efdeportes.com

Relações conflituosas no esporte de base: olhar sobre os pais

Relaciones conflictivas en el deporte: el papel de los padres

Conflictual relations in sport: analyzing parents

 

LEPESPE, DEF, IB, UNESP

Rio Claro, Janeiro

(Brasil)

Renato Henrique Verzani

Kauan Galvão Morão

Ivan Wallan Tertuliano

Adriane Beatriz de Souza Serapião

Afonso Antonio Machado

renato_verzani@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          A preparação esportiva tem evoluído muito nos últimos anos, sendo que diversos aspectos que são fundamentais passaram a ser mais pesquisados e discutidos, como no caso dos psicológicos, visto que pesquisas demonstram o potencial de provocar oscilações no rendimento. As questões que envolvem os pais também podem ter implicações quanto ao rendimento dos atletas, o que precisa ser mais estudado. Desta forma, o objetivo deste trabalho foi avaliar questões referentes à participação dos pais e sua influência na modalidade que os filhos praticam. A amostra contou com 147 atletas, todos participantes da Copa São Paulo de Futebol Junior, que responderam a um questionário fechado com escala tipo “Likert” (5 opções) sobre o envolvimento dos pais na prática esportiva. Todos tinham entre 16 e 18 anos. Foram encontrados resultados interessantes, como por exemplo, os grandes planos (46% dos resultados são “sempre” e 31% “muitas vezes”) e a importância que os pais dão à continuidade (61% assinalaram “sempre”), que podem gerar grandes cobranças, que normalmente são negativas e também resultados positivos, como a ausência de interferência nas instruções dos técnicos (54% assinalaram “nunca” e 31% “raramente”), o que é fundamental neste contexto. Foi possível perceber que esta relação entre pais e a prática esportiva dos filhos é bastante delicada, sendo que os profissionais devem estar atentos para que as interferências dos pais não sejam inadequadas e conduzam a reflexos negativos, procurando assim conhecer as diversas condutas dos pais e buscando aconselhar da melhor maneira possível para evitar problemas.

          Unitermos: Psicologia do esporte. Desenvolvimento humano. Futebol.

 

Abstract

          The sports preparation has advanced in recent years, and many aspects that are critical now more researched and discussed, such as the psychological aspects, the importance of which has been highlights through research that demonstrate the potential that these have to cause fluctuations in performance. Issues involving parents may also have implications for the performance of athletes, which needs further study. Thus, the objective of this study was to evaluate issues involving parents and their influence in the sport that children practice. The sample consisted of 147 athletes, all participants of the São Paulo Junior Soccer Cup, which answered closed questions in a 5-point Likert-type scale relating to parental involvement in sports. All were between 16 and 18 years. Interesting results were found, such as great plans (46% of the results are “always” and 31% “often”) and the importance that parents give to the permanence (61% answered “always”), which can generate large charges, which are usually negative and positive results too, as the absence of interference in the coach instructions (54% answered “never” and 31% “rarely”), which is crucial in this context. It could be observed that the relationship between parents and sports activities of children is very delicate, and professionals should be attentive to the interference of parents, thereby avoiding problems.

          Keywords: Sports psychology. Human development. Soccer.

 

Recepção: 02/02/2016 - Aceitação: 29/07/2016

 

1ª Revisão: 20/07/2016 - 2ª Revisão: 27/07/2016

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 21, Nº 219, Agosto de 2016. http://www.efdeportes.com

1 / 1

Introdução

    Com o passar dos anos, diversos mecanismos que envolvem o ambiente esportivo vêm sendo cada vez mais investigados e analisados por muitos profissionais com a intenção de encontrar respostas para uma série de questionamentos que surgem durante a prática cotidiana dos treinamentos e dos jogos, para que desta forma as intervenções frente aos atletas sejam melhoradas.

    Com toda a evolução do futebol e de todos os aspectos que estão envolvidos com o mesmo, os atletas precisam conviver com diversos tipos de demandas que, caso não sejam devidamente trabalhadas, podem levar a quedas de performance e diversos outros tipos de problemas.

    Através deste raciocínio, percebe-se que na atualidade não basta mais ter preocupação apenas com aspectos físicos, técnicos e táticos. E um dos aspectos que vem sendo cada vez mais abordado e estudado é o aspecto psicológico, visto que diversas pesquisas apontam para relações diretas deste com oscilações no rendimento atlético.

    Dentre as diversas possibilidades de estudo, surge a questão que envolve os pais e suas interferências na formação de seus filhos como atletas, que pode ser um fator delicado de ser trabalhado, devido a chance de muitas vezes os pais exercerem um papel negativo neste processo, fato este que deve ser estudado e a partir dos resultados, buscar alternativas para reverter o que está prejudicando em ações positivas, interferindo de modo adequado dentro deste contexto.

