Educação Física Escolar e inclusão: de que estamos falando School Physical Education and inclusion: of who we are talking |
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* Mestrando do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação física da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). **Prof. Esp. Rita de Fátima da Silva, Mestranda do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). ***Prof. Dr. Paulo Ferreira de Araújo. Professor da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) **** Professor da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) |
Luiz Seabra Júnior* seabrasil@hotmail.com Rita de Fátima da Silva** rita_fátima@hotmail.com Paulo Ferreira de Araújo*** paulof@fef.unicamp.br José Júlio Gavião de Almeida**** (Brasil) |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 73 - Junio de 2004 |
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Introdução
Inclusão é uma palavra dos tempos modernos. Caminho sem volta nas relações sociais. Nasce dentro de um ideal neoliberalista, refletindo-se também, na organização das políticas públicas, inclusive a educacional. Sendo assim, interfere na forma e oferta de serviços de ensino.
Como uma das conseqüências desta matriz de organização da sociedade, os governos que seguem estas orientações estimulam a privatização, ou organizações comunitárias para o atendimento da população pobre. É parte do atendimento que atinge todos os aspectos do processo educacional. A inclusão por sua vez vem se efetivando, desde então, gradativamente, num processo social amplo e tem como pressuposto a igualdade de oportunidades, convívio com as diversidades, aproximação das diferenças quer sejam religiosas, políticas, sociais e culturais. De maneira geral, falar em processo inclusivo também significa abordar questões referentes às pessoas com algum tipo de deficiência, com necessidades especiais, significa falar em mudanças, desequilíbrio, sobretudo, considerar o indivíduo, o aluno, como ser único com suas capacidades e potencialidades.
Para Cidade e Freitas, 1997, este processo deve promover uma sociedade que aceite e valorize as diferenças individuais, aprenda a conviver dentro da diversidade humana, através da compreensão e da cooperação.
Esse processo, que ao nosso ver caminha lentamente, deve ir além de iniciativas isoladas ou de pequenos grupos abordando casos específicos. Deve ter uma dimensão ainda mais ampla com objetivo de modificar a sociedade na sua maneira de agir e pensar.
A inclusão é uma modificação da sociedade como pré-requisito para que pessoa com necessidades especiais possa buscar seu desenvolvimento e exercer a cidadania"; "é um processo amplo, com transformações pequenas e grandes, nos ambientes físicos e na mentalidade de todas as pessoas, inclusive da própria pessoa com necessidades especiais. (Sassaki, 1997, citado por Cidade e Freitas 2002).
No entanto, quando falamos em processo inclusivo, devemos refletir que esta opção nos remete a uma série de abordagens e cada uma delas pode abranger a uma população diferente. Portanto, inclusão não trata somente de uma minoria específica (pessoas em condição de deficiência). Se assim for, não estaríamos defendendo uma discriminação já existente?
Ampliando esta visão, dentro da ótica educacional também temos o papel importante da escola que como um dos principais espaços inclusivos necessita de mais reflexões não somente quanto às suas dimensões físicas, adequações técnicas e de engenharia, mas, sobretudo nas suas dimensões atitudinais e suas competências humanas.
Para que possamos compreender melhor esta concepção de ensino inclusivo necessitamos refletir sobre qual é o papel da escola. O que a escola pretende desenvolver com e em seus alunos? Quais são os ganhos dos envolvidos? O que e como está sendo desenvolvido? Principalmente, quem se beneficia do ensino inclusivo?
Para Mello (1997), o primeiro passo para abordar estas questões acerca da inclusão passa pela escola, já que seu papel não é apenas o de ensinar e transmitir conhecimentos sistematizados como português, matemática entre outras, mas também o de participar e promover ações que objetivem o estabelecimento dos padrões de convivência social. A escola pode ser um veículo facilitador junto à sociedade onde esta poderá adquirir, fundamentar e modificar conceitos de participação, colaboração e adaptação.
Edler e Carvalho (1998) enfatizam que todos devem participar da vida acadêmica, em escolas consideradas comuns e em classes regulares devendo ser desenvolvido um trabalho pedagógico que sirva para todos, indiscriminadamente.
