Vestígios da educação física em Fortaleza (1863-1945) |
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Mestre em Educação Brasileira- Faced/UFC. Professora de Educação Física Universidade Vale do Acaraú - UVA |
Ariza Maria Rocha Lima arizarocha@zipmail.com.br (Brasil) |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 9 - N° 64 - Septiembre de 2003 |
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A idéia de reconstituir a história da Educação Física no Ceará, no período de 1863-1945, nasceu durante a pesquisa realizada no Mestrado1. As dúvidas surgiram na medida em que incursionei naquela área de visibilidade nacional e confrontando-a com a história local. Encontrei, a exemplo de um trabalho que a referida disciplina ficou restrita ao Rio de Janeiro até a década de 302. Esta afirmação se contrapõe ao que foi encontrado em alguns trabalhos de autores cearenses. Embora sejam esporádicos, dispersos e que estão postos aqui e ali na literatura cearense, há registros de fragmentos de uma Educação Física em Fortaleza a partir de estudos locais realizados. Sobre este assunto, há vasta bibliografia nacional, no entanto, observar a história desta disciplina por um ângulo homogeneizador é perder de vista os estudos das diferentes realidades sociais que compõem o conjunto do nosso País.
O alerta de Cavalcante (2000, p. 57) serviu-me como estímulo à reflexão sobre alguns problemas metodológicos que porventura podem ocorrer na pesquisa histórica. Entre eles, encontra-se o uso "apressado" de alguns fatos históricos. De tanto serem repetidos, são tomados como verdades absolutas. A naturalização de um determinado acontecimento desagua na fácil aceitação e rejeita qualquer dúvida ou questionamento que porventura tivesse a audácia de nascer.
A história da Educação Física no Ceará continua adormecida, sobretudo àquela de tempo mais longíquo. Encontra-se esquecida nos cantos das estantes, dos arquivos, dos estabelecimentos escolares, dos jornais da época e de tantos outros espaços de memória.
As fontes que possibilitaram a execução deste ensaio foram variadas. Contei com dados de trabalhos acadêmicos, fontes periódicas, além da literatura regional, que enfocaram o Ceará daquele período como narrativa. Entre os autores estão Rachel de Queiroz, Adolfo Caminha, Rodolfo Teófilo, Antônio Bezerra, Raimundo Girão- os principais.
A utilização dessa literatura se justifica por tratar-se de uma importante fonte de informação, pois, além de revelar os detalhes da época, acredito que me ajudaram em contemplar o corpo cearense, institucionalizado ou não.Todavia, é bastante discutido a institucionalização do corpo em razão, de já nascermos dentro de um modelo que é transmitido no seio da família.
Vale salientar que a institucionalização da Educação Física se deu em um processo social desencadeado pela preocupação de educar corporalmente os indivíduos no ímpeto de alinhar-se aos interesses, paixões e padrões estéticos, econômicos e higiênicos locais, nacionais e internacionais, no período de 1863-1945. Naquele momento, Fortaleza vivia seus dias de efervescência social, política e econômica, movida, principalmente, pelas idéias abolicionistas, republicanas e da belle époque3, mola propulsora do olhar "científico - europeu" sobre o corpo do sertanejo como raça inferior.
Fortaleza, a higiene e a educação físicaO ponto de partida é Fortaleza, no final do século XIX e início do século XX. No entanto, a compreensão daquela Fortaleza requer o entendimento da educação corporal atrelado ao contexto social, político, econômico e climático. Assim, poderemos estabelecer um diálogo do ser corpóreo cultural e social com as dimensões do local.
Em linhas gerais, Fortaleza, do referido período, conviveu com a seca, o medo e a migração, o sertão, a "modernização", epidemias como a varíola, febre amarela e a coléra, as idéias como as liberais, positivistas, militaristas, higiênicas e eugenistas, medidas de disciplinamento, controle e a educação do homem "civilizado".
Um panorama da Cidade, na metade do século XIX, é apresentado por Cordeiro (2000, p.135), com o surgimento de "novas idéias, ligadas ao cientificismo e ao liberalismo político", assim como, " com intensos movimentos" políticos e partidos, tribuna, imprensa, crescente circulação de idéias, agrupamentos intelectuais", e a "preocupação com a educação".
