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Composição corporal e perfil
antropométrico de ginastas masculinos

   
Professor Assistente I - Universidade Federal do Mato Grosso
Doutorando em Ciências da Motricidade (Biodinâmica da Motricidade Humana)
 
 
Gustavo Puggina Rogatto
grogatto@hotmail.com
(Brasil)
 

 

 

 

 
Resumo
    O presente estudo teve como objetivo comparar características antropométricas e de composição corporal de jovens praticantes de ginástica artística (GA) com indivíduos da mesma faixa etária não participantes de programas sistematizados de treinamento. Assim, 16 meninos foram distribuídos em 2 grupos de acordo com a participação em programas de treinamento: 1) controle (meninos que não participavam de programas de treinamento); e 2) ginastas (meninos participantes de programas de treinamento em GA). Os participantes foram submetidos a avaliações da massa e estatura corporal, índice de massa corporal (IMC), circunferência de braço, dobras cutâneas (triciptal, abdominal e subescapular) e áreas muscular e total do braço (AMB e ATB, respectivamente). A ANOVA indicou que para a mesma estatura, o grupo de ginastas apresentou valores de massa, IMC, dobras cutâneas, massa e percentual de gordura significativamente menores que o grupo controle. Não foram observadas diferenças significativas quando se comparou os parâmetros referentes à quantidade de massa muscular (massa corporal magra, AMB e circunferência magra do braço) dos dois grupos estudados. Os resultados nos permitem concluir que as modificações antropométricas decorrentes da participação em programas de treinamento em GA podem estar relacionadas com alterações da adiposidade corporal e não do conteúdo muscular em meninos com idade pré-púbere.
    Unitermos: Antropometria. Gordura corporal. Área muscular. Crianças. Treinamento. Ginástica.

Abstract
    The aim of this study was to compare anthropometric and body composition characteristics of young gymnasts (GA) with individuals of the same age group not participants of systematized exercise training programs. Thus, 16 boys were distributed in 2 groups according to the participation in GA training programs: 1) controls (not participants of GA training programs); and 2) gymnasts (participants of GA training programs). The participants were submitted to the following evaluations: body mass, stature, body mass index (BMI), arm circumference, subcutaneous fat (skinfolds: triceps, abdominal and subscapular), and muscular and total arm area (MAA and TAA, respectively). ANOVA indicated that for the same stature, the gymnast group presented values of mass, BMI, subcutaneous fat, fatty mass and percentile significantly lower than control group. No significant differences were observed when muscular mass parameters (lean body mass, MAA and lean arm circumference) of both groups were compared. These results led us to concluded that anthropometric modifications of pre-pubertal boys resulting of the participation in GA training programs can be related to the body adiposity and not to the muscular contents.
    Keywords: Anthropometry. Body fat. Muscle area. Children. Training. Gymnastics.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 9 - N° 62 - Julio de 2003

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Introdução

    A participação em programas de treinamento físico pode resultar em inúmeras modificações dos componentes corporais, promovendo aumento da massa muscular e redução de tecido adiposo (McARDLE, KATCH & KATCH, 1992; FOX, BOWERS & FOSS, 1991). Contudo, ao mesmo tempo que tais adaptações são observadas, como efeitos esperados da maior exigência muscular e metabólica, alguns desvios de comportamento podem gerar respostas negativas para a performance e a saúde do individuo. Um ponto extremo desta afirmação é baseado no exemplo de uma ginasta escandinava que em 1982 morreu de anorexia nervosa (LINDBOE & SLETTEBÆ, 1984). Este tipo de incidente pode ser mais freqüente do que se imagina, uma vez que grande parcela das mortes de atletas pode não ter sido associada ao fato da excessiva preocupação com o peso.

    Particularmente em esportes onde as categorias são feitas por peso corporal, o uso de recursos para a manutenção ou redução do peso corporal é freqüentemente observado. Desta forma, manipula-se a ingestão calórica, a quantidade de sal da dieta, e em alguns casos faz-se uso de medicamentos diuréticos ou até mesmo a suspensão da ingestão hídrica pré-competição (como no fisiculturismo ou no judô).

