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Prevenção da queda do idoso. As alterações
induzidas pelo treino da força no desempenho do
Timed Get-Up & Go Test e do Functional Reach Test

   
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
(Portugal)
 
 
Nelson Sousa
Urbano Marques

nelsons@utad.pt
 

 

 

 

 
    As quedas são um problema significativo para muitos idosos. a prevenção de quedas é um aspecto fulcral, de forma a promover a independência e qualidade de vida entre a população idosa, e minimizar os problemas que lhe estão associados. Neste contexto preventivo, a actividade física (o treino da força em particular) é o principal meio para promover a saúde nos idosos, mostrando ser um instrumento efectivo na diminuição do risco de quedas entre esta população. Com o presente estudo pretendemos identificar as alterações induzidas pelo treino de força ao nível dos índices de força máxima, e no desempenho de dois testes funcionais em idosos do sexo masculino.
    A amostra foi constituída por 20 idosos, que foram subdivididos em dois grupos de 10, um grupo experimental (média de idades de 73 + 6 anos) e um grupo de controlo (média de idades de 75 + 5 anos). O estudo consistiu na aplicação de um programa de treino da força com a duração de 12 semanas (3 sessões de treino semanais), ao grupo experimental. Durante o seu desenvolvimento foram efectuadas avaliações de força máxima de quatro em quatro semanas, de forma a registar a evolução dos intervenientes ao longo das 12 semanas. Antes da aplicação do programa de treino foi avaliado (nos dois grupos) o desempenho em dois testes funcionais (pré-teste) fortemente associados ao risco de quedas, o Timed Get-Up & Go Test e o Functional Reach Test. Após a aplicação do programa, foi novamente avaliado o desempenho da amostra nos mesmos testes (pós-teste).
    A ANOVA de medidas repetidas revelou que a força máxima aumentou significativamente em todos os momentos de avaliação e em todos os exercícios do programa de treino (p<0,05). A anova factorial revelou diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos, em ambos os testes funcionais e nos diferentes momentos de avaliação (p<0,05).
    Em suma, descobrimos que um programa de força com intensidade progressiva aumentou significativamente (p<0,05) os níveis de força máxima ao fim de 12 semanas. Mais ainda, o treino de força pode estar directamente associado à diminuição do risco de quedas e consequente aumento da qualidade de vida, uma vez que este programa de treino influenciou significativamente (p<0,05) o desempenho de dois testes funcionais altamente relacionados com o risco de quedas nos idosos, o Timed Get-Up & Go Test e o Functional Reach Test, respectivamente.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 53 - Octubre de 2002

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Introdução

    As quedas são um problema significativo para muitos idosos, resultando na maior parte das vezes em lesões que causam a perda de independência, comprometendo desta forma a qualidade de vida (Wooley et al., 1997). Mais ainda, a maior ameaça à qualidade de vida nos idosos advêm das lesões causadas pelas quedas, que são a causa líder de morbilidade e mortalidade entre esta população (Baker & Harvey, 1985; Debra & Sean, 2000; Hinman, 1998; Kane et al., 1999; O’Loughlin et al., 1993; Overstall et al., 1990; Schuerman, 1998).

    O risco de quedas torna-se ainda um problema maior quando nos deparamos com a frequência com que se sucedem entre a população idosa. Neste contexto, o risco de quedas excede os 20% por ano entre aqueles que têm idade superior aos 65, e os 35% por ano entre os que têm idade superior aos 75 (Campbell, 1981; Schuerman, 1998). Está estimado que um terço da população idosa cai em cada ano que passa (Tinetti et al., 1988).

    Outro grande problema que se verifica entre a população idosa, está associado à perda de força muscular, uma vez que a sarcopenia e o enfraquecimento muscular é uma característica universal do envelhecimento. Para vários investigadores, o enfraquecimento muscular é referido como uma das causas mais comuns de incapacidade funcional na comunidade, predispondo os idosos para as quedas (Brill, et al., 1998; Campbell et al., 1989; Cwikel & Fried, 1992; Lipsitz et al., 1994; Lord et al., 1992; Lord et al., 1994; Schlicht et al., 2001; Spirduso, 1995; Whipple et al., 1987), e limitações funcionais (Aniansson et al., 1984; Bassey et al., 1992; Brill, et al., 1998; Bucher & Dalateur, 1991; Hyatt et al., 1990; Judge et al., 1996; Laukkanen et al., 1994; Rantanen & Avela, 1997; Rantanen et al., 1994 e 1996; Satariano et al., 1996; Westhoff et al., 2000).