Não foram poucos os esforços4 de pessoas ilustres que empenharam-se pela criação, organização e difusão do sistema educacional no Ceará. A criação de importantes instituições de ensino foi uma luta árdua no decorrer do século XIX e início do século XX, como por exemplo, o Liceu do Ceará5, a Escola Normal6, a Escola Militar do Ceará7 e a Escola de Aprendizes Artífices do Ceará8. Foi possível extrair da história destas instituições, os vestígios de uma Educação Física (também denominada de ginástica e/ou instrução militar) no Ceará.
O colégio Ateneu Cearense, criado por João de Araújo Costa Mendes em 1863, representou em seus 23 anos de existência um importante Instituto Educacional e que " vinha reforçar a ação do Liceu" (Girão,1984, p.219) na transformação de homens rudes e sem "educação" para cidadãos instruídos, polidos e civilizados. Exemplo complementado pela escritora Rachel de Queiroz9 ao abordar o desejo de uma mãe em ter um filho doutor e o desgosto pela rudeza de um outro filho vaqueiro. O programa curricular daquele Estabelecimento constava de "Educação Religiosa, Humanística e mais a de Música, Dança e Ginástica" 10.
Sousa mencionou os vestígios da revolucionária introdução da classe de ginástica pelo regulamento de 1896, como se deduz das seguintes linhas,
O regulamento de 1889 foi substituído em 1896. Nesse ano José de Barcelos, que tinha sido substituído desde 1891, por uma sucessão de Diretores, reassume o posto onde ficará interinamente até 1900. Passam a incluir-se no Curso Normal novas disciplinas, modificando-se certos programas, em alguns casos com evidente alcance prático. E o mais revolucionário é a introdução da classe de ginástica ( Sousa, s/d:163).
O impacto desta revolucionária introdução da ginástica, não apenas neste estabelecimento, mas na sociedade cearense é explicado por Madeira da seguinte forma:
Não era apenas na Escola de Aprendizes que as aulas de Educação Física eram ministrada por oficiais do Exército. Em toda a rede regular de ensino, não havia professores habilitados para lecioná-los. Esta situação, de certo modo, favorecia à formação do espírito patriótico nos alunos, haja vista que, possivelmente, as aulas obedeciam a uma disciplina inteiramente militar, pois pressupomos que tais oficiais não foram formados para educar o corpo sob outra perspectiva que não a do adestramento e do condicionamento para a disciplina... Por conta dessa carência, a primeira saída que se apresentara era recrutar oficiais do Exército para tal exercício, já que a compreensão de Educação Fisica, como a afirmamos, tinha uma conotação de instrução militar (Madeira,1999, p.117).
Para educar a mulher, surge o tradicional Colégio da Imaculada Conceição1112, em 15 de agosto de 1864. A preocupação de educar a mulher, ou melhor, o corpo feminino, estava na preparação em assumir o seu papel "natural" na sociedade do século XIX12, a maternidade. Mais do que "aguardar marido", a Escola Normal representou importante mudança na imagem da mulher, pois, como normalista, a mulher conquistou o direito de andar sozinha pelas ruas da Cidade, ter acesso à leitura de alguns livros considerados perniciosos ao belo sexo, e sobretudo, defender suas idéias, a exemplo da professora Adília Albuquerque Morais13 Defendendo a igualdade entre o sexo, pregou a Educação Física como via para equiparar a uniformidade cultural do País. Como segue abaixo,
Os Novos Direitos da Mulher- por Adília de Albuquerque Morais14
(...) Abrem-se agora, para nós, mulheres as portas até então vedadas do recinto dos Parlamentos, onde penetraremos, em breve, com o denodo e coragem necessarios para "defendermo-nos , a nós mesmos, ao nosso lar , e melhoramos as condições de vida e crenças pela instituição de leis sadias".(...)
(...) Unidade da cultura nacional- Uniformidade dos programas dos cursos superiores, secundário e primário do professor nacional nas Escolas Normais superiores da União. Fiscalização deste, em todo território da República do ensino uniformemente registrado. Educação Física.(grifo meu). Ensino religioso. Formação moral e cívica...(O POVO, 21/nov/32).
