efdeportes.com
A Educação Física revisitada a partir das
experiências escolares de futuros professores do 1º CEB

   
Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa
Universidade de Aveiro
 
 
Rui Neves
rneves@dte.ua.pt
(Portugal)
 

 

 

 

 
    Comunicação oral apresentada em Dezembro de 2000 no VIII Congresso de Ciências do Desporto e Educação Física dos Países de Língua Portuguesa - Faculdade de Motricidade Humana - Universidade Técnica de Lisboa (Portugal)
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 77 - Octubre de 2004

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Introdução

    A Educação Física (EF) é na estrutura curricular da escola portuguesa, em paralelo com o Português e a Matemática, uma disciplina que acompanha o percurso escolar do aluno do 1º ao 12º ano de escolaridade (Dec.Lei 286/89). Há portanto um claro reconhecimento curricular da sua função para o desenvolvimento dos alunos. As suas finalidades educativas estão articuladas entre os diversos ciclos e merecem de uma forma geral a concordância dos seus professores (Cabral, 1991; Neves, 1995). Por outro lado, a investigação na área da EF tem disponibilizado cada vez mais informação sobre como se desenrola o processo de ensino-aprendizagem dos alunos em EF (Carreiro da Costa, 1988, Carreiro da Costa, 1996,) sobre os processos de pensamento dos professores nas suas dimensões pré-interactivas (Januário, 1992, Neves, 1995), suas crenças, concepções e atitudes (Neves, 1995) em paralelo com estudos centrados naquilo que são as crenças, opiniões e representações dos alunos sobre as suas vivências em EF (Shigunov, 1991; Gonçalves, 1997; Fraga, 1994; Pereira, 1995).

    Sobre esta última dimensão da investigação em EF, vários estudos em Portugal têm evidenciado que os alunos gostam da disciplina de EF e consideram importante a sua integração no currículo escolar, existindo diferenças significativas nas percepções dos alunos em função da idade e do sexo. A atitude dos alunos parece não ser influenciada pela condição sócio-económica da família e a localização da escola (Shigunov, Carreiro da Costa e Brito, 1993; Leal, 1993; Gonçalves, 1994; Fraga, 1994).

    De acordo com Carlson (1995) diferentes estudos têm evidenciado que 80% ou mais dos alunos referem gostar da disciplina de EF. Também em Inglaterra Williams & Woodhouse (1996) num estudo com 2993 alunos, identificaram grande satisfação com a EF, com diferenças entre rapazes (84% positiva) e raparigas (63% positiva).

    No entanto, há indicadores que apontam no sentido do crescimento do número de alunos que consideram pouco relevante e agradável a EF (Tinning & Fitzclarance, 1992, apud Carlson, 1995). Em Portugal, diversos estudos apontam para a satisfação global dos alunos (Leal, 1993; Gonçalves, 1993). Mais recentemente, Mourão (1997), num estudo centrado no pensamento do aluno sobre as percepções e crenças sobre o sucesso e insucesso em EF, conclui que os alunos possuem uma atitude globalmente muito positiva em relação à EF, indicando um gosto elevado pela disciplina e reconhecendo um elevado grau de importância no contributo para o seu processo de formação. As preferências dos alunos por aulas de EF estruturadas numa perspectiva de ensino-aprendizagem, expressa através da valorização de dimensões relacionados com a promoção da aprendizagem e comportamentos de ensino do professor, superiorizaram-se à perspectiva pedagogista de aulas centradas no divertimento e prazer dos alunos e à perspectiva biologista de aulas com elevada intensidade e centradas na melhoria da aptidão física (Mourão, 1997). Numa perspectiva mais ampla, num estudo sobre as percepções de jovens europeus sobre a escola e a EF, envolvendo dados de 5 países (Portugal, Bélgica, Alemanha, Finlândia e Grã-Bretanha) a EF é considerada uma disciplina do agrado dos alunos, tendo mais de 70% dos inquiridos uma atitude favorável perante ela (Piéron et al. 1999). Ainda neste estudo os dados dos alunos portugueses destacam-se dos apresentados pelos alunos de outros países, por traduzirem valores mais elevados de atitudes favoráveis perante a EF (96% - raparigas / 92.5% rapazes), os mais baixos nas atitudes de indiferença (4.1% raparigas / 7.5% rapazes) e o único país com valores nulos nas atitudes desfavoráveis perante a EF (Pierón et al. 1999). É neste sentido que nos interrogamos sobre o que representa efectivamente a EF para os alunos. Qual a sua visão, o que vêm e sentem os alunos em relação à EF? Que traços das vivências, aprendizagens e relações proporcionadas pela EF são valorizados pelos alunos? Até que ponto há uma contradição / conflito entre as finalidades da EF explicitadas no currículo formal e aquelas que os alunos interiorizam a partir do currículo vivido? Que dimensões da prática vivida da EF assumem significado para os alunos?