    Deste modo, a prevenção de quedas é um aspecto fulcral, de forma a promover a independência e qualidade de vida entre a população idosa, e minimizar os problemas que lhe estão associados. De acordo com a literatura a actividade física é o principal meio para promover a saúde nos idosos (Lampman, 1987; Ruchlin & Lachs, 1999; Seeman et al., 1995; Thompson, W., 1994). Dentro do contexto preventivo das quedas, com o objectivo de diminuir a sua incidência entre a população idosa, um dos poucos factores que se pode influenciar são os índices de força máxima (Campbell et al., 1997; Province et al., 1995). Quando devidamente aplicado, o treino da força mostra-se como um instrumento seguro e eficaz, proporcionando ganhos de força máxima e melhoria da capacidade funcional (Agre et al., 1996; Buchner & Delateur, 1991; Chandler et al., 1998; Evans, 1999; Fiatarone et al., 1990; Fiatarone et el., 1994; Frontera et al., 1988; Grimby et al., 1992; Häkkinen et al., 1998; Häkkinen, & Häkkinen, 1995; Hortobágyi et al., 2001; Hurley et al., 1995; Laidlaw et al., 1999; Lan et al., 1998; Lemmer et al., 2000; Nichols et al., 1993; Nicklas et al., 1995; Sauvage et al., 1992; Taaffe et al., 1996; Taaffe et al., 1999; Tracy et al., 1999; Trueth et al., 1994; Westhoff et al., 2000).

    Neste contexto operacional, pretendemos com este estudo identificar os efeitos de um programa de treino da força (com 12 semanas de duração) numa amostra de idosos. A análise desses mesmos efeitos será efectuada através da evolução dos índices de força máxima (observados à medida que se desenvolve o programa de treino), e pelo desempenho em dois testes funcionais fortemente associados ao risco de quedas, o Timed Get-Up & Go Test (TUG) e o Functional Reach Test (FRT).


Metodologia

Amostra e desenho experimental

    A amostra em estudo foi constituída por 20 idosos do sexo masculino com idades compreendida entre os 65 e os 85 anos. A mesma foi dividida em dois grupos de 10, um grupo sujeito à intervenção do programa de treino da força com uma média de idades de 73 + 6 anos e o outro grupo de controlo (não foi sujeito à intervenção do programa de treino da força) com uma média de idades de 75 + 5 anos. Os indivíduos que constituíram a amostra preencheram uma ficha de anamnese, de forma a serem depois seleccionados. Todos os indivíduos seleccionados eram aparentemente saudáveis.

    O estudo consistiu na aplicação de um programa de treino, com a duração de 12 semanas, a um grupo de idosos. Durante o seu desenvolvimento, foram efectuadas avaliações de força máxima de quatro em quatro semanas, de forma a registar a evolução dos intervenientes ao longo das 12 semanas.

    Antes da aplicação do programa de treino foi avaliado o desempenho em dois testes funcionais (pré-teste), o Timed Get-Up & Go Test (TUG) e o Functional Reach Test (FRT). Após a aplicação do programa, foi novamente avaliado o desempenho da amostra nos mesmos testes (pós-teste), com o intuito de verificar se existira, ou não, alterações nas capacidades funcionais adjacentes às tarefas avaliadas por estes instrumentos, após a administração de um programa de treino da força.


Protocolo

    O programa de treino teve a duração de 12 semanas com 3 sessões de treino semanais. Todos os indivíduos do grupo experimental concluíram a totalidade do programa.

    As sessões de treino iniciavam sempre com exercícios de alongamentos e um pequeno aquecimento cardiovascular (em bicicletas ergométricas, ou marcha). A parte principal das sessões era constituída por um circuito de 7 exercícios realizados em máquinas convencionais (Quadro 1.). Para além dos exercícios realizados em máquinas, os indivíduos realizavam também, depois de terminar todas as estações do circuito de treino, exercícios no solo para os abdominais e extensores da coluna. Todas as sessões de treino terminavam com um retorno à calma, incluindo exercícios de flexibilidade.

Quadro 1. Exercícios do programa de treino.

