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Educação física no ensino médio:
estudo exploratório sobre os conteúdos teóricos

   
UniFMU e UNIBAN - SP
(Brasil)
 
 
Camila F. Lorenz
Cynthia Tibeau

cynthiatibeau@terra.com.br

 

 

 

 

 
    Esse estudo objetivou verificar se os conteúdos teóricos (CT) são considerados importantes para os alunos, quais conteúdos despertam o interesse dos alunos e como são desenvolvidos nas aulas. Participaram dessa pesquisa 60 alunos do ensino médio de escola particular e pública. Os resultados obtidos demonstraram que os alunos consideram os CT importantes nas aulas e os assuntos de interesse foram: Atualidades, Primeiros Socorros, Exercício Físico e Atividade Física, Alimentação e Hidratação. São temas abordados constantemente pela mídia, que tratam de uma melhor qualidade de vida, têm significado para os adolescentes e são utilizados na vida diária. Foi possível por meio deste estudo, viabilizar para os profissionais da área uma melhor compreensão da necessidade e interesse de seus alunos em relação aos conteúdos teóricos, demonstrar a importância de ocorrer um equilíbrio entre a teoria e a prática na Educação Física. Além disso, proporcionar, mediante da análise dos conteúdos teóricos, um planejamento muito mais completo, relacionando teoria e prática de acordo com a preferência dos alunos.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 9 - N° 66 - Noviembre de 2003

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Introdução

    Esse trabalho complementa uma pesquisa anterior por nós realizada, que tinha como objetivo verificar a percepção de estudantes do Ensino Médio da rede pública e particular sobre as aulas de Educação Física Escolar.

    Tal pesquisa mostrou que os alunos do Ensino Médio consideram as aulas de Educação Física apenas como uma atividade e não como uma área de conhecimento. Se a Educação Física faz parte do currículo escolar, é e deve ser considerada uma disciplina que possui um objeto de estudo e, consequentemente, conhecimentos a serem transmitidos, vivenciados e (re)construídos.

    As aulas de Educação Física não devem atingir extremos: totalmente prática ou somente teorização. A Educação Física é uma área de conhecimento que possui uma especificidade: o movimento humano consciente. É preciso que a prática seja realizada com embasamento teórico, sem perder suas características.

    Desta forma, esse trabalho teve como objetivos:

  • conhecer quais conteúdos teóricos da Educação Física são considerados importantes na opinião de alunos do Ensino Médio.

  • analisar, através do relato dos alunos, quais conteúdos teóricos são considerados importantes e necessários na disciplina de Educação Física e por quê.

  • verificar como os alunos percebem os conteúdos teóricos desenvolvidos em aulas de EF.


Educação Física: disciplina ou atividade?

    A Educação Física, mesmo sendo uma disciplina do currículo escolar, ainda é percebida por muitos como uma atividade. Segundo KOLYNIAK (2000), um dos motivos para que esta indefinição ocorra são os problemas específicos, como, por exemplo a ausência de um corpo teórico próprio que seja referência para toda a categoria profissional.

    Existe uma tendência em enfatizar apenas a parte prática da profissão em detrimento da sistematização teórica e do aprofundamento do estudo em outras áreas de conhecimento.

    GRUPPI (1998), afirma que as aulas de Educação Física perdem o significado no Ensino Médio, pois se não são percebidas pelos alunos como atividades recreativas e de lazer, são consideradas como uma prática específica de atividade esportiva.

    Muitos profissionais da área postulam a Educação Física como uma disciplina, no entanto, desenvolvem as aulas caracterizando-a como uma atividade. Limitam-se a comandar exercícios e atividades desportivas esquecendo da sua principal função como educador que é a elaboração e transmissão de conhecimentos (KOLYNIAK, 2000).

    Pesquisas realizadas por BRITO (1999) apontam a falta de contextualização dos conteúdos das aulas, já que 74,4% dos alunos de um Colégio afirmaram que nas aulas "práticas" não existem explicações teóricas do conteúdo ministrado. Desta forma, a aula de Educação Física perde o seu significado, caracterizando-a cada vez mais como uma atividade.

