Força isométrica máxima de indivíduos fisicamente ativos: influência do envelhecimento e do sexo |
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Professor Assistente I - Universidade Federal de Mato Grosso Laboratório de Pesquisas em Educação Física e Esportes Doutorando em Ciências da Motricidade (Biodinâmica da Motricidade Humana) |
Gustavo Puggina Rogatto grogatto@hotmail.com (Brasil) |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 9 - N° 67 - Diciembre de 2003 |
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Introdução
A velhice é uma fase da vida marcada por profundas alterações nas habilidades físicas e nas funções orgânicas. O processo de envelhecimento biológico pode resultar em declínios progressivos na saúde do indivíduo idoso, afetando sua capacidade de viver com independência.
A redução da força muscular é uma característica, freqüentemente observada com o envelhecimento, que pode comprometer a realização de tarefas simples da vida diária como levantar de uma cadeira, ou segurar um neto nos braços. Além disso, o enfraquecimento muscular tem uma relação direta com prejuízos na flexibilidade muscular, no equilíbrio, e principalmente na velocidade (HADLEY et al., 1993), sendo responsável por grande parte de quedas freqüentes, uma das maiores causas de morbidade e mortalidade desta população.
O declínio dos níveis de força muscular no envelhecimento, causado pela redução da atividade neural ou pela atrofia/hipoplasia muscular, deve-se entre outras coisas à falta de atividade física (RUDMAN, 1989). Assim, a redução na força muscular causada pela inatividade física, pode ser atenuada ou revertida pela adoção de um estilo de vida mais ativo.
Numerosos estudos sobre os efeitos do treinamento resistido com cargas elevadas em indivíduos idosos têm reportado favorecimento de algumas variáveis musculares, como por exemplo, do conteúdo muscular (hipertrofia) ou da função músculo-esquelético (ganho de força) (FIATARONE et al., 1990; ROGATTO, 1998; ROGATTO & GOBBI, 1998). Contudo, os efeitos da realização de atividades de intensidade leve-moderada (como danças, caminhadas, esportes adaptados e ginástica) por indivíduos de diferentes grupos etários não têm sido avaliados no sentido da melhoria dos níveis de força muscular. Além disso, a realização destas atividades menos intensas não requer um controle tão rigoroso, como no caso do treinamento de força, uma vez que este último pode comprometer a saúde de indivíduos idosos portadores de patologias como hipertensão arterial e artrose.
Assim, o objetivo do presente estudo foi investigar os efeitos da idade sobre os níveis máximos de força de preensão manual em homens e mulheres que praticam regularmente atividade física de intensidade leve-moderada.
Materiais e métodos
Participantes do estudoA amostra foi constituída por 90 indivíduos distribuídos em 4 grupos de acordo com a classificação etária e o sexo.
Grupo HJ (homens jovens): 20 homens com média de idade de 21,3+2,3 anos;
Grupo HI (homens idosos): 20 homens com média de idade de 65,1+4,7 anos;
Grupo MJ (mulheres jovens): 25 mulheres com média de idade de 20,6+1,2 anos;
Grupo MI (mulheres idosas): 25 mulheres com média de idade de 62,7+6,2 anos.
Os critérios para a inclusão dos sujeitos no estudo foram: 1) ausência de doenças que aumentassem a probabilidade de risco para a saúde do participante durante a realização do estudo, notadamente de origem articular (artrite, artrose), cardiovascular (hipertensão arterial, palpitações ocasionais, sopro aórtico), e respiratória (asma brônquica, doença pulmonar obstrutiva crônica); 2) participação em programa de atividade física regular de no mínimo 1 hora por dia, três vezes por semana, por pelo menos um ano.