Países desenvolvidos, como a Inglaterra, França e os Estados Unidos foram tomados como exemplos de civilidade, e não difere dos dias de hoje. Ser civilizado significou uma modificação corporal pela assimilação de boas maneiras, cortesia e polidez e, assim, conseguir uma projeção social. Com efeito, o indivíduo educado seria aquele que controlasse sua rudeza, educasse seu corpo. Daí não ser à toa a Educação Física (ginástica) ser representante do que havia de mais moderno na época.
Tal exemplo é citado na obra de Antonio Bezerra, O Ceará e os Cearenses (1906), onde o autor menciona a existência de um cearense que, utilizando-se de seus conhecimentos de "gimnástica saiu pela vida a fora até chegar na velha Inglaterra"15.
O Estado do Ceará, também, considerado atrasado em relação ao Estado de Pernambuco16, segue seus passos demonstrando o interesse já existente dos jornais em destacar a importância da Educação Física como sinônimo de lugar civilizado que acompanha o progresso dos países europeus. No jornal O Cearense, foi encontrado este valioso achado em páginas de anúncio do periódico.
Internato Pernambucano
Para educação physica tão recomendada nas cazas de educação, há um lago para a natação, botes para os exercícios de remar, e um pequeno circo para gymnástica ( O Cearense, 31/05/1877).
Um corpo educado que não era diferente do encontrado nas escolas religiosas de Pernambuco. Vejamos o programa do Collegio de São Francisco Xavier, dirigido pelos padres da Companhia de Jesus (1867),
CAPITULO II- Educação Religiosa e Civil
Art.3 - Com toda a diligencia prover-se-há a parte da educação physica para manter são, vigorosos e agil o physico dos alumnos. Os passeios e recreios ordinarios e estraordinarios o exercicio gimnastico, a hygiene nas comidas, os exercicios litterarios devidadmente intercalados serão os meios que principalmente se empregarão para este fim (Azevedo, 1981, p. 199).
A respeito do curriculo da Educação Física, tem-se conhecimento que a ginástica sueca foi incluida na Escola Normal pelo Regulamento de 1918, juntamente com as matérias novas como inglês, datilografia, estenografia (Sousa,s/d,p.164). Fato, também observada no trabalho final da formanda Aracy Coelho de Negreiros que tratava da EDUCACÃO PHYSICA ( Silva, 2000, p.174).
A contribuição do pedagogo Lourenço Filho na educação cearense, embora muita discutida, foi considerada, por alguns educadores, significativa17 no sentido de implementar uma primeira grande reforma no ensino cearense, em 1923. Na Escola Normal, a reforma estabeleceu um plano de quatro anos e a Educação Física passou a ser ministrada duas vezes semanais18.
Seguindo, ainda, as pistas deixadas por Sousa, encontramos na Escola Normal Rural a presença da Educação Física. Com o objetivo de fornecer ensino simples e prático à gente rural (Sousa, s/d, p.168), esse estabelecimento foi criado em 1934. Considerada, mais do que uma simples instituição didática, a Escola Normal Rural foi fecunda em criar em torno dela vários serviços e associações, "em sentido pedagógico, amplo e orgânico, como por exemplo Cooperativa Escolar, do Pelotão de Saúde, do Clube de Leitura e Recreação, Bibliotecas Infantis e Museus Escolares" (Sousa s/d,p.169).
Autores como, Sousa (s/d:270) e Castelo (1970), apontaram pistas da Educação Física no Ensino Militar no Ceará. Esta importante Instituição teve o primeiro estabelecimento no ano da proclamação da República do Brasil19. Passando por uma série de modificações, o Decreto de 9 de janeiro de 1942 instituiu ao Colégio Militar o caráter de uma Escola Preparatória de Cadetes, seguindo a legislação que regulava o Ensino Secundário, juntamente com as leis e regulamentos do Exército. A organização era a seguinte:
Instrução Militar
1ºAno
Educação Moral e Instrução Geral
Educação Física
Instrução Técnica, ordem unida, armamento (armas individuais), instrução prepartória para o tiro, técnica de tiro com fuzil, intrução individual de Serviço em Campanha;
Instrução tática Individual.