Como podemos observar cabe a escola uma grande parcela de responsabilidade nessa transformação onde o aluno não pode ter somente o papel de coadjuvante, mas deve também ser protagonista tornando-se assim em mais um agente multiplicador deste processo.
Ainda na perspectiva escolar, temos a área da Educação Física, que sendo um componente da educação, também tem seu papel como agente transformador.
Selecionamos o tema para ser discutido na ótica e perspectiva da Educação Física no ambiente escolar por acreditarmos que além do processo de inclusão ela também tem em seu currículo oculto o papel da integração.
Se recorrermos ao Dicionário Aurélio para estas duas questões teremos:
Inclusão: Ato ou efeito de incluir, de modo inclusivo, compreendido; ato pelo qual um conjunto contém ou inclui outro.
Integração: Ato ou efeito de integrar-se, tornar-se inteiro, completo, completar-se.
Devemos estar atentos, pois apesar dos dois termos - inclusão e integração - terem significados semelhantes podem apresentar situações e resultados diferentes quanto a sua aplicabilidade e metas. Estar integrado, muitas vezes, não significa estar incluído ou participar ativamente.
Referencial teóricoNas últimas duas décadas a Educação Física tem procurado fazer uma ampla reflexão de sua própria identidade, abrangendo discussões como conceitos, paradigma, metodologia, identidade acadêmica, pesquisa, objeto de estudo, preparação e atuação profissional.
Na área escolar, a partir de 1971, com decreto 69.450 a Educação Física guardando ainda seu caráter militarista e funcionalista, passou a ser considerada como "atividade que por seus meios, processos e técnicas, desenvolve e aprimora forças físicas, morais e cívicas, psíquicas e sociais do educando". A iniciação esportiva era um dos eixos fundamentais de ensino, a partir da quinta série, buscando-se com isso descobrir e produzir talentos esportivos. Proposta com interesses político ideológicos propagando o regime político vigente e uma Educação Física puramente utilitarista, funcionalista.
Já na década seguinte, esse modelo passou a ser contestado pelos resultados não obtidos, ou seja, os planos de tornar o Brasil um pais olímpico não se efetivou. As competições esportivas de alto nível não trouxeram o número esperado de praticantes nas atividades físicas. Assim, instala-se uma profunda crise de identidade nos pressupostos teóricos e no próprio discurso da Educação Física. Por conseqüência, a Educação Física Escolar, aproveitando o momento, redireciona seus objetivos, priorizando o segmento de pré-escola e de primeira a quarta série. O seu enfoque passa a ser o desenvolvimento psicomotor, tirando da escola a responsabilidade de promover o esporte de alto rendimento.
Inicia-se então, no final da década de 80, uma considerável mudança na Educação Física tanto no que dizia respeito à natureza da área quanto aos seus objetivos, conteúdos, pressupostos pedagógicos e metodológicos.
Oliveira (1981) e Medina (1983) discutiram sobre a importância de se questionar criticamente os valores que vinham sendo dados a Educação Física e contrapondo-se à visão fragmentada do comportamento humano, à mecanização e automatização dos movimentos, o modelo tecnicista de ensino, defendendo o humanismo não diretivo, uma sociedade mais justa e igualitária o que passou a ser o princípio norteador da Educação Física. A psicomotricidade continuava presente como referência.
Entretanto essas mudanças não puderam ser constatadas na prática profissional o que nos leva a compreender que elas aconteceram basicamente no meio acadêmico. Tanto Betti (1990), Rezende (1995), Darido (1997), Lopez (1997) e Tani (1998) afirmam que este distanciamento entre produção acadêmica e atuação profissional, apesar de amenizado, tem sido apontado como um outro problema a ser solucionado pela área, sendo preciso fazer chegar ao conhecimento e ao domínio do professor os benefícios daquilo que se tem produzido nas universidades..
Antes de avançarmos em algumas questões, acreditamos que para um melhor entendimento e visualização, faz-se necessário uma breve contextualização da Educação Física Escolar.
Assim como a Educação Física, a Educação Física Escolar tem sido encarada e colocada em discussões acadêmicas não só nas universidades, mas também em eventos científicos e pedagógicos. O resultado desse período de pesquisas é a existência, atualmente, de uma quantidade de publicações e abordagens.