    A utilização de manobras de restrição calórica na dieta e/ou aumento do gasto energético pela prática de exercícios físicos pode ser feita por técnicos responsáveis pelo treinamento de crianças e adolescentes, uma vez que o acúmulo excessivo de gordura corporal pode representar um "peso extra" a ser suportado pelo atleta durante a competição. Contudo, níveis de percentual de gordura muito reduzidos podem resultar em prejuízos para a saúde, principalmente quando se trata de uma população em fase de crescimento e desenvolvimento (McARDLE, KATCH & KATCH, 1992).

    O objetivo do atual estudo foi comparar características antropométricas e de composição corporal de jovens praticantes de ginástica artística (GA) com indivíduos da mesma faixa etária não participantes de programas sistematizados de treinamento.


Material e método


Voluntários

    Fizeram parte do presente estudo 16 meninos. Os voluntários foram distribuídos em 2 grupos experimentais:


Características físicas

    Todos os participantes foram submetidos à avaliação da massa e da estatura corporal, índice de massa corporal, medida de dobras cutâneas, e circunferência de braço.


Massa corporal

    A medida da massa corporal foi feita em balança do tipo plataforma da marca Filizolla, com precisão de 100 gramas. As crianças foram avaliadas sem calçados utilizando apenas "shorts". Os valores de massa corporal foram expressos em quilogramas (Kg) (MAUD & FOSTER, 1995).


Estatura

    A estatura foi avaliada por comparação com escala específica (com precisão de 0,5 centímetros) para avaliação de estatura onde as crianças foram posicionadas eretas e sem calçados. A estatura corporal foi avaliada após e execução de inspiração máxima seguida de apnéia e os resultados foram expressos em centímetros (cm).


Índice de massa corporal

    A partir das medidas de massa e estatura corporal foi calculado o índice de massa corporal (IMC) pela equação:

IMC (Kg/m2) = M/E2

onde M corresponde à massa corporal (Kg) e E corresponde à estatura corporal (expressa em metros).


Circunferência de braço

    A medida de circunferência de braço (CB) foi realizada por meio de fita milimetrada flexível com precisão de 0,1cm. O local de medida da CB foi determinado pelo ponto médio da distância entre o acrômio da escápula e o olécrano. Para a realização desta medida o participante permaneceu na posição em pé, com os braços relaxados ao lado do corpo de acordo com técnica proposta por MAUD & FOSTER (1995).


Dobras cutâneas

    Para a avaliação das dobras cutâneas dos membros superiores foi utilizado um compasso de dobras cutâneas Lange (Beta Technology Incorporated, Cambridge - MD) com precisão de 1mm e pressão constante de 10gr/mm2. Os pontos avaliados foram:

  • Tríceps (dobra cutânea triciptal): dobra longitudinal realizada na porção posterior do braço sobre o ponto médio da distância entre o acrômio da escápula e o olécrano;

  • Subescapular (dobra cutânea subescapular): dobra oblíqua medida imediatamente abaixo da extremidade inferior da escápula;

  • Abdômen (dobra cutânea abdominal): dobra vertical medida a 2,5cm da cicatriz umbilical;

    Todas as medidas, realizadas no lado direito do corpo, foram feitas com o indivíduo em pé, com o braço relaxado ao lado do corpo (McARDLE, KATCH & KATCH, 1992; MAUD & FOSTER, 1995). Foram feitas 3 medidas de cada uma das pregas cutâneas, admitindo-se a média destas. Os valores das dobras cutâneas foram expressos em milímetros (mm).


Circunferência muscular do braço

    As medidas de circunferência de braço (CB) e dobra cutânea triciptal (DCTr) também foram utilizadas para o cálculo da circunferência muscular do braço (CMB) a partir da equação:

CMB (cm) = CB - DCTr

    Áreas total e muscular do braço

    A partir das medidas de circunferência de braço (CB) e dobra cutânea triciptal (DCTr) foram determinadas as áreas total (ATB) e muscular (AMB) do braço pelas equações:

ATB (cm2) = (CB/2)2
AMB (cm2) = CB - DCTr


Análise estatística

    Os resultados foram submetidos à estatística descritiva e avaliados por teste t-Student para amostras independentes. O nível de significância pré-estabelecido foi de 5%. Os tratamentos estatísticos utilizados no presente trabalho fazem parte do pacote estatístico BioEstat 2.0 (AYRES, AYRES Jr., AYRES & SANTOS, 2000).


