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A trajetória do punhobol no sul
do Brasil: da inserção ao declínio

   
Estudantes do curso de Educação Física (2º período),
na Universidade Federal do Paraná
(Brasil)
 
 
Fernanda Braga Justus | Fábio Spisila
Janira Meneghetti | Juliana Mendonça
Eduardo Lindner

fer@gui.pro.br
 

 

 

 

 
Resumo
    O presente artigo visa resgatar a história de um esporte que apesar de pouco conhecido, trouxe inúmeros títulos internacionais para o Brasil. Tentando apresentá-lo de forma objetiva, iniciou-se esta pesquisa com o estudo das razões sociais e políticas que ocasionaram a imigração alemã e, posteriormente, a relação da proibição da difusão dessa cultura com a 2º Guerra Mundial. A partir desta etapa, foi estudada a inserção do Punhobol no Brasil, ocorrida através desses imigrantes, tentando reconstituir sua história desde a primeira apresentação até sua regulamentação como esporte. Outro aspecto ressaltado foram os motivos que ocasionaram o declínio deste esporte a partir da década de 40. Tentando entender este processo através dos conceitos formulados por Pierre Bourdieu, que afirma que a definição ou estruturação de uma sociedade ou de determinado grupo social é o resultado da combinação dos hábitus individuais, percebe-se que a partir da 2º Guerra Mundial, com a então perseguição aos imigrantes alemães e com as mudanças dos interesses dos esportes tradicionais para os novos, começa ocorrer o desaparecimento da prática do Punhobol.
    Unitermos: Imigração Alemã. Punhobol. Habitus. Declínio.
 
    Artigo apresentado pelos alunos do 1º ano, disciplina de História da Educação Física, curso de graduação em Educação Física, Universidade Federal do Paraná, sob a orientação do Professor André Mendes Capraro, andre.capraro@bbs2.sul.com.br
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 80 - Enero de 2005

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Introdução

    A finalidade desta pesquisa é a de registrar a história da imigração alemã no sul do Brasil e a sua influência na introdução de esportes, em especial o esporte denominado Punhobol.

    Esta pesquisa se faz necessária em virtude do desaparecimento dos dados históricos pela falta de arquivamento, bem como pela falta de publicações especializadas neste setor.

    O resgate histórico a que se propõe este estudo torna-se importante porque somente a partir de 1961 começou-se o arquivamento dos dados relativos a este esporte com a fundação da Federação Gaúcha de Punhobol.

    Será objetivo deste trabalho o relacionamento deste esporte com a população de origem germânica que o introduziu e o desenvolveu no país.


1. A imigração alemã para o sul do Brasil

1.1. Primeiras Imigrações

    Segundo NOGUEIRA (1974) foi através de Dom João VI, em 1774, que houve a primeira oportunidade para que se iniciasse a imigração alemã para o Brasil, com a oferta de bens materiais como armas, terras e ferramentas para trabalho. BOURDIEU, em seu capítulo "Os usos do Povo" do livro Coisas Ditas (1990), comenta que o povo é sempre manipulado nas questões políticas. Percebe-se nessa primeira oportunidade claramente essa manipulação, já que são oferecidos ao povo bens em troca de sua presença em território brasileiro. Nota-se nesta primeira oportunidade o interesse da coroa portuguesa em povoar a futura colônia.

    Após a separação do Brasil de Portugal, em 1822, a colonização passa a ter um caráter militarista para garantir a independência, já que Dom Pedro I temia a invasão dos exércitos portugueses para a retomada da colônia (HUNSCHE, 1975). Neste mesmo ano, começa a ser promovida a imigração espontânea de artistas e lavradores.


1.2. Motivos Sociais e Políticos que influenciaram na Imigração Alemã

    Segundo ALDAIR (1980), a Alemanha no início do século XIX possuía sua economia baseada principalmente na prática rural. Em 1870, após o início da industrialização na Alemanha, os trabalhadores rurais não conseguiam mais concorrer com as grandes empresas, o que os forçou, então, segundo LANDO (1980), buscar um novo mundo com melhores condições de vida.

    Em sua chegada ao Brasil, começaram a sofrer restrições governamentais, o que ocasionou seus isolamentos. Buscando uma estabilização, começaram a fundar as primeiras associações, com o intuito de preservar suas culturas. Criaram associações religiosas, esportivas e recreativas, estas que viriam a se tornar os primeiros clubes sociais e esportivos (ROCHE, 1974).

    Outros fatores que favoreceram a imigração foram as perseguições políticas e religiosas.


1.3. A 2º Guerra Mundial e a proibição da cultura alemã.

    Quando em 1939 foi iniciada a segunda guerra, o Brasil prudentemente manteve-se neutro, pois o governo brasileiro nesta época mantinha boas relações com a Alemanha e a Itália, sendo que a tendência junto com os países do Prata, Argentina e Uruguai, era de manter uma situação de neutralidade, o que economicamente mais tarde foi muito favorável a estes países.