    Outra pesquisa, realizada por RODRIGUES (1996), com alunas de colégios da rede pública confirma a falta de significado nas aulas de Educação Física Escolar: as alunas entrevistadas afirmam que desconhecem o nível teórico-pedagógico das aulas e se sentem desmotivadas pela maneira de como são ministradas e, conseqüentemente, faltam às aulas.

    LORENZ & TIBEAU (2001) após realizar um estudo com alunos do Ensino Médio de uma escola particular e de uma escola pública, relatam que tanto na escola particular quanto na escola pública os alunos consideram a aula de EF uma atividade. Afirmam que freqüentam as aulas de EF apenas para a distração, descontração e lazer.

    As mesmas autoras consideram atividade tudo que é realizado sem compromisso com a aprendizagem de algo, ocorrendo uma despreocupação com a formação integral do indivíduo. Por disciplina, as mesmas autoras, entendem uma parte de um campo de conhecimentos responsável por viabilizar a aquisição de novos conhecimentos, seja no aspecto motor, cognitivo e sócio-afetivo buscando a formação integral do indivíduo (p.41).

    De acordo com os PCNs (1999), um dos objetivos da Educação Física no Ensino Médio é o aprofundamento e consolidação de conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental. No entanto, não existe, na prática, essa continuidade.

    No entender de TIBEAU (2001), os PCNs apontam para a busca de uma postura educacional que se distancie daquela em que o professor apresenta a atividade pronta e acabada para o aluno. Em seus objetivos aparecem palavras como transformar, produzir, expressar, comunicar idéias, questionar, formular problemas, termos que se associam ao conceito de criatividade.

    De acordo com a mesma autora, esses objetivos não podem ser alcançados apenas pela repetição de gestos estereotipados ou se restringir a exercícios de certas habilidades e destrezas, nem por modalidades esportivas institucionalizadas e codificadas.


O conhecimento específico da Educação Física

    Para identificar a Educação Física como disciplina é necessário, primeiramente, saber qual é o seu objetivo e qual seu objeto de estudo.

    Segundo BETTI (1991), a Educação Física deve ir mais além do simples fazer, ou seja: não basta correr ao redor da quadra; é preciso saber porque se está correndo, como correr, quais os benefícios advindos da corrida, qual intensidade, freqüência, e duração são recomendáveis.

    KOLYNIAK (2000) considera o movimento humano consciente como objeto de estudo da Educação Física: todo movimento corporal que possibilite uma representação psíquica e uma interferência voluntária imediata ou mediata é considerado como movimento humano consciente. O autor complementa citando que ao reconhecer o movimento humano consciente como objeto de estudo da Educação Física, faz com que a prática da disciplina deixe de ser o núcleo para ser as partes. Portanto, é necessário estabelecer um conjunto de referências conceituais e experiências motoras que envolvam todos os níveis de ensino.

    Para NASCIMENTO (1998:51) a Educação Física tem como objeto de estudo o conhecimento das manifestações que compõem a cultura corporal, ou seja, as formas de representação do mundo através do corpo, como os jogos, os esportes, as danças, a ginástica, as lutas e outras práticas corporais.

    Da mesma forma, TIBEAU (2002) apoia os autores que consideram a motricidade e o movimento consciente como objeto de estudo da Educação Física e acrescenta que o ambiente escolar é propício para o professor desenvolver conteúdos que ajudam na formação de cidadãos mais conscientes. No entanto, isso não ocorre porque a concepção de aulas de Educação Física para alunos e educadores ainda é aquela que trabalha apenas capacidades que se limitam ao corpo, deixando de lado outros aspectos que possam influenciar no comportamento do indivíduo.

    Porém, se o movimento humano é o objeto de estudo da Educação Física, porque a reprodução de movimentos comandados pelo professor, enfatizando apenas o desenvolvimento do aspecto motor, ou seja, o "fazer pelo fazer", são ainda características das aulas de Educação Física. Para que a aula seja significativa, os alunos devem começar a entender o movimento humano e não apenas reproduzi-lo.

    Se nossos alunos necessitam apenas de uma bola na quadra e, com ela, jogar os quatro esportes tradicionais (Vôlei, Futebol, Basquete e Handebol) e nada mais, para quê freqüentamos tanto tempo uma instituição de ensino superior específica na área? É uma incoerência saber que possuímos tanto conhecimento para transmitir e, ao mesmo tempo, não somos capazes de elaborar um plano de aula que atenda às necessidades de nossos alunos.

