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Comportamento da freqüência cardíaca durante uma sessão
de treino da resistência específica no tênis
de campo: estudo de caso

   
Treinador de Tênis
Pós-Graduado em Bases Fisiológicas e Metodológicas do
Treinamento Desportivo
Universidade Federal de São Paulo
 
 
Adriano Vretaros
professorav@bol.com.br
(Brasil)
 

 

 

 

 
Resumo
    Este estudo exploratório de campo teve como objetivo verificar o comportamento da freqüência cardíaca durante uma sessão de treino da resistência específica no tênis de campo através de um estudo de caso. Participaram desta pesquisa 01 tenista de competição do sexo feminino, com faixa etária de 17,6 anos de idade, estatura de 164,7cm, envergadura de 166,3cm e massa corporal com 57,2Kg. Sua freqüência cardíaca máxima é de 203bpm. A atleta em questão foi submetida a duas baterias de testes da resistência específica, onde foram analisados o comportamento da freqüência cardíaca durante os esforços. Encontramos resultados no qual podemos especular que a sessão de treino da resistência específica no tênis de campo pela sua estrutura e forma de aplicação, aparentemente, respeita o princípio da especificidade
    Unitermos: Resistência específica. Freqüência cardíaca. Especificidade. Tênis de campo.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 9 - N° 59 - Abril de 2003

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Introdução

    A elaboração dos programas contemporâneos de preparação física especial são dependentes do conhecimento fisiológico e biomecânico da modalidade desportiva(Verkhoshanski, 2001). Será através da interpretação desses processos em conjunto com uma análise detalhada das tarefas competitivas, que se poderá criar atividades motoras que respeitem o princípio da especificidade.

    O tênis de campo é uma modalidade de desporto que exige em termos energéticos a utilização de substratos mistos(Groppel & Roetert, 1992). Os movimentos rápidos e explosivos realizados em uma partida são derivados da ressíntese bioquímica da enzima ATP-CP. No entanto, o tempo de duração total de uma partida que pode perdurar de trinta minutos até infinitas horas, acabam solicitando do processo aeróbio. De acordo com Fox et alii(1991), a distribuição energética no tênis de campo ocorre na seguinte proporção: 70% ATP-CP, 20% anaeróbio alático e 10% aeróbio.

    Entre as diferentes valências físicas empregadas na preparação de tenistas competitivos, a resistência é uma das mais comentadas e controversas. A mesma subdivide-se em geral e específica. Podemos entender como resistência geral os processos aeróbios, pois, é através dos mesmos que se permite criar uma otimização da capacidade de recuperação no organismo durante as breves interrupções que ocorrem na partida. Em contraste, a resistência específica concentra-se no requerimento predominante do sistema fosfogênio de energia durante a realização dos movimentos.

    Segundo Skorodumova(1998), o treino da resistência específica no tênis de campo está correlacionada com os índices funcionais derivados na intensidade e duração das fontes anaeróbias para suportar o ritmo imposto pela lógica e tática de uma partida. Neste sentido, Marques(2002) ao estudar o esforço específico no tênis, reporta que a maioria dos movimentos de competição ocorrem em elevada intensidade e não ultrapassam os 5-10 segundos de duração.

    Na pesquisa de Marques(2002) sobre o esforço específico do tênis, o autor retrata que devemos dar uma maior enfase ao treino próximo a zona de intensidade situada nas imediações do limiar anaeróbio. Portanto, devemos perseguir um maior percentual de treino anaeróbio do que aeróbio. Corroborando com esta observação, Groppel & Roetert(1992) constatam que no tênis existe uma predominância de energia no sistema fosfogênio.

    De acordo com Astrand & Rodahl(1980), durante a confecção de um treinamento para se conceber um progresso nos processos anaeróbios compostos pela produção de fosfatos de alta energia na célula muscular, devemos potencializar um trabalho máximo de duração muito curta, compreendida em até 10-15 segundos. Somando-se a isto, Barbanti(2001) especula que devemos empregar exercícios específicos que possuem um estrutura parcial ou idêntica ao movimento efetuado na competição ou jogo.

    Com base nestas observações, esta pesquisa de campo tem como objetivo verificar o comportamento da freqüência cardíaca durante uma sessão de treino da resistência específica no tênis de campo por meio de um estudo de caso.


Metodologia

    Sujeito: participaram deste estudo 01 tenista de competição do sexo feminino, com faixa etária de 17,6 anos de idade, estatura de 164,8cm, envergadura de 166,3cm e massa corporal com 57,3Kg. O valor de freqüência cardíaca máxima da atleta é de 203bpm. O seu tempo de prática desportiva na modalidade é de 06 anos e 03 meses. A tenista C.F. participa das competições de nível do ranking estadual e nacional brasileiro.

    Material: 01 quadra de tênis(piso rápido), 01 trena métrica, 01 cronômetro digital, um monitor de freqüência cardíaca(marca Polar modelo accurex NV), fita adesiva, 01 raquete e 09 bolinhas de tênis.