Todavia, as diferentes abordagens, como não poderia deixar de ser, apresentaram divergências conceituais, filosóficas e questionamentos em vários campos, incluindo estrutura, organização política, social e cultural.
A finalidade desta discussão não é defender, questionar ou criticar uma ou outra abordagem, nem estabelecer um único caminho a ser seguido, até por que acreditamos na diversidade quando trata de temas relacionados à Educação mas sim apresentar suas particularidades visando contribuir com as reflexões presentes na área e pontuar aspectos que acreditamos sejam relevantes nesta discussão.
Para Soares, Taffarel, Varjal, Castelani Filho, Escober & Bracht(1992), a "Educação Física é uma prática pedagógica que, no âmbito escolar, tematiza diferentes formas de atividades expressivas corporais como: jogo, esporte, dança, ginástica, formas estas que configuram uma área de conhecimento que podemos chamar de cultura corporal".
Nesta perspectiva os autores mostram uma preocupação com a importância em refletir não só histórica, mas também pedagogicamente as implicações desta cultura corporal, no desenvolvimento do homem na sociedade.
"É preciso que o aluno entenda que o homem não nasceu pulando, saltando, arremessando, balançando, jogando etc. Todas essas atividades corporais foram construídas em determinadas épocas históricas, como respostas a determinados estímulos, desafios ou necessidades humanas" (Ibid).
Esta concepção enfatiza a importância de valores como solidariedade, cooperação, liberdade de expressão dos movimentos que devem ser retraçados e transmitidos para os alunos na escola.
Mesmo considerando as tendências destes trabalhos, o que ainda observamos é uma Educação Física inspirada na aptidão física e no desporto de alto rendimento, tendo como uma de suas metas principais aprimorar capacidades físicas e desenvolver habilidades esportivas.
Mais do que formar atletas, a educação física pode contribuir com o desenvolvimento pleno da pessoa, com a formação de uma consciência crítica, com o conceito de cidadania e com o próprio desenvolvimento da consciência corporal, entendendo que o conhecimento do corpo precede a descoberta e integração do mundo exterior.(De Marco, 1995).
Preocupar-se mais com o que podemos denominar de desenvolvimento integral da personalidade, ou seja, sem dissociar mente e corpo, vendo o ser humano na sua totalidade, como um sistema aberto, que interage com o meio ambiente passou a ser um outro foco desta nova Educação Física. Freire (1989 e 1991) discute em seus trabalhos a preocupação com o excesso de racionalismo da educação e da Educação Física, enfoca o respeito à cultura e a individualidade da criança, o estímulo à criatividade e a liberdade individual.
Numa outra vertente, Tani, Manoel, Kokubun &Proença (1988) preconizam que todo processo educacional deve procurar atender adequadamente às necessidades biológicas, psicológicas, sociais e culturais da população a que se destina e fundamentam seu trabalho nos processos de crescimento, desenvolvimento e aprendizagem motora e a interação entre eles. O posicionamento central deste trabalho é que se existe uma seqüência normal de desenvolvimento destes processos (crescimento, desenvolvimento e aprendizagem) isto implica que as crianças necessitam ser orientadas de acordo com essas características, sendo que assim as suas reais necessidades e expectativas seriam alcançadas. A observância destes aspectos sugere que a Educação Física Escolar atenderia o processo educacional de forma mais concisa.
Daolio (1995), defende uma educação física que no âmbito escolar deveria atender a todos os alunos, considerando e respeitando suas diferenças. Para o autor, a educação física na escola deve ir alem do foco da cultura corporal. Deve explorar as diferenças da própria pluralidade da cultura corporal.
