Autopercepção dos alunos do curso de Educação Física da UCB quanto ao domínio da língua portuguesa |
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* Mestre em Educação, Professora e Assessora do Curso de Educação Física da Universidade Católica de Brasília - UCB. **Alunos do Curso de Graduação em Educação Física da Universidade Católica de Brasília - UCB. (Brasil) |
Sandra Mara Bessa Ferreira* | Guilherme Costa e Lima Jonathas Cabral Borges | Marco Antônio Caetano Júnior Marcus Vinícius Casqueiro Gois | Rafael de Abreu Inácio** sandram@ucb.br |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 76 - Septiembre de 2004 |
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Introdução
O uso da leitura é imprescindível em nosso cotidiano. O hábito de ler permite-nos ampliar nossos conhecimentos em relação a diversos meios como o cultural e o profissional. Mas o domínio da leitura não se prende só a estes aspectos, pois o principal destes é a educação. É através dela que o indivíduo adquire uma base para a formação de valores e consolidação dos mais variados saberes, o que nos permite compreender o que se passa ao nosso redor, ampliando nossa cosmovisão.
A falta de domínio da língua acarreta a marginalização diante de um mundo repleto de acontecimentos que muitas vezes só são notados através da leitura, seja de um jornal, livro ou revista. No mercado atual, o mínimo que se exige para exercer bem uma profissão, é que o profissional saiba se expressar de uma forma clara, seja através da escrita ou da oralidade, mostrando uma comunicação fluente para que consiga resolver determinadas situações cotidianas.
A pessoa que se comunica adequadamente conduz discussões construtivas e interessantes sobre variados assuntos sem que o diálogo se torne desinteressante. Hoje saber ler, escrever e se comunicar tornou-se fundamental para que o indivíduo construa seu próprio espaço numa sociedade que tem a seu dispor uma enormidade de conhecimentos. Evidencia-se, assim, que a leitura revela-se mais uma vez como instrumento de obtenção de informações sobre as experiências acadêmicas, científicas e culturais dos povos ou grupos sociais.
Eni Orlandi afirma, nesse sentido, que "A leitura não é uma questão de tudo ou nada, é uma questão de natureza, de modos de relação, de trabalho, de produção de sentidos, em uma palavra: historicidade". (Rocco, 2003: s/p)
As dificuldades de compreensão e produção textual resultam, muitas vezes, da ausência de hábitos de leitura, desde simples notícias até informações acadêmicas, o que compromete a principal forma de desenvolvimento da capacidade de intelecção de textos. É imprescindível lembrar que o domínio da língua não é um dom e sim uma habilidade que pode ser adquirida em qualquer momento de nossas vidas.
Este artigo tem como objetivo analisar a importância do domínio do idioma para o mercado de trabalho, que exige cada vez mais profissionais que primem pela capacidade de persuasão e uso adequado da linguagem, bem como analisar de que maneira o homem lida com a questão da comunicação na profissão e no gerenciamento da própria comunicação. Nesse sentido, não cabem mais visões equivocadas de que em algumas profissões é preciso dominar a língua materna e que em outras isto seria dispensável. Em nosso estudo, pretendemos ainda verificar como o aluno do Curso de Educação Física se vê nesse contexto que ora se configura.
O domínio da Língua Portuguesa e sua importânciaLer, escrever e falar são fatores que devem ser respeitados e dominados, são fatores primordiais para a tentativa do alcance dos principais objetivos relativos ao futuro. Não se pode esquecer de uma comunicação adequada para facilitar a obtenção das metas pretendidas. Falar, de acordo com o dicionário, significa dizer, proferir, conversar, articular palavras, discutir: Escrever tem como significado redigir, compor, rabiscar, garatujar. Ler, segundo Leonardo Boff significa:
"reler e compreender, interpretar. Cada um lê com os olhos que tem. E interpreta a partir de onde os pés pisam. Todo ponto de vista é a vista de um ponto. Para entender como alguém lê, é necessário saber como são seus olhos e qual é a sua visão de mundo. Isso faz da leitura sempre uma releitura. A cabeça pensa de onde os pés pisam. Para compreender é essencial conhecer o lugar social de quem olha. Vale dizer, como alguém vive, com que convive, que experiências tem, em que trabalha, que desejos alimenta, como assume os dramas da vida e da morte e que esperanças o animam. Isso faz da compreensão sempre uma interpretação, Sendo assim, fica evidente que cada leitor é co-autor. Por que cada um lê e relê com os olhos que tem, pois compreende e interpreta a partir do mundo em que habita". (2001: s/p)
Há diversos tipos de leitura, escrita e fala que auxiliam as pessoas a compreenderem e entenderem mais acerca de determinados assuntos, além disso, estes ajudam na aquisição de conhecimentos. Está comprovado que a educação básica não prepara o aluno para a vida, no que tange principalmente, ao domínio da língua portuguesa. A maior parte das pessoas que saem do ensino médio não sabe ler, compreender, reescrever ou recriar com qualidade, para sua comunicação, utilizam-se excessivamente, de gírias, independente do contexto em que estão inseridas, afastando-se ainda mais da norma culta, e mostrando total despreparo para o mercado de trabalho que se torna cada vez mais exigente.