2ºAno
Educação Moral e Instrução Geral
Educação Física
Francês
Instrução técnica; ordem unida; maneabilidade do Grupo de combate (formal); instrução individual de serviço em campanha; tiro do F.O.; armamento coletivo(FM)
Instrução Tática Individual
3ºAno
Educação Moral e Instrução Geral
Educação Física
Instrução Técnica e Tática; revisão e aperfeiçoamento da instruçao já recebida; maleabilidade do Grupo de Combate (em terreno variado) (Sousa,s/d,p.272).
Em nome do "aformoseamento" da cidade, foi travado um conjunto de reformas que implicavam " 'civilizar' e 'domesticar' a população, sobretudo os setores populares, cujos hábitos e costumes eram tidos como rudes e selvagens pelos agentes daquele processo civilizador" (Ponte, 2000, p. 163). Para discipliná-los, os higienistas "estabelecerem práticas de controle higiênico sobre a população. Neste espírito criou-se o Lazareto da Lagoa Funda, Santa Casa de Misericórdia e um novo cemitério, como também, a ferrovia para Baturité, a fundação da Academia Francesa e o plano urbanístico de Adolfo Herbster (Ponte, 2000, p. 164).
A educação corporal era exigida na formação de homens polidos (educados), disciplinados (polícia, militar, controle, vigilância), limpo (higienizado, sadios). Deste modo, se deu a modificação do "rude" sertanejo que, passava deste "a rigorosa disciplina e a adaptação contínua a novas tecnologias sociais: vida em comum, banheiro, horários rígidos, higiene pessoal, vacinação", a uma vigilância constante, " um aprendizado de novas hierarquias"20 e o surgimento de outros saberes, a exemplo dos médicos higienistas-sanitaristas e dos educadores físicos. O papel destinado à educação era "instruir o povo nas letras, na higiene e nos sentimentos nacionalistas"21. Vejamos, então, como as idéias que estavam em destaque chegaram aos corpos dos escolares,
Por ocasião do grande fluxo migratório da zona rural para as principais cidades brasileira, a população que começava a constitui-las tinha uma formação cultural diferencida dos padrões culturais da classe social em ascensão. Como vimos, Fortaleza, por ex; foi uma das capitais brasileiras onde, mais abruptamente, crescera a sua população em virtude das grandes secas que expulsavam um enorme contingente de retirantes, famintos e acometidos por epidemias como a varíola. Todo esse quadro fazia a população fortalezense se distanciar largamente dos ideais pretendidas pelos republicanos. (...) tornava-se absoluto a incorporação de hábitos higiênicos como as únicas responsáveis para uma vida saudável. O espaço escolar, por sua vez, não ficara imune a esse controle. Vários artigos da Revista Pedagógica, expressem a preocupação de intelectuais cearense em ver o ambiente escolar dentro dos padrões higiênicos exigidos (Madeira,1999, p.165).
Pelos periódicos locais encontramos a presença da ginástica e dos jogos nos Grupos Escolares e foi noticiada da seguinte forma,
Com a presença do dr. Moreira de Sousa, Diretor da Instrução Pública, Filgueiras Lima e Djacir Menezes, funcionários da Diretoria da Instrução iniciaram-se as festividades do Grupo Escolar do Bemfica, ás 8 horas da manhã de hontem, em comemoração do "Dia da Criança". Visitámos todas as classes, em cujas paredes viam-se desenhos coloridos, acompanhados de legendas morais e cívicas que constituíam otimas lições para a criançada.
No pateo do Grupo realizaram-se jogos infantis, cirandas, ginásticas, cantigas, no meio da maior cordialidade e do mais intenso entusiasmo (O POVO, 13/out/32).
O espírito da "belle époque" foi interropido pela seca de 1877-1879 e devido "a longa estiagem possibilitou a propagação de um fulminante epidemia de varíola". Com aquela grande seca e, com as que a sucederam, Fortaleza tornou-se um reduto para onde os retirantes corriam para se salvar, ou morrer nos Campos de Concentração22. Diante do flagelo das secas, as autoridades políticas e a elite criaram medidas para evitar a presença dos retirantes que, além de enfeiar a Cidade, ainda a contaminavam com a doença dos corpos e da alma (a mendicância, prostituição e saqueadores).