    É em torno destas questões que o presente estudo foi desenvolvido, considerando a qualidade e o significado das experiências individuais de cada futuro professor do 1º Ciclo do Ensino Básico (1º CEB), enquanto aluno da disciplina de EF, nos diferentes níveis de escolaridade. Assim, a natureza das experiências positivas e negativas vividas enquanto alunos na disciplina de EF, por parte dos futuros professores do 1º CEB, podem constituir-se como referências marcantes das suas posteriores opções educativas, na abordagem desta área no 1º CEB. Isto porque nos motiva o estudo do grau de satisfação e/ou insatisfação dessas vivências, considerando que os professores em formação poderão, ser de certa forma, produto de um processo cumulativo, complexo e interdependente de saberes, experiências, práticas, atitudes e competências. Até porque a aprendizagem da profissão docente não principia com a frequência de um curso de formação de professores (Carreiro da Costa, 1996), já que entre outras dimensões o grau de familiarização com a escola, sua cultura e organização, levam à aprendizagem por observação (Lortie, 1975) que poderá ser um factor de filtragem a partir das suas crenças e conhecimentos, das perspectivas a veicular posteriormente durante a formação inicial. Não podemos deixar de salientar a forte influência das experiências biográficas sobre a orientação profissional dos futuros professores em geral (Lortie, 1975). Estamos perante o que alguns autores referenciam no âmbito da socialização profissional, como de socialização antecipatória (Carvalho, 1996). Por outro lado, no 1º CEB a área de EF tem tido uma abordagem marginal que leva os seus professores a perspectivá-la de forma diferente e condicionada pelas suas próprias histórias de vida, formação inicial e contínua, concepções e crenças sobre a área (Rocha, 1998). Isto porque as referências sócio-culturais de qualquer área ou disciplina radicam nos hábitos, valores, representações, práticas de trabalho e de lazer, nas tradições e aspirações que constituem a vida dos indivíduos e dos grupos (Carreiro da Costa, 1988), nas quais se integram as experiências escolares da EF de futuros professores do 1º CEB. Num contexto mais vasto de preocupações decorrentes da formação dos futuros professores do 1º CEB portadores de reflexividade crítica, não podemos ignorar a natureza das suas experiências de vida, todo o seu percurso de vida, toda a sua história de vida. A quantidade e qualidade de vivências pessoais, dentro e fora da instituição escolar. Importa pois, reflectir em função do facto da intervenção pedagógica dos professores do 1º CEB, em termos de regularidade e qualidade da prática, estar associada às representações, experiências e expectativas positivas da área de EF tendo como referência a sua juventude (Rocha, 1998). Já que, o comportamento actual dos professores, numa perspectiva biográfica sobre o seu desenvolvimento profissional, é determinado pelas suas experiências do passado, pela sua percepção do presente e pelas expectativas em relação ao futuro (Kelchtermans, 1995). Mas não são apenas as vivências pessoais, que nos devem interessar. A natureza e a qualidade dessas vivências pessoais enquanto "marcas"1 capazes de possibilitarem a construção de fortes concepções mobilizadoras para a acção, o desenvolvimento e a aprendizagem, são dimensões influenciadoras que importa conhecer e caracterizar. Como reforça Piéron (1996), admite-se cada vez mais que a formação de um professor começa antes do seu empenhamento num programa de formação. É nesta linha que a necessidade de os professores assumirem a EF como área de ensino-aprendizagem orientada para a introdução das crianças e jovens a uma cultura motora, numa base de socialização (Crum, 1993), faz emergir o seu papel de profissionais que acreditam no papel essencial das habilidades de ensino para uma prática educativa de qualidade, mas sem esquecer que não substituem todavia ideias e valores (Carreiro da Costa, 1996). Consideramos que a natureza e a qualidade da formação dos professores do 1º CEB na área de EF, poderá não ser suficiente para capacitar para uma futura intervenção pedagógica nesta área, quem tenha na sua história de vida recordações, vivências, e experiências com "marcas" pouco agradáveis ou gratificantes. Pelo que importa relevar na sua formação pessoal e profissional a reflexão sobre as percepções pessoais construídas durante o percurso escolar na área de EF. Numa recente auscultação junto de futuros professores do 1º CEB2, apenas um número reduzido (14 - 40 %) possuía no momento vinculação com as Actividades Físicas e Desportivas (AFD's), contra a maioria (21 - 60 %) que assumia uma nula vinculação com as AFD's na sua vida pessoal. Trata-se também de um indicador revelador da relação que cada um mantém com esta área. Como refere Rosado (1998:49) "construir atitudes positivas face à EF e ao Desporto passa, entre outros aspectos, pela optimização da relação consigo mesmo e da relação interpessoal de tal modo que a relação que se estabelece entre diversos intervenientes seja claramente satisfatória. Particularmente decisivo parece-nos ser uma preocupação sistemática de reforçar e proteger a auto-estima dos alunos e facilitar o desenvolvimento da autoconfiança garantindo a sua segurança física e emocional".


Objectivos

  1. Conhecer a percepção da Educação Física dos futuros professores do 1º CEB

  2. Caracterizar aspectos marcantes da EF na vida escolar dos futuros professores do 1º CEB

População-Alvo

- 121 alunos (12 homens - 109 mulheres) do 1º Ano dos Cursos de Professores do 1º Ciclo do Ensino Básico, da Universidade de Aveiro, com a média de 20.8 anos de idade.


Metodologia

a) Instrumento - sua construção

Fase 1 - Elaboração de um questionário centrado nas questões conceptuais da EF tomando como referência o percurso escolar dos alunos. O questionário é composto por 1 pergunta aberta, 2 semi-fechada e 1 de resposta múltipla.

