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O futebol como prática desportiva: gênese e
espraiamento mundial do jogo de bola

   
Professor do Departamento de História da
Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e
do Centro UniNorte.
Graduado em História e Mestre em
Sociedade e Cultura na Amazônia.

 
 
Tarcisio Serpa Normando
tsnormando@yahoo.com.br
(Brasil)
 

 

 

 

 
    Este artigo resulta de uma versão resumida de um item de minha dissertação de mestrado intitulada
"Jogos de Bola, Projetos de Sociedade - por uma história social do futebol na Belle Époque Manauara".
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 76 - Septiembre de 2004

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    A FIFA, realizou no primeiro semestre de 2000 um grande censo dirigido às confederações nacionais, com o objetivo de detectar o efetivo crescimento do futebol mundial na última década do século XX. O Big Count distribuiu questionários às 204 confederações associadas, das quais 161 os retornaram preenchidos no tempo estabelecido e os resultados divulgados no ano seguinte pela entidade confirmaram o senso comum: o futebol aglutina pessoas em dimensões únicas, tanto como prática, quanto espetáculo esportivo.

    Segundo dados do censo, no mundo inteiro quase 250 milhões de pessoas jogam futebol regularmente de maneira profissional ou amadoristicamente como prática associada ao lazer. Os resultados foram saudados pela entidade oficial como uma inequívoca prova de força presencial do esporte tanto quanto uma constatação de que este fora subestimado nas décadas anteriores:

The data (...) shows clearly that football is of great worldwide significance. Around 4% of the total population of world play football at least occasionally or are involved in the game as referee or in other functions. (...) However, as experience in connection with the Big Count has shown, the figures obtained are problematic - despite, or perhaps because of - the major importance of the game. Exactly when the aim is to make predictions about the numbers of occasional or children players, a lack of reliable data makes it necessary to make a number of additional assumptions.

Survey results within Europe have indicated that the 'official figures' submitted by the associations definitely underestimate the actual importance of the game. Therefore it would seem appropriate to collect and evaluate the relevant information more systematically. 1

    Por mais abrangentes que possam parecer, os dados colhidos não são suficientes para equacionar a totalidade de simpatizantes que se dispõem a acompanhar, a torcer, a se envolver com jogos de bola. Felizmente - ou infelizmente -, não há números suficientes, nem em quantidade nem em rigor, para mensurar uma paixão. É certo, contudo, que essa paixão teve seu espraiamento, sua capacidade de inserção em sociedades de caracteres ideológicos diversos, potencializada no último quartel do século passado muito em função da visão estratégica da entidade mundial gestora do futebol, cujo planejamento vislumbrou, principalmente, o potencial econômico do esporte.

    Essa paixão, hoje mundial, já foi bastante restrita: foi identificadora de camadas socialmente segregadas e tida como perturbadora da ordem urbana. Mergulhar, pois, na ancestralidade do futebol e refazer seu caminho não-linear de desenvolvimento ajuda a estabelecer significados para as estatísticas contemporâneas tanto quanto possibilita um viés de entendimento da história sócio-cultural dos seus agentes, uma vez que, com uma certa anterioridade temporal, a pelota acompanha o homem no seu caminhar através da história.

    Quaisquer objetos de configuração arredondada tendem a se adequar como instrumentos lúdicos para o homem. Vestígios arqueológicos revelam a presença de esferas ligadas a formas de passatempo nas civilizações inaugurais do Oriente Próximo e mesmo nos dias do neolítico2 . Impossível pensar que alguma sociedade desconhecesse - ou desconheça nos dias de hoje - um tipo qualquer de jogo que não envolva uma bola. Embora essas atividades simbolizem, num certo sentido, modos de compreensão de realidades específicas, nem todas, obviamente, podem ser identificadas como ancestrais diretas do futebol. Contudo, a sobrevivência de algumas fontes históricas apontam alguns caminhos com relativa plausibilidade.

    Pelo menos desde o século III a.C. na China, durante o império de Xeng-Ti, da duradoura Dinastia Han (206 a.C. - 220 d.C.), os soldados dispunham de um livro de instruções militares que identificava o Ts´uh Kuh como atividade de treinamento da guarda imperial e, posteriormente, de todos os soldados que se preparavam para guerra. Ts´uh Kuh ou ainda Tsu-Chu significa "golpe na bola com o pé". A bola - de 22 cm de diâmetro, feita de couro ou bexiga, recheada com plumas, pelos ou vegetais resistentes - era lançada com os pés em uma área quadrada com cerca de 14 metros de lado. Times com oito componentes promoviam uma disputa acirrada visando fazer a bola traspassar uma pequena rede de seda fixada em varas de bambu distanciadas entre si em 40 cm. Provavelmente no campo havia obstáculos entre as metas aumentando as dificuldades e exigindo dos soldados maior destreza. 3

    A associação deste tipo de jogo de bola com a prática de treino militar deveu-se a violência do contato físico entre os grupos de jogadores. A rudeza das disputas serviu para o preparo de homens duros, másculos, capacitados a resistir as adversidades cotidianas trazidas no bojo dos conflitos bélicos, extravasando-as através do jogo4 .