Cada dia mais é necessário se atender a exigência de um domínio da língua portuguesa e só se consegue um amplo entendimento desta, através da fala, leitura e escrita de qualidade, principalmente, quando se quer alcançar as metas programadas para o futuro. João Gabriel Lima, em seu texto "Falar e Escrever, Eis a Questão" diz que:
"as pessoas finalmente perceberam que precisam dominar a norma culta do idioma. Principalmente na vida profissional, pois nunca, no mundo corporativo, houve tantas reuniões e apresentações. Quem não consegue articular pensamentos com clareza e coesão tem um grande entrave à ascensão na carreira. A invenção do e-mail contribuiu para este quadro, ao incrementar também a comunicação por escrito dentro das empresas. Na Nestlé, por exemplo, o número de mensagens eletrônicas trocadas entre funcionários dobra a cada ano. Foram dois milhões em 1999, quatro milhões em 2000, e até o fim de 2001, esses números devem chegar a oito milhões. É obvio que é péssimo para a imagem de alguém enviar a seu chefe um e-mail confuso ou com erros de português" (2001: 104)
O domínio da língua portuguesa é importantíssimo para qualquer profissional. Tanto que, na hora de admitir novos funcionários, muitas empresas optam por fazer um teste de expressão escrita, é o que informa Carlos Faccina, diretor de recursos humanos da Nestlé. (Lima, 2001, p. 104). Muitas pessoas devido ao desconhecimento da norma gramatical impedem seu próprio sucesso na vida profissional, pois não conseguem manter uma comunicação adequada com outros profissionais, portanto é fundamental que se ingresse no mercado de trabalho com seu potencial comunicativo bem desenvolvido, sendo capaz de comunicar suas idéias com clareza e coerência, utilizando-se de um vocabulário fluente, vasto, de forma a manter uma comunicação de mesmo nível ou superior à de seus concorrentes.
Existem vários objetivos para a leitura que compreendem desde a leitura para obter informações, a leitura recreativa, até a leitura que visa apreender e reter conhecimentos. Em relação a esse último tipo de leitura, pode-se realizá-la de forma dividida em: leitura inspencional (consiste em extrair o máximo de um texto, num tempo limitado), leitura analítica (busca a assimilação de novos conhecimentos a partir de conhecimentos prévios já acumulados pelo leitor), e leitura crítica (consiste em ler, estabelecendo conclusões acerca da intencionalidade do texto e da ideologia que lhe subjaz). Pode-se fazer um paralelo entre fala, linguagem e comunicação adequada, já que estas mantêm uma relação de interdependência, além disso, a linguagem aparece de diversas formas. Existe a linguagem coloquial ou popular que é a linguagem empregada no cotidiano, em situações sem formalidade; há a linguagem literária que é aquela usada por poetas e prosadores e existe também a norma culta usada em ocasiões de maior formalidade, é o registro falado pelas classes sociais mais privilegiadas, é importante dizer que nem sempre usar a linguagem de maneira mais rebuscada, ao se utilizar a norma culta, significa saber do que se está falando, "Num país com tantas incoerências educacionais, falar de maneira rebuscada é indicador de status, mesmo que o falante não esteja dizendo coisa com coisa" afirma o professor Francisco Platão Savioli, da Universidade de São Paulo. (Lima, 2001: 104)
No Brasil, foi comprovado que grande parte dos estudantes não entende o que lêem. Isso se deve a uma multiplicidade de fatores que levam ao desinteresse e à falta de hábito de ler, o que acarreta a ineficiência em interpretar qualquer tipo de texto e, principalmente, deficiências em comunicar-se, seja na modalidade falada ou escrita.