Para compreender como a seca abalou as relações sociais, recorro às explicações de Neves:
...estamos falando de certas características da sociedade brasileira - a economia tradicional de subsistência, o paternalismo, o controle coronelístico da política etc - que tornam uma extensa população que habita o semi-árido nordestino extremamente vulnerável diante da irregularidade de chuvas e de outras alterações de suas condições de subsistência, por mais insignificantes que sejam...(Neves, 2000, p. 100),
Outras secas vieram e o governo, além das mencionadas medidas, incorporou o recrutamento dos jovens retirantes para frente de combate na "Revolução Constitucionalista" de São Paulo, em 1932, como também, na formação do "Soldado da Borracha"23, por ocasião da II Guerra Mundial.
No episódio, mencionado acima, observou-se o uso da ginástica sueca para corrigir o corpo dos "Soldados da Borracha" dentro dos padrões considerados normais. Nos desenhos de Chabloz24, a anatomia de um homem tida como normal era chamado de Normolíneo e comparado aos tipos de corpos nordestinos (Disgenopata, Mixotipo e Brevilíneo) considerado nos desenhos como "biotipos inferiores". Suas características eram:
O Normolíneo apresenta pêlos e pescoço longo
Valor tronco= valor membro, valor torax=valor abdômem;
Os pêlos podem não serem abundantes, porém obedecem ao tipo de implantação masculina;
O pescoço é um tanto longo, única nota desharmonica, sob o aspecto morfológico;
Biotipos Nordestinos:
1-Disgenopata - apresenta traços de inferioridade.
As dismorfias são elementos frequentes. Está aqui presente o joelho varo;
Existem outros sintomas de inferioridade; implantação feminina dos pêlos (cabeça e pube);
Também as faces deste indivíduo exprime uma inferioridade psíquica, que ele, de fato, é um débil mental.
2-Mixotipo- tronco longo e pouco volumoso mais próximo do "normal".
É também um tipo aproximadamente central;
O tronco, apesar de longo não é tao volumoso;
Os membros inferiores são relativamente curtos.
3- Brevilineo- ventre proeminente, ausência de pêlos desvaloriza o tipo.
Ventre proeminente, ptósico;
Panículo adiposo mal distribuído;
A ausência de pêlos não tem valor aqui, por se tratar de um melanodermo (Lima, 2002, p.16).
Fora dos muros escolares e no terreno das atividades "mundanas-sociais", surgiram os laços extensivos da educação de um corpo que carrega em sua memória as marcas culturais da época. Foram encontrados, por exemplo, na forma de acrobacia pelo jornal O Cearense2526; nos clube recreativos da cidade2627, pelos jornais: A República (1898), O Cearense (1898), O Povo (1932); no lazer, pelo jornal O Povo (1932) 2728, o hipismo na praia n' O Povo (1932) 2829; a ginástica circense no Ceará2930, as danças dos casais na Festa da Primavera3031, as pistas de corridas no Jockey3132 e o nado.
À feição de uma conclusãoDiante da incursão do texto, concluo que, ao longo do tempo, as transformações ocorridas nas citadas estruturas sociais transformaram, também, as relações do fortalezense com o seu corpo. A Educação Física foi a pedra angular da correção dos chamados desvios físicos e morais, além de ajudar na modernização de Fortaleza. Compreendo que, existem aqui duas relações: uma relação de alguém que atua sobre o corpo de alguém, neste caso, trata-se das instituições, e a outra relação é a do indivíduo sobre o seu próprio corpo. Assim, além de receber e incorporar uma educação corporal de fora para dentro, o fortalezense passou a interiorizar as relações sociais em seu corpo. Talvez, por essas raízes imbricadas na história, possamos compreender os apelidos pejorativo como "cabeça-chata", "moleque" e "nanico" em que o cearense, ao longo da sua trajetória de vida passou a ser chamado.
Notas
Intitulada "O Sentido da Educação Física nos documentos e no Cotidiano de uma Escola Pública Cearense", Dissertação de Mestrado desenvolvida no período de 2000- 2002, Faced/UFC.
Cf. Betti (1991, p. 63).