Podemos observar uma preocupação em acentuar-se as diferenças entre as abordagens e não seus pontos comuns, o que na realidade tem causado dificuldades em se alcançar uma prática pedagógica consistente em termos de objetivos, conteúdos e métodos de ensino. Numa visão macroscópica constatamos outra preocupação: Que nome dar a essa disciplina ou área? Educação Motora, Cinesiologia, Ciência da Motricidade entre outros, porém não cabe nem estamos aqui para discutir estas questões, mas sim enfatizar a crise de identidade estabelecida e suas possíveis conseqüências. Conseqüências estas que influem diretamente na prática profissional, deixando à deriva e à mercê de modismos, professores, alunos e sociedade Nesta perspectiva torna-se difícil avaliar o impacto e os resultados que estas publicações tem tido na Educação Física Escolar na sua realidade prática, ou seja, no processo ensino-aprendizagem.
Entretanto, podemos reconhecer que a atual Educação Física, no seu aspecto de todo, não é a mesma de tempos atrás, evoluindo consideravelmente tanto no campo acadêmico como profissional.
Independente das divergências e discussões em torno das diferentes abordagens pode-se evidenciar um aspecto comum entre elas que é a importância do movimento no desenvolvimento do ser humano. Quando falamos em educação motora, motricidade, cultura corporal, estamos nos referindo a movimento. Esta importância não se restringe apenas ao aspecto biológico. A educação motora educa, entre outras coisas, para a liberdade; para a liberdade de expressão. E a expressão humana é sempre, em última instância, corporal. Ou seja, é pela motricidade que o homem se realiza.(Freire in De Marco, 1995).
Tani, Manoel, Kokubun & Proença (1988) colocam o movimento humano como centro das preocupações da Educação Física Escolar. O movimento como um aspecto crítico da vida onde seu significado é entendido como um elemento fundamental que contribui e influencia na interação dinâmica do homem com o meio ambiente, bem como dentro do seu ciclo de vida.
Schmidt (1982) afirma que capacidade do ser humano de se mover é mais do que uma simples conveniência que o possibilita a andar, jogar e manipular objetos. O autor vê o movimento como um aspecto crítico do nosso desenvolvimento evolucionário.
Se analisarmos o movimento por esta perspectiva, poderemos questionar: qual o seu grau de importância para os portadores de necessidades especiais? Estariam eles privados deste conhecimento, desta forma de interação com o mundo e com a sociedade?
Na área da Educação Física Adaptada continuamos nossa observação e pudemos perceber o mesmo ponto comum até agora descrito e encontrado em outras abordagens: o movimento e suas implicações para a vida.
A Educação Física Adaptada "é uma área da Educação Física que tem como objeto de estudo a motricidade humana para as pessoas com necessidades educativas especiais, adequando metodologias de ensino para o atendimento às características de cada portador de deficiência, respeitando suas diferenças individuais" (Duarte e Werner, 1995: p.9) Importante salientar a preocupação dos autores em respeitar diversidades, adequar conteúdos e metodologias, em atender necessidades e capacidades, reforçando a tese de um princípio comum.
Para Cidade e Freitas (1997), a Educação Física Adaptada na escola, se constitui em uma grande área de adaptação ao permitir a participação de jovens e crianças em atividades adequadas às suas necessidades e possibilidades, proporcionando que sejam valorizados e se integrem num mesmo mundo.
Quando nos referimos à importância do movimento estamos nos referindo a qualquer pessoa, quer seja ela com necessidades especiais ou não. Pedrinelli (1994) afirma que os programas de educação física devem conter desafios a todos os alunos, permitindo a participação de todos e respeitando suas limitações, promovendo a autonomia e enfatizando o potencial no domínio motor.
Podemos observar, mais uma vez, que estes autores referem-se a importância do movimento, do domínio motor como um meio e não como um fim.
A nova Lei de Diretrizes e Bases, promulgada em 20 de dezembro de 1996, através dos Parâmetros Curriculares Nacionais, evidencia uma preocupação em modificar o caráter que a Educação Física assumiu nos últimos anos ao explicar em seu texto, no artigo 26, parágrafo 3º que "a Educação Física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular da Educação Básica ajustando-se às faixas etárias e às condições da população escolar".
Dentro dos Parâmetros Curriculares Nacionais, na tentativa de se buscar uma melhor compreensão do seu papel, o trabalho da Educação Física tem sua fundamentação na concepção de corpo e movimento adotando para tanto a distinção entre organismo como sendo um sistema estritamente biológico e corpo, o qual se relaciona dentro de um contexto sócio-cultural.