Fase 2 - Pré-testagem do questionário através da sua aplicação oral a 13 alunos dos mesmos cursos do 2º e 3º Ano, centrada sobre as questões de formulação, clareza e aferição de categorias de análise da questão 4 (resposta múltipla).

b) Recolha de dados

    O questionário foi aplicado a 121 alunos. Tal ocorreu durante 4 anos lectivos, 1996/97, 97/98, 98/99 e 99/2000 na primeira aula da disciplina do 1º ano da área de EF. Cada aluno respondeu individualmente ao questionário.

c) Análise dos Dados

    Foram definidas categorias para a análise das respostas à questão 2 (EF - palavra-síntese), elaboradas e validadas, que resultaram da análise interpretativa dos dados. A questão 3 (2 experiências positivas e 2 negativas em EF) foi analisada a partir da utilização de um sistema de categorias elaborado e já validado por Carreiro da Costa et al. (1996).

d) - Tratamento dos Dados

    Os dados foram tratados através do cálculo das frequências relativas e absolutas de cada categoria. Pela sua natureza, considerou-se também, dentro de cada categoria, as expressões utilizadas que pelo seu conteúdo e juízos de valor permitiram ilustrar os resultados. Sempre que a sua frequência o justificou, foram identificados os totais de referências a cada expressão em particular, como reforço da natureza das percepções da EF dos futuros professores do 1º CEB.


Resultados

    Os resultados que se apresentam, analisam e discutem são decorrentes dos dados recolhidos, através das respostas às questões 2 e 3 do questionário aplicado. As duas questões (EF - palavra-síntese e experiências positivas/experiências negativas em EF), pelo conteúdo das respostas dos futuros professores do 1º CEB, articulam-se e permitem ter acesso a uma ideia mais clara das percepções dos inquiridos sobre a natureza dos seus percursos escolares na disciplina de EF.


Educação Física - palavra-síntese

    A esmagadora maioria dos futuros professores do 1º CEB utilizaram palavras com conteúdo positivo (114 - 94.2%) para caracterizar a disciplina durante o seu percurso como alunos do ensino básico e secundário. O conteúdo das respostas obtidas reforça, na maioria das opiniões, percepções extremamente positivas da EF enquanto vivência pessoal formativa. Palavras como "fantástica", "essencial", "espectacular", "fundamental", "a preferida", "tudo", "qualidade de vida" são o expoente extremamente positivo das percepções sobre a EF, em paralelo com outras que, apesar de positivas, serão menos fortes como "positiva", "boa" "qualidade", "comunicativa", "útil".

Gráfico 1 - Educação Física - conteúdo da palavra-síntese

    Também Leal e Carreiro da Costa (1997), no seu estudo com 257 alunos, concluíram que a EF, relativamente à preferência pelos alunos, apresentou sempre um elevado nível, destacando-se das restantes disciplinas no 2º e 3º Ciclo e sendo igualada pela Matemática no ensino secundário. O seu nível de aceitação decresceu sempre com a idade dos alunos, sendo os rapazes que mais valorizam a EF, relativamente às raparigas (Leal e Carreiro da Costa, 1997).

    Da totalidade das palavras-síntese com conteúdo positivo, houve um conjunto delas que se salientaram pela sua frequência. Assim, as três que obtiveram um maior número de referências foram as constantes do quadro 1 :

Quadro 1 - palavras-síntese mais referenciadas

    No âmbito duma percepção positiva da frequência da EF durante o percurso escolar, os inquiridos dão relevo ao carácter de ela lhes proporcionar momentos agradáveis e de descontracção. Importa aqui para já salientar o carácter catártico que de forma mais consistente transparece da prática da EF. A associação com a Saúde congrega ainda um número importante de opiniões.

    As percepções negativas da EF sintetizadas numa só palavra foram muito poucas (7 - 5.8%). Pelo seu reduzido número, talvez importe salientar as palavras-síntese utilizadas, que foram : "inútil", "desagradável", "preocupação", "chatice", "seca", "injustiça" e "cansativa". A maioria destas referências parece surgir a partir de experiências pessoais pouco gratificantes, senão mesmo penosas, do ponto de vista formativo. Quando alguém se refere a uma disciplina que frequentou durante vários anos como "seca" e/ou "chatice", tem claramente experiências muito pouco positivas daquilo que viveu nessa disciplina. Comparando com os valores do estudo de Gonçalves (1997), em que apenas 9.5% dos 398 alunos inquiridos manifestaram a sua pouca ou nula satisfação com a disciplina de EF, os nossos são muito próximos, já que apenas 5.4 % dos futuros professores se referiu ao seu percurso escolar em EF negativamente.