    Os PCNs (1999), citam que o profissional de Educação Física durante sua formação acadêmica adquire inúmeros e diversificados conhecimentos, porém com o comodismo de seu trabalho, o professor não utiliza o que aprendeu, esquecendo do seu potencial, não resgatando suas capacidades e habilidades, ou seja, a aula se torna rotineira e mecânica perdendo a importância dentro do ambiente escolar.

    PALAFOX & et ali (1998:122) referenciando as críticas das ações pedagógicas ético-moral e social-ideológicas consideram que agir na prática educativa negligenciando a utilização de referenciais teóricos significa reproduzir uma consciência intencionalmente conservadora, pois este tipo de prática educacional não conta mais com nenhum tipo de argumentação convincente que a sustente.


A importância da teoria nas aulas de Educação Física

    BARBOSA (1997), em suas considerações sobre teoria e prática, afirma que teoria é um processo interno, abstrato - é o pensamento em si - e a prática é o ato concreto que se pode ver, ouvir, sentir; é quando nosso interior entra em contato com o mundo exterior (p.20).

    O mesmo autor define que aulas práticas como sendo aquelas em que são colocados em prática os conteúdos vistos nas aulas teóricas, através da execução de movimentos corporais, atividades recreativas, rítmicas e jogos, facilitando o entendimento e a assimilação desses conteúdos (p.94).

    Da mesma forma, MATTOS & NEIRA (2000) citam que todas as aulas deveriam ser divididas em duas partes: parte teórica e parte prática. A parte teórica tem como objetivo proporcionar ao aluno o conhecimento dos principais conceitos do tema que está sendo desenvolvido, além disso, explicar a importância e o porquê trabalhar tal tema nas aulas.

    Na parte prática, o aluno poderá vivenciar os conceitos estudados na teoria. Através da supervisão do professor, realizará movimentos corretos que possibilitarão a aprendizagem do tema estudado, tanto os conceitos quanto os movimentos.

    Mas, será que para realizar movimentos corretamente os alunos necessitam de aulas teóricas? A Educação Física não exige ser teorizada, porém é preciso ocorrer um equilíbrio entre a teoria e a prática. O aluno precisa saber por qual motivo ele está realizando os movimentos e, não, notificar-se do movimento através da biomecânica para depois realizá-lo.

    Pesquisas realizadas por BRITO (1999) e também por RODRIGUES (1996) demonstram que os alunos têm grande interesse em buscar os conhecimentos teóricos da disciplina, porém, na maioria das vezes, os alunos desconhecem os objetivos da Educação Física, não sabendo o significado da mesma.

    Baseado nos fatores que ainda limitam a existência da teoria nas aulas de Educação Física ressaltados por ZIMBRES (2001) sintetizamos os seguintes itens:

  1. Conhecimentos teóricos são direcionados para os professores e não para o interesse dos alunos.

  2. A concepção do aluno de que aulas teóricas devem ser dentro da sala de aula ou qualquer outro ambiente fechado.

  3. Os professores necessitam aprofundar-se no embasamento teórico antes de transmitir os conteúdos aos alunos.

  4. Muitos professores ainda pensam que teoria é perda de tempo nas aulas.

    Não há impedimento para transmitir conteúdos conceituais aos alunos. Para que isso ocorra não é necessário uma faixa etária, local e/ou materiais específicos para esses conteúdos serem transmitidos. Basta o educador se notificar da importância destes conhecimentos para a formação integral do indivíduo como cidadão. Transpondo esta etapa, o processo ensino-aprendizagem tornar-se-á mais eficaz se o professor se adequar às necessidades da aula.


Conteúdos das aulas de Educação Física

    Segundo COLL (1996) e ZABALLA (1999) conteúdo está relacionado com conhecimento ou saber, portanto, é tudo aquilo que possui um objetivo de aprendizagem em uma proposta educacional. Os autores classificam os conteúdos da seguinte maneira:

Conteúdos conceituais: são conteúdos que envolvem conceitos, princípios e fatos. Abordar o tema "Benefícios da atividade física" é um exemplo de conteúdo conceitual, com também, a história do Futebol é um conteúdo factual que é considerado um conteúdo conceitual pelos autores.