Esta mesma concepção contempla em seus conteúdos questões como pluralidade cultural (expressões de produções culturais, como conhecimentos historicamente acumulados, produzidos e transmitidos), cidadania, afetividade e estilo pessoal bem como atividades culturais de movimento (conhecimento sobre o corpo, esportes, atividades rítmicas e expressivas) com finalidade de lazer, expressão de sentimentos e manutenção da saúde. Assim, essa proposta entende a Educação Física como Cultura Corporal.
Tomando-se como base esses referenciais teóricos nos deparamos com algumas questões fundamentais no processo ensino aprendizagem quando em seu texto, os Parâmetros Curriculares Nacionais referem-se a: Atenção à Diversidade, Diferenças entre meninos e meninas, Capacidades e Competências, Deficiência Física o que nos remete a refletir sobre o papel da Educação Física Escolar bem como a preparação do profissional desta área que deve e tem que participar como agente transformador, uma vez que o ambiente educacional bem como a prática diária pode propiciar meios para concretização desta tão desejada educação inclusiva.
MétodoCaracterização do Estudo
Este estudo caracteriza-se como do tipo descritivo, com teor de registro de análise documental (relatório final da disciplina de estágio supervisionado e prática de ensino), tendo como objetivo refletir sobre a atuação do professor de educação física no âmbito escolar, acerca da gestão de aula e inclusão educacional, no ensino fundamental (5ª á 8ª série) em escolas públicas na região de São José do Rio Preto - SP - Brasil.
População e AmostraA seleção da amostra foi feita de maneira aleatória, correspondendo a trinta relatórios de estágio, referentes a trinta professores de educação física do ensino fundamental (5ª á 8ª série).
InstrumentosPara o desenvolvimento do estudo foi utilizado como instrumento os registros de observação, referentes ao relatório de estágio supervisionado e prática de ensino.
Este se compõe por: ficha de observação diária (identificação de gestão de aula), roteiro semi-estruturado para elaboração da apreciação final e apreciação final propriamente dita.
ProcedimentosFoi realizada uma observação direta e individual da atuação do professor de educação física, por um observador estagiário, durante 100 horas/aula, distribuídas ao longo do ano letivo de 2003.
ResultadosA partir das respostas obtidas destacamos uma amostra das situações que foram apontadas e reconhecidas como as mais críticas levando-se em consideração nossa proposta de estudo:
Discurso 1
"Desci até a quadra, conforme foi orientado, para que eu aguardasse a decida dos alunos, e qual foi a minha surpresa quando os professores trancaram o portão e sentaram em baixo de algumas árvores que existiam na área. Eu tive duas opções: ou subia até lá e acompanhava a conversa, ou ficava com os alunos e tentava organizar alguma coisa."
Discurso 2
"A professora que observei não tinha qualquer interesse sobre o ensino de habilidades ou outras atividades que não fossem as modalidades esportivas. E ainda os alunos mesmos é que pegavam a bola que queriam, e faziam os grupos para jogar".
Discurso 3
"Na prática de esportes alguns alunos mais habilidosos reclamavam e até xingavam e discutiam com aqueles que não sabiam jogar ou eram menos habilidosos. A professora mesmo percebendo não tomava nenhuma atitude".
Discurso 4
"Então pude notar que desde a infância não houve qualquer tipo de estimulação e desenvolvimento das habilidades básicas e fundamentais dos movimentos, como lançar, o rebater, o saltar, etc, e com isso, agora que as modalidades esportivas são desenvolvidas os alunos não conseguem praticá-las adequadamente. E a professora mesmo tendo conhecimento dessa deficiência, não se importa e aplica os esportes mesmo assim, deixando que os alunos façam como conseguirem. Dessa forma as aulas de Educação Física tornaram-se somente aulas para treino das modalidades esportivas".
Discurso 5
"Os próprios alunos decidem o que vão jogar, o professor fica na observação e qualquer problema que ocorra na partida ou resolvem sozinhos ou ficam chamando o professor o tempo todo. Não há interesse dos alunos, a desmotivação é completa, e a Educação Física se torna cansativa, tanto para quem participa como para quem observa."
