A utilização de dicas na aprendizagem da ginástica rítmica: um estudo de revisão |
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Departamento de Educação Física - UFPR Curso de Mestrado em Educação Física Centro de Estudos do Comportamento Motor - CECOM (Brasil) |
Priscila Martins Caçola pri_martins@hotmail.com Iverson Ladewig iverson@ufpr.br |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 82 - Marzo de 2005 |
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Introdução
A ginástica rítmica é uma modalidade desportiva essencialmente feminina que se fundamenta na expressividade artística. É conceituada como a busca do belo, uma explosão de talento e criatividade, em que a expressão corporal e o virtuosismo técnico se desenvolvem juntos, formando um conjunto harmonioso de movimento (LAFFRANCHI, 2001, p. 3). Hoje é considerada um dos mais belos esportes da atualidade e nas Olimpíadas, um dos esportes que atrai mais público. A ginasta pode competir a partir do ano em que completa 15 anos, ou seja, entre os 15 e 20 anos a atleta deve estar no auge de sua performance desportiva.
Considerando este aspecto conclui-se que a criança deve iniciar na ginástica rítmica (GR) por volta dos seis anos. Segundo Alonso (2004, p. 439) a GR é um dos esportes privilegiados, que por possuir habilidades motoras bem próximas da cultura corporal encontrada nas brincadeiras e nos jogos infantis, favorecendo desde os cinco anos de idade possibilitar vivências motoras na GR sem que estejamos iniciando precocemente na habilidade. Também para Gallahue e Ozmun (2003, p. 115), as crianças possuem um potencial desenvolvimentista para estar no estágio maduro da maior parte das habilidades motoras fundamentais por volta da idade de seis anos. A iniciação na GR (voltada para o treinamento de alto rendimento) para Róbeva e Rankélova (1991, p. 53) é: "exatidão e perfeição: essa é a contínua exigência no começo da carreira. Mais tarde, corrigem-se os erros difíceis, alguns jamais se corrigem. Aprender algo errado é pior do que não ter aprendido nada."
Com estas considerações verifica-se que para tratar de um procedimento pedagógico adequado a crianças de seis anos, que desenvolva um padrão de habilidades específicas ao esporte, deve-se traçar estratégias específicas para que então assim ocorra a aprendizagem pretendida. Ladewig, Cidade e Ladewig (2001, p. 173) apontam que "em termos de habilidade motora atingir a automatização da performance é a meta maior dentro do processo de aprendizagem, e se possível, de maneira rápida. Porém a velocidade em que se atinge a automaticidade está relacionada a complexidade da tarefa, o nível de experiência do indivíduo e a quantidade de prática." No primeiro ano na ginástica rítmica o nível de experiência e a quantidade de prática é pequeno, e as tarefas já são complexas, devido ao alto grau de dificuldade das habilidades.
A proposta é que então seja explorado um caminho que facilite o processo pedagógico, utilizando-se de "dicas" que desenvolvem a atenção seletiva e facilitam a aprendizagem de habilidades específicas.
Revisão de literaturaDe acordo Ladewig, Cidade e Ladewig (2001, p.168) as pesquisas sobre a atenção iniciaram no campo da psicologia, onde os processos mentais do indivíduo eram estudados a partir do final do século 19. Estudiosos da atenção divergem em vários pontos, porém concordam que a atenção possui duas características: capacidade limitada e processa as informações de maneira seriada. A atenção é essencial no processo de aprendizagem, especialmente a atenção seletiva, que para Ladewig, Gallagher e Campos (1996, p. 86) pode ser definida como "a habilidade do indivíduo de dirigir o foco da atenção à um ponto em particular no meio ambiente".
Na idade estimada para a iniciação na GR as crianças estão no estágio da atenção inclusiva, onde as inúmeras informações as distraem, não são capazes de separar as informações relevantes das irrelevantes. As crianças na idade de 5 a 8 anos de idade são conhecidas por "não prestarem atenção" (Ladewig, Gallagher e Campos 1996, p. 86).