Quadro 2 - Categorias de Conteúdo das Palavras-Síntese e respectivas Frequências Relativas e Percentagens

    Os resultados globais evidenciam e destacam a categoria PRAZER/CATARSE (38 - 31.4 %) em relação a outras categorias. Os futuros professores do 1º CEB parecem valorizar, de forma mais pronunciada, dimensões que relevam do prazer da prática e do carácter catártico da EF. É assim que esta categoria congrega, de forma quase exclusiva, palavras-síntese como : "divertida", "divertimento", diversão", "descontracção", "descontrair-se" e "convívio". Parece ser valorizada uma perspectiva da EF com finalidades de fruição e carácter meramente utilitário. Ao contrário dos resultados do estudo já citado de Mourão (1997), em que os alunos valorizaram mais os aspectos relacionados com a promoção da aprendizagem, os futuros professores do 1º CEB parecem valorizar mais as dimensões da EF associadas ao facto de obterem satisfação, prazer, divertimento no âmbito da sua participação na aula. Esta questão não pode, quanto a nós, ser colocada em oposição. O prazer, a satisfação, o divertimento podem e devem estar presentes durante o processo ensino-aprendizagem de qualquer área de ensino. O problema coloca-se quando a hipervalorização das referidas dimensões oculta e/ou impede a percepção de dimensões de aprendizagem e desenvolvimento do aluno. Como refere Crum (1987), esse é o processo de impedir um ciclo de reprodução de percepções da EF não imbuídas de uma forte dimensão de aprendizagem. A segunda categoria AVALIAÇÃO DA ACÇÃO (23 - 19 %) é uma categoria em que são claramente emitidos juízos de valor sobre a qualidade da vivência da EF durante o percurso escolar, quase na sua totalidade de conteúdo positivo. Para a definição dos juízos de valor identificamos palavras-síntese como : "fantástica", "essencial", "fundamental", "muito agradável", "espectacular", "boa", "importante", "interessante", "util", em paralelo com juízos de pendor negativo "seca", "chatice", "inútil", "desagradável", "injustiça". Importa salientar a capacidade crítica revelada perante a EF, mas também a expressão dessa capacidade, através de juízos de valor. Por vezes, negligenciamos a visão crítica do nosso ensino por parte dos alunos e como se verifica eles têm opinião, sendo mesmo capazes de emitir juízos de valor avaliativos da própria prestação profissional, a partir da sua vivência da EF. As palavras-síntese ligadas à SAÚDE (17 - 14%) relevam de exemplos como "saúde", "bem estar", "saudável", "salubridade" como que inferindo as implicações da prática da EF no aluno. Há uma identificação com o impacto da frequência da EF na qualidade de vida, saúde e bem estar do aluno. A categoria DESENVOLVIMENTO DE CAPACIDADES (15 - 12.4 %) releva de palavras-síntese que associam o desenvolvimento global e/ou específico de capacidades no aluno. Encontramos expressões como "desenvolvimento", "boa forma", "preparação" que implicam uma visão da finalidade da EF no desenvolvimento do indivíduo. A categoria RELAÇÃO (15 - 12.4 %) englobou as palavras-síntese decorrentes de interacções pessoais como "amizade", "liberdade", "independência" e "camaradagem". A categoria TÉCNICA (9 - 7.4 %) incluiu variadas referencias à prática e à actividade como "desportiva" "bola", "actividade", "movimento", "desporto", "exercício". As duas últimas categorias ABRANGENTE (2 - 1.7 %) englobou menções totalizantes como "tudo". A categoria NÃO RESPONDE (2 - 1.7 %) teve reduzida expressão para o número total de inquiridos. A expressão das percepções positivas evidenciadas sobre o percurso escolar em EF é fundamental para qualquer abordagem de formação posterior, já que como identificou Carreiro da Costa et al. (1998) através de um estudo junto de actuais professores do 1º CEB, um quarto dos professores não teve EF durante toda a sua escolaridade.

Educação Física - Significados das Experiências

    Com a finalidade de identificar um sentido com significado, na identificação das dimensões das experiências positivas e negativas, considerámos pertinente apresentar e analisar os resultados, sem considerar a sua origem. Assim, os resultados englobando o somatório das categorias de conteúdo das experiências positivas e negativas em EF, é o apresentado no Quadro 3:

Quadro 3 - Somatório de Categorias das Experiências em EF. Frequências relativas e percentagens

    A categoria "CARACTERÍSTICAS DAS AULAS" (147 - 30.4%) assume grande peso na identificação de dimensões significativas nas experiências escolares em EF, pelo facto não só de ser a mais associada, mas principalmente por estar presente tanto como experiência positivo como negativa, sempre com elevado número de referências. Podemos assim, inferir que tanto positivo, como negativamente as dimensões vivenciadas pelos futuros professores do 1º CEB, que mais marcas, mais significado tiveram durante o seu percurso escolar em EF, estiveram ligadas à natureza das suas aulas de EF, ao nível das suas características. Reforça-se assim a noção de que o significado positivo ou negativo das suas experiências escolares em EF, não se pode dissociar da forma e da dinâmica com que viveram as suas aulas. Refira-se que de acordo com a tendência dos nossos resultados associados às características das aulas - tanto positiva como negativamente -, Leal e Carreiro da Costa (1997), tenham concluído que a dimensão clima de aula é o comportamento do professor de EF mais valorizado pelos alunos, o que vem reforçar a importância atribuída pelos futuros professores do 1º CEB a dimensões associadas a esta categoria.