"A professora usa o apito e todos estão sempre atentos a participação, é sempre 100%, os que estão no banco é porque estão incapacitados para as aulas práticas".
Discurso 6
"O professor responsável pegava sempre 2 bolas, uma de futebol e a outra de voleibol e muito das vezes a de basquetebol, assim soltava a bola e os alunos mesmos se dividiam, assim as meninas ficavam de fora do jogo, assim acontecia com o voleibol, o professor sentava e dali não saia até que terminasse a aula e muito triste pois tinha uma estrutura boa (quadras), materiais esportivos e didáticos mas não eram utilizados adequadamente".
Discurso 7
"As atividades desenvolvidas não me proporcionaram grande recolhimento de informações e conteúdo prático, pois eram repetitivas e monótonas, ocasionando assim a desistência na grande parte dos alunos em praticá-las e a participação dos mesmos se restringiam na sua grande maioria em meninos. Apesar dos professores terem boas condições do local da prática (quadras), materiais em bom estado e qualidade, não utilizavam esse material didático adequadamente ou quase não usavam (no caso de cordas e bambolês) permanecendo as atividade desportivas como futsal e vôlei e não outras práticas como o local permitiria brincadeiras e gincanas".
Discurso 8
"Os materiais Didáticos utilizados pelo professor são limitados. As aulas são repetitivas e não tem objetivo de melhorar o desenvolvimento corporal e a relação entre os alunos. O professor na maioria das vezes não se interessa em conduzir suas aulas, deixando de orientar adequadamente os alunos. Foi possível perceber pela lista de presença que a maioria dos alunos não freqüentam as aulas de educação Física, tendo como motivo a falta de motivação por parte do professor com seus alunos."
Discurso 9
"No segundo nível os alunos obesos, mais baixos e de menos habilidade são os últimos a serem selecionados, tanto entre meninos quanto entre meninas".
Discurso 10
"As aulas dadas pelo professor não é aplicado de acordo com o seu plano de ensino, todas as aulas ele libera bolas de futebol e vôlei para as crianças jogarem e fica sentado olhando, no qual ele deveria estar passando os fundamentos para os alunos".
Discurso 11
"No Colégio XYZ, a realidade era bem diferente. Apesar de aqui o espaço ser bem maior (ainda que não fosse o ideal), o professor utiliza o método "tradicional" : futebol para os meninos e bola queimada para as meninas. Outro agravante é que as aulas eram divididas em : femininas e masculinas. Ou seja, quando eram as aulas femininas os meninos deviam ficar sentado assistindo as aulas sem fazer bagunça e vice e versa".
Discurso 12
"De 5ª a 8ª série do ensino fundamental, estagiei no período matutino e vespertino com professores diferentes, no entanto com objetivos e propostas pedagógicas iguais".
Discussão e considerações finaisO ritmo acelerado da vida moderna, a tecnologia, mas também, a falta de emprego tem causado grandes alterações no comportamento social e motor desse novo aluno.
Entendemos que as crianças de hoje, desde o nascimento, são mais ativas, elas se arrastam, engatinham, andam, correm, pegam, jogam, brincam de faz de conta, enfim exploram o espaço e o próprio corpo através de movimentos constantes, compreendendo, assim sua própria existência, a existência do outro, o mundo a sua volta. Porém, nesta mesma velocidade, esquecem e ou são levadas a esquecerem do corpo. De um lado temos uma classe social onde passam a experimentar novas tecnologias; as crianças não lêem manuais de ajuda mas sim testam suas habilidades e buscam informações na internet, dedicando-se aos teclados, games, vídeos, cds, mantendo-se estáticas, movimentando mais os dedos do que o restante do corpo. O crescimento urbano, a diminuição dos espaços nas ruas, os condomínios, bem como a falta de segurança, também se constitui em fatores que restringem as possibilidades de se praticar atividades motoras adequadas ao desenvolvimento infantil. De um outro lado, com as menos favorecidas socialmente, temos as que não brincam, pois têm que trabalhar para ajudar os pais. Para essas, muitas vezes, só lhes resta a rua como forma de se movimentarem e exercitarem suas fantasias.
