A desaposentação e os reflexos na qualidade de vida do idoso La renuncia a la jubilación y reflexiones sobre la calidad de vida de personas mayores The unretirement and it’s reflections on the quality of life of the elderly |
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Universidade Feevale Novo Hamburgo, RS (Brasil) |
Esp. Ana Paula Lima Dr. Gilson Luis da Cunha Profa. Dra. Geraldine Alves dos Santos |
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Resumo O presente estudo tem como objetivo realizar uma reflexão sobre os motivos que levam as pessoas à aposentadoria e os reflexos da desaposentação na qualidade de vida do idoso aposentado. O fato da maioria das pessoas se aposentarem em idade produtiva reduz o valor de suas aposentadorias e, passados os anos, com a defasagem destes benefícios, os mesmos tornam-se insuficientes para a manutenção de suas necessidades provenientes da idade o que os fazem buscar alternativas para a complementação de seus rendimentos. Unitermos: Qualidade de vida. Desaposentação. Inclusão social.
Abstract This study aims to conduct a reflection on the reasons that lead people to retirement and unretirement reflections on the elderly’s quality of life. The fact that most people retires during productive age reduces the value of their pensions and through the years, with the gap of these benefits, they become insufficient for the maintenance of their age related needs, making them to seek alternatives to complement their income. Keywords: Quality of life. Unretirement. Social inclusion.
Recepção: 23/08/2015 - Aceitação: 02/12/2015
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 212, Enero de 2016. http://www.efdeportes.com/ |
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O envelhecimento e a inclusão dos idosos na sociedade
O processo de envelhecimento e a diminuição do número de jovens vêm alterando anualmente a estrutura etária da população pois, havendo menos crianças, conseqüentemente aumenta a atenção aos idosos com políticas voltadas para a saúde, assistência social e previdência social.
A queda da fecundidade é o fator mais importante para a redução do nível de crescimento da população. Em 1970 a mulher brasileira tinha, em média, 5,8 filhos. Trinta anos depois, esta média era de 2,3 filhos. Em 2000, com exceção da Região Norte, as demais regiões apresentam taxas de fecundidade próximas à taxa média nacional, 2,3, sendo que a região Sudeste apresentou a menor taxa de fecundidade, 2,2 filhos por mulher (IBGE, 2015). O estudo do IBGE projeta ainda o adiamento da idade que as mulheres terão filhos, ficando para 28 anos em 2020 e 29,3 anos em 2030, sendo que a projeção para 2060 é de que os idosos representarão 26,7% da população Brasileira (IBGE, 2013). O envelhecimento da população é afetado pela queda da fecundação e mortalidade que está diminuindo desde a primeira metade do século XX. A expectativa de vida atualmente é projetada em 74,9 anos (IBGE, 2014), e o aumento gradativo desta expectativa se deve ao avanço na medicina, nutrição e cuidados com o ser humano desde o nascimento, reduzindo a mortalidade.
Com o aparente envelhecimento da sociedade é possível acompanhar o crescente interesse em assuntos relacionados à velhice assim como a grande demanda de normas jurídicas visando assegurar os direitos dos idosos. Alguns dispositivos jurídicos devem ser levados em consideração quando o assunto é direito do idoso. A lei maior do Brasil, a Constituição Federal Brasileira em seu artigo 230 (BRASIL, 1988), prevê o dever da família de amparar o idoso garantindo-lhe a vida, dignidade e bem estar, assim como o § 2° da mesma norma legal prevê gratuidade do transporte público aos maiores de 65 anos.
O artigo 230 da Constituição Federal de 1988 estabelece:
At. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.
1º Os programas de amparo aos idosos serão executados preferencialmente em seus lares.
2º Aos maiores de sessenta e cinco anos é garantida a gratuidade dos transportes coletivos urbanos.
Além do artigo 230 da Constituição Federal, o artigo 203 (Brasil, 1988) prevê um salário mínimo ao idoso que comprovar viver em estado de miserabilidade não possuindo meios de prover a sua própria manutenção ou ser mantida por sua família. Conjuntamente com os artigos da Constituição Federal há também o Estatuto do idoso, Lei 10.741/2003, art. 15 (Brasil, 2003) que assegura atendimento preferencial no Sistema Único de Saúde e prevê penas para delitos cometidos contra o idoso.
O artigo 203 da Constituição Federal assim prevê:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A lei 10741/2003, Estatuto do idoso, artigo 15 prevê:
Art. 15 - É assegurada a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde – SUS, garantindo-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos.
Além destas normas jurídicas há ainda políticas públicas de proteção ao idoso e leis Estaduais onde cada região, conforme suas necessidades, prioriza de forma regionalizada a proteção ao idoso. O fato de existirem as normas, não comprova que as mesmas são efetivamente aplicadas, muitas melhoras ocorreram mas ainda falta muito para que se tornem uma regra.