Para auxiliar as crianças no estágio da atenção inclusiva a aprenderem habilidades motoras tão complexas da GR sugere-se o uso de estratégias cognitivas, que tem a finalidade de auxiliar as crianças a focarem nos aspectos relevantes da tarefa. Segundo Chi (1976); Thomas (1980), citados por Ladewig, Gallagher e Campos (1996, p. 87) "estratégias cognitivas podem ser definidas como processos usados na memória de curta duração com a finalidade de armazenar, recuperar e reorganizar informações na memória de longa duração. As estratégias ligadas a atenção seletiva estão relacionadas às informações específicas da tarefa, as quais são chamadas de "dicas" e ajudam a criança a obter uma idéia do movimento. Essas estratégias auxiliam a criança a direcionar a atenção para o ponto crítico da habilidade, podendo facilitar o processo de aprendizagem.
Para podermos relacionar a atenção com a aprendizagem precisa-se rever como são divididos os estágios de aprendizagem. Vários autores discutiram este conceito, como Adams (1971); Fitts e Posner (1967) e Gentile (1972), citados por Schimidt e Wrisberg (2001, p. 200). As características atribuídas pelos autores aos estágios é bastante semelhante, e em resumo podemos destacar: Estágio verbal-cognitivo - este estágio é caracterizado pela iniciação numa tarefa que não é familiar. Os aprendizes passam muito tempo "pensando" para realizar a habilidade, ou seja, os problemas são de "natureza" cognitiva. O desempenho é variável, mostrando a falta de consistência de uma tentativa para outra. Estágio motor-associativo - na maioria dos casos os aprendizes progridem para este estágio, depois de ter obtido uma idéia geral do movimento, sendo o objetivo refinar a habilidade para um organização mais eficiente dos padrões de movimento para produzir a ação. Os executantes detectam seus próprios erros e começam a monitorar seus próprios feedbacks1. É considerado um processo de refinamento. Estágio autônomo - para se chegar ao estágio autônomo é necessário uma grande quantidade de prática. Os aprendizes são capazes de produzir suas ações quase que automaticamente, com pouca ou nenhuma atenção.
A capacidade de detectar os erros é altamente desenvolvida, e as melhoras na performances são difíceis de ser detectadas.
Considerando a idade sugerida para que se inicie na GR (enfocando um treinamento de alto nível no futuro), lembramos que crianças possuem diferenças dos adultos em relação ao processamento de informações (são mais lentas), são ineficientes no uso dos processos de controle de memória (não sabem usar estratégias para lembrar e memorizar), além de que possuem uma quantidade limitada de experiências. Como não existe uma proposta pronta de dicas específicas para a GR, deve-se primeiramente avaliar as alunas a fim que possamos planejar a aula com o objetivo de contornar essas dificuldades. No início de uma atividade é encontrado o estágio cognitivo, como foi citado anteriormente, onde há muitas informações sobre um movimento. Uma dica específica à habilidade, que respeite a idade e o nível cognitivo da criança, fazendo parte do mundo em que ela vive dirige o foco da atenção para a dificuldade do movimento. Com a prática das habilidades chega-se ao estágio associativo, onde não é necessária uma grande demanda de atenção para o movimento, a aprendiz já conseguiu entender os princípios básicos para realizar a habilidade. Finalmente, depois de muitos anos ou horas de prática o aluno chega ao estágio autônomo. Este não precisa ficar mais atento ao movimento, ou seja, não precisa mais pensar para realizá-lo, ou seja, automatizou o movimento. As dicas podem acelerar a passagem entre os estágios, diminuindo o tempo para que se realize a habilidade ideal. Caso as dicas utilizadas não tragam um resultado esperado deve-se avaliá-las e criar outras que auxiliem a aprendizagem, lembrando que o período inicial (estágio cognitivo) a aprendiz encontra-se carregada de informações, e reduzir as demandas na atenção neste processo pode até assegurar a continuação na atividade, considerando que muitas crianças desistem do esporte devido a experiência de fracasso e frustração que têm nas primeiras aulas. Para Ladewig, Cidade e Ladewig (2001, p. 193) uma criança motivada com a atividade irá realizá-la com mais prazer, "prestando mais atenção".
