Peculiaridades tipológicas do sistema nervoso e traços de personalidade |
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Licenciada em Educação Física/UFSM Especialista em Aprendizagem Motora/UFSM Mestre em Ciência do Movimento Humano/Desenvolvimento Humano/UFSM Prof. da UFSM/ Brasil |
Maria Cristina Chimelo Paim crischimelo@bol.com.br (Brasil) |
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Typological peculiarities of the Abstract |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 8 - N° 53 - Octubre de 2002 |
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Introdução
A personalidade talvez seja, como diz Stagner apud Lannoy (1975), o fenômeno mais complexo estudado pela ciência. E também o mais fascinante, porque todos nós desejamos nos conhecer e conhecer outras pessoas com as quais convivemos. Saber o que em nós é comum a todos os indivíduos e o que mais nos distingue deles, talvez seja a busca mais constante do homem. Conhecer nossas qualidades positivas e verificar nossos traços negativos é um trabalho diário que nos preocupa e incentiva. Enfim, a descoberta mais importante para nós é o conhecimento da nossa própria personalidade.
A compreensão da personalidade humana não é simples, devido à complexidade e à grande variedade dos elementos que a estruturam, gerados por múltiplos determinantes, tanto biológicos, quanto psicológicos e sociais. Em relação aos aspectos sociais, quanto mais complexa e diferenciada a cultura e a organização social, mais complexo e diferenciado será o ser humano, o qual é, resultante do conjunto de seus relacionamentos vivenciados no interior de sua cultura e da organização social a que pertence. Biologicamente, o ser humano já traz em seus genes diferentes tendências, interesses e aptidões e, sabe-se que é formado pela combinação dinâmica de vários fatores hereditários e uma multiplicidade de influências sócio-psicológicas que recebe do meio ambiente (Fernandes Filho,1992).
Estudar e conhecer a individualidade de uma pessoa consiste em situá-la em relação a todos os outros indivíduos do grupo. Somente desta maneira pode-se conhecer esta pessoa nas suas aptidões, traços de caráter e atitudes. Personalidade é uma construção científica, elaborada pelos psicólogos, com a finalidade de definir, no nível da teoria científica, a maneira de ser e de funcionar que caracteriza o organismo psicofisiológico a que denomina-se pessoa humana. Esta reconstrução teórica é feita a partir dos comportamentos observados, das disposições ou traços inferidos e das relações constatadas, de forma a chegar a um conjunto funcional que explique os diferentes fenômenos característicos da pessoa humana (Nuttin, 1969).
Para Allport (1966), a personalidade é a organização dinâmica, no indivíduo, dos sistemas psicofísicos que determinam seu comportamento e seu pensamento característico. A Personalidade é a síntese integral das atividades psíquicas, e é atributo característico do homem. É difícil dizer que um bebê recém-nascido tenha personalidade, pois não tem a organização característica de sistemas psicofísicos (o funcionamento da personalidade inseparável corpo e mente). Para o autor a personalidade começa no nascimento, o bebê tem uma personalidade potencial: é quase inevitável que certas capacidades se desenvolvam. O físico, temperamento e inteligência, ou seja, fatores orgânicos, psíquicos, sociais e culturais, são a matéria prima da personalidade, embora com o passar dos anos, passe por lenta maturação. Dentre os três, o físico é o mais visivelmente ligado à hereditariedade, mas existem muitos estudos que provam que as bases do temperamento, e da inteligência são também determinados geneticamente. O autor alerta que, os três fatores, dentro de certos limites, são influenciados, durante a vida, por nutrição, saúde, doença, ambiente. Na estrutura da personalidade, distinguem-se: a constituição, o temperamento, o caráter e o Eu.
O desenvolvimento da personalidade no tempo se faz ao nível psicológico, por inserção progressiva no mundo, com o auxílio do comportamento. Essa inserção comportamental não é puramente motora, e sim se trata de um contato, ao mesmo tempo cognitivo e dinâmico, que produz, além de hábitos motores, atitudes, opiniões, valores. A extensão e continuidade do desenvolvimento da personalidade no tempo, é dependente da memória, a qual mantém essa unidade de funcionamento que caracteriza o comportamento de cada ser humano. Assim, pode-se dizer que uma pessoa aparece sob forma de um conjunto de traços físicos e de comportamentos. Esses comportamentos são de uma variedade muito grande e se sucedem sem interrupções. As formas físicas também sofrem mudanças contínuas e estão intimamente ligadas aos comportamentos que elas ajudam a construir (Nuttin ,1969).