    Ainda no Oriente, outra milenar tradição se identifica como espectro de ancestralidade do futebol. O Kemari, praticado no Japão, cerca de 500 ou 600 anos depois do exemplo chinês, demonstrava um acuro muito mais ritualístico que competitivo:

This is a type of circular football game, far less spectacular, but, for that reason, a more dignified and ceremonious experience, requiring certain skills, but not competitive in the way the Chinese game was, nor is there the slightest sign of struggle for possession of the ball. The players had to pass the ball to each other, in a relatively small space, trying not to let it touch the ground. 5

O Kemari, em certa instância, identificava a aristocracia nipônica e era praticado, inclusive, por imperadores. Cada disputa envolvia oito membros num campo aberto cujos elementos demarcatórios deveriam ser árvores nobres: um pinheiro a noroeste, um ácer a sudoeste, uma cerejeira a nordeste e um salgueiro a sudeste. Delicado, o jogo exigia alto grau de paciência e destreza de seus apreciadores - qualidades cultuadas entre a nobreza japonesa.

    O mundo ocidental conheceu um tipo de jogo de bola minimamente sistematizado primeiramente na Grécia. O mundo grego antigo foi marcado por uma fragmentação política bastante diversa dos reinos orientais a ele contemporâneo. As numerosas poleis mantiveram arraigadas em seu ideário constituinte, desejos de independência e auto-suficiência associadas a ciosa prática de resguardar uma distância cultural dos "bárbaros" que habitavam para além dos arredores da península balcânica. Nesse sentido, os jogos - ao lado da língua e da religião -, foram eficientes elementos unificadores dessa identidade grega.

    Entretanto, o principal evento disputado na Hélade, em homenagem a Zeus, os Jogos Olímpicos não incluíram nenhuma sphairomakhia - nome genérico das atividades que envolviam bola -, ainda que estes gozassem de certa popularidade, como o epyskiros, o mais comum deles. 6Poucas informações sobreviveram a respeito dessa modalidade, a não ser que, em comum com o jogo chinês, quando um grupo conseguia a ultrapassagem da bola de uma certa linha demarcatória nas extremidades do campo, conhecia-se o vencedor da contenda.

    O mundo antigo, depois de helenizado pelos diádocos de Alexandre Magno, 7 prostrou-se ante o Império Romano. Mas o poderio militar dos itálicos não conseguiu subverter a pujança dos elementos greco-macedônios que se enraizaram por grande parte da eurásia. Em diversos aspectos os algozes viram-se enredados pelos povos conquistados - como no caso do epyskiros exercido pelos gregos e que foi absorvido pelos romanos para posteriormente ser adaptado conforme as condições para prática. Assim nasceu a variante itálica do jogo de bola.

    O harpastum romano apropriou-se do cerne constituidor do jogo grego - que é, aliás, o mesmo da prática chinesa: a disputa pela posse de bola até a ultrapassagem das linhas demarcatórias de metas -, mas ampliou-o indelevelmente quando fixou certas funções aos seus praticantes. Esta transformação traçou uma inquestionável aproximação tática com o jogo contemporâneo, colocando-o como um antecessor direto do futebol de hoje:

O campo era retangular, com uma linha divisória em duas linhas de meta, devendo as duas equipes lutar pela posse da bola e tentar leva-la até a meta adversária, denominada locus santium. Essa zona do campo era protegida por jogadores lentos, quase parados, de funções defensivas como as do goleiro ou zagueiros de hoje. Os jogadores mais velozes e ofensivos atuavam por uma zona do campo chamada area pilae praetervolantis et superiectae, enquanto um terceiro tipo de jogador, o medicurrens, permanecia sobre a linha divisória do campo. Sua função não se sabe ao certo qual tenha sido, pois jogava para os dois lados ao mesmo tempo, passando a bola ora a um, ora a outro jogador de defesa ou de ataque. 8

    Claramente, a armação do "time" sujeitava-se as qualidades físicas e técnicas dos jogadores e, ao que tudo indica, a brutalidade das disputas foi cedendo espaço para jogadas viabilizadas a partir de uma unidade coletiva. A bola era pequena e deveria ser lançada de trás das linhas demarcatórias. As equipes desenvolveram uma diversidade de alternativas táticas e técnicas para ludibriar os adversários nas quais os passes e dribles eram incentivados para o deleite do público que aplaudiam e gritavam com regozijo.

