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A Educação Física brasileira e os clássicos da década de 1980: a atualidade de Vitor Marinho de Oliveira e ‘O que é Educação Física’

La Educación Física brasileña y los clásicos de la década de 1980: 

la actualidad de Vitor Marinho de Oliveira y “Qué es la Educación Física”

 

*Mestre em Educação pela Universidade do Estado do Pará. Doutorando em Educação no Programa

de Pós-graduação da Universidade Federal de Santa Catarina. Professor do Departamento de Artes

Corporais da Universidade do Estado do Pará. Pesquisador do Grupo de Estudos sobre Política

Educacional e Trabalho (GEPETO) e Ressignificar – Experiências Inovadoras na Formação

de Professores e Prática Pedagógica em Educação Física (UEPA)

**Mestre em Educação pela Universidade do Estado do Pará. Doutoranda em Educação no Programa

de Pós-graduação da Universidade Federal de Santa Catarina. Professora do Departamento de Artes

Corporais da Universidade do Estado do Pará. Pesquisadora do Grupo de Estudos sobre Política

Educacional e Trabalho (GEPETO) e Ressignificar – Experiências Inovadoras na Formação

de Professores e Prática Pedagógica em Educação Física (UEPA)

Anibal Correia Brito Neto*

anibalcbn@yahoo.com.br

Eliane do Socorro de Sousa Aguiar**

eliane_aguiar@yahoo.com.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A resenha evoca a necessidade de resgatar os clássicos produzidos no âmbito da Educação Física brasileira durante a década de 1980. A partir da obra “o que é Educação Física”, de Vitor Marinho de Oliveira, escrito originalmente em 1983, é possível evidenciar que passados mais de três décadas da sua publicação, aquilo que aparentemente significava uma singela introdução aos impasses de uma suposta crise de identidade da área, expressava, no concreto, a disputa de projetos históricos antagônicos pela direção desta prática social que se mantém profundamente atual na contemporaneidade.

          Unitermos: Educação Física. Epistemologia. História. Vitor Marinho de Oliveira.

 

Resumen

          La revisión se refiere a la necesidad de rescatar los clásicos producidos dentro de la Educación Física brasileña durante la década de 1980. A partir del libro "Qué es la Educación Física", de Vítor Marinho de Oliveira, escrito originalmente en 1983, es posible demostrar que pasadas más de tres décadas de su publicación, lo que aparentemente significó una simple introducción a los callejones sin salida de una supuesta zona de crisis de identidad, expresaba en lo concreto, la disputa proyectos históricos antagónicos para la dirección de esta práctica social que sigue muy presente en la sociedad contemporánea.

          Palabras clave: Educación Física. Epistemología. Historia. Vítor Marinho de Oliveira.

 

Recepção: 30/03/2016 - Aceitação: 03/05/2016

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 21 - Nº 216 - Mayo de 2016. http://www.efdeportes.com/

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    Trata-se da obra de número 79 da Coleção Primeiros Passos, da Editora Brasiliense. Como o próprio nome sugere, a idéia desta coletânea seria apresentar aos interessados uma primeira abordagem sobre um amplo leque de assuntos (política, ciência, religião, educação, etc.) de modo didático e convidativo, não se restringindo exclusivamente aos especialistas. Neste formato, o acervo já superou mais de 03 centenas de volumes nos seus 36 anos de existência (1980-2016), tornando-se um verdadeiro fenômeno de vendas, com inserção em diversos grupos sociais.

    O livro “O que é Educação Física”, de Vitor Marinho de Oliveira, registrou sua primeira edição em 1983. Considerado como um grande protagonista do propalado “Movimento Renovador da Educação Física”, ao alcançar o marco de 20 reimpressões, a sua segunda edição (2011) ganhou um posfácio, onde o autor deixou suas impressões “sobre como ‘andam as coisas’ na nossa Educação Física (EF) no início (que não é tão início assim) do século XXI” (p. 127).

    Neste posfácio, o qual seria um de seus últimos escritos, ficou explícito a radicalização de sua elaboração teórica, de uma perspectiva humanista centrada no individuo como “arquiteto de si mesmo” (Oliveira, 1983) para uma análise com base nas categorias do materialismo histórico em que o mesmo assevera que “seguramente a sociedade dividida em classes não nos educa para vermos o mundo desta forma [na perspectiva da totalidade], pois nela prepondera homens que exploram outros homens, em lugar de serem educados para criar igualdade de oportunidades (Oliveira, 2011, p. 140).

    Apesar de ser uma obra datada, a mesma se destacou como um verdadeiro clássico, imprescindível para todos os defensores de uma educação física que vise o desenvolvimento pleno dos valores da coletividade e da cooperação. Nela está contido o embrião do que de melhor foi produzido nas últimas três décadas em prol da superação do tecnicismo e conservadorismo profundamente alastrados na área.

    O seu conteúdo reflete muito bem a conjuntura que envolvia a Educação Física no final da década de 1970 e início da década de 1980, período em que segundo Daolio (1998) começava a pensar a área não somente como atividade técnica ou biológica, mas como fenômeno psicológico e social. Este autor também ratifica que devido à carência de referencial teórico dentro da própria área para cumprir tal objetivo, outras bases teóricas subsidiaram as reflexões iniciais sobre Educação Física, corpo e o movimento humano, com destaque para a Psicologia, a História, a Sociologia e a Pedagogia (Daolio, 1998).

