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Proposta construtivista e interacionista:
um novo olhar na relação entre ciência e desporto

  *Museu da Vida /COC/FIOCRUZ
**Centro de Educação em Ciência, Museu da Vida /COC/FIOCRUZ
(Brasil)
Marcelo Santo*
Bianca Santos Silva Reis**
msanto@fiocruz.br

 

 

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 7 - N° 34 - Abril de 2001

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Introdução

    Diversos estudos têm comprovado que a educação formal não consegue, por si só, fornecer subsídios para que o cidadão comum tenha acesso à (in)formação técnico-científica necessária para uma leitura crítica do mundo e do seu meio ambiente(Lucas, 1983) e (Uko, 1985).

    Como decorrência dessa realidade, começaram a surgir em diversas partes do mundo Museus e Centros de Ciência com uma proposta de difusão e alfabetização em ciência, que interagem processos dinâmicos com seu público (Alexander, 1979), constituindo-se em importantes instituições de educação não formal, atendendo na atualidade - segundo a Association of Science-Technology Centers - a mais de 50 milhões de pessoas por ano.

    Buscando portanto, alternativas que reforcem a ampliação democrática do conhecimento científico à todos os indivíduos (Cazelli, 1992) o pre-sente estudo teve como objeto um pro-jeto pi-loto desenvolvido em parce-ria entre a Fun-dação Oswaldo Cruz/Museu da Vida, o Instituto de Desenvolvimento dos Desportos e o Instituto Romário, objetivando tes-tar e avaliar uma pro-posta de educação em ci-ência junto a 150 pré-adolescen-tes e adoles-centes, oriundos das escolas pú-blicas do bairro de Man-guinhos/RJ.


Metodologia

    Visando o desencadeamento do processo de redescoberta, o programa foi estruturado de forma que o trinômio percepção/observação/participação quando exercitados (Azenha, 1993), levasse os alunos a ver, sentir e conhecer os processos científicos dos desportos. Possibilitando dessa forma, um gancho para uma abordagem de conteúdos históricos, aplicativos e implicativos da ciência relacionados às questões doença versus saúde.

    Em virtude da exposição de uma variedade de situações suficientemente complexas, utilizou-se como fer-ramenta de trabalho diversos recursos materiais do Museu da Vida (modelos 3D, ex-posições, cartazes, vídeo, multi-mídias) e uma variedade de atividades de apoio como teatro, oficinas e jo-gos.

    As atividades - implementadas em oficinas, laboratórios, experimentotecas e vídeos debates - contemplaram: a fisiologia humana; a biomecânica; a célula animal, o cérebro, corpo humano x esporte, percepção e emoção; física x esporte, bioquímica; AIDS e DST; drogas; cidadania; violência; auto-estima; história da ciência.

    Objetivando a reflexão analítica e metodológica do processo, optou-se por uma observação direta visando a identificação e correções de possíveis nós críticos.

    Nesse sentido, acompanhou-se diariamente:

  1. a receptividade dos conteúdos e o grau de aprendizagem dos mesmos junto aos alunos;

  2. os impactos da proposta junto ao staff do Museu da Vida.

    Como resultantes dessas observações, foram identificados dois nós considerados críticos.

    O primeiro nó - explicitado na falta de interesse dos alunos aos conteúdos educativos - revelava que a participação dos alunos no projeto, encontrava-se fortemente condicionada ao desejo de ascensão financeira e profissional, motivada por dois fatores: a ausência dos conteúdos ministrados às disciplinas curriculares da escola e a associação do projeto a um ídolo do futebol, o jogador Romário.

    Tais fatores reafirmaram as preocupações de Krasilchik (1978) e Pedro Demo (1990) a cerca da necessidade de se realizar esforços para a retomada da reestruturação do ensino de ciência, iniciada na década de 70. Revelando um desenho fosco e/ou invisível de conhecimentos básicos de ciências nos sujeitos do projeto, cujo quadro reforça a tese de interdisciplinalidade para o ensino de ciência com o abandono gradativo do currículo extensivo nos cursos de licenciatura.

    Levando em consideração que os museus científicos, são espaços de educação não formal, onde o enfoque interdisciplinar (e mesmo transdisciplinar) é possível (Astolfi, 1990) e (Koatz, 1999), pode-se, ao contrário da educação formal, trabalhar com conceitos selecionados e organizados segundo temas unificadores, sintetizando dessa forma os princípios básicos da ciência através da exploração não diretiva.

