Correlação entre o aumento de cargas dos exercícios resistidos e o estresse mental |
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*Mestre em Educação Física - UCB/DF **Prof. do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Física - UCB/DF (Brasil) |
Aníbal Monteiro de Magalhães Neto* anibal1@zaz.com.br Dra. Nancí Maria de França** nfranca@pos.ucb.br |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 54 - Noviembre de 2002 |
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Introdução
No mundo atual o estresse é provocado por objetivos superdimensionados, as pessoas vivem tensas e extremamente preocupadas. O estresse é determinado pela capacidade de adaptação do indivíduo frente a um novo desafio, isto é, que pode deixar o organismo em tensão e inquietude, não só em nível de suas forças físicas, mas principalmente psíquicas. De acordo com MACHADO (1997), o estresse deve ser entendido como a totalidade das reações da adaptação orgânica, as quais objetivam a manutenção ou restabelecimento do equilíbrio interno. Já para VASCONCELOS (1992), estresse é o processo não específico resultante de qualquer demanda sobre o organismo, ele é caracterizado pelas alterações fisiológicas e psicológicas que se processam no organismo quando este se encontra em uma situação que requeira uma reação mais forte do que aquela que corresponde a sua atividade orgânica normal.
Desta forma, o corpo produz substâncias que terão um efeito no organismo visando protegê-lo. Hans Selye citado por VASCONCELOS (1992), introduziu o termo estresse, após vários experimentos, tentando a descoberta de mais um hormÔnio sexual em ratos, usando diversos extratos de placenta e do ovário registrou, nestes ratos, que sempre ocorria grande dilatação do córtex supra-renal, atrofia do timo e de todos os outros órgãos linfáticos do corpo, além de uma série de úlceras perfuradas nas paredes do estÔmago e do duodeno. Assim, chegou à conclusão que diferentes agentes estressores, como microorganismos, traumatismos, emoção, agentes estes não específicos, manifestam-se dentro de um determinado padrão caracterizado como “síndrome geral de adaptação” que para o autor é o estresse.
LIPP (1996), admite duas formas de estresse, a primeira de natureza aguda (muito intenso, mas que desaparece rapidamente), a segunda de natureza crÔnica (não tão intenso, mas que perdura por períodos de tempo mais prolongado); este estresse crÔnico contribui para uma pobre qualidade de vida e aumento do risco de doenças coronarianas, da hipertensão e baixa do sistema imunológico. Ainda segundo a autora, quando nos deparamos com uma situação de estresse, nossas reações seguem as seguintes fases: 1. Fase de reação ou alarme; 2. Fase de Resistência; 3. Fase de Quase Exaustão; 4. Fase de Exaustão.
Recentemente, vários estudos têm demonstrado a eficácia de diferentes formas de tratamento para a combater o estresse. O exercício físico é uma dessas novas descobertas no tratamento do estresse. MORGAN (1971) e SILVA (1999), em seus estudos relatam que o exercício pode influenciar de duas maneiras: na primeira como forma de proteção contra o desenvolvimento de sintomas com valor preventivo, na segunda o exercício pode ajudar pessoas portadoras do estresse através de mecanismos psicológicos e fisiológicos. Entre os benefícios psicológicos temos: desvio da atenção em relação ao estímulo estressor, maior controle sobre seu corpo, sua vida e a interação social proporcionada pelo convívio com outras pessoas. Os efeitos fisiológicos, segundo os autores, podem estar ligados aos efeitos das endorfinas. O cérebro e outros tecidos produzem varias endorfinas que têm efeito similar à morfina, que podem reduzir a sensação de dor e produzir um estado de euforia. Outro efeito fisiológico que vem sendo estudado, está ligado à concentração/ação das monoaminas (dopamina, serotonina, noradrenalina).
Neste sentido, a atividade física vem sendo utilizada como forma de tratamento adjunta às já tradicionais, farmacoterapia e psicoterapia. Diversos autores têm reafirmado seu papel positivo sobre a saúde mental. Já foram demonstrados efeitos benéficos do exercício junto a depressão (MARTINSEN & STEPHENS, 1994), ansiedade (BLUE, 1979), estados de humor (BYRNE, A. & BYRNE, G., 1993) e níveis de estresse (CARUSO, et al., 1999). Além disso, diferentes formas de exercício aeróbios (HULL, et al., 1984), anaeróbios (NELSON & WERNICK, 1998) foram testados; bem como seus efeitos agudo (SINYOR, et al., 1986) e crÔnicos (SINYOR, et al., 1983). Porem, esta associação precisa ser confirmada para diferentes faixas etárias e extratos da população.
Baseado nestes fatos é que este trabalho tem por objetivo estabelecer a relação entre a carga de trabalho de exercícios resistidos e a diminuição do estresse em estudantes em fase de preparação para o vestibular.
