O remate de futebol: caracterização biomecânica e considerações para o treino da força rápida |
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*Licenciado em Desporto e Educação Física Mestrando em Treino de Alto Rendimento **Licenciado em Educação Física e Desporto Mestrando em Treino de Alto Rendimento ***Licenciado em Desporto e Educação Física Treinador de Futebol - Nível I (Portugal) |
Pedro Santos* pedrosantos@bragatel.pt Pedro Silva** s_pedro@sapo.pt Nelson Jardim*** neljardim@netmadeira.com |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 72 - Mayo de 2004 |
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Introdução
O remate é um gesto técnico de grande complexidade motora que necessita de estar bem ajustado às variáveis do jogo, devendo realizar-se no local e momento adequados, além de exigir um nível elevado de força explosiva (Alcalde 1991, citado por Soares, 1995). Deve por isso mesmo ser encarado como um sistema aberto e esta noção deve emergir nos seus diferentes estudos, sabendo-se à priori que "no futebol não é possível estandardizar as acções dos jogadores e muito menos a sua sequência" (Garganta, 1999).
Segundo Morin (2003), da noção de sistema advêm uma unidade complexa, um todo que não se reduz à soma das suas partes constituintes. O sistema aberto está na origem de uma noção de termodinâmica cuja existência e cuja estrutura dependem de uma alimentação exterior não apenas material/energética mas também organizacional/informacional (Morin, 2003). No jogo "as equipas funcionam num registo de uma termodinâmica do não-equilibrio, pois só assim é possível desenvolver mecanismos de auto-organização que criem estrutura e sentido a partir da aleatoriedade. (…) As equipas são "estruturas dissipativas" na medida em que se desenvolvem longe-do-equilibrio" (Garganta & Cunha e Silva, 2000).
Morin (2003) refere que um sistema fechado está em estado de equilíbrio. O futebol enquanto sistema aberto implica um "desequilíbrio do fluxo energético que o alimenta, e, sem esse fluxo, haveria desregulação organizacional provocando rapidamente enfraquecimento" (Morin, 2003). Este autor refere que num primeiro sentido, o desequilíbrio que alimenta permite ao sistema manter-se em aparente equilíbrio, quer dizer, em estado de estabilidade e de continuidade, e este aparente equilíbrio só pode degradar-se se for abandonado a ele próprio, ou seja, se houver fecho do sistema. Este autor refere ainda que neste estado, firme, constante e no entanto frágil, steady-state, as estruturas permanecem as mesmas (no caso do remate de futebol, o padrão geral de execução motora) mas os constituintes são mutáveis (no caso do nosso exemplo, a forma externa variável e adaptada ao contexto).
Ao falarmos de remate no futebol estamos a falar implicitamente do seu objectivo, o golo. É em função das situações (modelação aberta) que o remate se vai materializar nas diferentes variantes do seu gesto técnico. Garganta e Cunha e Silva (2000) reportam-se ao conceito de ilhotas de determinismo (que podemos associar por exemplo ao remate de futebol) no indeterminismo global do jogo, a que está associado um sistema caótico. De uma forma empírica sabemos que próximo da sua noção de eficácia encontramos as de velocidade da bola e colocação. Cabri et al (1998) referem que os jogadores para além da sua superioridade técnica, têm valores de força superiores aos não jogadores, ao nível da performance para o remate, salientando que a influência do treino específico é o responsável por estas diferenças de força. Estes autores demonstram que os jogadores de futebol apresentam uma melhor performance no remate não só pelas suas capacidades e habilidades técnicas mas também por um uso mais eficiente do sistema muscular. Segundo Cabri et al. (1998), as correlações com a performance do remate demonstram que melhor força no ciclo de alongamento / encurtamento dos quadricípedes produzem uma melhor performance no remate. De Proft et al (1988) referem correlações significativas entre a performance do remate e a força concêntrica dos extensores do joelho e a força excêntrica dos flexores.
