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Efeito hipocolesterolemiante do arroz 

fermentado por Monascus ruber em coelhos

Efecto hipocolesterolémico del arroz fermentado con Monascus ruber en conejos

Hypolipidemic effects of rice fermented by monascus rubber in rabbits

 

*Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular

Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais

**Coordenadora do curso de graduação em nutrição

da Univiçosa, Minas Gerais

(Brasil)

José Humberto de Queiroz*

Tânia Toledo de Oliveira*

Cristiane Sampaio Fonseca**

Mônica Maria Magalhães Caetano*

Filippe Elias de Freitas Soares*

Marcos Vidal Martins*

jqueiroz@ufv.br

 

 

 

 

Resumo

          Produtos fermentados por fungos, em especial o “Anka” (arroz fermentado por fungos do gênero Monascus) produzem substâncias capazes de reduzir a concentração do colesterol sérico. Foi realizado um ensaio biológico com o objetivo de avaliar o efeito hipolipidêmico do arroz fermentado pelo fungo Monascus ruber em 36 coelhos machos da raça Nova Zelândia Branco, com hiperlipidemia induzida por colesterol 1% administrado na ração juntamente com o arroz fermentado que foi seco e triturado e adicionado nas concentrações de 1, 5 e 10%. O arroz fermentado na concentração de 10% foi mais eficaz no controle da hiperlipidemia, promovendo redução de colesterol total (37,14%) e triacilgliceróis (51,44%). O arroz fermentado por Monascus ruber se mostrou promissor na modulação dietética de lipídios sanguíneos, embora estudos em outros modelos animais e humanos sejam necessários para resultados mais conclusivos.

          Unitermos: Monascus ruber. Arroz fermentado. Dislipidemias.

 

Abstract

          Products fermented by fungus, especially the “Anka” (fermented rice by fungus of gender Monascus) produce a substance used in the reduction of the concentration of blood cholesterol. Biological assays were carried out with the objective of evaluating the hypolipidemic and toxicological effects of fermented rice by fungus Monascus ruber. Thirty six male rabbits of New Zealand White strain were used, with hyperlipidemia induced by 1% cholesterol administered in the animals feed, together with the fermented rice that was dryed and triturated and added in the concentrations of 1, 5 and 10%. The rice fermented in the concentration of 10% was more effective in the control of the hyperlipidemia, lowering total cholesterol by 37.14% and triglycerides 51.44%. The 10% fermented rice promoted an increase of 33.85% on the level of HDL-c.The fermented rice with Monascus ruber was shown in that study to be an alternative choice in the dietary modulation of blood lipids

          Keywords: Monascus ruber. Fermented rice. Dyslipidemia.

 

Recepção: 29/06/2015 - Aceitação: 03/11/2016

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 213, Febrero de 2016. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    As dislipidemias consistem em modificações nos níveis lipídicos na circulação, caracterizando qualquer alteração envolvendo o metabolismo lipídico, sendo classificadas em primárias ou secundárias (Gobal & Mehta 2010). As hiperlipidemias causam alterações do sistema de hemostasia, aumentando a formação da placa aterosclerótica ou induzindo a formação de trombos que irão ocluir as artérias, interrompendo o fluxo sanguíneo e causando morte tecidual (Miller 1994; Ferrara et al., 1997).

    A aterosclerose é causada por vários fatores, inclusive genéticos, entretanto existe estreita relação entre níveis de colesterol sérico e o desenvolvimento de ateromas. Neste sentido, vários trabalhos de pesquisa procuram identificar comportamentos, dietas, compostos químicos, dentre outros que diminuam os níveis de colesterol sanguíneo (Ferrara et al., 1997).

    Pesquisadores Investigando produtos fermentados por fungos, em especial o “Anka” (arroz fermentado por fungos do gênero Monascus), tradicionalmente usado na culinária asiática, isolaram e identificaram algumas substâncias que apresentam propriedades hipocolesterolemiantes (Endo et al., 1995). Outros grupos de pesquisa também identificaram esses metabólitos em culturas de outros fungos, principalmente, do gênero Aspergillus terréus (Casas López et al., 2003).