Conteúdos procedimentais: são conteúdos que envolvem a ação e podem variar em três parâmetros:

  • Continuum motor / cognitivo: trata-se de um conteúdo procedimental que possui uma vertente mais inclinada para capacidades motoras ou para o cognitivo.

  • Continuum poucas ações - muitas ações: está relacionado com o número de ações de um conteúdo procedimental e uma de suas funções é determinar a provável dificuldade de um conteúdo procedimental.

  • Continuum algoritmo / heurístico: relacionado com o grau de predeterminação da ordem das seqüências. O continuum algoritmo é aquele conteúdo em que a ordem das ações é sempre a mesma e o continuum heurístico é aquele conteúdo em que a ordem das ações depende de cada situação de aplicação do conteúdo.

Conteúdos atitudinais: são constituídos por valores, normas e atitudes. As atitudes demonstram, em nível comportamental, o respeito a valores e normas.

    ZABALLA (1999) também descreve que há conteúdos que é necessário "saber" (conteúdos conceituais), "saber fazer" (conteúdos procedimentais) e conteúdos que admitem "ser" (conteúdos atitudinais). O autor afirma que apesar dos conteúdos serem classificados em grupos distintos, não podem ser trabalhados compartimentados, ou seja, um mesmo conteúdo pode provir de uma natureza conceitual, atitudinal e procedimental.

    Normalmente, no ambiente escolar a tradição é desenvolver com mais profundidade os conteúdos trabalhados de forma mecânica e conteúdos que são mais complicados de dominar, são trabalhados superficialmente. Não basta apenas o aluno ter conhecimento de conteúdos procedimentais se estes não forem relacionados com os outros tipos de conteúdos. Portanto, para que os conteúdos sejam pertinentes à aprendizagem, precisam ser conteúdos que educam e formam o aluno de maneira integral.


Metodologia

    Esse trabalho constituiu-se em uma pesquisa de campo do tipo quantitativa e qualitativa descritiva, realizada em duas escolas da cidade de São Paulo/SP, sendo uma particular e a outra estadual. A pesquisa se caracterizou qualitativa, pois é através das respostas dos indivíduos que se pode obter opiniões mais significativas e concretas. As estratégias utilizadas proporcionaram aos sujeitos investigados responderem de acordo com sua perspectiva pessoal, levando-os a expressar livremente suas próprias opiniões.

    A amostra foi constituída por 60 alunos do Ensino Médio, sendo 50% de uma escola particular e 50% de uma escola pública, com idade entre 15 e 19. Foram amostras não-casuais e independentes.

    Os primeiros dados foram coletados mediante ficha de identificação e um questionário com perguntas fechadas (Instrumento1) e, imediatamente após, os alunos responderam a um outro questionário com perguntas abertas e fechadas (Instrumento2). Ambos foram elaborados especificamente para este estudo.

    No Instrumento 1, os dados foram analisados através da freqüência, percentual e, posteriormente, ranquiados do mais escolhido ao menos escolhido. No Instrumento 2, as respostas foram analisadas qualitativamente, criando-se categorias " a posteriror", com o objetivo de apreender, através do discurso dos escolares, questões importantes para este estudo.


Resultados e discussão

    A primeira questão do Instrumento 2 (I2) tinha como objetivo verificar como os alunos percebem os conteúdos teóricos, portanto foi perguntado o que eles aprendiam nas aulas de Educação Física (EF). Na Escola Particular (EPa), 50% dos alunos referenciaram o esporte como o principal conteúdo de aprendizagem nas aulas de EF.

    Estes resultados confirmam as citações que GRUPPI (1998) faz a perda de significado das aulas de EF no Ensino Médio, pois se não são percebidas como atividades recreativas e de lazer, são percebidas apenas como uma prática específica de atividade esportiva.

    Na Escola Pública (EPu), o Condicionamento Físico (27%) foi o conteúdo mais indicado pelos alunos. Pode-se perceber que na EPu a preocupação com a saúde está se tornando mais efetiva.