Esta fase da vida pode ser muito bem caracterizada com a expressão “modernidade liquida”, utilizada pelo sociólogo Zygmunt Baumann, para definir o presente, ao invés de “pós-modernidade”, para o momento que a sociabilidade humana experimenta uma transformação que pode ser sintetizada como a metamorfose do cidadão, sujeito de direitos, em indivíduos em busca de afirmação no espaço social. Ele afirma que é preciso acreditar no potencial humano para que outro mundo seja possível (Oliveira, 2014, p. 55).
A fragilidade proveniente do envelhecimento, associada à desvalorização social, sensibilizam o idoso que, de um lado possui experiência de vida podendo usufruir dela em seu benefício e, de outro, se depara com a falta de condições financeiras para custear a velhice.
Os reflexos da desaposentação na qualidade de vida do idoso
O Brasil ocupa a 58° colocação no ranking de qualidade de vida para as pessoas idosas. Estes dados foram apresentados no relatório Global Age Watch 2014, divulgado neste ano, por ocasião da passagem do dia mundial do Idoso, 01 de outubro. O relatório é elaborado anualmente pela organização britânica de ajuda à velhice Help Age International e avaliou fatores como renda, saúde, transporte e segurança de 96 países. A análise é realizada com base no resultado da combinação de vários documentos de instituições internacionais. No Brasil o relatório levou em conta a opinião de 1000 idosos brasileiros que consideraram o transporte público e a segurança um dos piores aspectos avaliados na pesquisa (Helpage, 2014)
A má qualidade de vida dos idosos brasileiros é uma realidade que pode ser notada diariamente. Insegurança, empobrecimento, acesso precário a saúde são alguns dos aspectos que favorecem para o país aparecer na 58° colocação. Observa-se uma crescente mudança dos ideais quando se fala em qualidade de vida. As pessoas estão buscando formas de aumentar seus anos de vida e de dar vida a estes anos.
O conceito de qualidade de vida, com o passar dos anos se ampliou, significando além de crescimento econômico, o desenvolvimento social como educação, saúde e lazer (Paschoal, 2000). O envelhecimento, além de ser um processo biológico é uma fase negada pela sociedade, também é um problema social porque a sociedade capitalista considera a produção como o objetivo maior da vida (Gonçalves, 2014).
A Constituição Federal de 1988 prevê no artigo 201, § 7°, inciso I, dois tipos de aposentadoria, aposentadoria por idade e por tempo de contribuição. Possui direito a aposentadoria por tempo de contribuição o homem com 35 anos de contribuição e a mulher com 30 anos de contribuição, sem a exigência de idade mínima para ambos os casos.
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei,
7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher.
A aposentadoria por idade, prevista no art. 201, § 7°, inciso II da Constituição Federal de 1988, privilegia o idoso com 65 anos de idade se homem e 60 anos se mulher.
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei,
7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.
O fato de inexistir a exigência de uma idade mínima para aposentadoria, leva muitas pessoas, após alcançar o tempo de contribuição exigido, 30 ou 35 anos de contribuição, a aposentarem em idade produtiva, em média 53 anos. Mesmo com a incidência do fator previdenciário nos benefícios de aposentadoria o qual reduz o valor do benefício, as pessoas preferem se aposentar mais cedo devido a insegurança jurídica do país em relação às aposentadorias (Magalhães, 2012). Com o passar dos anos e com a defasagem dos benefícios muitos procuram soluções jurídicas para revisar suas aposentadorias.
O fator previdenciário é uma fórmula utilizada para cálculo de aposentadoria por tempo de contribuição, obrigatoriamente, e para cálculo de aposentadoria por idade, facultativamente. A fórmula leva em consideração idade, expectativa de vida e o tempo de contribuição do segurado ao se aposentar (Duarte, 2007, p. 112).
Vários fatores justificam a permanência ou a reinserção dos idosos aposentados no mercado de trabalho, tais como o prazer pelo trabalho, ocupando o tempo livre e exercendo uma atividade física e mental ou, em decorrência da necessidade financeira, tanto pelas perdas do poder aquisitivo devido aos baixos valores dos benefícios que com os anos ficam defasados, quanto pela necessidade de prover a família.
A legislação brasileira, devido às constantes mudanças da sociedade, vem sofrendo algumas alterações. Em relação aos aposentados há um tema recente, pendente de decisão no Superior Tribunal Federal sobre desaposentação, que trata-se do desfazimento do ato administrativo de aposentação com a finalidade de obtenção de um melhor benefício. Segundo a compreensão de Martinez (2008, p. 401):
A desaposentação compreende dois atos administrativos: 1) um de natureza desconstitutiva, consistindo na renúncia à aposentadoria; 2) o outro de natureza constitutiva, em face de nova aposentação ou de pelo menos renúncia com o restabelecimento do status quo ante, sem outra pretensão.
A desaposentação, se aprovada, permitirá que o aposentado que permaneceu no mercado de trabalho melhore sua renda utilizando as contribuições vertidas após a aposentadoria para complementá-la.