    Porém, antes de iniciar o programa os indivíduos tiveram um período de duas semanas para aprendizagem das técnicas de execução e adaptação aos exercícios (familiarização) de forma a que o programa de treino de 12 semanas tivesse início após a aprendizagem da correcta execução técnica por parte dos respectivos intervenientes (grupo experimental).

    Houve vários motivos para introduzir um período inicial de adaptação. Muitas das alterações iniciais, que se verificam ao nível da força podem ocorrer devido às adaptações neuromusculares que resultam do aumento do recrutamento de fibras musculares (Sale, 1998). Mais ainda, grande parte das lesões que ocorrem durante os estudos do treino da força, acontecem durante as primeiras duas semanas (Shaw et al., 1995). Finalmente, a introdução de novas habilidades no desempenho de tarefas motoras envolve uma previsível curva de aprendizagem (Schlicht et al., 2001).

    O período de adaptação permite melhorias neuromusculares e na aprendizagem. É também o tempo ideal para fornecer feedbacks e correcções sobre a postura mais adequada na execução de cada exercício enquanto o estímulo de treino é ainda pouco intenso (pouca ou mesmo nenhuma resistência). Por outro lado, permitiu facilitar e aumentar o rigor da primeira avaliação de força máxima, ao mesmo tempo que reduziu o risco de lesão.

    Nas primeiras quatro semanas os exercícios foram realizados em 2-3 séries com 8 a 12 repetições (rep) a uma intensidade de 50% de uma repetição máxima (1RM), para depois passar a 2-3 séries de 8 a 12 repetições a uma intensidade de 60% de 1RM na quinta e sexta semana. Na sétima e oitava semana a intensidade subiu para os 65% de 1RM (2-3 séries, 10-12 rep), 70% na nona e décima semana (2-3 séries, 6-10 rep), acabando a 80% nas últimas duas semanas (2 séries, 6-10 rep).


Avaliações

    Força máxima - As medidas de força máxima foram realizadas tendo em conta o método de uma repetição máxima (1RM) para cada exercício. Esta técnica tem mostrado ser segura e efectiva na avaliação da força entre a população idosa (Kraemer & Fry, 1995; Shaw et al., 1995).

    A avaliação de 1RM foi sempre realizada numa sessão de treino regular, e constituía a totalidade da sessão nesse dia. De forma a registar 1RM o mais rigorosa possível, retirou-se sempre os valores de 1RM entre 3 a 5 tentativas com um intervalo de tempo de aproximadamente 3 minutos.

    Uma vez que esperávamos que os níveis de força máxima aumentassem com o decorrer do programa de treino, foram realizadas avaliações de 1RM de 4 em 4 semanas, permitindo desta forma controlar a evolução dos níveis de força máxima e ajustar a intensidade de treino estabelecida aos valores actualizados de 1RM. No total, realizaram-se quatro avaliações de 1RM, efectuadas antes do início do programa de treino (primeira semana), na quinta, nona e última semana de treino.

Testes funcionais - Uma vez que o equilíbrio e a marcha têm componentes diferentes, não é possível de avaliar apenas com um instrumento (Branch & Meyers, 1987). Tendo em conta aspectos relacionados com os custos, grau de complexidade e validade destes instrumentos de avaliação, optamos por recorrer ao uso de dois testes funcionais, o Timed Get-Up & Go Test (TUG) e o Functional Reach Test (FRT), para avaliar as principais componentes relacionadas com o risco de quedas. O FRT avalia a habilidade de controlar o movimento do centro de gravidade sobre uma base de sustentação fixa (Duncan et al., 1990), enquanto que o TUG incluí a habilidade de ajustar o centro de gravidade continuamente sobre uma base de suporte em movimento (Duncan & Studenski, 1994; Podsiadlo & Richardson, 1991).

    Outro aspecto importante na escolha destes dois instrumentos prende-se com o facto das tarefas adjacentes aos mesmos, estarem directamente relacionadas com actividades da vida diária e que, ao mesmo tempo, são bons simuladores de actividades de risco de quedas, nomeadamente, actividades como o alcançar, marchar, levantar e sentar numa cadeira.

    Finalmente, quer o TUG quer o FRT, são excelentes instrumentos de avaliação para aplicar a uma população idosa com vida independente (Nakamura et al., 1998).

    As avaliações do desempenho dos testes funcionais foram realizados em dois momentos: antes do desenvolvimento do programa de treino (pré-teste) e após o desenvolvimento do mesmo (pós-teste).