    Levando em consideração os atletas em formação, devemos analisar que diversas questões podem interferir no rendimento dos mesmos e, exatamente pelo momento da vida em que se encontram, precisam ser devidamente amparados e contar com uma equipe de profissionais que dê o suporte necessário com base em um bom respaldo teórico, para intervir sempre que possível.

    Segundo Paoli (2007), levando-se em consideração a visão acadêmica sobre os talentos esportivos, temos que estes são os que possuem diversas habilidades (motoras, técnicas, psicológicas, etc.) em níveis superiores aos de um determinado grupo, considerando assim o ambiente esportivo específico a que está associado.

    Com isso, devemos observar, de acordo com Silva & Sponda (2009), que estes talentos, levando em consideração suas características individuais e também das competições que estes disputam, estão propensos ao surgimento de diversos sentimentos e emoções, que estão diretamente relacionados com essa prática, como por exemplo, a ansiedade, o medo, o estresse, etc.

    Na atualidade, os jovens atletas que estão no caminho para o esporte profissional podem estar sendo expostos cada vez mais a diversos tipos de situações que se aproximam muito do universo profissional, porém, ainda não têm a mesma vivência e experiência que estes, evidenciando ainda mais a necessidade de proporcionar o suporte adequado durante este período de formação.

    Caso contrário, o atleta pode ser influenciado por diversas questões, como o estresse, que segundo Weinberg & Gould (2008), seria representado por um desequilíbrio entre demandas físicas e psicológicas que um atleta pode receber e sua real capacidade de responder a estas demandas, visto que muitas vezes essa situação pode ocasionar em problemas.

    Contudo, devemos evidenciar que o estresse nem sempre é negativo, visto que existe o eustress (estresse positivo) e o distress (estresse negativo). O eustress seria uma demanda que prepararia o corpo para uma determinada atividade. Neste, o individuo ficaria mais alerta do ponto de vista fisiológico, apresentando mais atenção, disposição e motivação para prática. No caso do distress, os prejuízos seriam de ordem comportamental (como falar rapidamente, balançar os pés, etc.), físico (sudorese, tensão muscular, aumento da freqüência cardíaca, etc.) e mental (ansiedade, problemas de concentração, medo, etc.).

    Levando em consideração as contribuições de Santos, Coelho, Keller & Stefanello (2012), existem diversos fatores que podem interferir no rendimento e nos níveis de estresse, como a experiência, o gênero, as condições do ambiente e outros fatores, como a influência dos pais, que será o foco deste trabalho.

    Brandão (2000) afirma que os atletas devem estar sendo devidamente preparados para estarem aptos a lidar com qualquer tipo de demanda que possa surgir no esporte de alto rendimento, visto que diversos tipos de pressões, exigências, incertezas e outras questões que fazem parte do cotidiano destes atletas.

    De acordo com as contribuições de Weineck (2005), quando diversos fatores começam a influenciar os atletas nos momentos competitivos, pode haver um decréscimo na performance devido as dificuldades, como a de dormir, por exemplo, ou mesmo tensões que podem originar uma fadiga nervosa considerável.

    Assim sendo, quando pensamos no esporte de alto rendimento, devemos ter uma reflexão quanto à importância de se executar um trabalho realmente significativo para a evolução destes atletas, visto que para isso é necessário ter muito conhecimento aplicado praticamente, levando em consideração questões que são fundamentais, mas muitas vezes deixadas de lado pelos técnicos e preparadores físicos.

    Por exemplo, questões que envolvem as interferências de pais no contexto esportivo podem provocar alterações nos níveis de estresse e de ansiedade dos atletas, sendo que de acordo com as colaborações de Fleury (2005), níveis alterados de ansiedade no momento pré-competitivo podem surgir através de nervosismo e preocupação. Este fato pode desencadear em prejuízos ao desempenho, devido a grande tensão muscular, gerando um aumento em desequilíbrios de coordenação, problemas de concentração e atenção, evidenciando desta forma como o rendimento dentro de uma modalidade vai muito além do treinamento físico/técnico/tático.

    Com relação a proximidade dos pais com a prática esportiva dos filhos, Uva (2005) afirma que a interferência é absolutamente normal, visto que estes estão diretamente relacionados com esta prática, como por exemplo sendo responsáveis por transporte, alimentação, compra dos materiais esportivos, escolha e pagamentos dos locais de treinamento, dentre outros fatores.