A capacidade motora Força, necessária para o movimento humano e, de uma forma geral para a execução de toda e qualquer técnica desportiva, não aparece no Futebol sob uma forma "pura", mas combinada com outras capacidades (Silva, 1990). Para responder com eficácia às exigências e diferentes solicitações do jogo, o futebolista necessita de uma notável capacidade de força explosiva (Bauer & Ueberle, 1988), particularmente ao nível dos membros inferiores (Bosco, 1994). A capacidade de um jogador exercer força durante um jogo de Futebol não depende somente da força dos músculos implicados no movimento, mas é também influenciada pela capacidade de coordenar a acção dos músculos no momento apropriado (Bangsbo, 1997).
Para entender "os factores que limitam o desenvolvimento da potência num movimento de Futebol, introduzem-se três classificações de força: a Força Básica; Coordenação da Força e Força no Futebol" (Bangsbo, 1997). No entender deste autor, chamamos Força Básica à força dos grupos musculares implicados num determinado movimento, quando os músculos se contraem de uma forma similar ao que fazem durante os movimentos naturais. A Coordenação da Força está associada à capacidade de um jogador coordenar os diferentes grupos musculares num movimento utilizando, a Força Básica. A Força no Futebol associa-se à quantidade de Força produzida num movimento específico de Futebol, como por exemplo um remate (Bangsbo, 1997).
A capacidade de Força Explosiva parece constituir-se como uma das bases fundamentais para a qualidade das acções a desencadear pelo futebolista (Luhtanen, 1984) e uma das características mais importantes do jogo de Futebol quando essas acções se referem à solicitação dos membros inferiores (Garganta, 1991), sendo a elasticidade muscular uma das qualidades fisiológicas mais interessadas (Bosco, 1985, citado por Garganta, 1991).
Weineck (1994) define força explosiva como sendo a capacidade que o sistema neuro-muscular tem de superar resistências com a maior velocidade de contracção possível. Zatsiorski (1971) citado por Harre e Lotz (1986), considera a força explosiva como a capacidade que permite obter valores elevados de força num intervalo curto de tempo. É assim a forma de manifestação da força mais específica dos JDC, uma vez que permite ao jogador a rápida e eficaz execução de diversas acções de natureza técnica (Faina et al., 1988). Existe uma diversidade de designações terminológicas atribuídas a esta forma de manifestação da força. A força explosiva, para alguns autores, surge designada por força rápida ou por força dinâmica de máxima expressão. Autores tais como Bührle e Schmidtbleicher (1981), Bührle (1985) citado por Garganta (1991) ou Harre e Lotz (1986), consideram a força explosiva como uma das componentes da estrutura da força veloz, a par da força máxima e da força inicial, isto é, consideram a força explosiva como subcategoria da força veloz.
Estudos efectudos por De Proft et al (1988) demonstram que o treino da força, no futebol, melhora a performance do remate devido a uma melhoria na força. No entanto concluem que o desenvolvimento das habilidades técnicas (ou controlo neuromuscular) é o factor predominante no remate de futebol e na sua performance.
A acção de remateSegundo Bosco (1994), um jogador de alto nível imprime uma elevada velocidade à bola, situando ao máximo as velocidades angulares do músculo e da perna, com alterações contínuas de forças e de momentos, antes que o pé contacte com a bola, havendo um recrutamento dos diferentes grupos musculares com uma sincronização espaço-temporal que depende da capacidade individual, de decisão, técnica pessoal e que destrinça um bom jogador de um medíocre.
O padrão de movimento da acção de remate é, geralmente, aceite como uma acção encadeada de movimentos, nos quais, o segmento proximal (anca) inicia o movimento, causando aos restantes segmentos distais ("coxa", "perna" e "pé"), progressivamente, uma maior aceleração no momento que precede o impacto do pé na bola (Lees & Nolan, 1998).