AntropometriaOs participantes do estudo foram submetidos a testes para a determinação das características físicas da amostra. Foram mensuradas as variáveis antropométricas: estatura (em centímetros, obtida pela utilização de um estandiômetro), massa (em quilogramas, utilizando uma balança do tipo plataforma - marca Fillizola), índice de massa corporal (IMC, em Kg/m2), percentual de gordura corporal (medidas de dobras cutâneas, plicômetro Lange). A partir das medidas de massa corporal e percentual de gordura foram calculadas a massa corporal magra (MCM) e massa de gordura (MG).
Força voluntária máximaA força voluntária estática máxima dos músculos flexores dos dedos foi aferida pelo movimento de flexão dos dedos (preensão manual) por meio de um dinamômetro de preensão manual da marca Takey Kiki Kogyo, modelo TK-1201 (Takey & Company, LTD) de acordo com técnica proposta por HEYWARD (1998). Cada voluntário realizou três tentativas (3 minutos de intervalo entre cada uma delas) assumindo-se a média aritmética como valor final. Avaliou-se a força máxima de preensão manual de ambos os membros dominante e não dominante separadamente.
Análise estatísticaOs resultados foram analisados por teste t de Student, ANOVA two-way e teste post-hoc de Bonferroni onde indicado. O nível de significância foi pré-fixado em 5%.
ResultadosOs resultados são expressos como média desvio padrão (DP) e encontram-se dispostos no formato de tabelas.
Na tabela 1 encontram-se registradas as características físicas e o número de horas de prática de atividades físicas por semana dos participantes do estudo. Os participantes dos "grupos jovens" masculino e feminino apresentaram idades por volta dos 21 anos, enquanto que os pertencentes aos grupos idosos possuíam em média 62 anos. Esta característica etária caracteriza os grupos como jovens e idosos de acordo com a classificação de SPIRDUSO (1995). Os grupos jovens apresentaram estatura significativamente superior aos grupos idosos, sendo que no grupo idoso observou-se interferência do sexo sobre esta variável. Enquanto o grupo idoso masculino apresentou redução da massa corporal, quando comparado ao grupo jovem masculino, o grupo feminino idoso apresentou significativo aumento da massa quando comparado com seu respectivo grupo jovem. A observação destes valores pode dever-se à redução da massa corporal magra, no caso dos homens, e ao aumento do conteúdo adiposo, no grupo feminino, em decorrência do avanço da idade. Estas modificações da massa corporal e da estatura refletiram em aumentos dos índices de massa corporal em ambos os grupos idosos. Não foram observadas diferenças significativas no nível de atividade física semanal, avaliado pelo número de horas de exercícios por semana, entre todos os grupos experimentais.
Tabela 1: Características físicas e nível de atividade física (Ativ.Fís) dos participantes do estudo.
° diferença estatisticamente significativa entre jovens e idosos (p<0,05).
* diferença estatisticamente significativa entre homens e mulheres (p<0,05)
A tabela 2 apresenta os valores de força voluntária estática máxima de homens e mulheres jovens e idosos que praticam exercícios físicos regularmente. Somente o grupo masculino apresentou modificações nos níveis de força estática máxima com o processo de envelhecimento. Estas diferenças refletiram em reduções da força muscular de ambos os membros, dominante e não dominante. Os grupos masculinos (jovem e idoso) apresentaram maiores níveis de força estática máxima de ambos os membros quando comparados com seus respectivos grupos femininos (jovem e idoso).
Tabela 2: Valores de força estática máxima (em Kg) dos membros dominante (MD) e não dominante
(MND) de homens e mulheres jovens e idosos praticantes de atividades físicas.
Discussão
A sarcopenia ou redução da força muscular decorrente do processo de envelhecimento pode ocorrer por causas diversas, sendo os fatores neurais e/ou musculares, mais freqüentemente atribuídos por pesquisadores da área (GISOLFI, LAMB & NADEL, 1995).