    Porém, não podemos deixar de levar em consideração, de acordo com Machado, Miotto, Presoto & Silva (1997), que as atitudes e condutas das crianças podem sofrer interferências dos pais, influenciando a participação na modalidade. Este autor ainda afirma que as relações da criança com a sociedade ocorrem através de diversos tipos de influências, iniciando com a dos pais e, com a entrada na escola e em outros ambientes, como o esportivo, de professores.

    E nesta relação é importante analisar o modo como os pais podem estar interferindo na formação da conduta dos filhos, visto que em muitas situações, pais, técnicos e outros envolvidos com a modalidade se preocupam com a própria vontade de observar a criança se destacando, sendo titular de uma equipe, superando as outras crianças, ganhando títulos e acabam se esquecendo do aprendizado que é necessário para esses sujeitos (Filgueira, 2004).

    Raciocinando neste sentido, os pais muitas vezes acreditam que o fato de estarem criticando as atuações de seus filhos pode ser algo realmente positivo durante um treinamento ou competição, mas dependendo do modo como é feita esta crítica (como de modo muito agressivo, por exemplo), as alterações podem ser negativas, visto que podem interferir na autoimagem das crianças, podendo conduzir o fracasso, de acordo com Machado, Miotto, Presoto & Silva (1997).

    Desta forma, percebe-se que a interferência dos pais com relação aos filhos dentro do contexto esportivo pode gerar respostas negativas, evidenciando desta forma a necessidade de ter um olhar adequado sobre esta relação. Portanto, o objetivo desta pesquisa foi avaliar questões referentes a participação dos pais e sua influência na modalidade que os filhos praticam.

Procedimentos metodológicos

    Foi realizada a pesquisa com 147 atletas, todos com idades entre 16 e 18 anos, participantes da Copa São Paulo de Futebol Junior, sendo que foram escolhidas as equipes que estavam na cidade de Rio Claro, Araras e São Carlos. No total, sete equipes aceitaram disponibilizar seus atletas para a participação, respondendo um questionário fechado com uma escala do tipo “Likert” (5 pontos), envolvendo o objetivo acima especificado. A pesquisa foi realizada nos locais onde as equipes estavam alojadas durante a primeira e a segunda partida da competição.

Resultados e discussão

    Existem muitas pessoas que compõe o contexto esportivo e, desta forma, fazem parte de toda organização e funcionamento deste. Desta forma, focados basicamente no atleta em formação, todos os profissionais envolvidos e seus pais, necessitam ter uma preocupação com relação a todos os tipos de conhecimentos que são fundamentais para que a evolução dos jovens ocorra do modo mais adequado e coerente.

    De acordo com as colaborações de Korsakas (2002), todas as possibilidades de práticas esportivas para jovens dependem de ações adultas e suas interferências nessas experiências. Quando pensamos nestes que podem interferir, vemos pais, professores, técnicos, dirigentes, dentre outros que se fazem presentes e podem influenciar os praticantes, aproximando ou afastando estes da modalidade em que estão inseridos.

    No gráfico a seguir, estão expostas as porcentagens com relação ao que os jovens atletas assinalaram quanto aos itens que correspondem ao envolvimento de seus pais na sua prática esportiva, possibilitando desta forma que sejam discutidos estes resultados dentro da população escolhida.

Gráfico 1. A influência e participação dos pais em relação à atividade esportiva de seus filhos (%)

    Com relação ao gráfico acima exposto, podemos observar no sétimo item que 46% dos pais sempre demonstram desagrado com relação a algum resultado negativo ou rendimento inadequado durante uma competição. Paes, Ferreira, Galatti, & Da Silva (2008) afirmam que este tipo de influência dos pais pode ser negativa, visto que os pais passam a ver a necessidade de seus filhos serem campeões e deixam de compreender questões do esporte e também outras possibilidades, tendo olhos apenas para os bons resultados.

    Paes, Ferreira, Galatti, & Da Silva (2008) destacam ainda que a vitória faz parte da prática esportiva, mas não é a única possibilidade. Desta forma, é fundamental que todos profissionais envolvidos na modalidade e os pais dos atletas tenham uma compreensão do fenômeno esportivo e todas suas possibilidades, inclusive educacionais.

    O fato dos pais estarem presentes no cotidiano esportivo dos filhos e os acompanharem nas competições pode ser motivador para os jovens, como acontece nos itens quatro e cinco do gráfico, demonstrando que boa parte dos mesmos demonstram interesse ou mesmo acompanham os filhos nas competições.

    Contudo, de acordo com Machado (1994), esta relação de proximidade pode ter conseqüências negativas, visto que os mesmos sentem-se a vontade para fazer cobranças excessivas para que os filhos aumentem seu desempenho e obtenham bons resultados na modalidade.