    Anka tem sabor adocicado e tem sido utilizado na Medicina Tradicional Chinesa há mais de 1000 anos. As substancias produzidas, com efeito, hipocolesterolemiantes são denominadas monacolinas, as quais são inibidoras específicos de 3-hidroxi-3-metilglutaril-CoA-redutase (HMG-CoA redutase) (Noto et al., 2003; Lee et al., 2005; Wong & Rabie, 2008).

    Assim, o presente trabalho teve como objetivo geral avaliar os efeitos do arroz fermentado pelo fungo Monascus ruber nas concentrações de lipídios sanguíneos em coelhos.

Materiais e métodos

    Para a produção do arroz fermentando Anka utilizou-se a cepa do fungo filamentoso Monascus ruber CCT1236, adquirida da Fundação Tropical de Pesquisas e Tecnologia André Tosello, Campinas, SP.

    Os ensaios biológicos e as dosagens bioquímicas foram realizados no Laboratório de Biofármacos do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da Universidade Federal de Viçosa, Viçosa – MG. Os animais utilizados foram 36 coelhos machos da raça Nova Zelândia, com idade de 50 dias, pesando em média 1.700g adquiridos do setor de Cunicultura do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa. Os animais foram distribuídos em 6 grupos com as seguintes dietas:

  • G1 Ração, G2 Ração + colesterol (1%), G3 Ração + colesterol (1%) + arroz sem fermentar 10%, G4 Ração + colesterol (1%) + arroz fermentado 1%, G5 Ração + colesterol (1%) + arroz fermentado 5% e G6 Ração + colesterol (1%) + arroz fermentado 10%. Para que a indução da hiperlipidemia fosse obtida, foi incorporada à dieta dos animais colesterol 1% da marca VETEC, exceto para o grupo controle. No período experimental, os animais permaneceram em gaiolas individuais, apropriadas, com ventilação natural seguindo a legislação vigente sobre os princípios éticos na experimentação animal pelas normas da diretriz brasileira para o cuidado e a utilização de animais para fins científicos e didáticos (DBCA).

    As dosagens dos constituintes sanguíneos colesterol total, triacilgliceróis, colesterol-HDL, colesterol-LDL e colesterol-VLDL foram realizadas em três etapas. Inicialmente após 7 dias de adaptação dos animais, caracterizando o tempo zero, após 15 dias de tratamento e com 30 dias concluídos sob o tratamento descrito. Os animais encontravam-se em jejum de doze horas e a coleta de sangue foi efetuada pelo plexo venoso retro-orbital utilizando-se tubo capilar. Os resultados obtidos dos ensaios biológicos foram analisados pelo teste de Tuckey , teste de Dunnett e teste F.

Resultados e discussão

Efeitos do arroz fermentado nos níveis de colesterol total

    De acordo com a tabela 1, no tempo zero, os grupos controles G1 (ração) e G2 (ração + colesterol) apresentam valores diferentes pelo teste F (p<0,05). Já os grupos tratados G3, G4, G5 e G6 não mostram diferenças significativas. Observa-se também que o grupo G3 possuía uma diferença significativa em relação aos grupos controles.

    Aos 15 dias, os grupos controles apresentavam diferença significativa (p<0,05). Observou-se que o grupo tratado apenas com ração e colesterol (G2) teve um aumento percentual nos níveis de colesterol de 3371,47% em relação ao grupo que recebeu somente ração (G1), constatando, assim, que o colesterol a 1% foi eficaz na indução da hipercolesterolemia. Os grupos G5 e G6, os quais receberam uma dose maior de arroz fermentado, apresentaram variações dos níveis de colesterol significativamente menores daqueles do grupo controle G2.