Entendemos que algumas dessas restrições de movimento podem resultar em defasagens de aprendizagem, muitas vezes expressas ou não no aproveitamento escolar. Não é difícil encontrarmos professores falando sobre dificuldades de alunos em fixar atenção, organização do espaço, seleção de objetos, leitura, escrita, desenho dos números e outras dificuldades de ordem afetiva e social como agressividade.
As experiências ou ações motoras quando oferecidas e vivenciadas adequadamente, colaboram na maturação do sistema nervoso e nas expressões posturais contribuindo amplamente para o equilíbrio das ações deste aluno na sociedade presente.
Alguns destes aspectos relacionados, por si só, poderiam ser suficientes para ressaltar a importância do movimento da criança.
Pudemos observar, mais especificamente no ensino fundamental, diferentes situações e atuações pedagógicas que não foram ou são exclusividades da Educação Física. Muitas perguntas, ao longo deste tempo, foram respondidas, porém no que se refere a mudanças qualitativas substanciais na prática diária da ação profissional ainda continuam lacunas a serem preenchidas o que nos levou a novos questionamentos.
Questões importantes, que merecem ser consideradas e analisadas, como as diferenças e interesses que os alunos possuem; a velocidade dessas mudanças na educação, na ação pedagógica em relação ao professor, procurando assim estabelecer um elo, uma forma de entender este novo adolescente ou criança que chega à escola.
De maneira geral, o professor ingressa na carreira docente em uma escola de ensino fundamental em média aos 25 anos, sendo que os alunos ingressam na primeira série do ensino fundamental ao sete anos. Após 4 anos de magistério, portanto aos 29 anos, o professor encontrará seus novos alunos ingressando na escola aos sete anos; Após 10 anos na carreira docente, já aos 35 anos, este mesmo professor continuará a receber seus novos alunos com sete anos de idade. Caberia-nos perguntar, então: nesse mesmo período, quantas mudanças ocorreram no mundo, na sociedade e na tecnologia? Quantos cursos de atualização foram feitos por este professor? Quem nasceu a menos de dez anos não conheceu disco de vinil. E a educação mudou? Acompanhou essa evolução?
Contudo parece que de maneira geral o professor de educação física não leva em conta este fato quando não consegue responder clara e objetivamente a perguntas como: Por que a Educação Física na escola? Para que? Para quem? Como?
Podemos identificar estes aspectos na maioria das narrativas descritivas dos estagiários, quando em seus depoimentos relatam que mesmo os professores observando em seus alunos a falta de vivência em alguns conteúdos básicos como lançar, rebater, saltar entre outros, ainda assim aplicam o conteúdo esportivo, aceitando qualquer resultado, tornando suas aulas treino de modalidades esportivas.
Aparece, então, a questão central detectada nas observações: a falta de interesse do professor, seguida por questões metodológicas e de gestão de aula.
A grande maioria diz trabalhar o esporte como conteúdo de suas aulas: futebol, voleibol, basquete entre outros. Contudo, aqui não iremos abordar, discutir ou questionar a aplicação e adequação do esporte ser utilizado de maneira genérica e de certa forma indiscriminada, tanto para o ensino fundamental quanto para o ensino médio.
Gostaríamos de refletir, então, 'como' ele vem sendo abordado nas escolas.
Conforme afirma Daolio 1995 p. 55 in Píccolo 1995:
Dessa forma, trabalhar com uma prática esportiva nas aulas de Educação Física é muito mais do que o ensinamento de regras, técnicas e táticas próprias daquele esporte. È necessário, acima de tudo, contextualizar está prática na realidade sociocultural onde ela se encontra".
Os trabalhos de Paes (2001) apontam alguns equívocos ocorrendo no âmbito escolar também observados em nosso trabalho:
"Não compartilhamos de uma Educação Física escolar que atue seletivamente, não tendo o esporte como conteúdo, mas sim como "prática esportivizada" que se atribui, equivocadamente, a tarefa de formação de atletas". (Paes, 2001 p. 62)
Para tanto, gostaríamos de relembrar alguns discursos:
Discurso 10
"As aulas dadas pelo professor não é aplicado de acordo com o seu plano de ensino, todas as aulas ele libera bolas de futebol e vôlei para as crianças jogarem e fica sentado olhando, no qual ele deveria estar passando os fundamentos para os alunos".