Resultados e discussão

    Estudos na área de Medicina do Esporte têm se preocupado com o estado de saúde de atletas de diferentes modalidades, sendo que questões referentes ao estado nutricional têm despertado grande interesse para a realização de pesquisas aplicadas ao exercício físico e à saúde (BARLETT, MANCE & BUSKIRK, 1984; LINDBOE & SLETTEBÆ, 1984; HERGENROEDER, FIOROTTO & KLISH, 1991; CUPISTI, D´ALESSANDRO, CASTROGIOVANNI, BARALE, MORELLI, 2001).

    Na tabela 1 são apresentados os valores de idade, massa, estatura, índice de massa corporal (IMC) e circunferência de braço dos grupos controle (GC) e ginastas (GG). Ambos os grupos apresentaram a mesma idade cronológica. O GG mostrou valores de massa corporal significativamente menores que o GC (p<0,05). Não foram observadas diferenças entre as estaturas médias dos dois grupos. A diferença de massa corporal entre os grupos, associada com a manutenção da estatura resultou em menor IMC no grupo participante de programas de treinamento de ginástica artística (p=0,007). Não foram observadas diferenças significativas quando comparamos as medidas de circunferência de braço entre os grupos estudados.

    Em um estudo de LINDBOE & SLETTEBÆ (1984) que avaliaram características de massa, estatura e índice de massa corporal de ginastas do sexo feminino, não foram observadas diferenças significativas destas variáveis quando se fez a comparação com as características do grupo controle. Estes resultados geraram surpresa neste grupo de estudiosos, uma vez que se esperava redução do peso corporal devido ao controle da ingestão alimentar realizado pelos atletas. Como observado em nosso estudo, CUPISTI et al. (2001) encontraram diferenças na massa corporal e no IMC de praticantes de ginástica rítmica, com valores similares de estatura. Diferentemente do atual estudo, estes autores observaram que a circunferência de braço de praticantes de ginástica rítmica desportiva era significativamente menor que a do grupo controle. Contudo, as diferentes características de esforço entre as modalidades de Ginástica Artística e Ginástica Rítmica podem ter influenciado a observação de resultados distintos do atual trabalho, uma vez que na GA as exigências dos membros superiores quanto a realização de movimentos balísticos ou de sustentação são mais presentes, o que pode favorecer uma manutenção do volume muscular. A observação de IMCs médios de 17,83 e 19,78 Kg/m2 nos grupos GG e GC respectivamente, aponta para valores considerados baixos, uma vez que a faixa de normalidade situa-se entre 19 e 25 Kg/m2 (SHARKEY, 1998).

Tabela 1: Características descritivas de idade (anos), massa (Kg), estatura (cm), índice de massa corporal (IMC) (Kg/m2) e circunferência de braço (CB) dos participantes do estudo. Resultados expressos como média ± desvio padrão. N.S = diferença não significativa.

    Na figura 1 são apresentadas as medidas das dobras cutâneas triciptal, abdominal e subescapular e a somatória da dobras dos grupos GC e GG. O GG apresentou menores medidas de espessura de todas as três dobras cutâneas avaliadas quando comparado ao GC. Tal comportamento refletiu em diferenças na somatória das dobras cutâneas entre os grupos. O percentual de gordura (% Gord.), a massa de gordura (MG) e a massa corporal magra (MCM) estão apresentados na tabela 2. A diferença na quantidade de tecido adiposo subcutâneo, aferida pela medida das dobras cutâneas, refletiu em menor percentual de gordura com conseqüente interferência na MG de GG. Esta menor adiposidade tem sido freqüentemente observada em crianças e adolescentes que participam de programas de treinamento em modalidades de dança, corrida e ginastas (COHEN, KIM, MAY & ERTEL, 1982; WARREN, 1983). Tal modificação da composição corporal, com acentuada redução do percentual de gordura corporal, deve-se a um desequilíbrio entre o conteúdo energético de ingestão e de gasto, e pode influenciar algumas funções endócrinas do adolescente, resultando em comprometimentos da síntese de alguns hormônios (WILSON & FOSTER, 1992; BERNE & LEVY, 1993; GUYTON & HALL, 1997). Esta relação entre a quantidade de gordura corporal com síntese hormonal pode ser observada freqüentemente em atletas do sexo feminino com amenorréia (COHEN, KIM, MAY & ERTEL, 1982; WARREN, 1983). Estudos apontam que a amenorréia em dançarinas e atletas está associada com osteopenia e fraturas por estresse (DRINKWATER, NILSON, CHESTNUT, BREMNER, SHAINHOLTZ & SOUTHWORTH, 1984; MARCUS et al., 1985; WARREN, BROOKS-GUNN, HAMILTON, WARREN & HAMILTON, 1986).