    No entanto, a marinha brasileira mantinha contrato participando ativamente com o comércio americano (DELTA LARROUSSE, 1967). Após ataques contra navios brasileiros e início de manifestações populares, o governo é forçado a reconhecer o estado de guerra contra a Alemanha, em 22 de agosto de 1942.

    Com a participação ativa do Brasil na 2º Guerra, verificou-se que a aversão crescera contra os teuto-brasileiros no Brasil, tornando-se um fato comum o sofrimento de muitos brasileiros de sangue alemão pelas perseguições sofridas, na maioria das vezes totalmente infundadas.

    Segundo o relatório do DOPS de 1943, foram tomadas no Brasil, nesta época, sérias medidas quanto à nacionalização dos três estados do sul do Brasil, o que contribuiu para tornar a dissolução da cultura alemã um fato evidente nesta época.

    Depois de 10 de novembro de 1937, foram fechadas ou nacionalizadas todas as escolas e associações alemãs, tomando as associações nomes no idioma português. Os presidentes dessas associações passaram a ser brasileiros indicados pelo exército e os estatutos ditados por agentes da comissão nacionalizadora.

    Muitos dos clubes que possuíam bibliotecas, com a maioria do seu acervo em alemão, tiveram estas obras confiscadas e muitas desapareceram ou foram queimadas.

    A correspondência recebida do exterior na época era censurada e muitas pessoas foram presas e responderam a inquéritos por simples cartas de parentes.


2. A inserção do punhobol no Brasil

2.1. A Fundação das primeiras Sociedades e Clubes no Rio Grande do Sul

    Esta pesquisa se faz necessária em virtude da inserção do Punhobol ter ocorrido no Brasil através, primeiramente, do estado do Rio Grande do Sul, com o clube Turnerbund, hoje SOGIPA.

    De acordo com o livro comemorativo ao Centenário da Imigração Alemã (1924), foi através da imigração que começaram a surgir no sul as primeiras sociedades teutas. Distribuídas em diversos setores como: sociedades esportivas, patrióticas e religiosas, viriam a se tornar, posteriormente, os primeiros clubes sociais e desportivos.

    A mais antiga sociedade, fundada no Rio Grande do Sul em 1º de junho de 1855, foi a Sociedade Germânica.

    Em 1867, com o nome de Turnerbund, foi criada a primeira sociedade para a prática de Educação Física. A sua fundação surgiu da importação feita pelo Sr. Alfredo Schüett, natural da cidade de Hamburgo, que em 1865 trouxe aparelhos da Alemanha para a prática da ginástica.

    Devido aos processos de nacionalização dos três estados do sul do Brasil, com o início da 2º Guerra, a sociedade Turnerbund é obrigada a adotar um nome no idioma português, passando a se chamar Sociedade Ginástica Porto Alegre (SOGIPA).


2.2. Primeira apresentação no Brasil

    Há controvérsias no que diz respeito à primeira apresentação deste esporte. AMARO JUNIOR (1977) comenta que os primeiros colonos que vieram para o Brasil, em 1824/25, começaram logo a praticar dois esportes: o Bolão e o Punhobol. Autores alemães, como KRAUSE (1972), apresentam a data de 1909 como o ano em que o Punhobol começou a ser praticado.

    Segundo a publicação mensal do clube Turnerbund de Porto Alegre (hoje Sogipa), em seu número 5, de maio de 1935, o real implantador foi Georg Black, professor de ginástica do clube, que apresentou o Punhobol como um novo esporte nas suas aulas para homens, em maio de 1906.


2.3. Formação das Primeiras Equipes

    A primeira equipe a realizar partidas de Punhobol e a convidar associados para essa prática foi a Turnerbund (SOGIPA), em Porto Alegre no ano de 1911.

    Considerado como introdutor do Punhobol no sul do Brasil, o Professor Georg Black nasceu em 24 de abril de 1877 na Alemanha e veio para o Brasil como sanitarista. Notou que a ginástica teria um grande desenvolvimento no país e decidiu difundi-la na capital do Rio Grande do Sul (100 JAHN DEUTSCHTUM in Rio Grande do Sul, 1824/1924).

    Iniciou suas aulas de ginástica na então Turnerbund e em maio de 1906 apresentou pela primeira vez o Punhobol no Rio Grande do Sul - acredita-se no Brasil. O esporte começou a se difundir e em 1922 já eram registradas a existência de quatro ligas no estado.

    Em 1930 o Punhobol filiou-se a Federação Atlética do Rio Grande do Sul (FARG). Neste mesmo ano aconteceu o primeiro campeonato oficial.