    Foi o Exército Romano o principal agente na introdução do harpastum na Europa. Mesmo na Gália e na Britanha - grosso modo, os atuais territórios da França e da Inglaterra - as legiões romanas se não o introduziram, pelo menos reforçaram a prática do jogo, acompanhando o compasso da consolidação fronteiriça.

    O Império se esforçou em romanizar cada reentrância sob seu domínio e como resultado - assim como aconteceu com ele próprio, quatro ou cinco séculos antes -, legou experiências e tradições ao ocidente em processo de transição para o feudalismo.

    A Europa do Medievo e da Renascença foi marcada pela ubiqüidade da Igreja Cristã que encaminhou uma rígida regulação do cotidiano do europeu ordinário na tentativa de expurgar hábitos e atitudes que se constituíssem profanas, uma vez que a crença reverberada nos sermões, nos elementos da cultura popular e - um pouco mais tarde -, nos discursos políticos era que o cultivo de práticas indevidas atrairia a ira divina a se abater sobre a coletividade e não apenas sobre o errante herege. Assim, o clero revestiu com uma áurea de medo e culpa todas atividades que não estivessem associadas ao trabalho ou a religião. 9 As únicas exceções em que a rigidez do dia-a-dia poderia ser, momentaneamente, virada de cabeça para baixo ocorria durante as festas. 10 Estas eram ocasiões propícias a alegria das músicas e representações, ao desperdício de alimentos e bebidas e ao desprendimento religioso, onde as frustrações e o peso da vida laboriosa podiam ser permutados por um segundo mundo e por uma segunda vida. 11

    Nesses raros dias de tolerável liberdade e libertinagem, os jogos de bola voltavam a ser disputados. Contudo, em seguida aos festejos, eles retornavam a sua condição clandestina, perseguido pelo clero que costumava associa-lo a diversos tipos de profanação aos dogmas cristãos. Acusavam-no de ser instrumento para cultos pagãos - numa dessas associações, a bola representava o sol que fertilizaria a terra pela qual rolasse, assegurando, dessa forma, um bom crescimento do cultivo, além de proteger a colheita dos ataques da turba. E quando o jogo envolvia mulheres, o teor herético crescia exponencialmente, pois ao instrumento profanador da propalada moralidade cristã somava-se a metade subversiva da humanidade. 12

Quite apart from man's natural impulse to demonstrate his strength and skill, even in chaotic and turbulent fashion, it is certain that many cases, pagan customs, especially fertility rites, played a major role. The ball symbolized the sun, which had to be conquered in order to secure a bountiful harvest. The ball had to be propelled around, or across, a field so that the crops would flourish and the attacks of the opponents had to be warded off. A similar significance was attached to the games between married men and bachelors that prevailed for centuries in some parts of England, and, likewise, to the famous game between married and unmarried women in the Scottish town of Inveresk at the end of the 17th century which, peharps by design, was regularly won by the married women (...). 13

    Não há consenso entre os pesquisadores se o futebol primitivo praticado na Inglaterra da passagem do Medievo para a Idade Moderna tenha se originado de tradições antiqüíssimas, mas autóctones ou se tenha sido realmente introduzido pelas legiões romanas. Há ainda aqueles que defendam que o jogo chegou à ilha européia via referências normandas do norte da França. Esta dúvida resvala no orgulho britânico que, além de se considerar inventor do jogo contemporâneo, não parece gostar da idéia de ver a primazia deste ser exterior ao reino. O fato é que, segundo algumas fontes primárias, no longínquo ano de 217 os bretões comemoraram uma vitória sobre os romanos chutando o crânio de um general. Outra versão dá conta que no século XI após rechaçar dinamarqueses, saxões divertiram-se com o crânio de um oficial morto em combate, disputando-o e arremessando-o com os pés. 14 A brutalidade congênita a este jogo de bola não se dissociaria do arquétipo inglês tão cedo.

    Genericamente, ludus pilae era a expressão que designava jogos de bola na Inglaterra desde, pelo menos, o século XII. Durante o Carnaval e, principalmente nas Shrove Tuesdays - o equivalente as nossas terças-feiras gordas -, praticava-se uma disputa pela pelota bastante peculiar: cerca de 500 pessoas de cada lado esbofeteavam-se numa celeuma para fazer a bola traspassar a linha de meta adversária. 15 Na cidade de Ashbourne, os portões norte e sul serviam como gols às equipes.

    A violência era tão premente que, além das brigas, seguidamente o saldo final das partidas era a morte de alguns praticantes.