    Este fato citado anteriormente pode ser exemplificado pelo sexto item, visto que 46% dos pais sempre fazem planos com relação à permanência dos filhos na modalidade, seguidos por outros 31% que muitas vezes também têm esta intenção, visto que desta forma a pressão sobre resultados possa vir a ser prejudicial.

    No último item, podemos observar que 61% dos pais sempre consideram importante que os filhos consigam vir a ser jogadores profissionais, o que é coerente com o que Barbanti (2005) afirma, uma vez que, para ele, os pais sempre desejam o melhor para seus filhos. Porém, isso se torna ser negativo quando os pais passam a considerar que os filhos têm a obrigação de vencer, pois consideram que a vitória ou derrota dos filhos está diretamente relacionada com o sucesso ou insucesso deles no processo de formação esportiva.

    Já Machado (1998) salienta que muitas vezes essas pressões se originam de pais que são ex-atletas frustrados, sendo que desta forma passam a transmitir essa “missão” e responsabilidade aos seus filhos, para que os mesmos consigam realizar estes desejos, gerando pressão que pode levar ao abandono da modalidade.

    Outro fator interessante e que merece ser destacado é que, como ocorre em muitos casos, apesar de 61% dos pais desejarem que seus filhos continuem na modalidade devido ao seu bom rendimento, 54% raramente acompanham os treinamentos de seus filhos, o que evidencia, aliado aos que raramente ou poucas vezes se interessam por saber o que ocorre nos treinamentos (que juntos, representam 53% dos pais), que os pais se preocupam pouco com o processo e muito com o resultado, fazendo cobranças excessivas sem, na grande maioria das vezes, buscar saber realmente o que ocorreu para acarretar em uma queda de rendimento.

    Quanto a este aspecto, Machado (1998) também destaca que devido à proximidade afetiva dos pais com os atletas, aliados aos poderes de “autoridade” que exercem, passam a ser os torcedores mais ácidos naquele contexto, visto que se dão o direito de insultar, gesticular e ter uma série de outras condutas que podem ser muito nocivas para os filhos, prejudicando-os com relação aos técnicos e podendo inclusive gerar problemas de coesão grupal.

    Com relação aos resultados negativos, 46% dos pais sempre e outros 39% muitas vezes apóiam os atletas, algo que é muito importante, mas não esquecendo também que os pais devem ser devidamente aconselhados com relação ao modo que devem auxiliar neste momento, para que não ocorra um reflexo mais negativo ao invés de positivo nesta intervenção dos pais.

    Para Lavoura, Presoto & Machado (2008), esta situação ocorreria quando os pais assistem aos jogos e, momentos depois, fazem uma série de comentários, que também muitas vezes podem ser infelizes, e desta forma potencializam o efeito já muito negativo de um possível desempenho abaixo do esperado dos atletas, o que é nocivo e poderia ser evitado.

    Um fator importante de ser observado é a grande maioria dos pais nunca (54%) ou raramente (31%) se expressam contrariamente a opinião ou instrução dada pelos treinadores, fato este que é fundamental em um ambiente harmonioso, não ocorrendo o que Paes, Ferreira, Galatti, & Da Silva (2008) chamam de “pais fanáticos”, isto é, os que facilmente questionam e se exaltam com decisões dos técnicos e transformam o ambiente em um local hostil,

    Portanto, os resultados favorecem reflexões acerca do papel dos pais neste ambiente e também da necessidade de oferecermos informações que viabilizem que os mesmos não prejudiquem a prática dos filhos, como por exemplo, cobrando resultados imediatos e não acompanhando as evoluções ao longo do processo. Com isso, os atletas poderiam ser beneficiados com inter-relações adequadas dentro e fora do ambiente esportivo.

Conclusão

    Por meio desta pesquisa, buscou-se analisar questões relacionadas aos pais e suas interferências no contexto esportivo de seus filhos. Foi possível perceber alguns aspectos que revelam possíveis reflexos negativos no desenvolvimento esportivo dos jovens, como no caso dos pais que não aceitam resultados negativos ou mesmo que projetam a necessidade do filho conseguir sucesso na modalidade, aumentando a obrigação por boas performances.

    Estas questões reforçam a necessidade de aprofundamento dos profissionais envolvidos, com a finalidade de intervir pontualmente de modo a dar o devido suporte aos jovens, além de fornecer orientações que conduzam os pais a relações mais positivas com relação aos filhos, possibilitando assim avanços na formação esportiva.

Referências

Outros artigos em Portugués

www.efdeportes.com/

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 21 · N° 219 | Buenos Aires, Agosto de 2016  
Lecturas: Educación Física y Deportes - ISSN 1514-3465 - © 1997-2016 Derechos reservados