Os músculos da anca, tal como sustentou Narici et al. (1988), desempenham um papel fundamental na acção de remate uma vez que o movimento, e a posterior transferência do momento, se iniciam na anca.
É comummente aceite que os atletas que conseguem imprimir maior velocidade à bola, são aqueles que transmitem maior força e/ou energia e/ou potência à bola. Considerando o facto de se conseguir imprimir maior velocidade à bola com o pé dominante. Dörge (2002) sugere que o membro inferior a que os jogadores usualmente recorrem para rematar, é a aquele que apresenta uma melhor coordenação intra e intermuscular. Assim, é de esperar que os jogadores apresentem melhores resultados quando realizam a acção de remate com o membro inferior dominante. Os melhores valores da eficácia mecânica e de precisão do remate obtém-se quando a velocidade da bola alcança 80% da velocidade máxima (Bosco, 1994).
Membro inferior dominante (actividade muscular)Segundo Howe (1996, citado por Sousa, 2002), a acção de remate com o pé é complexa e pode ser dividida em 4 fases: (1) movimento da coxa e da perna à retaguarda; (2) rotação externa (lateral) da coxa e da perna que resulta flexão da anca; (3) aumento da velocidade angular da perna, com desaceleração da coxa; (4) após a bola deixar de estar em contacto com o pé. Segundo Howe (1996, citado por Sousa, 2002), durante a fase um, a anca correspondente à perna que remata é rapidamente estendida pela acção dos glúteos e a pélvis roda para trás. O joelho é flectido pela acção dos isquiotibiais e o tibial anterior flecte o tornozelo. Esta acção é limitada pelos flexores da anca e adutores, que frequentemente ficam demasiado distendidos em muitos jogadores. Quanto mais difícil o remate, maior a pressão exercida nestes músculos. Durante a fase dois, o psoas-ilíaco contrai e ocorre a flexão da anca para mover a coxa e a perna para a frente, rodando a pélvis também para a frente. A fase três envolve a acção dos isquiotibiais para promoverem a desaceleração da coxa, enquanto os quadricípites estendem rapidamente a articulação do joelho. A posição da articulação do tornozelo durante o contacto com a bola depende muito do tipo de remate realizado. Adicionalmente, os adutores irão contrair-se para traccionar a perna para a frente do corpo. Isto é particularmente relevante durante a execução de determinados tipos de remate, nomeadamente em remates com a bola situada em posições algo laterais relativamente ao corpo do jogador. A fase quatro começa depois da bola ter perdido o contacto com o pé. A perna e a coxa irão então continuar o movimento de acordo com o momento da coxa, perna e pé. Segundo De Proft et al. (1988b, citado por Sousa, 2002), isto causa uma tensão nos músculos antagonistas destas acções, especialmente nos isquiotibiais.
Os músculos do MI contrário ao que remata agem de uma forma similar à fase de corrida. Contudo, actuam principalmente para estabilizar o corpo, de forma a proporcionar uma plataforma estável na qual o MI que remata possa actuar. Este MI está usualmente, durante o remate, em abdução e rotação. Os músculos dos braços e do tronco desempenham um papel também importante, uma vez que trabalham para manter a posição e o equilíbrio necessários e para proporcionar um contrabalanço à perna que remata, o que possibilita maior controlo e velocidade no remate (Howe, 1996, citado por Sousa, 2002).
De acordo com Luhtanen (1994), os músculos flexores da anca assumem uma acção determinante durante a fase do balanço do membro inferior até o pé embater na bola. A contracção destes músculos, tem como objectivo, numa primeira fase, frenar o movimento para trás do membro inferior e, numa segunda fase, acelerar a coxa para levar o pé a embater na bola (Robertson & Mosher 1985; segundo Luhtanen, 1994).
