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História da Dança de Salão no Brasil: Sergipe do século XIX

Historia del Baile de Salón en Brasil: Sergipe en el siglo XIX

History of Ballroom Dancing in Brazil: Sergipe of 19th century

 

Mestre em Ciências Biológicas, Universidade Federal do Paraná

Especialista em Educação. Centro Universitário Internacional

Especialista em Dança de Salão, Faculdade Metropolitana de Curitiba

Licenciada em Ciências Biológicas, Universidade Federal do Paraná

http://danca-de-salao-maristela-zamoner.blogspot.com.br

Maristela Zamoner

maristela.zamoner@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Objetivou-se aprofundar o conhecimento sobre a forma como as Danças de Baile inseriram-se na sociedade sergipana do século XIX através da leitura de periódicos da época. Ao todo se constataram 13 (treze) instituições de ensino formal que fizeram anúncios citando o ensino de dança. A análise dos anúncios permitiu notar que a dança foi uma disciplina ofertada, geralmente, de forma complementar, inicialmente mais aproximada à Música e posteriormente à Ginástica. As quantidades de alunos matriculados por disciplina, em certos casos, revelaram que a dança era das mais requisitadas. Em determinadas publicações o valor das aulas de dança anunciadas revelava-se mais baixo que de outras disciplinas. Identificou-se uma sociedade de dança, denominada “Independência”, no ano de 1883. Diversos artigos publicados nos periódicos avaliados trataram do tema dança inclusive quanto aos seus aspectos educacionais. Poucas peças teatrais com números de dança foram constatadas. Provavelmente a dança mais praticada foi a Valsa, primeira Dança de Salão, seguida por Quadrilha, Polka, Mazurca e Lanceiros. Os resultados indicam que a dança foi parte importante da vida social de Sergipe no século XIX.

          Unitermos: Dança de Salão. Sergipe. História. Século XIX

 

Abstract

          We aimed to deepen knowledge on how the Prom Dances were brought into the society of Sergipe in the nineteenth century by reading periodicals of the time. Altogether there were found thirteen (13) formal educational institutions that advertised dance education. The analysis of the advertisements allowed us to notice that the dance was one offered discipline, usually in a complementary manner, initially closer to Music and then to Gymnastics. The quantity of students enrolled by discipline in certain cases has revealed that the dance class was one of the most requested. In certain publications the value of the dance classes advertised turned out to be lower than the other disciplines. A dance club called "Independence" was identified in the year 1883. Several articles published in the assessed periodicals mentioned dance and also its educational aspects. Few dance performances in theatrical plays were found. Probably the most practiced dance was the Waltz, the first Ballroom Dance, followed by Hoedown, Polka, Mazurka and Lancers. The results indicate that the dance was an important part of the social life of Sergipe in the nineteenth century.

          Keywords: Ballroom Dance. Sergipe. History. 19th century.

 

Recepção: 21/11/2015 - Aceitação: 13/02/2016

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 214, Marzo de 2016. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Ao discutir sobre aspectos sociais do século XIX em Sergipe, Albuquerque (2007) relembra que bailes e saraus faziam parte da vida familiar. Dantas (1971) registra para o mesmo século e local a importância dos bailes em grandes salões privados mantidos pelos mais abastados. Entretanto, poucos detalhes sobre estas práticas são conhecidos.

    Desta forma, o objetivo desta pesquisa é aprofundar o conhecimento sobre a forma como as Danças de Baile inseriam-se na sociedade sergipana do século XIX através da leitura de periódicos da época.

Metodologia

    Pesquisaram-se periódicos no acervo da Hemeroteca Digital Brasileira, obtidos pela busca filtrada por “Sergipe”, produzidos no século XIX. Esta pesquisa foi procedida com os periódicos disponibilizados até dezembro de 2014.

    A metodologia seguiu o padrão utilizado por Zamoner (2014a):

    Todos os periódicos elencados foram acessados procedendo-se a busca pelo unitermo “dança”. Registraram-se os totais de suas ocorrências e a natureza de cada uma delas.

    Os periódicos obtidos foram tabelados adicionando dados do intervalo de anos em que foram produzidos, quantidades de ocorrências do unitermo “dança” e de professores neles identificados. Os nomes de professores foram tabelados separadamente, com o ano em que apareceram, periódico, e, quando identificado, o endereço em que as aulas foram ofertadas.

    De forma complementar, para efeito de confronto de informações, foram consultados periódicos do século XIX produzidos em outras localidades brasileiras. (2014a).

Resultados

    Foram encontrados 46 periódicos de Sergipe produzidos no século XIX abrangendo o intervalo de tempo entre 1833 e 1900.