    A partir da década de 40, o Punhobol passou a ter um caráter popular. Em 1947 ocorreu o primeiro campeonato popular de Punhobol, realizado com a participação de 16 equipes.

    No final da década de 50, a FARG realiza o primeiro torneio nacional, envolvendo os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, visando atrair a atenção da Confederação Brasileira de Desportos.

    Após a realização do Primeiro Congresso Brasileiro de Punhobol, também organizado pela FARG, foi implantado um plano para a difusão do Punhobol em competições interestaduais e interclubes. Em 26 de julho de 1960, a FARG recebe da Confederação Brasileira de Desportos o pedido para tomar as providências necessárias para a regulamentação do jogo, assim redigido:

"CTN/FARG/PTG/COMUNICO DEVIDOS FINS PRESIDENTE AD REFERENDUM DIRETORIA CONCEDEU FILIAÇÃO FARG EM PUNHOBOL PT OBSÉQUIO PROVIDENCIAR URGENTE PEDIDO LICENÇA CLUBES PARTICIPAÇÃO TORNEIO INTERNACIONAL ACORDO LEI VIGOR PT OBSÉQUIO INFORMAR NOME DELEGADO BRASILEIRO CONGRESSO FUNDAÇÃO SULAMERICANA PUNHOBOL/DESPORTOS."

    Mais tarde, exatamente no dia 12 de agosto de 1960, mediante circular nº 60/60, a CBD comunica as suas filiadas:

"SENHOR PRESIDENTE",

TENHO O PRAZER DE COMUNICAR A V.S. QUE ESTA ENTIDADE CONCEDEU FILIAÇÃO ÀS FEDERAÇÕES PERNAMBUCANA DE DESPORTOS AMADORES E ATLÉTICA RIO GRANDENSE, EM TÊNIS DE MESA E EM PUNHOBOL RESPECTIVAMENTE.""


3. O declínio do punhobol e os motivos que o ocasionaram

    Certamente a 2º Guerra Mundial foi um dos motivos mais fortes para o declínio do Punhobol. Não tanto nas capitais, mas nas cidades do interior, com o fechamento dos clubes de origem alemã, bem como a prisão de alemães sob a suspeita de colaboracionistas. Sabe-se que muitas pessoas de origem alemã, que se reuniam para eventos culturais e esportivos começaram a evitá-los, com o medo de sofrerem perseguições.

    No entanto, fatores sociais também influenciaram neste declínio. Estados como São Paulo e Rio de Janeiro começaram a praticar outros esportes nos clubes de origem alemã, como foi o caso do Handebol, e os jovens preferiram dedicar-se à prática do novo esporte deixando de lado o esporte tradicional de seus pais e avós. Pode-se entender esse processo como uma mudança dos habitus individuais, que em conjunto, refletiram para a formação de um novo habitus geral definindo os novos interesses desses grupos sociais.

    Nos grandes clubes, pouco a pouco o espaço foi tornando-se pequeno, já que existia a necessidade de investir em espaços e estruturas para a prática desses novos esportes. Grandes campos como os de Punhobol foram os primeiros sacrificados.

    O fato do Punhobol não ser uma disciplina esportiva ministrada nas escolas de Educação Física também pode ser citado como um fator de declínio.


Considerações finais

    Ao finalizar este estudo, constata-se a real influência dos movimentos imigratórios alemães na introdução no Brasil deste esporte denominado Punhobol. Como não possui ainda a sua história escrita em nosso país, por ser um esporte com raízes européias, tentou-se chegar o mais próximo possível a sua trajetória. Apesar de constatado o seu declínio a nível quantitativo, atualmente as seleções brasileiras masculina e feminina gozam de excelentes resultados a nível mundial.

    Percebe-se, também, através de conceitos formulados por Pierre Bourdieu, que da mesma maneira que um esporte pode se difundir através de habitus gerado, pode entrar em declínio decorrente da mudança deste.

Referências

  • BOURDIEU, Pierre. Coisas Ditas. São Paulo: Brasiliense, 1990

  • BOURDIEU, Pierre. Questões de Sociologia. Rio de janeiro: Marco Zero, 1981

  • KUKLIK, Pércio. Punhobol: atividade esportiva praticada desde a Grécia. Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1997.

  • OLIVEIRA, Paulo. A imigração Alemã e a Introdução do Punhobol no Rio Grande do Sul. Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 1987.

  • PRONI, Marcelo; LUCENA, Ricardo. Esporte: História e Sociedade. Autores Associados, 2002.

  • RODRIGUES, Luiz. A Aplicabilidade do ensino de Punhobol na Educação Física de 1º Grau. Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1998.


Site

  • http://www.sogipa.esp.br acessado em 15/10/2004.

Outro artigos em Portugués

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