A contracção dos músculos agonistas inicia o movimento em cada uma das articulações. Todavia estes músculos tornam-se antagonistas na redução do movimento angular rápido, nas articulações, no momento anterior ao impacto do pé com a bola (De Proft et al. 1988). No momento anterior ao do embate do pé na bola, os músculos extensores (ísquio-tibiais) da anca assumem um papel dominante, levando a coxa e a articulação do joelho a abrandar a velocidade e, até mesmo, a parar em alguns jogadores (Luhtanen, 1994).
Luhtanen (1994) refere que os músculos extensores do joelho actuam de forma rápida e breve para encurtar e causar redução na extensão do joelho (ângulo coxa-perna). Menciona ainda, que os músculos flexores do joelho se tornam, rapidamente, dominantes no momento anterior ao contacto com a bola, actuando excentricamente para reduzir a extensão do joelho. Alega ainda que estes resultados são interessantes, uma vez que se esperaria uma actividade de extensão do joelho ao longo do movimento de remate. Contudo, nenhuma actividade de extensão do joelho foi encontrada no momento anterior ao contacto do pé com a bola (Robertson & Mosher, 1985, citado por Luhtanen, 1994).
No que se refere ao padrão de recrutamento dos músculos, De Proft et al. (1988b) sugerem que a actividade dos quadricípedes, na fase de balanço atrás do membro inferior, apresenta uma actividade antagonista ao movimento, o mesmo acontecendo com os ísquio-tibiais na fase de balanço à frente do membro inferior. A esta actividade muscular os referidos autores designaram de "paradoxo do futebol" (soccer paradox). Estas constatações foram corroboradas mais tarde por Örchard et al (2002).
De Proft et al (1988b) referem que na actividade muscular do remate, tanto os agonistas como os antagonistas demonstram altos níveis de actividade. Os jogadores de futebol possuem menor actividade muscular geral que os não jogadores, na execução deste gesto técnico, embora com maior actividade antagonista, o que sugere que os antagonistas são músculos sinergideos do movimento, apesar do trabalho excêntrico, tornando-se importantes na definição e controle do padrão de remate. Sugerem ainda uma cooperação agonista - antagonista não somente baseada na força dos agonistas e no grau de elasticidade dos antagonistas, mas numa sincronização da força e flexibilização tanto de agonistas e antagonistas.
Considerações para o treinoTal como Saliba e Hrysomallis (2001) e Reilly (1994) referem, o treino da força pode contribuir efectivamente para a melhoria da performance de remate em jogadores de futebol. No entanto, o princípio da especificidade preconiza que sejam treinados os aspectos que se prendem directamente com o jogo (estrutura do movimento, tipo de esforços, natureza das tarefas, …) no sentido de viabilizar a maior transferência possível das aquisições conseguidas no treino para o contexto específico do jogo (Garganta, 1999).
O significado das características de jogo bem como a importância atribuída ao remate enquanto gesto isolado pode, segundo Garganta (1999), ser distorcido, quando se atribui às capacidades motoras um estatuto de autonomia à margem do contexto táctico que as reclama.
Segundo Weineck (1994) os métodos clássicos para treinar a força-máxima, a força-velocidade e a força-resistência não podem ser transferidos facilmente ao futebol, nem tão-pouco a todos os escalões de idade e níveis de rendimento. Há que atender tempo disponível, às condições, aos objectivos (aumento do rendimento, manutenção ou reabilitação) considerando sempre que o saber jogar tem uma importância prioritária para o treino do que as componentes condicionais acessórias. De Proft et al (1988) referem estar demonstrado que o treino do futebol aumenta a força mas que um programa de treino individual associado ao treino irá resultar em níveis de força superiores, melhores performances de remate e melhor peformance funcional, considerando sempre que as habilidades técnicas são uma determinante importante do remate.
Bangsbo (1997) refere que a quantidade de tempo dedicado ao treino da força depende de vários factores nomeadamente (1) do tempo de treino disponível; (2) a motivação e autodisciplina dos jogadores já que o treino da força tem pouca utilidade na ausência de um esforço voluntário máximo; (3) o nível básico de força individual do jogador (a necessidade do treino da força é menor para os jogadores fortes que para os jogadores débeis - o estilo de jogo de cada jogador bem como de toda a equipa devem ser levados em consideração); (4) as instalações disponíveis.