Timed Get-Up & Go Test

    Os valores do TUG foram medidos através do tempo (em segundos) que um indivíduo demorava a levantar da cadeira, percorrer 3 metros, regressar e tornar a sentar na mesma cadeira. Para a realização deste teste foi necessário uma cadeira com aproximadamente 46 centímetros de altura e suporte para os braços, um cronómetro, e um sinalizador a indicar a distância de 3 metros do local onde se encontrava a cadeira.

    Ao indivíduo era pedido que colocasse correctamente a costas no encosto dorsal da cadeira e os braços em cima do suporte. A prova tinha início após a voz de partida (altura em que se iniciava a cronometragem), e terminava quando o indivíduo se colocava novamente na posição inicial (fim da cronometragem).

    O indivíduo realizava a tarefa o mais rápido possível, no entanto, sempre de uma forma confortável (evitando assim possíveis acidentes). Todos os indivíduos da amostra realizaram (em ambos momentos de avaliação) 2 vezes a respectiva prova, registando-se sempre o melhor desempenho.


Functional Reach Test

    Os valores do FRT foram medidos através da distância máxima (em cm) que os indivíduos conseguiam alcançar (à frente), enquanto permaneciam sempre na mesma base de sustentação. Para a realização deste teste foi necessário uma fita métrica, giz e um pequeno bastão.

    Ao indivíduo era pedido que se colocasse ao lado de uma parede, onde se encontrava esboçada uma linha que dividia o corpo do indivíduo ao meio no plano sagital. O indivíduo colocava de seguida os braços à frente (a 90º do tronco) segurando com ambas as mãos um pequeno bastão de madeira. De seguida era pedido ao indivíduo que alcançasse a máxima distância com o bastão (sempre perpendicular a linha esboçada na parede), e permanecesse nessa posição por alguns segundos (sempre sem alterar a base de sustentação). A medida registada era a distância verificada entre a projecção do bastão à frente e a linha perpendicular da parede.

    Todos os indivíduos da amostra realizaram (em ambos momentos de avaliação) 2 vezes a respectiva prova, registando-se sempre o melhor desempenho.

Análise estatística

    Neste estudo foi usado o programa informático de estatística SPSS (versão 10.0). Para a análise da evolução de força máxima ao longo do programa de treino, foi aplicada a técnica estatística ANOVA de medidas repetidas, enquanto que para a análise da comparação inter e intra grupos (experimental e controlo) entre o pré e o pós-teste (do desempenho do TUG e do FRT) foi aplicada a técnica estatística ANOVA factorial.


Resultados

Força máxima

    O Quadro 2. apresenta os valores médios de força máxima registada nos sete exercícios do programa de treino e nos 4 momentos de avaliação. Durante as avaliações de 1RM, não se verificaram quaisquer lesões nos indivíduos da amostra (grupo experimental).

    A ANOVA de medidas repetidas revelou que a força máxima aumentou significativamente em todos os exercícios e entre cada momento de avaliação (ver Quadro 2.).

Quadro 2. Valores de 1RM alcançados pelo grupo experimental nos 4 momentos de avaliação.


Os valores são a média (Kg) mais ou menos desvio padrão.
*P<0,05


Timed Get-Up & Go Test

    Ao nível do TUG, ambos grupos obtiveram valores aproximados no pré-teste (ver Figura 1.), no entanto, após a finalização do programa de treino da força o grupo experimental melhorou significativamente o seu desempenho, enquanto que o grupo de controlo para além de não melhorar o seu desempenho ainda piorou ligeiramente (embora de forma não significativa).


Figura 1. Resultado dos grupos (experimental e controlo), antes e após o programa de treino, no desempenho do Timed Get-Up & Go Test.

    Após a análise da Figura 1., podemos verificar que antes do início do programa de treino não existiam diferenças significativas entre os dois grupos, porém após o programa de treino da força verificou-se diferenças estatisticamente significativas entre os mesmos.


Functional Reach Test

    Ao nível do FRT, verificou-se que ambos grupos obtiveram valores aproximados no pré-teste (ver Figura 2.), no entanto, após a finalização do programa de treino da força o grupo experimental melhorou significativamente o seu desempenho, enquanto que também neste teste funcional o grupo de controlo para além de não melhorar o seu desempenho ainda piorou ligeiramente (embora de forma não significativa).


Figura 2. Resultado dos grupos (experimental e controlo) antes e após o programa de treino,
no desempenho do Functional Reach Test.


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