Vários aspectos estão sendo analisados nesta decisão dentre eles a devolução dos valores recebidos em virtude da aposentadoria renunciada. Entretanto, não há que se falar em devolução, visto que não houve qualquer irregularidade na concessão do benefício ou “má fé” no recebimento, ou seja, enquanto esteve aposentado o segurado fazia jus ao recebimento dos referidos valores. Assim a renúncia à aposentadoria produz efeitos ex-nunc, sendo certo que não se pretende a anulação do ato de concessão do benefício, conforme assevera Ibrahim (2010, p. 64):
Naturalmente, como visa o benefício posterior, somente agregará ao cálculo o tempo de contribuição obtido a posteriori, sem invalidar o passado. A desaposentação não se confunde com a anulação do ato concessivo do benefício, por isto não há que se falar em efeito retroativo do mesmo, cabendo tão-somente sua eficácia ex nunc. A exigência de restituição de valores recebidos dentro do mesmo regime previdenciário implica obrigação desarrazoada, pois se assemelha ao tratamento dado em caso de ilegalidade na obtenção da prestação previdenciária. A desaposentação em mesmo regime previdenciário é, em verdade, um mero recálculo do valor da prestação em razão das novas cotizações do segurado. Não faz o menor sentido determinar a restituição de valores fruídos no passado.
Existem várias decisões de magistrados de todo o país mas nenhuma concreta. O Superior Tribunal de Justiça (2009) já decidiu pela possibilidade de desaposentação sem devolução de qualquer valor portanto, a questão deverá ser decidida pelo STF no RE 381.367 de 15/04/2003 com repercussão geral da questão constitucional.
Constitucional. Previdenciário. § 2º do art. 18 da lei 8.213/91. Desaposentação. Renúncia a benefício de aposentadoria. Utilização de tempo de serviço/contribuição que fundamentou a prestação previdenciária originária. Obtenção de benefício mais vantajoso. Matéria em discussão no re 381.367, da relatoria do ministro Marco Aurélio. Presença de repercussão geral da questão constitucional discutida. Possui repercussão geral a questão constitucional alusiva à possibilidade de renúncia a benefício de aposentadoria, com a utilização do tempo de serviço/contribuição que fundamentou a prestação previdenciária originária para obtenção de benefício mais vantajoso (Superior Tribunal Federal. RE 661.256/DF, de relatoria do Min. Ayres Britto, Dje de 25-04-2012).
As decisões atuais demonstram que juridicamente a desaposentação é perfeitamente acolhida pelo atual sistema legal previdenciário: inexiste vedação legal, o sistema previdenciário é de caráter protetivo, assegurando a percepção do benefício mais vantajoso, não havendo necessidade de devolução dos valores recebidos em virtude da aposentadoria a ser renunciada.
Conclusão
Com o crescente número de idosos no Brasil e o constante aumento da expectativa de vida, necessário se faz uma melhoria para as condições de saúde e financeiras do idoso para que possam usufruir de uma melhor qualidade de vida e para que sejam incluídos no mercado de trabalho tendo em vista que em sua grande maioria são pessoas experientes e ativas que não almejam o fim de suas carreiras, seja por prazer a atividade que exercem, seja pela necessidade de complementação da renda familiar.
A aposentadoria, nos moldes atuais, não traz às pessoas aposentadas a garantia de uma vida digna, o que faz com que optem por continuar a laborar, e conseqüentemente contribuindo à previdência sem que estas contribuições lhe tragam alguma vantagem. Resta claro que a desaposentação pode trazer prejuízo ao equilíbrio financeiro da Previdência Social no entanto, mais importante é não deixar de levar em conta que a legalização da desaposentação, com o objetivo principal de obter melhores condições para o aposentado, seria uma medida importantíssima para a nossa população, pois além de melhorar a qualidade de vida, as milhares de vagas no mercado de trabalho, hoje preenchidas por idosos que não puderam parar de trabalhar por não possuir condições de seu sustento, provavelmente seriam preenchidas pelos jovens que hoje lutam por uma oportunidade.
É necessário acreditar no idoso e em seu potencial, nas suas experiências e anseios para que esta fase da vida possa ser vivenciada de forma mais digna.
Bibliografia
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Ibrahim, F. Z. (2010). Desaposentação. 4ª ed. Rio de Janeiro: Editora Impetus.
Magalhães, F. G. (2012). Idade média de aposentadoria do brasileiro dificilmente mudará nos próximos anos – InfoMoney. Acesso em 10 de janeiro de 2015 de: www.infomoney.com.br/minhas-financas/aposentadoria/noticia/2598138/idade-media-aposentadoria-brasileiro-dificilmente-mudara-nos-proximos-anos.
Martinez, W. N. (2008). Conseqüências práticas e jurídicas da desaposentação. Repertório de jurisprudência IOB, vol. II.
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Paschoal, S. M. P. (2000). Qualidade de vida do idoso: Elaboração de um instrumento que privilegia sua opinião. Dissertação de mestrado. Mestrado em Saúde Pública, Faculdade de Saúde Pública: Universidade de São Paulo.
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Superior Tribunal Federal (2012). RE 661.256/DF. Relator Ministro Ayres Britto, Dje de 25/04/2012.
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