No ano de 1280, em Ulgham, Northumberland, o jovem Henry Ellington, durante um jogo de bola, correu na direção de um adversário, David Le Keau, que tinha no bolso um canivete. Ao se chocarem, Henry saiu gravemente ferido, morrendo dias depois. Em 1322, um certo William of Spalding, seminarista de Norfolk, também matou acidentalmente um amigo, ao jogar futebol com um canivete no bolso. Só pode ordenar-se depois que o Papa João XXII o absolveu. Em 1303, um grupo de estudantes irlandeses atacou um aluno de Oxford, Adam of Salisbury, que jogava bola perto de sua casa. Em 1321, o mais sinistro de todos os registros: dois rapazes mataram um terceiro em Cheshire. Como que revivendo a tradição de Derby (...) os dois assassinos também jogaram futebol com a cabeça de sua vítima . 16

    O incômodo causado ao poder público pelos distúrbios originários de partidas de futebol pode ser medido pelos decretos proibitivos que se multiplicaram entre os séculos XIV e XV. Entre os anos de 1314 e 1467, doze decretos condenaram o jogo de bola em Londres, Perth (Escócia), Halifax e Leicester. 17 Temia-se que o interesse pelo ludus pilae desvanecesse o empenho dos homens no arco e flecha ou na esgrima - práticas de maior utilidade nos entreveros bélicos. Outra justificativa repetida para os decretos era a perturbação da ordem pública causado pela algazarra dos jogadores. Além, é claro, dos danos materiais advindos das vidraças quebradas por boladas sem direção.

    Na Itália do mesmo período, as formas anteriores de futebol não sofreram perseguições claras por conta do poder público. Havia, inclusive, uma certa boa vontade da nobreza para com o jogo. Na Itália esta aproximação da aristocracia com o calcio - termo ainda hoje utilizado no país como sinônimo do esporte contemporâneo - é comumente explicada por uma tradição florentina na qual, após longo período de enfretamentos entre os exércitos da cidade italiana versus o exército de Orange, duas facções de posições políticas contrárias resolveram decidir suas diferenças numa partida. Os aristocratas arregimentaram seus iguais e, em 17 de fevereiro de 1529, na Piazza Santa Croce, agregaram ao calcio um inédito valor diplomático para dirimir suas querelas. 18

    Os italianos foram os primeiros a registrar a organização em um conjunto de regras, o jogo de bola. Um certo Giovani Bardi recolhera depoimentos orais sobre a formatação tática do jogo disputado na década de trinta do século XVI e escreveu, em 1580 a obra "Discorso sopra il gioco del calcio fiorentino". As equipes compunham-se de 27 indivíduos em funções específicas: dois jogavam como datori adietro, isto é, como zagueiros fixos; quatro eram datori innanzi ou zagueiros avançados; cinco jogadores faziam-se de sconciatori, meio-campo e os quinze demais atuavam como corridori, os equivalentes a atacantes. O ápice da prática acontecia, assim como na Inglaterra, nos dias de festas. Em Florença reuniam-se várias equipes galanteadas por trajes coloridos para passar o dia jogando bola. 19

    Na França, o soule ou choule tinha um antiqüíssimo caráter religioso: era praticado pelos druidas nas florestas da Normandia em reverência a uma entidade divina solar. É provável que esta tradição celta tenha se fundido ao harspatum introduzido pelos romanos originando, dessa forma, o jogo apreciado pelos franceses desde o século 12.

La soule se pratique à travers les prairies, les bois, les landes et même les bourgs ou les étangs. Le but était de ramener le ballon dans un edroit indiqué, le foyer d'une maison par exemple ou tout autre lieu choisi par les joueurs. Dans certains cas, il fallait même tremper la soule dans une fontaine avant de la loger dans la cendre. Le jeu n'était donc qu'une immense galopade entrecoupée de mêlées plus ou moins acharnées. L'instrument de jeu pouvait être une balle de cuir, une vessie de porc remplie de foin, une pelote de toile, une boule de bois ou même un billot de bois. 20

    O jogo fora proibido em pelo menos duas ocasiões por lei régia: em 1319 por determinação de Philippe V e em abril de 1365, por ordem de Charles V. Ainda assim, como a aristocracia italiana, os franceses de estirpe nobre gostavam do jogo de bola tanto quanto os indivíduos provenientes das camadas sociais mais baixas.

    Por um lado, sua prática diferiu da rudeza da disputa anglo-saxã, na medida em que privilegiava a habilidade dos dribles em detrimento da força dos chutões. Entretanto, em consonância com os ingleses, as partidas podiam envolver até povoados inteiros em contendas que duravam horas ou mesmo dias.