Weineck (1994) refere investigações (Cabri et al., 1988; Togari et al., 1988) que demonstram que um treino de força integrado no jogo impõe alguns incentivos eficientes para a melhoria. Deste modo teremos então de falar de um treino de força selectivo e específico, durante todo o ano.
Nesta linha, Silva (1990) refere que para treinar a Força Rápida não são necessários aparelhos complicados nem salas de musculação, sendo possível recorrer-se a formas acessíveis (sprints, mudanças de direcção, multisaltos, etc). Assim, sempre que possível devem-se seleccionar exercícios que englobem situações de jogo ou formas reduzidas. Antes do treino da força rápida, o aquecimento (geral e específico) é indispensável e após o trabalho desta capacidade devem fazer-se alongamentos, incidindo nos grupos musculares previamente solicitados. No final utilizar exercícios de relaxamento (físico e psíquico).
Uma das consequências que advêm para os treinos é a de procurar aperfeiçoar a performance do remate, no treino, através de situações de treino próximas do movimento e no terreno. Por exemplo a nível do treino de futebol podemos criar exercícios em que o atleta tenha que rematar à baliza, imprimindo à bola a máxima velocidade, sem grandes preocupações com a colocação. Neste momento estamos a trabalhar a força (potência) mas de uma forma específica. Outros factores tal como a coordenação (técnica) e a análise perceptivo-cinética da trajectória da bola estão presentes. Posteriormente direccionamos a nossa intervenção onde a incidência alvo seja a técnica. Aí ao invés de rematar à máxima velocidade para a baliza, as preocupações dos atletas já serão de colocação da bola.
No treino da força, a força dos músculos aumenta mais depressa que a força de tendões, ligamentos e tecido conjuntivo. Deste modo se se promover demasiado o treino da força numa primeira fase podemos desenrolar desequilíbrios entre a força do músculo e das estruturas circundantes (Bangsbo, 1997).
Deverão surgir preocupações com a prevenção de lesões: preocupação ao nível dos desequilíbrios que possam existir entre os diferentes grupos musculares, nomeadamente na relação de força entre os agonistas e os antagonistas. Neste caso devem ser corrigidos através de um programa de flexibilização e musculação dos diferentes grupos musculares, no sentido de prevenção da lesão.
Bangsbo (1997) apresenta um quadro geral para o treino da força, ao longo da época (Quadro 1).
Quadro 1. Frequência e número de séries por sessões de treino de força durante e
depois do período de treino da força (Bangsbo, 1997)
Weineck (1994) refere 2 princípios gerais para o treino da força: (1) quanto menor é a capacidade de rendimento e o grau de treino mais facilmente poderão alcançar-se incrementos no rendimento força; num nível muito baixo são suficientes os diferentes estímulos de força que provêm do próprio jogo de futebol; (2) quanto maior a capacidade de rendimento ou o grau de treino, mais necessário é trabalhar com métodos diferenciados e efectivos.
No futebolista, não há nenhum interesse em conseguir uma musculatura muito desenvolvida nas pernas (hipertrofia), porque a partir de certo momento será prejudicial à produção de força (Weineck, 1994).
Silva (1990), adaptando a proposta de Harre, 1977, caracteriza os diferentes aspectos da carga (Quadro 2).
Quadro 2. Caracterização dos diferentes aspectos da carga, no treino da força,
e respectivo efeito no treino (Silva 1990).