O amadurecimento do ser humano não é igual, isto é, não recebe do meio exatamente os mesmos estímulos que recebe qualquer semelhante, ou reage da mesma forma frente aos mesmos estímulos. Embora exista na sociedade certas atitudes e regras similares para a educação da criança, cada indivíduo foi tratado diferentemente e cresceu em um ambiente diverso. Conseqüentemente, embora possa ter traços em comum, a personalidade é singular, própria de cada ser. Sua individualidade é determinada pelo conjunto das características ou diferenças interindividuais, dinamicamente estáveis, que constituem o ser humano, um ser concreto na sua identidade consigo mesmo e em sua diferenciação em relação aos demais (Lundin, 1979; Fernandes Filho, 1992).
Segundo Telles (1982), a personalidade e todos os seus traços resultantes (entendido aqui, como uma característica duradoura do indivíduo e que se manifesta na maneira consciente de comportar-se numa ampla variedade de situações), unem-se numa construção física única-a pessoa. Cada indivíduo tem uma construção física característica; desta resulta seu temperamento. Destes dois, em contato com o meio físico e social, surgem o caráter e grande parte dos restantes traços de personalidade. Tudo isso se harmoniza numa crescente integração em torno da parte subjetiva do “eu”. Do nascimento à vida adulta, o indivíduo vai estruturando progressivamente as situações do meio e reage às mesmas, de maneira padronizada, ajustando-se cada vez melhor ao seu meio. Assim, a personalidade segundo (Allport,1966), vem a ser a organização dinâmica dos vários sistemas físicos, fisiológicos, psíquicos e morais que se integram, determinando a maneira pela qual o indivíduo se ajusta ao ambiente.
É notório o fato de que os estudos sobre as questões que norteiam o comportamento humano, despertem interesse nos estudiosos à milênios. Para Petroviski (1985), são conhecidos vários sistemas básicos para explicar a essência do temperamento, dos quais os primeiros têm somente interesse histórico. O primeiro sistema (humoral), liga o estado do organismo com a proporção dos sucos (os líquidos e humores) que circulam pelo organismo, foram destacados os seguintes temperamentos: sangüíneo; colérico; fleumático e melancólico. O segundo sistema (constitucional) se apoia nas diferentes constituições do organismo e sua estrutura física. A tipologia constitucional representa uma abordagem ao estudo da relação entre características físicas e psicológicas. As duas Teorias mais aceitas, e utilizadas são as de Kretschemer e Sheldon. Jung classificou os homens em extrovertidos e introvertidos. A Teoria do temperamento de Pavlov, que liga os tipos de temperamentos com a atividade do sistema nervoso central, que é a mais aceitável pela sua aplicabilidade no esporte e a Teoria das dimensões primárias de Eysenck, que uniu alguns pontos das Teorias de Jung e Pavlov. Em nosso estudo abordaremos as possíveis relações entre estas duas últimas Teorias citadas, a de Eysenck e a de Pavlov.
A Teoria do Temperamento de Pavlov ou da Atividade Nervosa Superior, procura distinguir entre as múltiplas diversidades do Comportamento Humano, semelhanças e diferenças peculiares que definem com mais clareza tipos de temperamento. Os quatro tipos de sistema nervoso, identificados por Pavlov (1979), foram classificados de acordo com as três peculiaridades básicas do sistema nervoso central: a intensidade, neste caso o sistema nervoso pode ser Forte ou Fraco; o equilíbrio, o qual dividiu em sistema nervoso equilibrado e sistema nervoso desequilibrado e a mobilidade ou a inércia dos seus processos. Dessa forma, é possível dizer que há seres humanos com sistema nervoso forte, móvel, mas desequilibrados, nos quais os dois processos são poderosos, mas a excitação predomina sobre a inibição, que são os coléricos, segundo Hipócrates, tipo excitável e impulsivo. Os indivíduos com o tipo de sistema nervoso forte, equilibrado, mas inertes, são os fleumáticos, calmos e lentos. Em seguida o tipo forte, equilibrado, hábil, muito vivo e móvel, os sangüíneos. E finalmente um tipo fraco, sensível, delicado, que corresponde ao tipo melancólico de Hipócrates.
A teoria de Pavlov é aceitável pela sua aplicabilidade no esporte e pela influência significativa do tipo de sistema nervoso central nas peculiaridades dinâmicas do comportamento do ser humano. As principais peculiaridades tipológicas básicas do sistema nervoso do homem que têm maior influência no desempenho esportivo são: Força dos Processos de Excitação do Sistema Nervoso (FPE); Força dos Processos de Inibição do Sistema Nervoso (FPI); Equilíbrio dos Processos de Excitação e Inibição do Sistema Nervoso (E) e Nível de Mobilidade (M) (Rodionov, 1973, Viatkin, 1978, e Kalinine & Giacomini, 1998).