Discurso 6
"O professor responsável pegava sempre 2 bolas, uma de futebol e a outra de voleibol e muito as vezes a de basquetebol, assim soltava a bola e os alunos mesmos se dividiam, assim as meninas ficavam de fora do jogo, assim acontecia com o voleibol, o professor sentava e dali não saia até que terminasse a aula e muito triste pois tinha uma estrutura boa (quadras), materiais esportivos e didáticos mas não eram utilizados adequadamente".
A partir dessas narrativas podemos dizer que o esporte é trabalhado na escola? Será que estamos equivocados em afirmar que há falta de interesse ou conhecimento do professor?
Observando estas indagações podemos recorrer as questões de estrutura e ambiente de trabalho, no entanto, outras narrativas nos trazem a informação de que:
Discurso 7
"Apesar dos professores terem boas condições do local da prática (quadras), materiais em bom estado e qualidade, não utilizavam esse material didático adequadamente ou quase não usavam (no caso de cordas e bambolês) permanecendo as atividade desportivas como futsal e vôlei e não outras práticas como o local permitiria brincadeiras e gincanas".
Ainda observa-se que:
Discurso 12
"De 5ª a 8ª série do ensino fundamental, estagiei no período matutino e vespertino com professores diferentes, no entanto com objetivos e propostas pedagógicas iguais".
Portanto, o resultado é que:
Discurso 5
"Não há interesse dos alunos, a desmotivação é completa, e a Educação Física se torna cansativa, tanto para quem participa como para quem observa".
Contudo, acreditamos oportuno refletir e questionar a formação e atualização dos professores. Neste sentido Castellani Filho (2002 : p. 79-80) afirma que:
Não podemos perder de vista que tal quadro se configura com a aprovação da maioria dos professores da área, que por conta de seu processo formativo, afina-se com uma concepção de educação física escolar que tem no esporte quase que seu exclusivo conteúdo, ainda por cima voltado ao atendimento dos valores afetos à instituição esportiva, ou seja, performance esportiva, rendimento físico-esportivo.
Se algo faltou na formação destes profissionais, é necessário que a rede pública de ensino onde estes atuam busque criar meios para instrumentalização/atualização dos mesmos. Relatando sobre isso, Castellani Filho (idem pág. 78) diz que:
Evidentemente, a responsabilidade pela qualificação profissional, originalmente é das Instituições de Ensino Superior. Cabe, porém, à rede pública de ensino, buscar estabelecer mecanismos que viabilizem a capacitação/atualização profissional do seu quadro docente, ao mesmo tempo em que alerte àquelas instituições de ensino superior, da falácia contida no processo de formação profissional, chamando-as à responsabilidade. Sem envolvimento conseqüente destes setores, a pergunta ' como definir mecanismos eficazes de capacitação/atualização profissional de aproximadamente 17.000 professores - no caso da Educação Física - , ficará sem resposta.....
Podemos inferir na urgência desta providência ao refletirmos sobre esta narrativa feita por um estagiário:
Discurso 1
"Desci até a quadra, conforme foi orientado, para que eu aguardasse a decida dos alunos, e qual foi a minha surpresa quando os professores trancaram o portão e sentaram em baixo de algumas árvores que existiam na área. Eu tive duas opções: ou subia até lá e acompanhava a conversa, ou ficava com os alunos e tentava organizar alguma coisa."
Queremos enfatizar que as questões aqui levantadas não são para constranger ou sobrepujar aqueles que compõem a escola, porque a ela também pertencemos. Mas, torna-se urgente refletir sobre nossas ações com maturidade e o distanciamento necessário para enxergarmos não apenas os equívocos mas também os caminhos possíveis a serem percorridos. Temos ciência que estes aspectos não estão isolados mas sim compõem um quadro que abrange a sociedade como um todo.
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revista
digital · Año 10 · N° 73 | Buenos Aires, Junio 2004 |