    A idade moderna foi igualmente marcada pela insurgência de uma nova realidade capaz de alterar profundamente as concepções geográficas, sociais e políticas do ocidente europeu. A América foi incorporada pelo velho mundo como uma profícua fonte de riquezas. Na verdade, para além de uma funcionalidade econômica, ela foi preparada, no decorrer da era moderna, para acomodar os europeus em suas crenças, em suas estruturas cotidianas, em seus elementos identitários. 21

    Obviamente, este viés do processo colonizador acarretou fortes tensões, em todos os níveis, com as populações ameríndias. Contudo uma prática ritual denotou um mínimo de proximidade entre dois mundos opostos: na mesoamérica também existiu uma forma específica de jogo de bola, ainda que não fique claro seu estabelecimento como um antecedente direto do futebol contemporâneo. 22

    Desde 1.200 a.C., os olmecas, no Altiplano Central do México, praticavam um jogo cerimonial em áreas onde se encontravam grandes plantações de borracha Já o ullamalitzi ou ainda tlachtli era praticado pelos mexicas como uma simbolização terrena da luta que os deuses do bem e do mal travaram nos campos do céu.

Uma idéia fundamental na cosmovisão desses povos era que o céu noturno constituía o cenário da guerra eterna entre a luz e a escuridão. As estrelas tinham que morrer para que o sol pudesse se alimentar e iluminar a terra. O jogo de bola tinha um profundo sentido religioso e simbólico. Sua prática representava a luta cotidiana entre forças contrárias, conceitos antagônicos (...). Por esse motivo há uma relação simbólica entre o jogo de bola e a guerra, já em que ambas as atividades há um confronto de forças antagônicas. Os mexicas representavam também os guerreiros sacrificados. 23

    A pelota utilizada, chamada ollin, era confeccionada com borracha - um padrão que a experiência americana passaria a ditar aos europeus a partir do século XIX. Os "estádios" eram os próprios templos. 24

    O campo de jogo era demarcado nas suas extremidades por aros nos quais a bola deveria ser encaixada e que representavam o nascente e o poente. No centro, uma marca representava o lugar onde o sol sacrificava diariamente a lua e as estrelas: era o itzompan, ou lugar dos crânios. Cada lado do campo pertencia aos representantes dos deuses do bem (materializados na forma de luz, dia, sol, etc.) e do mal (escuridão, noite, lua, etc.). Nas bordas do campo, as paredes do templo eram utilizadas para rebater a bola que, de tão pesada, exigia que os jogadores usassem sobre os trajes rituais, protetores de couro e algodão nos braços e na cintura.

O tlachtli simbolizava o espetáculo do sagrado, prelúdio de um sacrifício sangrento, uma representação cosmogônica. A bola, em suas voltas no ar, representava a marcha do sol, no Cosmo. (...) Segundo os códices náhuatl, o movimento significava jogo. E, como um jogo do tempo, enquadrava-se na engrenagem cósmica, que, concomitantemente o sustentava e destruía. Assim, o ollin também significava terremoto, cataclismo e suas forças podiam acabar como os impulsos da bola que os jogadores lançavam até o esgotamento (...). 25

    Esta prática mesoamericana transpunha a tênue linha do simbolismo quando, ao final do jogo, fazia-se um sacrifício dos jogadores. Embora paire dúvidas sobre quem era efetivamente decapitado - vencedor ou perdedor -, o fato é que perante o juiz/sacerdote o jogador ajoelhava-se e tinha sua cabeça arrancada em um único golpe e, posteriormente, seu corpo era arrastado em volta do campo, ensangüentando e divinizando o espaço terreno.

    O tlachtli apresentava algumas variações em termos de nomenclatura de acordo com a região, mas que pouco mudava em sua exercitação. Obviamente, quando da implementação das diretrizes metropolitanas, as autoridades espanholas logo trataram de proibir o jogo tanto pelo caráter herético quanto pela necessidade de expurgar quaisquer elementos de identidade autóctone - tarefa na qual não tiveram sucesso, pois sobreviveram vários exemplos de práticas lúdicas locais que envolviam o manejo de pelotas de borracha além desta prática mesoamericana.

    Entre etnias amazônicas, exemplos de jogos de bola igualmente chegaram ao tempo presente através da sua reiterada prática não só como atividade de lazer, mas também como evento ritualístico. Este é o caso do jogo ancestral - mas praticado ainda nos nossos dias -, pelos índios Peoná, da região do alto Rio Negro. 26

    O jogo não tem um caráter de disputa: sua função principal é reavivar laços de convivência harmoniosa entre os membros da própria comunidade e/ou entre as tribos inimigas. Não existe limitação de jogadores, jogam tantos quantos estiverem presentes, podendo os mesmos sair e entrar na partida em qualquer instante sem que outro componente seja obrigado a deixar o campo, pois o jogo prolonga-se por até 12 horas e o resultado já é, de antemão, conhecido: sempre acabam empatados (quando disputados entre "times" da mesma aldeia) ou com a vitória dos convidados.