    As buscas nos periódicos trouxeram 149 apontamentos do unitermo “dança”, sendo que 41 deles corresponderam a palavras semelhantes ao unitermo de busca.

    Vários apontamentos trouxeram como resultados o uso da palavra “dança”, referindo-se a doenças nomeadas, por exemplo, como “dança de S. Guido”.

Professores de Dança

    Nesta pesquisa foi constatado um nome de professor de dança, “H. J. Barbosa”, constante na lista de docentes do colégio “Atheneu Bahiense”, como professor de dança. Este colégio ofertou aulas no “Jornal do Aracaju”, no ano de 1877, entretanto, foi uma instituição da Bahia. Consta no anúncio do “Jornal do Aracaju” que seu diretor seria “Aureliano Henrique Tosta”, e o jornal carioca “A Noticia” publica em 1941 um texto intitulado “Noticias da Baía” registrando que o referido diretor seria baiano, como o Atheneu Bahiense, o que pode ser constatado no trecho que segue.

    O Sr. Isaias Alves, secretario da Educação e Saude, baixou uma portaria, em que recomenda ao diretor geral do Departamento de Educação as necessarias providenias para que nas escolas primarias, secundarias, normais e profissionais sejam realizados estudos em torno da longa vida do professor Aureliano Henrique Tosta, cujo primeiro centenario de nascimento transcorrerá no próximo dia 13. Aureliano Tosta, que foi um dos mais dedicados mestres da mocidade baiana, como professor particular e diretor do antigo Atheneu Baiano, como catedrático, vice-diretor e diretor do Ginasio da Baia, e inspetor geral do Ensino, serviu á cauxa do ensino durante cerca de 75 anos, falecendo aos 95 anos de idade.

Dança no ensino formal

    Algumas instituições de ensino formal fizeram anúncios em periódicos de Sergipe no século XIX, citando o ensino de dança: Collegio da Conceição (1851), Padre José Antonio Correia – diretor (1852), Casa de Educação - diretor Dr. Luiz Alvares dos Santos (1853), Sergipe Larangeirense (1853), D. Roza Senhorinha de Carvalho – diretora (1854), Collegio N. S. das Dores (1854), Collegio Nossa Senhora do Bom Conselho – Recife (1858), D. Rosa Lazary Albertazzi – diretora (1866), Collegio fundado por Justino José de Oliveira e Guilherme Antonio Lopes (1874), Atheneu Bahiano – na Bahia (1877), Collegio Parthenon Sergipense (1879-1882), Educação Primária - Francina da Gloria M. Telles (1881), Collegio Euler (1882).

    A análise dos anúncios permite notar que a dança foi uma disciplina ofertada nas instituições, geralmente, de forma complementar. Os anúncios mais antigos posicionavam a dança juntamente com a música nos textos. Ao final do século o posicionamento da dança nos anúncios começou a ser feito juntamente com a ginástica. A exemplo de outros estados, este detalhe revela que a concepção sobre a dança migrou, ao longo do século XIX, da Arte para a Educação Física. No ano de 1881 o “Collegio Parthenon Sergipense” publica vários anúncios registrando que as aulas extraordinárias seriam as de “musica, dança e gymnastica”. Neste anúncio percebe-se que a dança foi posicionada no texto entre a música e a ginástica, período a partir do qual se notou mais enfaticamente, em Sergipe, o deslocamento da dança da concepção de Arte para a de Educação Física.

    Em 1853, “A União” publica um texto revelando os totais de alunos por disciplina no “Collegio Sergipe Larangeirense” revelando que a dança estava entre as disciplinas mais requisitadas, havendo um quantitativo total de alunos superior apenas nas aulas de latim.

    No ano de 1854 o “Correio Sergipense” publica um texto extenso sobre regulamentação de instituições de ensino formal, do qual se destacam os trechos que seguem.

    O Presidente da Provincia, autorizado pelo artigo 7.º da Lei Provincial n.o 398 de 21 de Julho de 1854 tem resolvido que nos Collegios, que se estabelecerem em virtude da mesma Lei se observe o seguinte:

    REGULAMENTO

    DO DIRECTOR OU EMPREZARIO DO COLLEGIO.

    [...]

    Art. 17. A aula de Dança será sómente nas quintas feiras pela manhã a hora que melhor convier á approvação do Director, e a de Musica nas quintas e sabbados a tarde, sendo designadas pelo Director a hora de principiar, e o tempo de sua duração diaria.

    Art. 18. Os Mestres de Dança e Musica ficão igualmente sujeitos ás obrigações e as penas á que são sujeitos os outros Professores.