Muitos casos de declínio da força muscular associados com a idade podem ser explicadas pela redução da atividade neural (BROOKS & FAULKNER, 1994). DOHERTY et al. (1993) investigando a relação da força muscular com o número de unidades motoras constataram que indivíduos idosos apresentaram uma redução de 47% quando comparados com jovens. Estudos com animais de laboratório têm confirmado estes achados, encontrando reduções de aproximadamente 30% no número total de unidades motoras dos músculos gastrocnêmio e sóleo em ratos (EDSTROM & LARSSON, 1987; KANDA & HASHIZUME, 1989). Esta diminuição do número de unidades motoras, decorrentes do processo de envelhecimento, resulta numa ativação de um menor número de fibras musculares, com conseqüente redução da geração de força.
O conteúdo muscular pode ser outro fator determinante dos níveis de força muscular. Com o avanço da idade tem sido observada uma redução da massa muscular (EVANS & CAMPBELL, 1993). Segundo estudos apontados por FLECK & KRAEMER (1999), esta atrofia muscular independe do grupamento (membros superiores e inferiores) ou da função muscular (movimento de flexão e extensão). A atrofia do músculo esquelético deve-se tanto à diminuição do número quanto do tamanho das fibras musculares, resultando em hipoplasia ou atrofia muscular respectivamente (SPIRDUSO, 1995).
DAW et al. (1988) investigou a massa muscular e observou que com o envelhecimento ocorreu uma redução de 83% e 70% no peso dos músculos sóleo e extensor longo dos dedos (ELD), respectivamente. Este decréscimo do peso muscular foi acompanhado de uma hipoplasia muscular de 5,6% (sóleo) e 4,2% (ELD). Contudo, BROWN (1987) não observou qualquer prejuízo no número de fibras musculares, pelo método de contagem direta.
A redução da área da fibra muscular também tem uma relação direta com a capacidade de gerar força muscular, e pode ser observada com o envelhecimento muscular. LEXELL et al. (1988) demonstrou atrofia nas fibras musculares do tipo II de pessoas com idades entre 70 e 80 anos comparadas com indivíduos jovens. Esta atrofia foi reportada com maiores detalhes por COGGAN et al. (1992) em ambos os subgrupos de fibras musculares IIa e IIb.
Em nosso estudo, observamos que o envelhecimento tem influência significativa somente sobre os níveis de força estática máxima de homens. Este resultado coincide com a ocorrência de redução de força muscular dinâmica observada por ROGATTO & GOBBI (2000), onde a perda de força foi acompanhada por redução da área muscular do braço (membro não dominante). Desta maneira, a redução da massa muscular, não avaliada no presente estudo, pode ser a principal causa dos menores níveis de força estática máxima no grupo idoso masculino. Um fato interessante, que se opõem aos achados de muitos autores, foi o fato das mulheres não terem apresentado prejuízos nos níveis de força muscular com o envelhecimento. Este resultado se contrapõe ao estudo de ROGATTO & GOBBI (2001), onde mulheres apresentaram redução da força dinâmica máxima. Neste estudo os autores também observaram atrofia da musculatura do membro não dominante, justificando que, a observação de menores níveis de força em mulheres idosas possivelmente estava relacionada com a perda de massa muscular. Os achados do atual estudo demonstram que o comportamento da força muscular estática difere dos resultados de força dinâmica máxima encontrados por pesquisas prévias. O esclarecimento dos mecanismos envolvidos com estas diferenças poderia contribuir com a forma de aplicação do treinamento físico em populações idosas, contribuindo com um melhor aproveitamento da atividade física na manutenção da força muscular. Desta maneira, a realização de estudos futuros, que visem responder algumas questões relacionadas com o funcionamento do sistema muscular desempenhando esforços estáticos e dinâmicos, faz-se necessária.
Referências bibliográficas
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ROGATTO, G.P. & GOBBI, S. (1998). Efeitos do treinamento com pesos nos níveis de força e área muscular do braço de idosos (Resumo). Anais do XXI Simpósio Internacional de Ciências do Esporte. São Paulo.
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digital · Año 9 · N° 67 | Buenos Aires, Diciembre 2003 |