O jogo assemelha-se a uma dança, onde expressam grande alegria em estar realizando aquela atividade. A cada jogada, eles cantam, brincam, riem e dançam. O jogo tem muito mais sentido de festa do que de uma competição. Ao mesmo tempo em que eles estão motivados a jogar, saem a correr para o mato, abandonando o jogo, e isto é motivo de alegria para os que ficam em campo. Depois eles voltam do mato, incorporados na figura de um bicho e entram na jogada como se nada tivesse acontecido. 27

    Após a partida, a comemoração segue exaustivamente numa festa com fartura de alimentos, bebidas, danças e músicas.

    Entretanto, uma leitura negativa do futebol processada pelos Estados e pelas Igrejas Cristãs da Europa ocidental, algo que reforçou uma idéia na qual o praticante do jogo, grosso modo, era desprovido de honra ou detinha um caráter duvidoso, era inútil e desprezível. Constituía-se, portanto, num perigo a harmonia da sociedade que deveria ser combatido pelas autoridades espirituais e seculares: na prática, os impedimentos - e mesmo perseguições - efetivados pelas burocracias dos Estados nacionais seguiram, a posteriori, as admoestações religiosas.

    Observa-se, entretanto, um relaxamento na oposição ao futebol a partir do século dezessete. Na medida em que o jogo atraiu mais adeptos, foi aumentando a tolerância do poder público que diminuiu substancialmente o número de éditos e dirimiu, em seus conteúdos, a pecha preconceituosa: em 1660, por exemplo, Carlos II, foi o primeiro soberano inglês a autorizar o jogo de bola - e, de certa forma, incentiva-lo, ao permitir que seus criados enfrentassem os serviçais do duque de Albernale em uma animada partida. Por outro lado, a desconfiança sobre o caráter dos jogadores de futebol se prolongou no imaginário popular até, pelo menos, meados do século vinte .28

    Entretanto, principalmente durante o setecentos, ao discurso religioso - imbricado, aliás, por séculos, no cerne dos discursos legitimadores do Estado - se contrapuseram conjecturas ilustradas que, aos poucos, saíram da discussão em círculos restritos para interagir de forma mais efetiva com a cultura popular. Esse espírito iluminista promovia uma crença nas potencialidades do homem como construtor de seus próprios caminhos, apoiado, sobretudo, na razão em detrimento das idéias reverberadas por déspotas monárquicos e/ou eclesiásticos 29. Assim, aos poucos, o afã por uma prática de divertimento do gosto de amplas camadas sociais foi encontrando parâmetros para suplantar sermões e procurar caminhos alternativos para não se expor ao poder público - até que este decidisse, acossado pela burla sistemática dos éditos proibitivos, amainar sua volúpia perseguidora.

    Talvez o mais eficiente desses caminhos alternativos que garantiram a sobrevivência do jogo de bola tenha sido sua esportivização, isto é, sua codificação em regras que tentaram diminuir seu acentuado tom de violência e de desordem e que viabilizaram a sua tolerância, sobretudo nas escolas e universidades da Inglaterra do início do século XIX.

É importante sabermos que, na fase anterior à esportivização, os jogos eram regulamentados por tradições locais, sendo assim variáveis suas regras de um local para o outro e se caracterizavam por um alto grau de violência entre seus jogadores. A normatização destes jogos na Inglaterra passou por vários estágios até se chegar ao que hoje é denominado de esporte.30

...Na Inglaterra, o futebol sobrevive - apesar de ilegal - nas escolas secundárias e nas universidades. Sofre um refinamento e ganha contornos diferenciados, assumindo uma postura cuja prática requer o respeito às regras e aos códigos. É conferido ao futebol o título de esporte de gentleman. 31

    A partir daí começou a ser gestado o futebol que conhecemos contemporaneamente e pelo qual, em última análise, centenas de milhões de pessoas regulam seu cotidiano. Ao assumir diversos papéis, de acordo com as percepções simbólicas das sociedades em que estava inserido, o futebol primitivo foi se perpetuando como eficiente elemento de repercussão e aproximação da cultura historicamente produzida pelo homem.


Bibliografía

  1. Cf. Big Count, op. cit., p. 6

  2. Cf. PIMENTA, C. A. M.Futebol e Violência entre torcidas organizadas: a busca da identidade através da violência. São Paulo: Dissertação de Mestrado (PUC-SP), 1995. Pp. 51 e 54

  3. Cf. GERHARDT, W. More than 2000 years of football: the colourful history of a fascinating game. site oficial da FIFA (http://www.fifa.com/fifa/history_S.html); PIMENTA, op. cit.; WERNECK, J.I. (eti alli) O Futebol na Mirador Internacional. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações, 1987.

  4. Essa idéia apóia-se na perspectiva sintetizada por TUBINO, M. O que é esporte. São Paulo: Ática, 1993, p. 14: "Na antiguidade, antes de surgir o esporte, existiam atividades físicas de caráter utilitário-guereiro, higiênicas, rituais e educativas. (...) Os japoneses, chineses e hindus praticavam atividades físicas emprestando-lhes um caráter higiêncico".