Ponte esclarece que "Esse processo significou a inserção da capital cearense no contexto da belle époque (belos tempos), termo francês cunhado para traduzir a euforia européia com as novidades extasiantes decorrentes da revolução científico - tecnológica (1850-1870 em diante)..." (2000, p.162).
5Cf. Sousa ( s/d, p.158).
O Liceu do Ceará foi criado em 15 de julho de 1844, pela Lei nº 304, sancionada pelo Presidente da Província José Maria da Silva Bittencourt, sendo instalado em 10 de outubro de 1845. Cf. Sousa, (s/d, p. 227).
Depois de muitas tentativas, a Escola Normal foi criada em 1878, pela lei de 28 de dezembro. A 2 de outubro de 1881 foi lançada a sua pedra fundamental. Cf Sousa ( s/d. p 162) e Silva ( 2001).
Segundo Sousa (s/d,p. 269), o Colégio Militar foi "criado pelo Decreto n. 10177 de 1º de fevereiro de 1889, e instalada a 1º de maio do mesmo ano, começou a Escola Militar do Ceará a funcionar com o Curso Preparatório e o 1º ano do Curso de Infantaria e Cavalaria. Mas, logo a seguir, o Regulamento de 12 de abril de 1890, que reorganizou o ensino nas escolas do Exército, reduziu a Escola ao Curso Preparatório em 3 anos. Em 1897 a Escola foi extinta, após breve vida, tendo diplomado cêrca de 2000 alunos, que se dirigiam para uma das Escolas Militares do Rio ou de Pôrto Alegre ".
Cf, Madeira, 1999.
Cf.Rachel de Queiroz, O Quinze, 1993, p. 17).
Cf. Girão (1984, p. 219).
Sobre este estabelecimento, consultar o romancista cearense Adolfo Caminha, A Normalista, (1985, p.16).
Sobre este assunto, consultar Lima (2001).
Segundo Coutinho (1989), Adélia de Albuquerque Morais nasceu em Icó, Ceará, no dia 12/dez/1874 e faleceu em Rio de Janeiro, no dia 2/nov/1942. Ela foi cronista e professora da Escola Normal, além de ter sido abolicionista e feminista. Suas obras foram: Crônica da Escola Normal, obras de História, de Gramática; além de ter sido colaboradora de períodicos como A Razão e O Povo.
Sobre o nome da cronista, foi encontrada uma discordância na sua grafia, respeitei a grafia de Coutinho (1989).
Cf. Bezerra ( 2001, p. 24).
Cf. Adolfo Caminha, A Normalista (1985).
Cf Sousa (s/d), Silva (2000), Cavalcante (2000).
Cf Sousa (s/d, p.184).
Sobre o assunto, consultar Neves (2000, p. 91).
Maiores informações, consultar Madeira (1999).
Os campos de concentração eram locais que as autoridades governamentais reservavam aos retirantes para prestarem ajuda no momento de estiagem. Em razão do grande número de flagelados, a "ração" alimentar não era suficiente e estes campos passaram a ser chamados de "cemitério dos santos".
A criação dos campos de concentração era uma dessas medidas, porém teve outras como " (a) proteger Fortaleza da 'invasão' dos retirantes, (b) criar mecanismos para "fixar o homem no campo"e (c) conectar os locais de atração dos migrantes com obras públicas de construção de poços, barragens e açudes. Maiores informações em Neves (2000, p. 90).
Cf. Lima, 2002a.
Suiço contratado pelo governo como responsável pela divulgação da campanha no recrutamento do retirante da seca.Cf. Lima, 2002a.
Nas páginas de anúncio, encontra-se a matéria sobre o "Recreio Gynmástico" que abordou os artistas em dificílimo trabalho acrobaticos. Cf. O Cearense, 29/11/1871.
Clubes como: Club Iracema, Grêmio Recreativo Estudantil, Club Cearense, entre tantos outros que existiram. Sobre o lazer na cidade de Fortaleza, consultar Jucá (2000).
O POVO-10/OUT/1932.
29O POVO-11/OUT/1932.
O Cearense- 31/05/1877.
O POVO, 27.8/1949- Pares ensaiam para a Festa da Primavera.
32O POVO, 13/8/1949- Pistas de corridas no Jockey são inauguradas.
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digital · Año 9 · N° 64 | Buenos Aires, Septiembre 2003 |