"Com uma nota média de 396, numa escala de zero a 800, os estudantes brasileiros ficaram em 37ª posição na prova de leitura do Programa Internacional de Avaliação de Alunos, o Pisa, aplicado a uma amostra de adolescentes com 15 anos de idade de 41 países. Nos resultados do teste de 2000, o Brasil havia ficado em último lugar entre 31 países participantes, mas, com o ingresso de mais dez nações, o chamado "Pisa Ampliado", com provas aplicadas em 2001, o patamar de colocação do País mudou. Na prova de leitura, o Brasil fica à frente de quatro nações: Macedônia, Indonésia, Albânia e Peru. Nas provas de matemática, com média de 334, e ciências, em que obteve pontuação de 375, o País é o penúltimo, ficando apenas em melhor posição que o Peru. Na média das três áreas avaliadas, o desempenho brasileiro também ficou em penúltimo lugar. 'Os dados revelados pelo Pisa vêm confirmar o que já era do conhecimento do Ministério da Educação', afirma Maria José Féres, Secretária de Educação Fundamental do MEC. Ela lembra que, recentemente, o Ministério divulgou uma pesquisa apontando a grave crise pela qual passa a educação brasileira. O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) constatou que 59% dos estudantes da quarta série do ensino fundamental ainda não desenvolveram as competências básicas de leitura." (Brasil, 2003: s/p)
Se observarmos a problemática da linguagem para o âmbito profissional da Educação Física, percebe-se que um grande obstáculo que esse profissional enfrenta é dispor de uma linguagem adequada (simples ou mais culta) com diferentes alunos, cujas variedades lingüísticas são enormes. A simples demonstração de movimentos técnicos não é suficiente para um perfeito entendimento por parte do receptor, se a linguagem usada pelo emissor é confusa (cf. Vanoye, 1991: 15), o que derruba de imediato atitudes ou causas de certos profissionais. Um ensino mais completo vem então, da junção de uma boa demonstração técnica, aliada a uma linguagem que alcance pleno entendimento. Tal ferramenta sempre utilizada por tal profissional, em qualquer momento de trabalho, deve ser bem manejada a fim de evitar danos a sua atuação. A linguagem, assim como uma ferramenta, precisa de cuidados para se aperfeiçoar (cf. Câmara Júnior, 1999, p.15). Para que idéias venham a ser transmitidas corretamente, além das técnicas corporais, o indivíduo precisa unir conhecimento e concatenação plena do pensamento para que sua mensagem possa ser passada e assimilada com sucesso. (cf. Câmara Júnior, 1999: 12).
Em virtude desse aspecto, é que se deve ter em mente a intervenção do profissional de Educação Física, cujos parâmetros são assim apresentados pelo CONFEF (Conselho Federal de Educação Física):
"Considerando as exigências de qualidade e de ética profissional nas intervenções, o Profissional de Educação Física deverá estar capacitado entre outros, a
Compreender, analisar, estudar, pesquisar (profissional e academicamente), esclarecer, transmitir e aplicar os conhecimentos biopsicossociais e pedagógicos da atividade física e desportiva nas suas diversas manifestações, levando em conta o contexto histórico cultural;
Atuar em todas as dimensões de seu campo profissional, o que supõe pleno domínio da natureza do conhecimento da Educação Física e das práticas essenciais de sua produção, difusão, socialização e de competências técnico-instrumentais a partir de uma atitude crítico-reflexiva e ética;
Disseminar e aplicar conhecimentos práticos e teóricos sobre a Educação Física (Atividade Física/Motricidade Humana/Movimento Humano), analisando-os na relação dinâmica entre o ser humano e o meio ambiente."
(CONEF, Intervenção do Profissional de Educação Física, 2002: s/p).Tal capacitação só é possível para aqueles que dominam sua língua materna em plenitude. O Código de Ética também o ratifica ao tratar das responsabilidades, deveres e proibições, em seu Artigo 1:
Entre outros, "São deveres e responsabilidades dos profissionais de Educação Física:
(Código de Ética, 2000: s/p)
Assegurar a seus clientes um serviço profissional seguro, competente e atualizado, livre de danos decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência, utilizando todo seu conhecimento, habilidade e experiência;
Orientar seu cliente, de preferência por escrito, quanto às atividades ou exercícios recomendados, levando-se em conta suas condições gerais de saúde;
Manter-se atualizado dos conhecimentos técnicos, científicos e culturais no sentido de prestar o melhor serviço e contribuir para o desenvolvimento da profissão;
Promover e/ou facilitar o aperfeiçoamento técnico, científico e cultural do pessoal sob sua orientação profissional;
Manter-se atualizado, cumprindo e fazendo cumprir os preceitos éticos e legais da profissão;
Emitir publicamente parecer técnico sobre questões pertinentes ao campo profissional, respeitando os princípios éticos deste código, os preceitos legais e o interesse público."