  5. Cf. GERHARDT, W., op. cit.

  6. Cf. PEREIRA, M. H. da R. Estudos de história da cultura clássica - I vol. Grécia. 7ª Edição. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993, pp. 340-348. Os Jogos Olímpicos ou Pan-Hellênicos ocorriam em 5 dias, nos quais disputavam-se provas que evidenciavam as necessárias qualidades para a defesa da polis: 3 modalidades de prova eqüestre; 5 modalidades de corrida; 2 modalidades de luta; 3 de pugilato, 1 de pancrácio e o pentatlo.

  7. Os diádocos eram os generais de Alexandre, o grande, morto em 323 a.C. Soberano do Império Macedônio, conquistou a Grécia, parte da península itálica, o Egito, a Ásia menor, o Oriente Próximo até a Índia. Com sua morte prematura, aos 33 anos, sem ungir um herdeiro, o império foi repartido em três: 1) o Egito, sob o comando da dinastia dos Ptolomeus 2) a península balcânica e adjacências européias, governado por Antígono e seus descendentes 3) o Império Seleucida (as províncias orientais), sob a dinastia de Antíoco. Os diádocos deveriam implementar a política alexandrina de interação étnica que visava unir os povos conquistados sob um "nacionalismo helênico" de caráter mais cultural que racial. Verificar: MOMIGLIANO, A. Os limites da Helenização.Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1991; FERREIRA, J. R. A Grécia Antiga.Lisboa: Edições 70,1992.

  8. Cf. WERNECK, op. cit., p. 5031.

  9. Nesse sentido ver: DELUMEAU, J. História do Medo no Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 1993; FRANCO JR, H. Idade Média, Nascimento do Ocidente. 6ª edição. São Paulo: Brasiliense, 1995; BURKE, P. Cultura Popular na Idade Moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 1995; BAKHTIN, M. A Cultura popular na Idade Média e no Renascimento. 3ª Edição. São Paulo/Brasília: Hucitec/Edunb, 1996; BETHENCOURT, F. História das Inquisições - Portugal, Espanha e Itália: séculos XV-XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

  10. Cf. BURKE, op. cit., p. 202: "Na cultura popular européia tradicional, o tipo de cenário mais importante era a festa: festas de família, como os casamentos; festas de comunidade, como a festa do santo padroeiro de uma cidade ou paróquia (Fête Patronale, Kirchenweihtag, etc.); festas anuais comuns a muitos europeus, como a Páscoa, o Primeiro de Maio, O Solstício de Verão, os doze dias de Natal, o Ano Novo, o dia de Reis e por fim o Carnaval. Eram ocasiões especiais em que as pessoas paravam de trabalhar, e comiam, bebiam e consumiam tudo o que tinham. (...) em oposição ao cotidiano, era uma época de desperdício justamente porque o cotidiano era uma época de cuidadosa economia".

  11. Cf. expressões de BAKHTIN, op. cit., p. 05.

  12. Expressão utilizada por DELEMEAU, op. cit., p. 350. Diversas obras do período medieval e da época moderna acusam a mulher de ser agente preferencial do demônio para espalhar o mal e corromper as criaturas de Deus. Manuais escritos por membros do clero demoravam-se em explicitar quão ardilosas e dissimuladas eram as mulheres: num dos mais famosos, o Malleus Maleficarum, escrito em 1484 pelos inquisidores Heinrich Kramer e James Sprenger, havia uma síntese das razões para mulher ser tão desprezível para sociedade ocidental cristã: "Mas a razão natural está em que a mulher é mais carnal que o homem, o que se evidencia pelas suas muitas abominações carnais. E convém observar que houve uma falha na formação da primeira mulher, por ter sido ela criada a partir de uma costela recurva, ou seja, uma costela do peito, cuja curvatura é, por assim dizer, contrária a retidão do homem" (KRAMER, H. & SPRENGER, J. Malleus Maleficarum - O Martelo das Feiticeiras. Trad. Paulo Fróes.13a edição. Rio de Janeiro: Rosa dos Ventos, 1998. p. 116).

  13. Cf. GEHARDT, op. cit.

  14. Cf. as crônicas de T.B Trousdale e de Edward Bradley, citadas por WERNECK, op. cit., p. 5032.

  15. Cf. GEHARDT, op. cit.: "The game that flourished in the British Isles from the 8th and 19th centuries had a considerable variety of local and regional versions - which were subsequently smoothed down and smartened up to form the present day sports of association football and rugby football. They were substantially diferent from all the previously know forms - more disorganized, more violent, more spontaneous and usually played by an indefinite number of players. Frequently, the games took the form of a heated contest between whole village communities or townships - trough streets, village squares, across fields, hedges, fences and streams. Kicking was allowed, as in fact was almost everything else. However, in some of these games kicking was out of the question due to the size and weight of the ball being used. In such cases, kicking was instead employed to fell opponents".