    Apesar de surgir referenciada de seguida a categoria "BENEFÍCIOS DOS ALUNOS" (94 - 19.4%) situa-se exclusivamente no campo das experiências positivas dos futuros professores do 1º CEB, enquanto a categoria "NÃO RESPONDE" (74 - 15.3%) é fortemente determinada pelas experiências negativas em EF. A categoria "CURRÍCULO DA EF" (69 - 14.3%) surge em quarto lugar, denotando como a natureza da EF vivenciada pelos futuros professores do 1º CEB, não lhes é completamente indiferente. Também encerra o grupo de quatro categorias que sozinhas obtêm quase 80% das dimensões caracterizadoras das experiências escolares em EF dos futuros professores do 1º CEB. As restantes categorias têm, em função dos valores do estudo, um peso relativamente pouco significativo.


Educação Física - Experiências Positivas versus Experiências Negativas

    Na apresentação e análise dos resultados reveladores das experiências positivas e negativas agrupados em categorias de conteúdo (quadro 4), podemos salientar o peso das respostas positivas sobre as negativas, considerando a expressão da categoria NÃO RESPONDE (26.8%) em relação às experiências negativas em EF.

Quadro 4 - Categorias de Conteúdo das Experiências Positivas e Negativas em EF. Frequências relativas e percentagens

    Os resultados destacam as frequências relativas de duas categorias perante as outras. Trata-se da categoria BENEFÍCIOS DOS ALUNOS (94 - 38.8%), identificando aqui os alunos aspectos em que reconhecem vantagens para o seu desenvolvimento e aprendizagem ("manter boa forma", aprendizagem de vários jogos", "desenvolver algumas capacidades físicas", "bem estar" "preparação física") e CARACTERÍSTICAS DAS AULAS ( 94 - 38.8%) em que encontramos os aspectos da forma, dos processos e características relevantes da aula de EF para os alunos ("convívio", "descontração", "divertido", "liberdade"). Estas categorias destacam-se nas experiências positivas, com forte expressão. Nas experiências negativas, destacando-se a categoria NÃO RESPONDE (65 - 26.8%) volta a evidenciar-se a categoria CARACTERÍSTICAS DAS AULAS (53 - 21.9%) como aconteceu nas experiências positivas. Saliente-se a ausência de referências positivas associadas à categoria RECURSOS DA EF e que nas experiências negativas alcança alguma expressão (27 - 11.2%) indiciadora de insatisfação face às condições físicas e materiais do ensino da EF nas escolas. A categoria ATITUDES DOS ALUNOS (2 - 0.8%) são referidas residualmente nas experiências positivas assumindo maior expressão nas negativas (17 - 7%), englobando aspectos da relação educativa ("companheirismo", "relação com o professor", "sentido de equipa", "desportivismo"). A categoria CURRÍCULO da EF (39 - 16.1 versus 30 - 12.4%) que revela aspectos decorrentes do currículo ("basquetebol", "variedade de actividades", "parte prática", "andebol"), surge hierarquizada na mesma posição, tanto positiva como negativamente. Com reduzida expressão nas experiências positivas a categoria CARACTERÍSTICAS DOS PROFESSORES (2 - 0.8%) englobou menções genéricas a estes ("professora", "prof."), aumenta fortemente nas experiências negativas (16 - 6.6%).

    Nesta análise comparada refira-se a expressão da categoria OUTROS (22 - 9.1%) nas experiências negativas e a emergência de referências apenas associadas negativamente FACTORES DO SISTEMA EDUCATIVO (8 - 3.3%) e FACTORES DA GESTÃO DA ESCOLA (4 - 1.7%).


Educação Física - Experiências Positivas

    O primeiro destaque vai para igual repartição de valores absolutos entre duas categorias - "CARACTERÍSTICAS DAS AULAS" (94 - 38.8%) e "BENEFÍCIO DOS ALUNOS" (94 - 38.8%) - num número tão grande de experiências positivas em EF identificadas pelos inquiridos no seu percurso escolar.

    Numa perspectiva de análise interpretativa dos dados importa salientar algumas das categorias não só pela sua frequência, mas também pelo seu conteúdo. Assim, na categoria CARACTERÍSTICAS DAS AULAS (94 - 38.8 %) as dimensões mais representativas foram : "convívio" (21) seguido de "descontracção" (18), "espírito de equipa/grupo" (17) e "divertido" (12). Destaca-se, assim, a importância atribuída pelos futuros professores do 1º CEB ao carácter catártico da aula de EF, mas também de convívio e interacção com os outros. Estes resultados identificam, do ponto de vista de conteúdo as mesmas dimensões de Gonçalves (1997), relativamente à questão "para que servem as aulas de EF ?". Uma percentagem significativa de alunos desse estudo - 41.8 % - referiu a melhoria da saúde/condição física como razão primeira da utilidade da EF, surgindo o carácter catártico, divertimento - 21 % - de seguida.

    Na categoria BENEFÍCIOS DOS ALUNOS (94 - 38.8%) o peso esmagador de referências associadas à aptidão física (36) através de expressões como "preparação física", "mantém-nos em boa forma" "fazer exercício", "manutenção física", "exercício", seguida de outras associadas à saúde e bem estar (16), "melhora a saúde" , "bem estar" e "saudável", "aprendizagem de desportos" (7), e "preparação psicológica" (5). Também Leal e Carreiro da Costa (1997), no estudo já citado, reconhecem que os alunos atribuem maior valorização ao facto de poderem, através das aulas de EF, melhorar a sua condição física, as suas performances desportivas e ainda divertir-se, do que aprender novas coisas. É nesta linha que os nossos resultados, em que os futuros professores do 1º CEB atribuem fundamental importância aos benefícios da EF, se relacionam com os obtidos por Gonçalves (1997) relativamente ao que os alunos aprendem nas aulas de EF. Quase metade deles elegeu a aquisição ou aperfeiçoamento de técnicas desportivas como percepção mais forte (44.7 %). Referem-se de seguida ao conhecimento do funcionamento do corpo humano (17.6 %) nas percepções de aprendizagem em EF.