    Aos 30 dias, o aumento da colesterolemia dos animais do grupo 2 chegou a 4.487,00 mg/dL, com uma porcentagem de variação de 4.760,79% em relação do grupo G1. A adição de 1% de colesterol na dieta de coelhos, os níveis plasmáticos de colesterol podem chegar até 5.000,00 mg/dL (Grundy, 1983).

    Com este experimento observou-se que o arroz fermentado nas porcentagens de 1, 5 e 10% foi eficaz na redução dos níveis de colesterol total em 19,25%; 30,96% e 37,14% em relação ao grupo 2, hipercolesterolêmico, após 30 dias de consumo das dietas, ou seja, a redução do colesterol sanguíneo foi dose dependente.

Tabela 1. Níveis médios de colesterol total e percentual de variação em relação aos grupos-controle de coelhos submetidos a diferentes tratamentos por 30 dias

    Na Figura 1 observa-se que a adição de colesterol a 1% foi eficiente na indução da hipercolesterolemia. Observa-se que durante o tratamento, os grupos tratados com uma quantidade maior de arroz fermentado, apresentaram um aumento nos níveis de colesterol total, porém este aumento foi inferior ao observado no grupo tratado com o arroz não fermentado (G3).

    Em um experimento utilizando-se frutose 30% induziram hipercolesterolemia em ratos e ao utilizarem 2,0% de Anka (arroz fermentado por Monascus sp) alcançaram uma redução significativa nos níveis séricos de colesterol total (Wang et al., 2010).

    Em outro experimento, utilizando-se coelhos como modelo experimental, a adição de arroz fermentado por Monascus purpureus nos níveis de 0,4 e 0,8 g/kg/dia na dieta com hiperlipidemia induzida através de uma dieta rica em gorduras, por 40 dias, observou-se uma redução do colesterol total em 24,79% e 33,2%, respectivamente. Quando a indução da hiperlipidemia foi por adição de caseína na dieta, a adição do arroz fermentado por Monascus purpureus nos níveis de 0,2, 0,4 e 0,8 g/kg/dia na dieta por 60 dias, reduziu os níveis de colesterol total em 45, 43 e 59%, respectivamente, enquanto que a mevinolina pura, na dose de 8 mg/kg reduziu em 52% o nível de colesterol total (Li et al., 1998)

    O coelho é um modelo sugerido pela literatura para o estudo de drogas hipocolesterolemiantes, pois uma de suas características é que os níveis de colesterol sérico podem ser manipulados pela dieta hipercolesterolemiante com relativa facilidade conforme observado nesse experimento (Dornas et al., 2010). Os fungos do gênero Monascus produzem a mevinolina, que é um potente inibidor da síntese de colesterol in vivo (Rubinstein et al., 1991; Wei et al., 2003).

    Num estudo foi evidenciada a redução de 23% na concentração de colesterol total em ratos tratados com 10mg/kg de mevinolina (Endo, 1980). O arroz fermentado por Monascus ruber contém, além da mevinolina, ácidos graxos insaturados que podem contribuir para a redução do colesterol sérico (Wang et al., 1997).

    Num estudo que analisou o efeito dos flavonóides e corantes naturais na redução dos lipídios séricos, foi possível concluir que o corante Monascus em associação com a substância morina reduziu a concentração de colesterol total em 74,23%. Quando analisou apenas a substância morina, a redução na concentração de colesterol total foi de 66,33%. O mesmo ocorreu com a associação do corante Monascus com a substância quercetina (Oliveira et al., 2000).

    Em seres humanos foi avaliado o efeito de um preparado de arroz fermentado com fungo do gênero Monascus em pacientes com hiperlipidemia, num período de oito semanas. Como resultado, houve redução de 22,7% do colesterol total e 93,2% dos pacientes obtiveram benefícios com o arroz fermentado (Wang et al., 1997).