    Neste contexto, Vitor Marinho cursava mestrado em Educação na Universidade Federal do Rio de Janeiro, desenvolvendo estudo sobre a relação entre o campo pedagógico e psicológico para subsidiar uma abordagem para Educação Física que superasse a perspectiva comportamentalista de um ensino diretivo, cristalizado na área através da influência dos postulados “Skinnerianos”. Para tanto, resgatou as contribuições da psicologia humanista de Carl Rogers, a qual foi a principal base teórica presente no livro “o que é educação física” e, posteriormente, de maneira mais sistematizada no livro “Educação Física Humanista” (Oliveira, 1985).

    Vitor entendia ser fundamental naquela ocasião discutir “os caminhos e descaminhos” da Educação Física, pois para ele a área se ressentia de um engajamento filosófico a orientá-la em direção às suas finalidades. Para tanto, após um capítulo introdutório em que de partida demarcou sua ruptura com abordagens biomédicas, militaristas e de manipulação ideológica presentes na área, organizou a exposição da obra em três eixos (história da Educação Física, questionamentos, defesa de postulados). Ao final, acrescentou uma parte para indicação de leituras relacionadas ao tema do livro.

    Com dois capítulos destinados ao eixo histórico, este se materializou como o mais longo (56 páginas) e talvez o mais problemático. Primeiro por uma desnecessária digressão histórica ao “tempo da pedra lascada” para explicar um fenômeno do período moderno. Segundo pelo desenvolvimento de uma visão tradicional da história (pré-história, antiguidade, idade média, modernidade) que por vezes perde elementos fundamentais para explicação do real. Terceiro por não diferenciar claramente os diversos elementos da atividade humana: movimento, ato físico, exercício, atividades esportivas e a própria Educação Física. Entretanto, os dois capítulos são importantes para identificarmos o “encantamento” do autor com perspectivas que supostamente concebiam o ser humano de modo integral, completo. O registro sobre a educação vivida no mundo grego denota claramente a posição do autor sobre a sua concepção humanista de homem:

    A filosofia pedagógica que determinou os caminhos a serem percorridos pela educação grega tem o grande mérito de não divorciar a Educação Física da intelectual e da espiritual. Postulava, dessa forma, o mais significativo de todos os princípios humanistas, considerando que o homem é somente humano enquanto completo (Oliveira, 1983, p. 21-22).

    Na seqüência, a obra levanta uma série de questões como possibilidades de explicar o que é educação física. O capítulo é de suma importância para dialogar com as representações iniciais dos alunos que ingressam ou intentam ingressar nos cursos superiores da área. Todo o debate suscitado continua bastante atual, mesmo passado três décadas. Os esclarecimentos sobre as origens da abordagem médica na área; os embates entre métodos naturais e artificiais no âmbito da ginástica; a crítica ao reducionismo de uma visão meramente biológica do homem; a defesa recorrente de uma ação voltada ao homem completo – ao organismo total; a predileção por recursos metodológicos capazes de propiciarem aprendizagens espontâneas e naturais, em detrimento da rigidez e do tecnicismo; o alerta ao uso da Educação Física como instrumento ideológico, além da necessidade de uma visão interdisciplinar para a área ainda são reivindicações de muitos intelectuais progressistas.

    Por fim, o autor retoma a questão central: afinal o que é Educação Física?. Apesar do tom recorrente de inconclusão, alguns postulados podem ser extraídos desta última parte sobre a incômoda questão, tais como: 1) o compromisso da Educação Física em estudar o homem em movimento, 2) a ginástica, o jogo, o esporte e a dança como instrumentos para cumprir os seus objetivos, 3) a sua existência em função do homem, enquanto ser individual e social, 4) a transmissão de cultura, mas também, acima de tudo, transformadora de cultura, 5) a necessidade de respeitar os níveis de maturidade motora, a capacidade de rendimento e os interesses individuais, 6) o entendimento de que o excesso de tecnicismo afasta a Educação Física de sua fundamental participação no desenvolvimento da inteligência (criatividade), 7) o juízo de que os exercícios físicos não sejam o fruto da pura imitação mecânica, mas que as pessoas se movimentem tendo consciência de todos os seus gestos, 8) mesmo como uma atividade essencialmente prática, pode oferecer oportunidades para a formação do homem consciente, crítico, sensível à realidade que o envolve, 9) consideração de que a atividade do professor de Educação Física é eminentemente intelectual, e não física, logo, a preocupação das escolas deveria ser, essencialmente, "ensinar a ensinar", pois o produto dessas escolas não são atletas, mas professores, 10) Enquanto processo individual, a Educação Física desenvolve potencialidades humanas. Enquanto fenômeno social, ajuda este homem a estabelecer relações com o grupo a que pertence, 11) Educação Física é Educação, na medida em que reconhece o homem como o arquiteto de si mesmo e da construção de uma sociedade melhor e mais humana, 12) A Educação Física exige o humanismo que se pauta no diálogo, no debate, no confronto de idéias.

    Na verificação dos 12 postulados acima é possível identificar a atualidade desta obra e, portanto, a necessidade do seu resgate principalmente nos cursos de formação superior em Educação Física. É inquestionável as conexões possíveis com o tempo presente, sobretudo na perspectiva de confrontar os avanços e retrocessos na área, tendo como pano de fundo a história como matriz científica.

    O posfácio de Vitor Marinho redigido em 2011 é um complemento indispensável para evidenciar a radicalização da elaboração do autor e confirmar que aquilo que aparentemente significava uma singela introdução aos impasses de uma suposta crise de identidade da área, expressava, no concreto, a disputa de projetos históricos antagônicos pela direção desta prática social que se mantém profundamente atual na contemporaneidade. Vitor Marinho faleceu em 07 de setembro de 2013, mas com a convicção de que os fundamentos da sua elaboração teórica só perderiam a atualidade com a materialização de uma outra sociedade, a socialista.

Bibliografia

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