    Nesse sentido, o estudo tendo sempre em vista as perspectivas cognitivistas da problematização dos conteúdos (La Taylle, 1992), coladas aos temas desportivos, optou pela readaptação à linguagem lúdica de grande parte dos conteúdos, à fim de ditar, naturalmente, o aguçamento da curiosidade nos alunos.

    O segundo nó por sua vez, revelado de forma implícita, demonstrou a existência de um questionamento interno a cerca da relação Desportos versus Museu de Ciência, indicando a necessidade de uma estratégia onde as atividades experimentais fossem garantidas, para evitar uma dicotomia na relação teoria-prática, como preconizam Delizoicov e Angotti (1990).

    Entendendo que o propósito de um experimento é a (re)descoberta das relações entre no mínimo duas variáveis (Carrater, 1986), o estudo prosseguiu catalisando padrões pedagógicos na contemplação dos contextos históricos, científicos e culturais dos Desportos.

    Tal imersão implicou em uma atenuação das fronteiras entre os campos do conhecimento, possibilitando assim, a elaboração de um código de conceitos estruturado estruturado a partir de um conjunto de variáveis que levaram em conta os elementos estruturantes do projeto.


Resultados

    Constatou-se com base nos dados coletados ao longo do projeto (filmagens das atividades, reuniões, entrevistas e questionários preenchidos pelos alunos ao final de cada atividade) os seguintes resultados:

  1. o despertar de um sentimento de posse e orgulho por uma herança científica e cultural que até então eles desconheciam - a Fiocruz, principal instituição de ciência e tecnologia da América Latina;

  2. expressivo aumento de familiaridade com os conceitos científicos do esporte (biomecânica, fisiologia, bioquímica, anatomia e física);

  3. aumento de interesse nas profissões científicas;

  4. mudança comportamental, com crescimento qualitativo de socialização; e

  5. o reconhecimento do tema Desportos como uma alternativa viável ao ensino de ciência, junto ao Staff do Museu da Vida.


Conclusão

    Estando portanto, os objetivos dos Museus e Centros de Ciência centrados na ampliação democrática do conhecimento à todos os indivíduos, pode-se detectar na aplicação de uma proposta construtivista e interacionista junto aos desportos, ganhos significativos para a difusão e a alfabetização em ciências, tendo em vista o rico repertório científico e cultural passíveis de exploração.

    Para tanto, recomenda-se a coletagem de dados sócio-educacionais dos sujeitos envolvidos no projeto, para que a partir de uma avaliação dos rendimento destes em sala de aula e em suas respectivas comunidades de origem, sejam elaboradas estratégias que possibilitem o desdobramento do presente estudo em um projeto que contemple as dimensões ciência e indivíduo junto ao Museu da Vida.


Bibliografia

  • ALEXANDER, E.P. (1979) Museums in Motion: An Introduction to the History and Functions of Museums. Nashville, American Association for State and Local History Press.

  • ASTOLFI, J.P. e DEVELAY, M.A. (1990) A Didática das Ciências. Campinas (SP), Papirus.

  • AZENHA, M.G. (1993) Construtivismo. São Paulo, Ática.

  • CARRATER, T.N. (1986). Aprender Pensando. Petrópolis (RJ), Vozes.

  • CAZELLI, S. (1992). Alfabetização Científica e Processos Educativos, PERSPICILIUM. Rio de Janeiro, Museu de Astronomia e Ciências Afins, vol. 6, no. 1, pp. 75-104.

  • DEMO, P. (1990). Pesquisa - princípio científico e educativo. São Paulo, Cortez

  • DELIZOICOV, D. e ANGOTTI, J.A. (1990) Metodologia do Ensino de Ciências. São Paulo, SP, Cortez.

  • KOATZ, E. (1999) A Escola e o Museu. Anais da IV Reunião da Rede de Popularização da Ciência - UNESCO

  • KRASILCHIK, M. (1978). O Professor e o Currículo das Ciências. São Paulo, EPU/EDUSP.

  • LA TAYLLE, Y. de et al. (1992) Piaget, Vygotsky e Wallon. São Paulo, Summus.

  • LUCAS, A.M. (1983). Scientific Literacy and Informal Learning. Studies in Science Education, no. 10, pp. 1-36.

  • UCKO, D. (1975). Science Literacy and Science Museum Exhibits. Curator, vol. 28, nº4, pp. 287-300.


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