    Em pesquisas realizadas por LORENZ & TIBEAU (2001) estes resultados já tinham sido obtidos em relação a EPu. Nestas pesquisas os alunos descreveram que o principal significado da aula de EF era a melhora da saúde.

    Quando questionados sobre os conteúdos teóricos que aprendem nas aulas de EF, os alunos da EPa (56%) e EPu (20%) afirmaram que não aprendem conteúdos teóricos nas aulas. Estas respostas confirmaram os resultados que foram encontrados na questão 1, ou seja, para os alunos da EPa e EPu o aprendizado teórico não está evidenciado como enriquecedor para seu desenvolvimento integral.

    De acordo com as citações de BRITO (1999), vale ressaltar que tanto na Epa quanto na EPu há uma falta de contextualização de conteúdos, pois estas respostas ratificam as pesquisas realizadas pelo mesmo autor, na quais os alunos entrevistados citaram que não há um embasamento teórico dos conteúdos nas aulas práticas, sendo assim as aulas de EF perdem seu significado, caracterizando-se como mera atividade.

    Buscando compreender a opinião dos alunos em relação aos conteúdos teóricos, foi perguntado a eles se esses conteúdos são importantes nas aulas de EF. Tanto os alunos da EPa (33%) quanto os alunos da EPu (29%) descreveram que conteúdos teóricos são importantes porque para praticar é preciso saber a teoria.

    Parece que os alunos estão começando a compreender que é necessário um embasamento teórico para desenvolver a prática, no entanto as aulas de EF não podem perder sua característica máxima que é o movimento humano, as manifestações da motricidade.

    Em ambas as escolas os resultados encontrados confirmam as pesquisas realizadas por RODRIGUES (1996) e também por BRITO (1999) que relatam que os alunos possuem grande interesse em buscar os conhecimentos teóricos da disciplina, no entanto, os alunos desconhecem os objetivos e significado da EF.

    Nos dados apresentados pôde-se perceber uma valorização dos conteúdos teóricos pela maioria dos alunos que relataram ser necessário. Nestes resultados demonstra-se a importância do conteúdo teórico para que o conceito atual existente e classificado para a aula de EF como "atividade" deixe de existir para ceder espaço ao real conceito "disciplina".

    Com o objetivo de verificar como os alunos percebem e dão importância aos conteúdos teóricos nas aulas de EF foi perguntado se possuíam aulas teóricas. Os resultados obtidos demonstraram que 73% dos alunos da EPa e 43% da EPu nunca possuíram ou não se lembravam de aulas teóricas. No entanto, 27% dos alunos da EPa e 50% dos alunos da EPu descreveram que possuem, algumas vezes, aulas teóricas.

    Com o intuito de averiguar as respostas acima referenciadas, foi perguntado aos alunos como os professores abordavam os conteúdos teóricos nas aulas. Os resultados foram o seguinte: 83% dos alunos da EPa e 80% dos alunos da Epu afirmaram que o professor não utiliza recurso material além da fala (explica).Tanto os alunos da Epa quanto os alunos da EPu se contradisseram em relação à resposta anterior, pois é possível confirmar que há a presença de conteúdos teóricos nas aulas, no entanto, a percepção desses conteúdos pelos alunos não está ocorrendo e/ou não está sendo significativa.

    Os alunos foram inquiridos sobre como o professor de EF explicava regras de jogos nas aulas. Em ambas as escolas os alunos responderam que durante o jogo, o professor vai explicando as regras mais importantes (EPa: 39% e EPu: 53%). Também aqui, foi possível verificar que há a presença de conteúdo teórico nas aulas, confirmando assim, os dados encontrados na questão anterior.

    Diante dos resultados obtidos nas duas questões anteriores, é importante ressaltar um dos fatores que ainda limitam a existência de teoria nas aulas - a necessidade de modificar o conceito que o aluno possui de aulas teóricas. O aluno precisa compreender que aula teórica pode acontecer em qualquer ambiente, não é obrigatória a permanência na sala de aula para a transmissão de conhecimentos teóricos. Talvez o motivo da falta de percepção dos alunos em relação aos conteúdos teóricos nas aulas de EF seja o entendimento errôneo do conceito de aulas teóricas.