    O mecanismo pelo qual o Anka (arroz fermentado) reduz o colesterol não é completamente conhecido. Este alimento natural contém inibidores da HMG-CoA redutase, ácidos graxos monoinsaturados, esteróis, proteínas, sacarídeos, isoflavona, glicosídeos e também elementos traços como selênio e zinco. Embora a inibição da HMG-CoA redutase diminua o colesterol, foi sugerido que a diminuição do agregado de colesterol pelo efeito do Anka é devido à combinação do conjunto dos seus constituintes (Li et al., 1998).

    Foi realizado um estudo químico dos extratos de Monascus ruber, cct 1236, onde se constatou a ausência da mevinolina (Carvalho, 1999). Embora no presente estudo não tenha sido realizada a identificação dos compostos do extrato, sugere-se que a redução nos níveis séricos de colesterol total, observadas nesse experimento seja devida à presença de outros constituintes presentes no arroz fermentado, como ácidos graxos monoinsaturados e esteróis.

Efeitos do arroz fermentado nos níveis de triacilgliceróis

    Na análise da Tabela 2, observou-se que no tempo zero, os animais dos grupos controles (G1 e G2) não possuíam diferenças significativas. Aos 15 dias, observou-se que o grupo 2 (ração + colesterol) estava hipertrigliceridêmico e diferindo do grupo 1 que recebeu apenas ração. Assim, adição de 1% de colesterol induziu a hipertrigliceridemia em coelhos. Notou-se que o grupo G2 teve um aumento nos níveis de triacilgliceróis séricos de 57,30% em relação ao grupo G1. Foi possível observar que já aos 15 dias houve um aumento inferior nos níveis de triacilgliceróis quando os animais foram tratados com arroz fermentado comparado aos animais tratados com ração e colesterol (grupo 2).

    No último dia do experimento existia uma grande diferença entre os grupos controles, onde o grupo G2 diferiu em 117,63% do grupo G1. Aqui se observou que os grupos tratados G3, G4, G5 e G6 possuíam diferenças estatisticamente significativas pelo teste de Tuckey. Observou-se também aumentos inferiores nos níveis de triacilgliceróis dos grupos G4, G5 e G6 comparados ao grupo G2.

    Na figura 2 observa-se que os animais pertencentes aos grupos G2 e G3 tiveram um aumento mais acentuado nos níveis de triacilgliceróis, comparado aos animais tratados com o arroz fermentado (G6), sendo possível observar que o grupo G6 teve uma redução maior nos níveis de triacilgliceróis, chegando a valores próximos aos animais pertencentes ao grupo controle (G1).

    Pesquisadores analisaram as concentrações de triacilgliceróis em ratos tratados com diferentes dietas e concluíram que a concentração sérica de triacilgliceróis nos animais que receberam ração + arroz fermentado a 2% diferiu significativamente dos animais que receberam apenas ração (Wang et al., 2010).

Tabela 2. Níveis médios de triacilgliceróis e percentual de variação em relação aos grupos-controle de coelhos submetidos a diferentes tratamentos por 30 dias

    Em outro estudo, utilizando ratos e Triton para se obter uma hiperlipidemia, observou-se que o corante Monascus quando em associação com a substância morina reduziu as concentrações de triacilgliceróis em 79,34%. Esta substância morina, isoladamente alcançou uma redução de 69,05%. A associação com quercetina mostra resultados semelhantes.

Conclusão

    O arroz fermentado foi eficiente na redução do colesterol total, sendo mais eficiente na concentração de 10% provocando uma redução nos níveis desse constituinte assim como também ocorreu na redução de triacilgliceróis o que implica num possível efeito cardioprotetor.

    É importante ressaltar que testes feitos em animais são considerados pré-clínicos. Sugerimos estudos clínicos em outras espécies animais e humanos para certificar os resultados encontrados nesse estudo, viabilizando, dessa forma, o emprego deste arroz fermentado por Monascus ruber, como um alimento funcional hipocolesterolemiante.

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