Educação Física - Experiências Negativas

    Na identificação de experiências negativas, destaca-se de forma explícita a categoria NÃO RESPONDE (65 - 26.8%) indiciador da dificuldade em identificar dimensões negativas. Desta forma, em que mais de ¼ das referências dos futuros professores do 1º CEB não identificam dimensões negativas, podemos interpretar tal facto como um reforço positivo das suas experiências escolares em EF. Apesar da expressão da categoria NÃO RESPONDE destacam-se outras como CARACTERÍSTICAS DAS AULAS (53 - 21.9 %), em que na sua esmagadora maioria as referências são centradas nas exigências intrínsecas à normal participação nas aulas de EF, ou seja, muitos dos futuros professores do 1º CEB associando o "cansaço"/esforço físico/esforço/cansativa" (19) a dimensões negativas da disciplina de EF. Para além desta referência salienta-se a identificação da competição (13) como uma das características negativas das aulas de EF através de expressões como "competição", "competição excessiva" "competitividade exagerada", como dimensão negativa das características das aulas de EF. Ao contrário do estudo de Leal e Carreiro da Costa (1997) em que os alunos valorizam mais as aulas de EF que são variadas, disciplinadas e que tenham competição, os futuros professores do 1º CEB revelam uma forte tendência para a associação da competição como dimensão negativa. Esta referência é negativamente referida pelos futuros professores do 1º CEB no seu percurso escolar em EF, eventualmente pelas características do nosso grupo de estudo, na sua esmagadora maioria do sexo feminino.

    Na categoria CURRÍCULO DE EF (30 - 12.4 %), a terceira a agrupar experiências negativas, destacam-se referências à organização curricular da disciplina e seus conteúdos. Neste campo destacam-se referências à gestão do tempo em EF (7) "ter mais horas", "pouco tempo de prática", "falta de tempo", "carga horária", "curta duração das aulas", que aglutinam opiniões de quem sente necessidade de desenvolver, durante um maior período de tempo, as práticas associadas à EF. Outras referências dentro desta categoria foram as relacionadas como a Ginástica (4) - "fazer o pino", "parte da aula sobre ginástica", "ginástica em aparelhos" - e Atletismo (4) "corridas", "atletismo" como as únicas duas modalidades associadas a experiências negativas pelos inquiridos. Em função destes dados, os futuros professores do 1º CEB, parecem gostar das Actividades Físicas e Desportivas que no contexto do currículo de EF viveram . Se tivermos em consideração o número de sujeitos envolvidos no presente estudo, temos que aceitar como muito poucas as referências negativas a Actividades Físicas e Desportivas. No entanto, na linha de diversos estudos, também os futuros professores do 1º CEB parecem identificar negativamente a actual situação da EF no currículo, que dá uma resposta insuficiente face às suas necessidades, não tanto em termos de conteúdo curricular, mas mais da quantidade da prática proporcionada. Estes resultados apontam no mesmo sentidos dos obtidos por Carreiro da Costa et al. (1998) em que os professores referiam como aspectos negativos da sua experiência escolar em EF a frequência e duração das aulas de EF, os recursos e os efeitos em termos da melhoria da Condição Física.

    A categoria RECURSOS DA EF (27 - 11.2 %) aglutinou todas as referências aos espaços, equipamentos e materiais necessários ao desenvolvimento de uma área específica como a EF. É significativo que seja mais uma das categorias que apenas é referida no campo das experiências negativas. A sua expressão apenas como experiência negativa na disciplina, evidencia como, apesar das alterações de condições em muitas escolas básicas e secundárias, na generalidade das nossas escolas, os espaços, equipamentos e materiais desportivos continuam a ser insuficientes aos olhos dos seus principais utilizadores. Este facto é mais relevante se pensarmos que a existência de melhores condições para a prática da EF contribui para uma atitude mais positiva face à escola (Carreiro da Costa et al., 1998). Os futuros professores do 1º CEB parecem sensíveis à qualidade dos espaços, equipamentos e materiais da EF disponibilizados em cada escola. As referências identificadas vão desde "falta de espaço", "falta de material", "equipamentos", até "instalações". A categoria OUTRAS (22 - 9.1 %) agrupou um leque diversificado de referências. No entanto destacou-se claramente as relacionadas com as lesões (16) de que os futuros professores do 1º CEB foram vítimas com maior ou menor gravidade1. Assim, desde simples referências como "algumas lesões", "uma lesão", "lesão num pé", "ferimentos" até outras que deixaram eventualmente marcas físicas e psicológicas de outra dimensão "quando parti um pé", "parti a clavícula", "torcer um pé 2 vezes e andar 1 mês de muletas". A expressão desta referência no contexto das experiências negativas em EF, coloca o problema do controlo dos riscos e segurança da EF e das Actividades Físicas e Desportivas em geral. Se podemos começar por equacionar a responsabilidade pedagógica das actividades realizadas, vimos como hoje em dia a responsabilidade civil assume importância na nossa sociedade. No entanto, sem esquecer esta perspectiva, valorizamos mais a questão pedagógica e profissional do controlo dos riscos e segurança, de maneira a formarmos alunos capazes de preservarem boas e gratificantes recordações da EF. Sabemos como uma experiência traumatizante numa qualquer actividade, poderá contribuir para a inibição da sua abordagem pedagógica como professor do 1º CEB, mesmo estando por vezes presentes todas as condições de segurança necessárias à sua realização. A categoria ATITUDES DOS ALUNOS (17 - 7 %) agrupou respostas que relevaram da apreciação das interacções entre alunos e que foram consideradas negativamente, podendo ser encontradas referências como "problemas relacionados com conflitos entre alunos", "falta de motivação", "individualismo", "troça por parte de alguns colegas". Muitas destas referências ficam na esfera emocional do aluno, não sendo na maioria das situações tidas em consideração pelo professor ou pelos colegas, mas deixando, em quem as vive, "marcas" e ligações afectivas, capazes de condicionarem o maior ou menor grau de satisfação para com a área de EF. O que nos leva a equacionar o carácter inclusivo como intrínseco da EF no contexto das suas práticas, porque infelizmente, muitas das práticas em EF na escola são deseducativas, sendo frequentemente a exclusão a norma em vez da inclusão (Carreiro da Costa, 1996) o que pode contribuir para atitudes ética e moralmente desaconselhadas.