A Força dos Processos de Excitação do Sistema Nervoso é uma das peculiaridades básicas do sistema nervoso. Ela caracteriza o limite da capacidade de trabalho das células nervosas do córtex e do encéfalo, ou seja, a sua capacidade de suportar altos estímulos, sem entrar no estado de inibição (Petrovski, 1985). A Força dos Processos de Excitação do Sistema Nervoso do ser humano é uma peculiaridade que influi em todas as outras, e é fator determinante no processo de desenvolvimento do comportamento. Por exemplo, pessoas cujo sistema nervoso têm alto nível da força dos processos de excitação se formam, na maioria dos casos, pessoas corajosas, ativas, extrovertidas e auto-confiantes. Por outro lado, pessoas que têm baixo nível da força dos processos de excitação do sistema nervoso, na maioria dos casos, se tornam introvertidas, melindrosas, pouco ativas e pouco confiantes (Merlin, 1973).
A Força dos Processos de Inibição do Sistema Nervoso, influi no comportamento do ser humano e, caracteriza a sua capacidade de ser discreto em emoções, condutas, ações e relações. A inibição segundo Pavlov apud Petroviski (1985), é um componente necessário na atividade integral e de coordenação do sistema nervoso. Os processos de inibição juntamente com os processos de excitação asseguram a adaptação do organismo para o ambiente, que está em constante mudança.
O Nível de Mobilidade do Sistema Nervoso é uma das primárias propriedades do sistema nervoso, que consiste na capacidade de reagir rapidamente às mudanças do ambiente (Petroviski, 1985). O nível de mobilidade dos processos de excitação e inibição que ocorre no sistema nervoso caracteriza a facilidade para passar de uma atividade para a outra com velocidade de adaptação às novas condições. Pessoas com alto nível de mobilidade do sistema nervoso possuem a capacidade de mudar suas atividades rapidamente sem perderem o raciocínio, conseguem fazer duas ou mais tarefas ao mesmo (Paim,2002)
O Equilíbrio dos Processos de Excitação e Inibição que ocorrem no sistema nervoso do homem, é uma peculiaridade que se revela pela proporção entre os processos de excitação e dos processos de inibição (Petrovski, 1985). A noção de equilíbrio dos processos nervosos, foi introduzida por Pavlov, e foi considerada por ele, como uma das peculiaridades independentes do sistema nervoso, que forma em conjunto com outras peculiaridades do sistema nervoso (força e mobilidade do sistema nervoso) o tipo de atividade nervosa superior.
Outra teoria que influenciou os estudos sobre a personalidade/temperamento associada à prática esportiva, foram os estudos de Eysenck. Segundo Samulski (1992; 2002), Eysenck para melhor estudar o indivíduo, utilizou-se da análise fatorial e também baseou-se nos “traços e tipos de personalidade”. A partir das quais acredita ser capaz de predizer o comportamento em uma vasta gama de variáveis individuais e sociais. Dessa forma, Eysenck (1968) considerou esses achados como uma dimensão da personalidade, e identificou o que segundo ele, seriam as duas dimensões primárias da personalidade: extroversão e neuroticismo. O autor considera que estas dimensões são representativas da atividade nervosa. Estabelece que extroversão é um contínuo entre extroversão e introversão e o neuroticismo é um contínuo entre neuroticismo (instabilidade emocional) e psicotismo (estabilidade emocional). Estas dimensões permitem, essencialmente, uma descrição do comportamento das pessoas. Estudos realizados por Ucha (2002), confirmam a teoria de Eysenck, no que diz respeito à dimensão neuroticismo. O autor concluiu que existe uma relação entre neuroticismo e estabilidade emocional. Sendo a mesma inversamente proporcional, de maneira que, a um aumento do neuroticismo a uma diminuição do controle emocional.
Atualmente em qualquer atividade que o indivíduo pretenda se envolver e desenvolver profissionalmente, é importante que o mesmo possua qualidades inerentes a sua área de atuação. No âmbito social é possível caracterizar os extrovertidos como ativos, otimistas, impulsivos e capazes de estabelecer facilmente os contatos sociais. Em contraste, os introvertidos estão caracterizados como reservados, ansiosos, precavidos e com dificuldades para o estabelecimento de contatos sociais (Bakker; Whiting & Brug, 1993).
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