    Delineamento da pesquisa: A tenista C.F. submeteu-se a uma sessão de treino que envolvia duas baterias de testes da resistência específica. Cada bateria consistia na realização de tiros com velocidade máxima em distâncias pré-estabelecidas. As distâncias por nós selecionadas foram de 5m, 10m e 15m, respectivamente. A seqüência adotada seguia um padrão com cargas crescentes de trabalho, assim dispostos: 1x1x5m, 1x1x10m e 1x1x15m, sendo efetuados três repetições desta seqüência pedagógica ficaria caracterizado como uma bateria. Na execução dos tiros, a atleta foi orientada a empunhar a sua raquete e a efetuar a devolução de uma bola lançada do extremo final da distância estabelecida. O tempo de recuperação entre os tiros foram de 10 segundos(T10) na primeira bateria e 15 segundos(T15) na segunda bateria. Aplicamos um intervalo regenerativo de 1 minuto entre as séries e de 3 minutos entre as duas baterias. Os valores monitorados da freqüência cardíaca(FC) eram anotados imediatamente após o término de cada tiro.


Resultados

Quadro 1 - 1ª bateria - tempo de recuperação entre tiros de 10 segundos(T10)

Quadro 2 - 2ª bateria - tempo de recuperação entre tiros de 15 segundos(T15)

Quadro 3 - Média geral de FC da 1ª e 2ª bateria


Discussão

    Os resultados encontrados da FC retratam características de cargas crescentes de trabalho. O comportamento das médias de FC na 1ª bateria durante as três séries elevou-se de forma linear, a saber: 5m(153,3+6,79), 10m(164,0+5,65) e 15m(172,0+0). Na 2ª bateria, cujo tempo de recuperação foi maior(15 segundos - T15), também houve um comportamento semelhante de linearidade: 5m(145,3+13,19), 10m(164,0+3,26) e 15m(173,3±4,98). Destacam-se dois aspectos na comparação entre as baterias; na 1ª bateria os valores de dispersão sofreram uma baixa variação(0-6,79). Em contraste, na 2ª bateria os valores de dispersão oscilaram entre 3,26-13,19. Acreditamos que os maiores valores de dispersão da 2ª bateria estejam relacionados ao estresse acumulado(fisiológico e emocional), haja visto terem realizado uma bateria anteriormente. Todavia, não se justificaria tal fenômeno pelo fato de existir um intervalo recuperativo entre as baterias de 3 minutos. Chama a atenção os valores iniciais de FC nos tiros de 5m nas duas primeiras séries da 2a bateria que se comparados com a 1ª bateria revelam-se inferiores(156bpm versus 128bpm, 160bpm versus 148bpm). Outro dado relevante diz respeito a FC nos tiros de 15m; que enquanto na 1ª bateria demonstrou-se estável (média de 172,0+0) e na 2a bateria elevou-se linearmente(168bpm, 172bpm, 180bpm e como média 173,3+4,98).

    Aparentemente se traçarmos gráficos com base na média geral das duas baterias evidenciaríamos uma representação linear na curva de FC. Porém, existem pesquisas recentes apontando que o comportamento da FC em cargas crescentes de trabalho possuam características curvilinear nos extremos inferior e superior da curva, ou seja, uma espécie de sigmóide. Neste aspecto, Perrout de Lima(1997) estudou o ajuste sigmóide, ponto de inflexão e o limiar de variabilidade da freqüência cardíaca em cargas crescentes de trabalho em 22 atletas masculinos de diferentes modalidades. O autor concluiu que para 82% dos sujeitos estudados a curva de FC era melhor ajustada pela equação sigmóide de Boltzmann. Entretanto, tal experimento foi realizado em laboratório, sob condições ambientais controladas, diferenciando-se da nossa pesquisa exploratória de campo. Contudo, podemos indagar que os testes laboratoriais aplicados no tênis ou em outras modalidades retratam aspectos isolados e extremamente controlados, fato este, que não condiz com a realidade das partidas. Assim sendo, os testes de campo seriam uma forma de aproximação da realidade de jogo.

    No aspecto recuperativo, os tempos que foram selecionados de 10 segundos(T10) e 15 segundos(T15) entre os tiros na 1ª e 2ª baterias basearam-se no estudo desenvolvido por Ferrauti et alii(2001), no qual avaliaram o efeito da recuperação em dez tenistas do ranking nacional da Alemanha através de drills intermitentes. Este autor encontrou valores de lactato pós-exercício nos tiros com recuperação de 10 segundos significativamente maiores se comparados com a recuperação de 15 segundos(9,04+3,06 versus 5,01+1,35 mmol x l -1, obtendo p<0,01). Na visão de Volkov(1984), durante os processos recuperativos de treino, as particularidades fisiológicas individuais do atleta devem ser levadas em consideração. O mesmo autor relata que a fadiga é o elemento que representa um papel importante nas capacidades anaeróbias do organismo e também na produção funcional do sistema respiratório e circulatório refletindo sobre a FC. Neste estudo, a tenista C.F. não relatou manifestação de fadiga durante a sessão.