É preciso, portanto, que se desmistifique a visão de que o profissional de Educação Física é alguém que apenas pratique esportes, sem qualquer fundamento teórico que embase sua prática.
Comunicar-se de forma adequada, em um mundo cada vez mais exigente, passou a ser um pré-requisito para um bom convívio na sociedade. No entanto, deve-se observar a pessoa com quem se anseia iniciar uma comunicação verbal ou não verbal, observando o seu grupo social, etnia, sua formação como ser humano e a situação em que ela se encontra. Assim, compreende-se que, em muitas situações do dia-a-dia, não se faz necessária a utilização de uma linguagem culta, formal, pois muitas pessoas não compreenderão a mensagem que tem como intenção transmitir alguma informação, ou com simples objetivo de manter uma comunicação informal. Esse pode ser um paralelo feito entre comunicar-se e a linguagem que deve ser utilizada ao se manter uma comunicação com uma determinada pessoa. A escrita está relacionada às regras gramaticais, isto ocorre porque não há como se escrever da mesma forma que se fala, por isso, geralmente, ao se escrever são empregadas construções mais complexas, mais planejadas com emprego de sinais de pontuação. Com um bom embasamento através da leitura e com o conhecimento reflexivo das regras gramaticais que auxiliam na escrita, é bem mais fácil se compreender um texto e conseqüentemente, o assunto que está sendo tratado. É importante dizer que todos esses pontos abordados, leitura, escrita, fala, linguagem, comunicação adequada estão muito bem interligadas e são indispensáveis para um amplo domínio da língua portuguesa.
A partir do momento em que se inicia um diálogo, é indispensável saber comunicar-se, não apenas utilizando uma fala correta com um vocabulário amplo, que nem sempre é necessário, como também de forma coerente, de modo que faça com que o ouvinte tenha uma maior confiança e seja persuadido, gerando assim, credibilidade diante de um grupo que pode ser tanto de amigos ou até mesmo de uma empresa renomada, só que para persuadir alguém, é necessário que se tenha um amplo conhecimento sobre o assunto que está sendo tratado. É nesse contexto que se insere a leitura e uma boa capacidade de se expressar através da escrita; quem possui essas habilidades, quase sempre, tem uma ótima aptidão para persuadir outras pessoas. Podem-se citar vários exemplos relacionados a isso como: uma pessoa, que precisa apresentar um projeto numa empresa, necessita de um bom embasamento teórico que é conseguido através da leitura. Para ter seu projeto aprovado, é necessário comunicar sobre o seu projeto. Desde o início da vida, é exigida uma boa capacidade de convencimento. Nesse contexto, Câmara cita Emerson, em seus ensaios: "O homem é apenas metade de si mesmo; a outra metade é sua expressão". (1986: 164).
A paz na comunicação pessoal só será alcançada quando no ato de comunicação, as pessoas consigam se expressar de maneira a convencer pelo diálogo, expondo suas idéias de forma convincente e respeitosa e, dessa forma, interajam com o grupo em que estejam, sabendo que a palavra tem o poder de mudar realidades muitas vezes adversas.
MetodologiaNo intuito de verificar a auto-percepção dos alunos do Curso de Educação Física, quanto ao domínio da Língua Portuguesa, foi realizada uma pesquisa na Universidade Católica de Brasília com 320 alunos escolhidos aleatoriamente (adotou-se o critério de sorteio de turmas que estariam respondendo ao questionário), dos quais 8 não devolveram.. Tal amostra representa, aproximadamente, 17 % do total de alunos do curso, permitindo uma confiabilidade de 95%.