ConclusãoOs estudos realizados por Ladewig, Gallagher e Campos (1996), Ladewig, Cidade, Ladewig (2001) e Bertoldi e Ladewig (2004) confirmam que a utilização de dicas auxilia a aprendizagem e em especial a aprendizagem de habilidades motoras. Baseado nestes estudos conclui-se que o esporte Ginástica Rítmica, modalidade desportiva pouco conhecida e estudada possui uma variedade de situações em o uso de dicas poderá facilitar a aprendizagem. Considerando a grande complexidade do esporte e a baixa idade da iniciação, vê-se o quanto há dificuldades em se pensar o processo ensino-aprendizagem por parte dos professores.
Dúvidas sobre o quë ensinar, como ensinar, como trabalhar com o aparelho, etc, são indagações pertinentes e importantes para o futuro das ginastas, pois de acordo com Lanaro Filho e Bohme (2001 p. 155) "a possibilidade de sucesso de um indivíduo em qualquer esporte depende do seu potencial genético, da metodologia de aprendizagem e treinamento durante os diferentes estágios do seu desenvolvimento". Vemos que os autores ressaltam a importância da forma de ensino do esporte para um sucesso futuro. A medida que as dicas são usadas na GR há também a possibilidade deste esporte, apesar da sua complexidade, ser mais agradável e divertido para as suas pequenas aprendizes, além de existir a possibilidade de diminuir o tempo de aprendizagem para aquisição dos movimentos. Esta redução no tempo é vantajosa e necessária quando sabemos que a ginasta pode competir oficialmente em campeonatos das federações estaduais de ginástica a partir do ano em que completa oito anos de idade. Além desse aspecto, não podemos esquecer o aspecto lúdico que as dicas proporcionam para as crianças, pois é não é possível aceitar que alunas tão pequenas apenas repitam habilidades motoras como se já estivessem em um treinamento para adultos. Enfim, com todas as condições que vimos na iniciação da GR vemos que as "dicas" como estratégias cognitivas podem facilitar um aprendizado de habilidades de um desporto complexo. Esta conclusão tem o suporte da tese de Kofka (Katona, 1940), citada por Ladewig, Gallagher e Campos (1996, p. 87), indicando que quando o aprendizado ocorre através da utilização de métodos com significados relevantes, fortes traços na memória são criados, melhorando a retenção. Por isso, acreditamos que o uso de dicas poderia auxiliar professores e técnicos de GR como uma estratégia para facilitar, motivar e alegrar as aulas de ginástica rítmica, fazendo com que haja um aprendizado eficiente e muito divertido para suas ginastas!
Notas:
Alguma informação sensorial relacionada ao movimento (SCHIMIDT e WRISBERG, 2001, p. 270).
Referências
ALONSO, Heloisa. Meu corpo, minha cultura, minha Ginástica Rítmica. Anais do 3º Congresso Científico Latino Americano de Educação Física da Unimep, Piracicaba, 438-443, 2004.
GALLAHUE, David; OZMUN, John. Compreendendo o desenvolvimento motor: Bebês, crianças, adolescentes e adultos. Phorte, São Paulo, 2001.
LADEWIG, Iverson, CAMPOS, Wagner de, GALLAGHER, Jere Dee. Das teorias de atenção às estratégias de atenção seletiva: Uma revisão bibliográfica. Revista Synopsis. Curitiba, V. 7, p. 81-94, 1996.
LADEWIG, Iverson; CIDADE, Ruth Eugênia, LADEWIG, Melissa Joy. Dicas de aprendizagem visando aprimorar a atenção seletiva em crianças. In: Avanços em comportamento motor, Luiz A. Teixeira (Editor). Rio Claro : Editora Movimento, p. 166-197, 2001.
LAFFRANCHI, Barbara. Treinamento Desportivo aplicado à ginástica rítmica. Londrina: Unopar, 2001.
LANARO Filho, Pedro, BOHME, Maria Tereza. Detecção, seleção e promoção de talentos esportivos em ginástica rítmica desportiva: Um estudo de revisão. Ver. Paul. Educ. Fís., São Paulo, 15(2): 154-168, jul./dez. 2001.
SCHMIDT, Richard; WRISBERG, Craig. Aprendizagem e performance motora: uma abordagem da aprendizagem baseada no problema. Porto Alegre: Artmed, 2001.
revista
digital · Año 10 · N° 82 | Buenos Aires, Marzo 2005 |