Tabela 2: Valores de percentual de gordura (% Gord.), massa de gordura (MG) e massa corporal magra (MCM) dos participantes do estudo. Resultados expressos como média ± desvio padrão e valores mínimos/máximos. N.S = diferença não significativa.

    A circunferência ou perímetro do braço tem sido um indicativo do estado nutricional em indivíduos de diferentes faixas etárias. Contudo, em função de sua inespecificidade, a utilização de tal medida como fator único de avaliação do estado nutricional pode não apontar de maneira objetiva a quantidade de gordura ou de massa magra deste segmento corporal. Desta forma, realizamos a medida de circunferência de braço (CB) e calculamos a circunferência muscular do braço (CMB) pela correção feita a partir da subtração da dobra cutânea triciptal. Utilizando as medidas de circunferência de braço e dobra cutânea triciptal, também foram calculadas as áreas total (ATB) e muscular do braço (AMB) dos meninos dos grupos controle e ginastas. No presente estudo não observamos diferenças estatisticamente significativas em nenhuma das três variáveis (CMB, ATB e CMB) (Figura 2) quando comparamos os dois grupos experimentais. Concordando com nossos resultados, em um estudo de CUPISTI et al. (2001) também não foram observadas diferenças no conteúdo muscular do braço entre um grupo de ginastas rítmicas e um grupo controle.

    A partir da análise dos resultados pode-se concluir que: 1) as características gerais de massa e IMC do grupo ginasta foi significativamente menor que o grupo controle; 2) os menores valores de massa corporal de GG devem-se a um menor índice de adiposidade, uma vez que as medidas de dobras cutâneas, massa de gordura e percentual de gordura foram menores neste grupo; 3) a participação de jovens em programas de treinamento de ginástica artística pode promover redução da adiposidade, contudo o conteúdo muscular destes indivíduos não sofre modificações pela prática regular do exercício físico.


Referências Bibliográficas

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  • GUYTON, A.C. & HALL, J.E. Tratado de fisiologia médica. 9.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1997. 1014p.

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  • MARCUS, R.C.; CANN, C.; MADVIG, P. et al. Menstrual function and bone mass in elite women distance runners. Ann. Intern. Med., v.102, p.158-163, 1985.

  • MAUD, P. J. & FOSTER, C. (Ed.). Physiological Assessment of Human Fitness. Champaign: Human Kinetics, 1995. 296 p.

  • McARDLE, W.D.; KATCH, F.L. & KATCH, V. Fisiologia do exercício: energia, nutrição e desempenho humano. 3ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1992. 510p.

  • SHARKEY, B.J. Condicionamento físico e saúde. 4.ed. Porto Alegre: ArtMed, 1998. 397p.

  • WARREN, M.P. Effects of undernutrition on reproductive function in the human. Endocr. Rev., v.4, p.363-377, 1983.

  • WARREN, M.P.; BROOKS-GUNN, J.; HAMILTON, L.H.; WARREN, F. & HAMILTON, W.G. Scoliosis and fractures in young ballet dancers. N. Engl. J. Med., v.314, p.1348-1353, 1986.

  • WILSON, J.D. & FOSTER, D.W. (Ed.). Williams textbook of endocrinology. 8th.ed. Philadelphia: W.B. Saunders, 1992. 1712p.

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