Caracterizando-se como um estudo de caso, o número de alunos respondentes constitui uma amostra significativa para a formulação de um perfil do aluno do curso sob o prisma de sua atitude em relação às suas próprias habilidades e competências lingüísticas. O instrumento de pesquisa utilizado foi um questionário, composto de seis questões fechadas, as quais contemplam os seguintes aspectos: nível de conhecimento do idioma; domínio da fala; dificuldades encontradas na redação de textos; qualidade de escritura de textos; motivação na leitura de textos e perspectivas quanto ao aprendizado da língua materna. As questões propostas advêm, em sua maioria absoluta, de questionário apresentado às turmas de Língua e Comunicação Virtual à guisa de apresentação da disciplina. No questionário, não se fez levantamento de dados pessoais da amostra, já que se trata de escolha aleatória simples e o curso já conta com a caracterização dos matriculados em 2003, o que nos permite inferir que sua população é, em termos gerais, composta de 60,2% de alunos do sexo masculino e 37,4% do sexo feminino (2,4% não responderam). Quanto à idade, até 20 anos, 43,9%; de 20 até 25 anos, 28,5%; de 25 até 30 anos, 19,55%; acima de 30 anos, 4,9%; não preenchidos, 3,3%. 67,5% destes alunos concluíram o ensino médio em escola pública; 26,0%, em escola particular; e 6,5% não responderam. Ao serem questionados sobre o porquê da escolha do curso, 0,8% respondeu que é mais fácil de passar; 79,5% que o curso corresponde à sua vocação; 11,5% porque a área oferece um bom campo profissional; 0,8% não há outra alternativa na UCB e 7,4% não responderam.
A pesquisa realizou-se no dia 03 de outubro de 2003, nas salas de aula, nos turnos matutino e noturno, tendo sido aplicada pelos próprios pesquisadores. Não foram aplicados questionários no turno vespertino, tendo em vista que tais turmas não chegaram ainda ao 8º semestre, o que poderia acarretar um viés à pesquisa, já que alunos em final de curso podem ter desenvolvido atitudes diferenciadas quanto ao domínio do idioma. As perguntas foram entregues em formulário próprio, por escrito.
Para categorização dos dados foi realizada a análise estatística de natureza descritiva. O resultado obtido encontra-se compilado e analisado no item Resultados e Discussão.
Resultados e discussãoDe acordo com os resultados obtidos na tabela 1, foi comprovado que 71,5% dos acadêmicos que participaram deste levantamento de dados conhecem a língua portuguesa o suficiente para "não fazer feio", ou seja, conhecem razoavelmente bem o código lingüístico, porém não se preocupam muito com o seu pleno domínio. É importante salientar que 10,9% dos estudantes pensam que sabem mal o português para o nível universitário que alcançaram. Isso é um fator preocupante devido à necessidade do domínio da língua durante a vida acadêmica, bem como é hoje uma exigência premente do mercado de trabalho.
Tabela 1: Nível de conhecimento do idioma
Legenda: 1.1 = Mal, para o nível universitário que alcançou;
1.2 = O suficiente para "não fazer feio";
1.3 = Bem, e estuda apenas para melhorar.Tratando-se da comunicação na modalidade falada (Tabela 2), 59% das pessoas envolvidas nesta pesquisa relataram que falam o português sem problemas, se for no registro informal. Isto mostra a falta de preocupação em relação à norma culta da linguagem e conseqüentemente, que é utilizado predominantemente o registro coloquial.
Entretanto, não são todos que se comportam dessa maneira, pois 30,8% dos entrevistados comunicam-se com desembaraço, em situações formais e informais, demonstrando, assim, estarem atentos para a necessidade de adaptação da linguagem aos diferentes contextos em que vivem. É preciso observar, no entanto, que 9,3% afirmaram que hesitam e cometem erros freqüentes ao se pronunciarem, o que pode ser considerada uma situação grave na medida em que tais pessoas estão na universidade, passaram por processos de seleção e constituem o que comumente se chama de elite intelectual do país.
Tabela 2: Domínio da fala
Legenda: 2.1 = Hesitando e cometendo erros freqüentes;
2.2 = Sem problemas, se for no registro informal;
2.3 = Com desembaraço, em situações formais e informais.
No âmbito da linguagem em sua forma escrita, com relação à elaboração de textos (Tabela 3), muitos sentem dificuldades no ato de redigi-los. Isso é demonstrado nos dados estatísticos da tabela 3, já que 64,7% possuem dificuldades em apenas uma ou duas das fases da construção textual, ou seja, problemas com o meio e o fim, início e meio, início e fim ou mesmo somente em uma das fases, seja na introdução, no desenvolvimento ou na conclusão. Isso acontece devido a dois motivos principais: o mau hábito da leitura e uma falta de base no ensino fundamental e médio. Pode-se destacar que 12,2% dos entrevistados têm dificuldade para iniciar, desenvolver e finalizar um texto, esta é uma porcentagem relativamente alta, quando se considera que são estudantes de nível universitário.
