demonstrando de forma clara que o processo democrático que deveria permear a política educacional brasileira, encontra - se em retrocesso.(BRASIL, 2000).
Por fim, após oito anos de trajetória, de caminhos e descaminhos temos a nova LDB, trazendo-nos a educação física como componente curricular obrigatório, mas não sendo obrigatória a sua realização por um profissional devidamente habilitado em licenciatura plena na educação física nas fases da educação infantil e séries iniciais (Ciclo I).
Compreender a educação física e compreender o processo educacional em sua totalidade significa que, é preciso construir uma educação física que seja para todos os alunos e se realize com todos os alunos. A viabilidade de este novo olhar exige novas reflexões, conhecimentos, criticidade, disponibilidade e dinamismo. A trilha realizada para que se chegasse a atual lei 9394/96, se reflete nas ações do presente. Não basta somente termos o conhecimento da LDB, é preciso a informação para que possamos propiciar as discussões democráticas sobre os entendimentos educacionais que nos levarão a enfrentar os desafios, a atender a todos os segmentos da sociedade e a contribuir com o universo escolar. Trata-se de um alerta para que nos mobilizemos e realizemos o que de fato acreditamos ser a educação.
Notas
Um anteprojeto elaborado por Dermeval Saviani.
Grifo meu. Adotado para referir - se - se ao fato de que este novo quadro político não apreciava com bons olhos o projeto aprovado na Câmara.
Referencias
ABREU, Mariza. A tramitação do projeto de LDB no Congresso Nacional a partir de novembro de 1992: Educação e Sociedade. Revista Quadrimestral de Ciência da Educação. Ano XIII, nº 42, agos. De 1992.
BRASIL. Lei LDB : de diretrizes e bases da educação: lei n. 9.394/96. Apresentação Esther Grossi. 3. ed. Brasília: DP&A, 2000.
CARVALHO, Rosita Edler. A Nova LDB e a Educação Especial. 2. ed. Rio de Janeiro : WVA, 1997.
CASTELLANI FILHO, Lino. Política educacional e educação física. Campinas : Autores Associados, 1998. (Coleção polêmicas do nosso tempo).
SAVIANI, Dermeval. A nova lei da educação: trajetória, limites e perspectivas. 4. ed. Campinas: Autores Associados, 1998 (Coleção educação contemporânea).
revista
digital · Año 10 · N° 86 | Buenos Aires, Julio 2005 |