    Na questão sobre os conteúdos teóricos preferenciais dos alunos, o mais citado na EPa, foi Alimentação e Atividade Física (27%) e na EPu, Primeiros Socorros juntamente com Benefícios da Atividade Física (17%) foram os conteúdos mais evidenciados.

    Diante da grande variabilidade encontrada nos conteúdos mencionados, verifica-se que existe um número grande de assuntos de interesse dos alunos que podem ser incluídos no planejamento.

    A escolha do conteúdo "Alimentação e Atividade Física" e "Benefícios da Atividade Física" poderia ser explicada pelo motivo destes conteúdos estarem ligados à estética, assunto característico de adolescentes, e que são freqüentemente lembrados pela mídia, como veículos de propaganda de produtos e lugares específicos para a prática da Atividade Física.

    A preferência dos alunos pelo conteúdo "Primeiros Socorros" poderia ser esclarecida devido à utilização deste conteúdo pela vida inteira. São conhecimentos que possuem significado e o aluno leva para fora da escola. É muito importante o indivíduo saber como lidar com a situação em momentos específicos que podem apresentar "perigo" e que são determinantes.

    O interesse dos alunos por esses temas é compreensível, já que são conhecimentos que têm significado e que podem ser utilizados em suas vidas diárias. Estes conteúdos, também são assuntos abordados constantemente pela mídia, que objetivam uma melhor qualidade de vida e são temas referentes à estética, aspecto valorizado pelos adolescentes.

    Os alunos apontaram, também, Recreação e ocupação do tempo livre (Epa: 70%) e Jogos cooperativos x Jogos competitivos (Epa: 70% e Epu: 97%), assuntos que nos levam a refletir sobre a necessidade de repensar a questão dos conteúdos trabalhados no Ensino Médio que valorizam mais a competição, como é o caso dos esportes coletivos.

    Uma questão que emerge: O que poderia levar os alunos a escolherem esses conteúdos? Será que os alunos estão "saturados" de apenas vivenciar jogos competitivos e estão em busca de coisas inovadoras? A adolescência é um período da vida em que se buscam coisas desafiadoras e inovadoras. Isso parece ter sido comprovado nas respostas obtidas através desse instrumento. Os assuntos assinalados devem ter despertado a curiosidade dos alunos, pois não é possível concluir que eles possuem conhecimentos sobre esses conteúdos ou se sabem o que significam.

    Outro aspecto interessante diz respeito ao conteúdo Regras de jogo. Quando questionados sobre quais conteúdos preferiam, na EPa este assunto foi apontado na 15ª posição e na EPu na 9ª posição. Estes resultados contrastam com as respostas do instrumento II, quando foi abordada a questão "o que os alunos aprendem de teoria nas aulas de EF" . Esse conhecimento conceitual (Regras de jogo) foi o mais citado pelos alunos. É possível constatar que esse conteúdo não é prioritário para o aluno, talvez porque seja mais interessante aprender esse conteúdo conversando com amigos e/ou assistindo jogos.

    Parece que os alunos dão mais importância aos conteúdos científicos do que aos conteúdos sócio-culturais. Isto pôde ser verificado pelos assuntos menos assinalados pelos alunos: parece existir um preconceito entre os temas relacionados à cultura e história. O assunto Folclore foi um dos conteúdos menos votados pelos alunos. No entanto, o Folclore é um conteúdo muito importante para se ter no planejamento, pois retrata a cultura de um país, sendo possível aprender sobre danças, comidas típicas, vestimentas, música, religião e outros aspectos interessantes, viabilizando ao aluno descobertas sobre diferentes povos, diferentes países, diferentes culturas.


Considerações finais

    A concepção das autoras deste estudo sobre uma aula de Educação Física adequada é aquela em que se desenvolve a prática com embasamentos teóricos, ou seja, saber fazer,e saber o por quê e saber como se faz. Os extremos não são interessantes: nem a teorização da EF, nem a prática sem significado.

    Depois de verificar os resultados obtidos concluiu-se que os alunos manifestam necessidade da presença de conteúdos conceituais nas aulas de Educação Física. Na análise das respostas foi possível perceber a valorização desses conteúdos pela maioria dos alunos. Valorizar os conhecimentos teóricos científicos da EF pode ajudar a mudar o conceito ainda existente de "atividade" para o real conceito de "disciplina".