MetodologiaA amostra foi composta por 24 voluntários de ambos os sexos com idade entre 16 e 18 anos, randomizados em dois grupos: Grupo Experimental (GE), com n=17, submetido a um programa de exercício resistido orientado, e Grupo Controle (GC) com n=07, que não participou de nenhum programa de exercícios durante o período do experimento. Para a avaliação dos níveis de estresse foi utilizado o Inventário de Sintomas de Stress de Lipp (ISSL) (LIPP, 1994), inventário de fácil aplicação, que visa identificar de modo objetivo a sintomatologia que a pessoa apresenta, o tipo de sintoma (somático ou psicológico) e a fase em que se encontra. O programa de exercícios resistidos foi realizado no Laboratório de Musculação da Faculdade de Educação Física da UCB. Durante cinco semanas, com freqüência de duas sessões semanais e duração de sessenta minutos. Uma das formas de se prescrever a intensidade da carga para um dado exercício é o uso da repetição máxima, neste sentido foi realizado o teste de repetições máximas (RMs), ou seja, realizou-se o máximo de repetições para um dado peso. Este tipo de trabalho pode ser utilizado também para prescrição da carga máxima, com o uso de (10RMs), pode-se extrapolar o valor máximo de (1RM). O programa de exercícios foi organizado em duas séries com 10RMs de uma carga estabelecida, com uma utilização próximo dos 80% de intensidade de 1RM. A Escala de Borg - CR10 (BORG, 2000), baseada na Percepção de Esforço, foi utilizada para estimar a intensidade dos exercícios. A utilização desta escala serviu de complemento para avaliar e prescrever a intensidade de cada exercício (valores compreendidos entre 8 a 10 da escala de Borg) no final de cada semana, sempre feita na quinta-feira. Os exercícios realizados foram: supino, remada, leg press inclinado, cadeira adutora, extensão de cotovelo e flexão de cotovelo. A análise estatística foi feita no pacote estatístico SPSS for Windows, versão 10.0. Uma Análise de regressão linear bivariada foi utilizada para estabelecer a associação entre a carga total de trabalho (KGT) e modificação no nível de estresse. O nível de significância adotado foi de p<0,05.
Resultados e discussãoPara analisar se as cinco semanas de exercícios resistidos, surtiram efeito sobre os níveis de estresse no GE foi realizado o teste do Qui-quadrado (x2) comparando-se os níveis de estresse entre os grupos antes e depois do tratamento. O resultado demonstrou que o estresse do grupo experimental diminui significativamente o estresse após o período de cinco semanas de atividade física quando comparados ao grupo controle (X2 =8,54; n=24; p=0,003) (Gráficos 1 e 2).
Gráfico 1: Nível de estresse antes do experimento.
Gráfico 2: Nível de estresse depois do experimento.
Para analisar se havia associação entre o aumento de carga durante as 5 semanas de tratamento (KG) e o nível de estresse, foi realizada uma análise de regressão linear bivariada. Para tanto, utilizou-se como variável preditora o somatório total de quilos (KGT) antes e depois do tratamento. A equação de regressão foi:
estresse =-0,0028 x (KGT) + 1,45.
A correlação entre KGT e o nível de estresse foi de r = 0,46, F(1) = 5,89, p<0,02. Aproximadamente 21,10% da redução do estresse e explicada pelo tratamento aplicado, como pode ser observado no gráfico 3.
Gráfico 3: Correlação entre o aumento de carga e a redução do estresse mental.
O resultados deste estudo, deixa evidências que o exercício físico, particularmente, os exercícios resistidos podem atuar no combate ao estresse. Resultados similares foram observados por BARRETO et al. (2000) com funcionários do restaurante universitário da Universidade de Brasília, em um programa sistematizado de atividade física. Os autores relatam que no grupo com intervenção houve eliminação do estresse e da fadiga intensa. Contabilizam um aumento em 21% de trabalhadores sem estresse e em 18,1% com fadiga leve. O estudo sinalizou positivamente para a utilização de programas de atividade física sistematizada no local de trabalho como instrumento para diminuição do estresse e da fadiga do trabalho.
De acordo com NAHAS (1995), a atividade física deveria ser prioridade para a educação, principalmente no ensino médio, onde existem pouca quantidade de atividades. Nas escolas de ensino médio, onde o trabalho foi realizado, a educação física pode proporcionar uma aquisição de conhecimentos e estimular atitudes positivas. Tendo este trabalho como precursor de novas idéias, buscamos inovar, implementando dentro das aulas de educação física, os exercícios resistidos como forma de atividade física, onde esta prática pode ser continuada no dia-a-dia desses jovens.
Conclusão
Através do estudo observamos que os exercícios resistidos podem ser utilizados como atividade física para minimizar os efeitos do estresse em uma amostra de adolescente, ampliando o leque de opções de atividades físicas capazes de levar ao mesmo resultado, a redução do estresse. Tem sido comum utilizar-se o exercício como agente estressante em diversas investigações analisando seus efeitos (agudos e crÔnicos). O esforço físico é uma forma de estresse, referido como estresse funcional, contudo, se praticado de forma regular, recreativa sem levar à exaustão, representa um estímulo que promove a saúde. No que se diz respeito a intensidade trabalhada neste estudo, a escala de Borg, nos possibilitou entendermos que os exercícios resistidos podem ser executados não apenas com uso dos testes de repetições máximas (RMs), o GE que participou das cinco semanas de tratamento teve sua intensidade medida através da escala de esforço percebido, tendo sua intensidade verificada toda semana durante o experimento o GE mostrou ter uma redução nos níveis de estresse em relação ao GC, mostrando que o trabalho de intensidade elevada pode ser utilizado contra os sintomas de estresse.
Referências bibliográficas
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