    O “Correio Sergipense” publica um artigo sobre educação no ano de 1856 abordando o assunto de forma geral, entretanto, citando dados relevantes que incluem o ensino da dança nas instituições formais. Deste artigo destaca-se o trecho que segue.

    Conta hoje a Provincia para o ensino elementar 38 escholas publicas do sexo masculino, e 15 de feminino, e além d’estas mais algumas particulares para um e outro sexo. Para o ensino secundário temos dois Internatos, um na Cidade da Estancia, e outro na de Larangeiras, nos quaes existem aulas de Latim, Philosofia, Geographia e Historia, Geometria, Francez, Muzica e Dança.

    É possível notar um aspecto da valorização do ensino de dança pelo preço de suas aulas em determinadas publicações. Em 1866, o estabelecimento de ensino dirigido por “D. Rosa Lazary Albertazzi” anuncia que as aulas de dança tem um custo de Rs. “2$000”, como de Geographia e História, enquanto as aulas de música, piano, ler, escrever, gramática e doutrina cristã são ofertadas por “Rs. 5$000”. Neste mesmo texto informa-se que as aulas de costura e bordado são gratuitas. Em 1882 o “Collegio Euler” publica um anúncio no “Sergipe”, informando os valores das aulas. Neste anúncio, os custos trimestrais das disciplinas são citados, nesta ordem: piano 30$; Allemão 20$; Desenho 20$; Harpa 40$; Canto 20$; Italiano 24$; Pintura 20$; Dança 20$.

No ano de 1882 o “Collegio Parthenon Sergipense” publica vários anúncios incluindo a oferta de aulas de dança, nos quais informa que foi fundado em 1879. Nestes anúncios, são citados os nomes dos professores das disciplinas, entretanto, a dança não recebe a mesma atenção, não havendo menção ao nome de seu docente.

Artigos, notas e outros textos

    No ano de 1843 o “Correio Sergipense” dedica um longo texto à educação da mulher, e a dança é citada no trecho que se destaca a seguir.

    No meu tempo, mestre, creavao se as raparigas com todo o recato e no temor de Deos! Ensinava-se-lhes a ler e escrever, a costura, a meia, o bordado e outras prendas ad rem! Todas sabião varrer a casa, limpar a sujadela do gato, lavar a louça e pôr a apanella ao lume! e nem por isso deixavam ellas de ter quem as requestasse, e se casavão tao real e perfeitamente como hoje se vão casando as nossas doudinhas! Agora as prendas que se ensinão as meninas do grande tom são todas de seducção e armadilhas do diabo! cozer e bordar muito pouco, para não applicar a vista! e em lugar d’estas uteis habilidades o que a menina aprende he a maldita musica para estar no piano desde amanhã até a noite! a dança para mobilizar o corpo e dar acção aos nervos!

    Em 1849 o mesmo periódico dedica-se novamente ao mesmo tema e mais uma vez aborda a dança, citando a valsa, como se pode conferir no trecho destacado a seguir.

    Acredita hoje huma moca, que tem posto o remate á obra de sua educação, quando por sobre um teclado, rico de harmonias, corre molemente os macios dedos; ou quando em calorosa valsa move os passos, e os requebros durante os applausos dos espectadores: mal sabe ella que apenas tem tocado os pontos menos importantes da educação, ou, talvez que o diga melhor, mal sabe ella, que ainda não deu hum passo para a educação propriamente dicta! E com effeito eu não reputo a musica, e a dança, que por accessorios della, e erro julgo de prudencia, e de economia tomar-se como se toma, accessorios por essenciaes.

    No ano de 1854 o mesmo periódico volta a abordar o tema da educação da mulher, citando a dança, em sua edição 21, conforme se constata pelo trecho destacado que segue: A vossa educação se limita até hoje no solo brasileiro a bem pouca cousa: vós aprendeis a ler a escrever, coser, dançar, tocar e desenhar, e poucas vezes uma, ou outra lingua.

    Na literatura, alguns trechos foram dedicados à dança, nos permitindo mais algumas percepções de como esta sociedade a considerava.

    Em 1851 o “Correio Sergipense” publica um texto de literatura em que o autor versa sobre sua própria vida, dedicando um parágrafo à dança, como segue: A dansa, a turbulenta dansa com o exercito de suas seducções, delirios e embriaguez, foi a expressão do que era o coração.

    O “Jornal de Aracaju” de 1873, em uma coluna “Folhetim”, publica um texto que em parte se dedica ao assunto dos bailes, enfocando um baile específico ocorrido no Atheneu Sergipense, dedicado ao médico “dr. Vasconcellos”, contendo trechos que versam especificamente sobre a dança, como segue.

    ...é o delirio da walsa, que enleia, e confunde.