Tabela 3: A redação de textos
A gramática é o principal entrave para o domínio da língua pela população, devido à sua dificuldade pelo seu excesso de regras, porém é uma ótima fonte de pesquisa que ajuda a todos quando da utilização da linguagem escrita (Tabela 4). Tal dificuldade acarreta problemas na escrita, como foi comprovado nesta pesquisa e pode ser constatado na Tabela 4, em que 57,1% dos indivíduos consultados têm dúvidas, mas conseguem resolvê-las consultando gramáticas, dicionários ou outras pessoas. Este fato pode indicar que os estudantes possuem interesse em desenvolver cada vez melhor o texto acadêmico, através de diversos tipos de consultas. Já 15,1% não têm dúvidas e ficam satisfeitos com o que produzem, demonstrando possivelmente que dominam a língua em sua modalidade escrita. Em 27,9% dos casos, os alunos indicam a dificuldade que têm de revisar os próprios textos, nem sempre conseguindo identificar os equívocos que cometem, o que, provavelmente, pode comprometer a qualidade dos textos por eles produzidos.
Tabela 4: Escritura de textos
A leitura pode abranger várias áreas em atendimento a diferentes objetivos. Nesta pesquisa, tomou-se como base a leitura como fonte de prazer, de conhecimento acadêmico e/ou de conhecimento geral (Tabela 5). Com relação à fonte de prazer, 45,5% acham que a leitura atende parcialmente a este objetivo, 37,5% consideram que o ato de ler atende completamente a essa expectativa, enquanto somente 15,7% pensam que a leitura não atende às suas expectativas como fonte de prazer.
Já na questão que diz respeito à expectativa ligada à fonte de conhecimento acadêmico, 55,8% responderam que a leitura atende plenamente às suas necessidades, 38,1% relatam que a leitura atende parcialmente à busca pelo conhecimento na universidade e 4,8% não lêem como forma de obter informações acadêmicas. Se somados os dois últimos índices, há que se refletir sobre a gravidade de seus indicadores, tendo em vista que 42,9% buscam parcialmente ou não buscam, na leitura, os conhecimentos necessários à sua formação acadêmica e, portanto, profissional. Cabe, então, questionar: onde buscam tais informações? Será que julgam as aulas fonte suficiente para a aquisição de conhecimentos?
Quanto ao aspecto de aquisição de conhecimento geral, 51% opinaram que atende às suas expectativas, já 37,2% responderam que atende parcialmente e apenas 10,6% responderam não atender a suas necessidades de obter conhecimentos de maneira geral. Tais dados tendem a indicar que o universitário preocupa-se demasiadamente com o conhecimento acadêmico específico da profissão em detrimento de uma visão holística do mundo em que vive, o que, certamente, propicia um diferencial entre estes profissionais e aqueles que se restringem aos conhecimentos específicos de sua área. Essa postura pode ser elemento impeditivo no que diz respeito à capacidade profissional de adaptar-se a novas realidades que futuramente alterem as características de sua área de atuação que se configurem, como tem acontecido no presente momento, em novos contextos e muitas vezes no desaparecimento de profissões e no surgimento de outras tantas. Não responderam a essa questão 4 respondentes (1,3%).
Tabela 5: Motivação para a leitura
A maior parte dos respondentes sabem da necessidade de aprimorar o seu conhecimento em português, como pode ser visto nos resultados obtidos, em que 7,7% disseram que nunca irão dominar o idioma; 20,5% que irão aprender só depois de muito esforço; já 68,3% que é necessário e é bom, já que esse código é utilizado a todo o momento e apenas 2,9% responderam que não há necessidade de dominar o português. A tendência de que há uma real necessidade de dominar o idioma vem crescendo não só entre jovens estudantes, universitários ou não, mas decorre inegavelmente da pressão do mercado de trabalho em ter profissionais que se comuniquem com grande proficiência, bem como decorre do fato de que vivemos em um mundo globalizado que demanda que se esteja atento à atual crise de socialização, advinda muitas vezes das dificuldades de comunicação interativa, ética e humanizadora. Há que se ter clareza, ainda, de que dominar a língua materna e saber utilizá-la em múltiplos contextos não depende de um dom, mas de sim de uma prática que leve ao aprimoramento de habilidades de que já dispomos.