    A categoria CARACTERÍSTICAS DOS PROFESSORES (16 - 6.6 %) é mais uma das que não tendo referências como experiência positiva, surge com alguma expressão no âmbito das experiências negativas em EF através de expressões simples como "professora" ou "alguns professores" até apreciações e juízos de valor sobre os professores ou o seu desempenho "professor sem capacidade", "falta de qualificações do professor", "falta de liderança", aludindo mesmo a atitudes profissionais como "faltas dadas pelo professor". Também ajuizando sobre o trabalho docente há quem refira "injustiça por parte do professor a atribuir as notas" ou mesmo o qualifique de "má orientação didáctica". Apesar da relativa pouca expressão das dimensões associadas a esta categoria, não deixa de se evidenciar uma capacidade crítica, com detalhe e de avaliação mesmo profissional. Não é apenas uma mera apreciação global, mas também análise e reflexão crítica sobre dimensões do exercício profissional, que parecem não passar despercebidos aos futuros professores do 1º CEB. A categoria FACTORES ASSOCIADOS AO SISTEMA EDUCATIVO (8 - 3.3 %) agrupando referências ao enquadramento macro-estrutural da disciplina no contexto do Sistema Educativo como "o facto de ser obrigatório", "baixar a média", "a nota não entrar na média". A categoria FACTORES DA GESTÃO DA ESCOLA (4 - 1.7 %) agrupou referências decorrentes de decisões a nível da escola na área da EF como "ser no meio das outras aulas", "o timing: antes de aulas teóricas faz com que o aluno tenha dificuldades de concentração".


Variação das Categorias versus Ano Lectivo

    Tendo este estudo sido desenvolvido ao longo de 4 anos lectivos, pensamos ter interesse analisar a forma como a ordenação das diferentes categorias variou ao longo dos anos lectivos. Os resultados apresentados no quadro 5 pretendem dar uma visão global da variação de ano lectivo para ano lectivo, relativamente às experiências positivas em EF.

Quadro 5 - Ordenação das Categorias de Análise das Experiências Positivas em EF / Anos Lectivos

    Duas categorias se destacam pelas posições principais - CARACTERÍSTICAS DAS AULAS E BENEFÍCIO DOS ALUNOS - que durante os 4 anos ocupam as duas primeiras posições. Esta ligação acentua-se quando nos dois primeiros anos lectivos (97/97 e 97/98) a primeira posição é ocupada pela CARACTERÍSTICAS DAS AULAS sendo substituída nos dois anos seguintes (98/99 e 99/2000) pela BENEFÍCIOS DOS ALUNOS e invertendo as posições. Na linha das reflexões sobre os dados anteriores, numa lógica global e sequencial, os futuros professores do 1º CEB evidenciam uma percepção positiva da EF em função da forma como a acção educativa se desenrola, bem como dos eventuais benefícios que essa vivência lhe poderá proporcionar. Este facto ajuda-nos a colocar a questão da importância não só da quantidade da prática da EF nas nossas escolas, mas antes da sua qualidade. A percepção positiva que sustentada ao longo dos anos pelos inquiridos, tem como base uma forte articulação entre a natureza e características das práticas em EF e as perspectivas de essas vivências estarem ligadas a benefícios individuais e/ou colectivos, nas mais diversificadas dimensões (ex : da saúde à aprendizagem). Apenas um destaque para o facto da CURRÍCULO DA EF se manter na terceira posição em todos os anos lectivos à excepção de 96/97. Ao longo dos anos o número de categorias que agrupam as dimensões que caracterizam as experiências positivas, é de 5 (com a excepção de 99/2000 que foi de 4), o que denota uma concentração de percepções sobre a natureza e características da visão positiva da EF no percurso escolar dos futuros professores do 1º CEB.