    Por outro lado, também foi possível constatar a falta de percepção dos alunos em relação aos conteúdos teóricos. Tanto os alunos da EPa quanto os alunos da EPu (em menor porcentagem) se contradisseram descrevendo que não possuíam e que não aprendiam conteúdos teóricos nas aulas mas, em outra questão, afirmaram que o professor explicava regras de jogo. Como já foi citado anteriormente, há uma necessidade de modificar o conceito que os alunos possuem sobre aulas teóricas. Parece que os alunos da EPu percebem melhor que aula teórica pode acontecer em qualquer ambiente, não sendo obrigatória a presença em sala de aula para a transmissão de conhecimentos teóricos. Afirmaram que possuíam aulas teóricas, nas quais aprendiam regras de jogo, fato confirmado quando citaram que o professor explica regras durante as aulas.

    Foi possível perceber que os professores que tentaram trabalhar com algum conteúdo teórico não se valiam de recursos didáticos - pedagógicos. De acordo com os alunos, os professores utilizam apenas o discurso como recurso para abordar conteúdos conceituais nas aulas. Vale ressaltar que na aula de EF, como em qualquer aula de qualquer disciplina, o uso de materiais audiovisuais pode tornar os conteúdos teóricos mais atraentes e interessantes para os alunos. Isto não significa que conteúdos conceituais devam ser trabalhados em salas "fechadas". Esses conteúdos não devem descaracterizar o estilo de atividades propostas nas aulas de EF.

    Não era de interesse da nossa pesquisa coletar dados a respeito do local de realização das aulas de EF, mas é interessante ressaltar que os alunos acreditam que conteúdos teóricos podem ser aprendidos em "lugares abertos". É evidente que a utilização de recursos audiovisuais anteriormente mencionados, tornar-se-á mais difícil em espaços abertos. Porém, este aspecto dependerá da experiência do professor na condução, execução e planejamento de suas aulas.

    O professor é um mediador, facilitador e transmissor de conhecimentos nas aulas. Sendo assim, é o principal responsável para transmitir e oportunizar a construção de conhecimentos aos seus alunos com um embasamento teórico para complementar a prática. Afinal, de acordo com os PCNs (1999) o profissional de EF durante a sua formação acadêmica adquire inúmeros e diversificados conhecimentos, que talvez por comodismo do seu trabalho, não se preocupa em adaptar esses conhecimentos às necessidade dos seus alunos. Vale ressaltar que nos cursos de graduação pouco se fala sobre adaptação desses conhecimentos para o ensino fundamental e médio. O professor acaba por transformar suas aulas de EF em atividades mecânicas e rotineiras.

    O interesse dos alunos por temas como Atualidades, Primeiros Socorros, Flexibilidade, Definição de exercício físico, Alimentação e Atividade Física e Hidratação, é compreensível, já que são conhecimentos que têm significado e que podem ser utilizados em suas vidas diárias.Também são temas abordados constantemente pela mídia, quando se referem à qualidade de vida. Além disso, são temas referentes à estética, aspecto valorizado pelos adolescentes.

    Os alunos apontaram, também, a Recreação e a ocupação do tempo livre e os jogos cooperativos x Jogos competitivos, assuntos que nos levam a refletir sobre a necessidade de repensar a questão dos conteúdos trabalhados no ensino médio que valorizam mais a competição, como é o caso dos esportes coletivos.

    Fica ainda a ser esclarecido: o que poderia ter levado os alunos a escolherem esses conteúdos? Será que os alunos estão "saturados" de apenas vivenciar jogos competitivos e estão em busca de coisas inovadoras?

    As afirmações feitas pelos alunos permitem considerar que os conteúdos conceituais, factuais e atitudinais são necessários e de interesse dos alunos e que são fortes aliados no entendimento da EF como disciplina e área de conhecimento. Esse estudo permite sugerir outras investigações sobre o tema e sobre metodologias ou estilos de ensino que viabilizem a introdução dos conteúdos teóricos, sem que se perca de vista as características da EF - as manifestações da motricidade, o movimento consciente.


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  • ZIMBRES, S F. Educação Física Escolar e cidadania: Uma nova concepção. Revista Digital. 2001; 38(7). Disponível em http://www.efdeportes.com

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