    [...]

    Dançou-se a primeira e mais sete quadrilhas, alem das walsas, polkas, masurkas, lanceiros etc. etc.

    A dança n’um baile é o elemento mais vital.

    Não é por sem duvida o acto material de trocar pernas, o que agrada, não, o que deleita, são os intervalos das quadrilhas, os passeios, o descanço da walsa: são estes momentos santos em que por um accordo, ou esquisitice social se pôde estar tête-tête com uma mulher bella, e lhe abrir francamente o coração. São.... estes mysteriosos instantes, em que muita vez o homem esquece tudo, e sómente se lembra d’ella. Se não fora a dança, um baile seria a monotonia mais aborrecida!

    Em 1881 o periódico “Sergipe” publica um texto com “instrucções que devem ser seguidas e observadas á risca” por candidatos políticos. Entre tais “instrucções” do texto no qual se pode entender um tom jocoso, citaram-se lições de dança para suas filhas, como o trecho que segue permite conferir.

    Se tiver filhas que gostem de bailes, o aspirante á assembléa caso não saiba dansar, deve tomar duas ou tres lições de dansa afim de que as meninas não fiquem sentadas nos salões de baile e possam dizer depois ao pai: Que bom moço, papai; ou então: Que velho patusco!

    O texto finaliza com as frases transcritas na seqüência: - Estas intrucções encerram-se em duas - Prometter o mais possivel. - Roer a corda depois de eleito.

    Em 1882 no periódico “Sergipe” publica-se um artigo versando sobre o assunto de mulheres desprovidas de beleza, que foi publicado também em várias outras localidades brasileiras no século XIX, abordando-se que o marido da mulher bela tema a dança e o das outras incentivam que suas esposas dancem.

Sociedades de Dança

    A pesquisa nos 46 periódicos de Sergipe do século XIX permitiu a identificação de uma sociedade, denominada “Independência”, que constou no jornal promovendo eventos dançantes em 1883.

    “O Guarany” publica em dezembro de 1883 que a “Sociedade Independencia” festejaria seu primeiro aniversário, como pode ser constatado na nota transcrita na seqüência.

    Sociedade Independencia – Esta sociedade de dansa, erigida na cidade de Larangeiras sob os auspicios de uma plêiade de moços criteriosos, festejou o seu primeiro anniversario no dia 8 do corrente, offerecendo aos seus convidados uma soiré.

    Consta-nos que essa festa de amigos foi muito concorrida por grande numero de senhoras e cavalheiros e cheia de enthusiasmo.

Espetáculos

    Em 1851 o “Correio Sergipense” publica um “Aviso” de uma “representação” de variados números incluindo mágicas, músicas e números de cunho circense, em benefício de “Maria Walter”. Dentre os números citados, um deles foi abordado textualmente como “dança”.

    O “Correio Sergipense” publica em 1859 um texto chamado “CORRESPONDENCIA.”, dirigida ao “Sr. Redactor”, assinado por “Celislino de Mantini Francisco Santini. José de Vecchy. Cavalheiro da imperial ordem da Roza e mestre de dança da casa Imperial”, agradecendo por terem sido bem recebidos e informando que partiriam para Maceió. No mesmo texto “José de Vecchy” desculpa-se por não ter justificado em tempo sua solicitação para que a orquestra interrompesse e repetisse a música em uma apresentação, devido a um prejuízo que tivera na “execução pantomimo”, tecendo alguns elogios ao flautista e ao clarinetista, finalizando o texto com um agradecimento ao regente da orquestra, “Sr. Antonio Simões de Freitas”, por “favores e bondade de trato”.

Danças

    A dança cujo nome foi observado mais vezes durante as leituras dos textos das edições dos periódicos nos quais contavam as palavras chave, ao longo de todo o século XIX, foi a Valsa, seguida pela Quadrilha, Polka, Mazurca e Lanceiros.

    Em 1880 o “Jornal de Sergipe” noticia detalhes sobre um baile informando, como segue, o que se dançou: Dançaram-se muitas quadrilhas, lanceiros, polkas e valsas.

Conclusões

    A pesquisa evidenciou que a dança, embora criticada por alguns especialmente no que tange a aspectos educacionais, foi parte importante da vida social sergipana no século XIX, o que se revelou por constatações como várias escolas de ensino formal anunciando aulas de dança, artigos trazendo-a em suas temáticas e quantidades relevantes de alunos nela matriculados. Possivelmente a dança praticada mais intensamente na sociedade sergipana do século XIX foi a Valsa, muito embora houvesse prática de outras danças como Quadrilha, Polka, Mazurca e Lanceiros.

Bibliografia

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