    Em relação a FC de jogo, Marques(2002) apresenta como média de ritmo cardíaco na partida em piso de saibro valor de 143,0bpm. Em tenistas russos, Skorodumova(1998) reporta como carga fisiológica nas competições valores médios de FC nos homens em torno de 165+8,0bpm e nas mulheres 173+4,9bpm. Neste estudo, os tiros de 15m foram aqueles que mais se aproximaram em termos de FC dos tenistas russos do sexo feminino(1ª bateria média: 172+0bpm e na 2ª bateria média: 173,3+4,98bpm).

    Vale ressaltar a forma em que foi escolhida as distâncias desta pesquisa. Baseados nos dados de Marques(2002) que retrata como distância média percorrida por ponto o equivalente de 8 a 12 metros. Somando-se a isto, Skorodumova(1998) ao investigar o tênis russo apresenta distâncias compreendidas desde 0,5m até 19m. Portanto, foram com base nestes relatos que após breve análise preferimos utilizar as distâncias de 5m, 10m e 15m. Acreditamos que existam distâncias intermediárias ou até inferiores, que poderiam ser empregadas, pois, de acordo com Skorodumova(1998) as mulheres tenistas correm em média 4,1+2,0m por partida. Nestas distâncias empregadas, nossa estratégia é que fosse potencializado como substrato energético administrador predominante de energia o ATP-CP, reproduzindo com isso, a especificidade energética solicitada nos jogos.

    Na concepção de Weineck(1999), uma variável importante para adaptação aos exercícios físicos num programa de treinamento de alto rendimento é a natureza específica do treino realizado. Portanto, deve ser levado em conta, que propusemos o uso da raquete e a devolução do lançamento da bola no extremo final da distância, como forma de especificidade simulada na modalidade e elemento motivador, buscando através disto uma aproximação em termos comportamentais de FC. Devemos frisar que na atualidade a ciência desempenha um papel elevado na resolução dos problemas metodológicos do treinamento. Respeitando esse postulado básico, Verkhoshanski(2001) reporta que o crescimento do potencial motriz do atleta é dependente de um aperfeiçoamento funcional do organismo e principalmente dos órgãos e sistemas que participam especificamente do movimento.


Conclusão

    Este estudo de cunho descritivo nos permitiu chegar as seguintes conclusões:

  • O comportamento da FC durante a sessão de treino apresentou características lineares, apropriadas para trabalhos com cargas crescentes;

  • Deve ser melhor estudado o estresse cumulativo de cargas em baterias subsequentes e seu tempo de recuperação no tênis, principalmente a nível fisiológico e emocional e sua influência sobre a FC;

  • Os valores de FC nos tiros de 15m foram os que mais se aproximaram de dados científicos literários;

  • A sessão de treino da resistência específica no tênis de campo pela sua estrutura e forma de aplicação, aparentemente, respeita o princípio da especificidade;

  • São necessários estudos adicionais com exercícios específicos semelhantes e também diferentes com uma população maior, para permitir melhor interpretação dos dados.


Referências bibliográficas

  • Astrand, P.O. ; Rodahl, K. Tratado de fisiologia do exercício. Interamericana, Rio de Janeiro; 1980.

  • Barbanti, V.J. Treinamento físico: bases científicas. 3ª edição, CLR Baliero, São Paulo; 2001.

  • Ferrauti, A. ; Pluim, B.M. ; Weber, K. The effect of recovery duration on running speed and stroke quality during intermittent training drills in elite tennis players. Journal Sports Science, v.19, n.04, p.235-242; 2001.

  • Fox, E.L. ; Bowers, R.W. ; Foss, M.L. Bases fisiológicas da educação física e dos desportos. 4ª edição, Guanabara koogan, Rio de janeiro; 1991.

  • Groppel, J.L.; Roetert, E.P. Applied physiology of tennis. Sports Medicine, v.14, n.04, p.260-268; 1992.

  • Marques, M.A.C. O esforço específico no tênis. Lisboa- Revista Treino Desportivo, 19(02), p.20-23; 2002.

  • Perrout de Lima, J.R. Freqüência cardíaca em cargas crescentes de trabalho: ajuste sigmóide, ponto de inflexão e limiar de variabilidade da freqüência cardíaca. Tese de Doutorado - Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo- EEFE-USP; 1997.

  • Skorodumova, A.P. Tênis de campo: treinamento de alto nível. Phorte, São Paulo; 1998.

  • Verkhoshanski, Y.V. Treinamento desportivo: teoria e metodologia. ArtMed, Porto Alegre; 2001.

  • Volkov, M.V. Los processos de recuperacion en el deporte. Stadium, Buenos Aires; 1984.

  • Weineck, J. Treinamento Ideal. 9ª edição, Manole, São Paulo; 1999.

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