  16. Cf. WERNECK, op. cit., p. 5032.

  17. Cf. PIMENTA, op. cit., p. 58

  18. Cf. WERNECK, op. cit., p. 5032. Ainda hoje, no dia de São João, padroeiro da cidade de Florença em 24 de junho, seus habitantes encenam o histórico jogo entre os partidários de Antinori (usando camisas verdes) e os de Cantiglione (com trajes brancos).

  19. Cf. WERNECK, op. cit., p. 5032 e GEHARDT, op. cit.

  20. Cf. http://pharouest.ac-rennes.fr

  21. Há uma vasta bibliografia concernente aos Descobrimentos, analisando desde seus móveis originários até os diversos aspectos de sua decorrência. Entretanto, para esta idéia de inserção da América na realidade européia, cita-se os artigos de Vitorino Magalhães Godinho, José V. de Pina Martins, Luiz Felipe de Alencastro, Eduardo Subirats e Jean Delumeau presentes na obra A Descoberta do Homem e do Mundo, organizada por Adauto Novaes e publicada pela Companhia das Letras/Minc-Funarte em 1998.

  22. Em que pese a análise de LEMOS, M. T. T. B. "Tlachtli - O jogo de bola na Mesoamérica" In: Revista pesquisa de Campo Nº 01. Rio de Janeiro: Uerj, 1995. Pp. 60-61: Observamos que ainda hoje, o espírito de tlachtli persegue os amantes do futebol. Os estádios, verdadeiros espaços sagrados, abrigam os torcedores fanáticos, durante os noventa minutos do jogo, o cotidiano ou o profano é esquecido. A torcida grita, xinga, segura seus patuás, acena suas bandeiras, reza, espreme as mãos e sente que o coração pára. O espetáculo do sagrado domina as emoções. No final, os vencedores são aclamados e saem do estádio com a sensação do poder, cantando ou tripudiando os derrotados. Como no tlachtli há a recompensa. A equipe vitoriosa é aclamada pela torcida e endeusada. (...)"

  23. Idem. p. 56.

  24. Ibdem, p. 59. Reside aí uma certa controvérsia: enquanto para uns os templos erguidos aos deuses serviam de local para prática do Tlachtli, outros autores identificam construções específicas para o jogo, sobretudo 26 nos Estados de Veracruz e Tabasco

  25. Ibdem, p. 57.

  26. Cf. JUREMA, J & GARCIA, R. "Futebol indígena: jogo de (re)criação" In: Amazônia: entre o esporte e a cultura. Manaus: Valer, 2002. p. 262: Os Peona são os indígenas considerados os mais primitivos habitantes daquela região. Eles empregam várias características, como por exemplo: o seu modo de andar, quando estão na cidade, pois caminham como se estivessem dando passos dentro de uma selva íngreme. Essa é uma das qualidades que difere esses índios dos outros. Outro aspecto é o fato deles não serem afeitos com números, gêneros e graus. O uso da roupa, mesmo estando numa comunidade que adota esses costumes, constitui-se num grande problema para aquela etnia.

  27. Idem, p. 263.

  28. Refiro-me aqui a uma passagem citada recorrentemente pelos comentadores do futebol: William Shakespeare revela, ainda no século XV, o entendimento sobre o praticante do jogo. Cf. AQUINO, R.S.L. Futebol, uma paixão nacional. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002. p. 15: Em sua Comédia de Erros, pergunta: "Tomais-me por uma bola de futebol? Vós me chutais para lá, e ele me chuta para cá. Se devo durar nesse serviço, deveis forrar-me de couro". Já em Rei Lear a marginalização social desse esporte fica evidente na fala insultuosa de um personagem: "Tu, desprezível jogador de futebol!". Há ainda que se considerar as lembranças de ex-jogadores como Mário Jorge Lobo Zagalo que repetidas vezes em entrevistas televisivas afirmou que precisou esconder dos pais de sua futura esposa que era jogador do Botafogo F.C. para que estes permitissem o noivado.

  29. Cf. FORTES, L.R.S. O Iluminismo e os reis filósofos. 6ª edição. São Paulo: Brasiliense, 1989.

  30. Cf. REIS, H.H.B. "Lazer e esporte, a espetacularização do futebol" In: Temas sobre o Lazer. Campinas: Editora Autores Associados, 2000. p. 134.

  31. Cf. PIMENTA, op. cit., p. 60.

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revista digital · Año 10 · N° 76 | Buenos Aires, Septiembre 2004  
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