Segundo Silva (1990), no treino da Força Rápida durante o Microciclo devemos atender às seguintes considerações: o atleta deverá estar recuperado da sessão de treino anterior para que os efeitos não interfiram negativamente com competições (importância da recuperação); quantos mais grupos musculares forem solicitados, mais tempo demorará a recuperar e menos específico será o treino; sabe-se que o trabalho em intensidade é muito exigente, na medida que requer uma elevada concentração aliada a um efectivo empenhamento na tarefa. Por esta razão, serão de esperar nos dias subsequentes ao treino da força rápida, estados de fadiga no âmbito da esfera neuromuscular e menor disponibilidade para realizar tarefas que exijam precisão.
Silva (1990) sugere ainda outras considerações, para o treino da Força Rápida:
Todos os exercícios devem ser executados com um empenhamento máximo, caso contrário tornam-se ineficazes;
A velocidade de execução dos exercícios deve ser rápida. A intensidade é elevada e preconiza-se a utilização de 4 - 6 séries de 5 - 10 repetições por treino; os intervalos entre as repetições deverão situar-se entre 1.30 a 2 min., sendo conveniente uma recuperação activa (por ex. alongamentos); os intervalos entre as séries deverão situar-se entre os 2.30 -5 min., dependendo do nível de preparação do atleta;
Após uma lesão não é conveniente solicitar os grupos musculares afectados pela utilização de cargas que pela sua natureza apelem a esta forma de manifestação. Importa reforçar os músculos afectados, primeiro com trabalho estático e só depois dinâmico (Força Resistente antes da Força Rápida);
Quanto mais trabalharmos a Força Rápida duma forma isolada, separando-a das outras capacidades, mais poderemos elevar o seu nível, mas menos adaptada estará às reais exigências do jogo de futebol. Deste modo, no período competitivo devemos trabalhar a Força rápida de uma forma integrada, associando-a à componente técnica, utilizando formas de exercitação que se assemelhem o mais possível às exigências da competição.
No quadro 3 apresentamos uma base para a construção de protocolos de treino da Força Rápida.
Quadro 3. Base para a construção de protocolos que incidam ao nível o treino da Força Rápida (adaptado de Pezarat Correia et al, 2003).
CVM - carga voluntária máxima
Da análise do quadro 3 podemos concluir que no treino da Força Rápida a palavra-chave é a velocidade de execução. Devem ser criados protocolos com cargas que solicitem o músculo com grande velocidade de contracção. A gestão da carga deve induzir um estímulo considerável para o organismo, sem comprometer a velocidade de contracção. No entanto, quanto maior a carga, mais lenta será a velocidade de execução. Pretende-se recrutar mais Unidades Motoras e com uma frequência de estimulação alta. A Força Rápida depende da taxa máxima de produção de força (que está relacionada com a Força Maxima) e da taxa inicial de produção de força (relacionada com a velocidade a que é capaz de produzir a força, nomeadamente com a taxa de activação de Unidades Motoras). Na lógica da construção de um protocolo de treino da Força rápida está sempre o objectivo e a especificidade do gesto desportivo em questão.
Tal como já foi referido, De Proft et al (1988b), salientam a importância de um treino muscular específico adicional ao programa de treino normal no futebol. Sugerem que os agonistas devem ser treinados de uma forma concêntrica e os antagonistas de uma forma excêntrica. No momento em que o pé de remate contacta a bola, os extensores do joelho e os flexores da anca são agonistas. Devem por isso ser treinados fundamentalmente concentricamente, embora a força excêntrica não deva ser negligenciada, porque noutras partes do movimento esses músculos são antagonistas. Ao mesmo tempo, os flexores do joelho e os extensores da anca são antagonistas, e deverão ser treinados excentricamente, embora a sua força concêntrica não deva ser ignorada (Proft et al, 1988b). Os mesmos autores referem que o desenvolvimento de um equilíbrio entre os agonistas e os antagonistas com combinação entre força concêntrica e excêntrica poderá significar que as lesões serão menos frequentes, o padrão neuro-muscular do remate será alcançado e a performance de remate melhorada.
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digital · Año 10 · N° 72 | Buenos Aires, Mayo 2004 |