    Os resultados da ordenação das categorias ao longo dos 4 anos lectivos relativamente às experiências negativas em EF são a constante do quadro 6:

Quadro 6 - Ordenação das Categorias de Análise das Experiências Negativas em EF / Anos Lectivos

    Aqui o destaque maior é o papel quase dominante da NÃO RESPONDE que em 3 dos 4 anos lectivos é a mais referida. Curiosamente no ano lectivo em que não é primeiro (97/98) ocupa o penúltimo lugar na ordenação das categorias. Este resultado coloca-nos perante uma reflexão que reforce as opiniões extremamente positivas já anteriormente identificadas ou uma ausência de resposta potencialmente especulativa. É nosso entendimento, a partir do cruzamento dos resultados, nomeadamente as respostas à questão 2 (EF - palavra-síntese) podermos interpretar este resultado, mais como um reforço das percepções positivas. A categoria CARACTERÍSTICAS DAS AULAS continua com destaque, mas muito menor do que nas referências positivas. Surgem sim outras categorias não referenciadas nas experiências positivas, como RECURSOS DA EDUCAÇÃO FÍSICA e outras com maior ênfase ATITUDES DOS ALUNOS e CURRÍCULO DA EF. Globalmente há uma muito evidente maior dispersão das experiências negativas dos futuros professores do 1º CEB, relativamente às experiências positivas. Nestas o número de categorias foi de 4/5 ao longo dos anos lectivos, enquanto nas negativas oscilou entre 8/9 categorias. Será caso para podermos referir uma maior coesão na identificação de experiências positivas em EF, por oposição às negativas com um largo espectro de opiniões.

    Se a EF representa para o professor um conjunto de oportunidades educativas relacionadas com as Actividades Físicas e Desportivas, a Saúde e o Bem-estar dos alunos, estes parecem associá-la mais às características proporcionadas pela natureza da acção e principalmente das relações pessoais e suas interacções. O aluno parece centrar-se no prazer do momento, na vivência agradável do convívio com os colegas, enquanto o professor se preocupa com a aprendizagem. Na linha do que Placek (1983) popularizou, como concepção de sucesso no ensino da EF salienta-se : alunos ocupados, bem comportados e satisfeitos. Mas não podem existir incompatibilidades. A natureza intrínseca da EF é indissociável da alegria, do prazer, do convívio e das interacções pessoais entre os participantes.

Conclusões

    Com a realização deste estudo de identificação e análise da natureza das experiências escolares na disciplina de EF, podemos concluir que os futuros professores do 1º CEB:

  • identificam muito positivamente a percepção da EF no seu percurso escolar;

  • as dimensões mais associadas ao significado das suas experiências escolares em EF, decorrem das "características das aulas";

  • as dimensões alusivas às experiências positivas em EF estão maioritariamente associadas às "características das aulas" e à percepção de "benefício para os alunos" que, ao longo dos quatro anos lectivos em estudo, são as mais representativas;

  • não identificam - pela ausência de resposta - dimensões negativas no seu percurso escolar em EF. As ausências de resposta na associação a experiências negativas em EF é muito forte, o que, cruzando com os resultados anteriores, os vem confirmar. Saliente-se que, em três dos quatro anos lectivos, é aquela a categoria mais representativa;

  • para além da não identificação, associam as "características das aulas", o "currículo da EF" e os "recursos da EF", entre outras a dimensões negativas do seu percurso escolar em EF;

  • associam também a dimensões negativas do seu percurso na EF aspectos nunca referidos positivamente, como : a quantidade e qualidade dos recursos materiais da EF, factores decorrentes do Sistema Educativo e factores da própria gestão da escola;

  • associam mais as dimensões das características dos professores a aspectos negativos do seu percurso escolar em EF do que aos positivos;

  • fazem uma clara distinção entre as dimensões que caracterizam como positivas ou negativas na disciplina de EF. As suas dimensões positivas são identificadas de uma forma mais consensual, directa e objectiva, enquanto que as negativas revelam grande dispersão e heterogeneidade de percepções;

  • parecem estar mais de acordo na identificação das dimensões positivas (4-5 categorias nos 4 anos lectivos estudados) do que nas negativas nas quais os consensos são muito menores (8-9 categorias nos 4 anos lectivos estudados);

  • dão relevo ao papel nuclear e decisivo do professor na construção curricular, na medida em que as suas percepções são principalmente centradas nas variáveis de ensino que dele dependem (características das aulas, benefício dos alunos, currículo de EF, ...);


Notas

  1. Marca - "sinal distintivo"; "cunho"; "limite"; "fronteira"; - Costa, J. A & Melo Sampaio (1992) Dicionário de Língua Portuguesa

  2. Questionário junto de alunos do 2º Ano da Licenciatura em Ensino Básico - 1º Ciclo, Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa da Universidade de Aveiro (1999/2000).

  3. Refira-se que num estudo por nós realizado a partir do que pensam e dizem fazer 47 professores do 1º CEB em exercício de funções docentes no ano lectivo 1996/97, uma das suas principais dificuldades identificadas para a intervenção na área de EF eram precisamente as questões das condições materiais das escolas, da sua própria formação e das lesões dos alunos (NEVES, 1997)


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