Tabela 6: Ao pensar em estudar português
Conclusão
O hábito de leitura e o conhecimento da língua portuguesa são cada vez mais cobrados em qualquer situação. Mário Quintana (In: Pereira, 1997: s/p) nos faz refletir que "O mais difícil, mesmo, é o ato de desler.", chamando- nos atenção para o fato de que a leitura é também a desconstrução do texto. Até mesmo no dia a dia, em uma conversa com amigos ou numa reunião de trabalho, é necessário que se domine tal competência de forma a não impedir as múltiplas possibilidades de interação e, conseqüentemente, de aprendizado.
De maneira geral, a comunicação deve-se ao esforço, à persistência e as oportunidades de cada um em aprender, estudar, conseguir interagir com o mundo, com as novas tecnologias. Tais elementos permitem ao egresso da universidade entrar no mercado, sentindo-se mais seguro e preparado, tendo em vista que a competição por um lugar ao sol, como profissional, está cada dia mais acirrada e exige de todos maior qualificação. Nesse sentido, quem não se comunica bem, em qualquer segmento da sociedade, não se destaca nem na sua vida pessoal, nem na profissional. Em que pesem outras variáveis, o conhecimento é a base para um diálogo coerente e bem fundamentado. Segundo Bonald, "O homem não pode pensar seu pensamento sem pensar sua palavra." (In: Pereira, 1997: s/p)
Tal concepção pressupõe que nenhuma área esteja isenta da responsabilidade, e porque não dizer, da necessidade, de adquirir conhecimentos, mas ao contrário, deve-se aprender cada vez mais sobre os mais variados campos, que vão desde valores éticos a conhecimentos técnicos, acadêmicos e científicos. Um aprendizado que requer estudos, ou seja, leitura e diálogo.
O pensamento de que a carreira de um profissional de Educação Física se resume apenas a prática ou mesmo a orientação para a prática de esportes se mostra, no mínimo equivocado, pois a necessidade do intelecto no que se refere a dominar a língua portuguesa em sua forma falada e escrita, se torna imprescindível no mercado de trabalho e também no próprio desenvolvimento da carreira. A atuação desse profissional, no que diz respeito à fala, precisa ser multidimensional, ou seja, ele precisa utilizar apropriadamente diferentes linguagens, que atinjam às diversas características lingüísticas de seus clientes e alunos.
Na pesquisa realizada, cujos resultados são apresentados neste artigo, evidenciou-se, em termos gerais, que os estudantes do Curso de Educação Física da Universidade Católica de Brasília, segundo a concepção que têm de si mesmos, apresentam um nível mediano do domínio da língua materna. Isso nos permite inferir que tais pessoas saem do Ensino Médio despreparadas para a Educação Superior, bem como permite-nos salientar que o hábito da leitura precisa ser consolidado de forma que cada cidadão exercite sua expressão e se faça entender por todos. Segundo Paulo Freire, "estudar não é um ato de consumir idéias, mas de criá-las e recriá-las." (In: Pereira, 1997: s/p)
Enfim, é preciso pensar com muita seriedade o papel da universidade nesse contexto, tendo em vista que as deficiências apresentadas pelos alunos podem e devem ser superadas. Como habilidades que são, as competências lingüísticas são passíveis de aquisição em qualquer momento de nossas vidas e perceber tal necessidade o quanto antes só nos ajudará a enfrentar uma realidade muitas vezes adversa e até preconceituosa em relação àqueles que não dominam o registro culto da língua. A perspectiva de sermos capazes de lidar com a língua portuguesa nos mais diferentes campos sociais é hoje chamado pelos lingüistas de letramento. E num mundo letrado, tanto pior para aqueles que não dominam o código que lhes abre as portas do pensamento, do mundo, da informação, da vida... Drummond nos convida poeticamente a pensar sobre isto nos versos:
"Escolhe teu diálogo e
tua melhor palavra ou
teu melhor silêncio.
Mesmo no silêncio e com o silêncio
dialogamos." (In: Pereira, 1997: s/p)
Bibliografia
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revista
digital · Año 10 · N° 76 | Buenos Aires, Septiembre 2004 |