efdeportes.com

Futebol brasileiro: a arquitetura do poder

Fútbol brasileño: la arquitectura del poder

Brazilian soccer: the power architecture

 

Prof. Adjunto IV da Universidade Federal

do Maranhão/UFMA

(Brasil)

Sidney Forghieri Zimbres

szimbres@terra.com.br

 

 

 

 

Resumo

          Este estudo de cunho bibliográfico objetiva realizar uma breve análise do futebol brasileiro e os “poderes” que estão interferindo nesse processo. Para tanto, utilizou-se como fontes de pesquisa livros, jornais, revistas científicas e trabalhos disponíveis na internet. A análise permitiu relacionar os vários conceitos de poder num contexto de mundo globalizado e sua associação com o futebol. Conclui-se que é necessário entender que, na estrutura do futebol brasileiro, o poder não tem mais um único centro (CBF e FIFA). O poder está espalhado por toda rede desportiva; federações, ligas, clubes, sindicatos, associações de jogadores entre outros. O conhecimento ou consciência disso não é aquilo que põe em xeque o poder; o conhecimento é parte inerente do poder.

          Unitermos: Futebol. Poder. Globalização. Mídia.

 

Abstract

          The aim of this bibliographical study is to analyze the Brazilian soccer and the “powers” interfering in this process. For that, books, newspapers, scientifics journals and available papers in the web. The analysis allowed to relate several concepts of power within the globalized world associated with football. It was concluded that it’s necessary to understand that, within the structure of Brazilian soccer, the power is not centered in CBF or FIFA, but widespread as a sporting web; sporting federation, leagues, clubs, football players associations, and others. The knowledge of that does not endanger the power; the knowledge is inherent of power.

          Keywords: Soccer. Power. Globalization. Media.

 

Recepção: 30/08/2015 - Aceitação: 07/10/2015

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 209, Octubre de 2015. http://www.efdeportes.com/

1 / 1

Introdução

    “Uma das armas mais perversas do poder é levar os sujeitos a se verem como impotentes e incapazes de operar grandes transformações. O poder age deprimindo-nos, ou seja, levando-nos a crer que não temos força, que as causas de nosso sofrimento social são demasiado complexas para termos o disparate de querer mudar o rumo dos acontecimentos” (Safatle, 2015).

    Na reunião do Comitê Executivo da Federação Internacional de Futebol/FIFA, realizada em 27 de maio de 2015, sete dirigentes foram presos pela polícia suíça, em ação conduzida pelo FBI e pela Justiça dos EUA, após serem acusados por suspeitas de corrupção envolvendo um montante de até US$ 150 milhões. Durante o congresso, que daria a Joseph Blatter mais um mandato, o ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) José Maria Marin foi atingido e permanece detido em Zurique. Além dele, de acordo com o departamento de Justiça dos EUA, outros dois brasileiros estão implicados no esquema de corrupção.

    A FIFA é o órgão responsável pelo futebol mundial. Vem recebendo acusações de corrupção, principalmente no processo de escolha da sede do Mundial de 2002, onde o vencedor foi o Catar.

    Para James Reevell, da BBC News (2015), a Copa do Mundo gera bilhões de dólares em receita. As prisões e investigações lançam dúvida sobre a transparência e honestidade do processo de escolha nos últimos torneios. A Justiça, segundo o referido jornalista, também cita a Copa do Brasil, organizada pela CBF, como uma das competições em que poderia ter havido corrupção na negociação de transmissão e marketing.

    Mendes Junior (2015), diz que a descoberta do esquema global de corrupção começa a arrombar a caixa preta no futebol brasileiro. Como consequência desse escândalo, o senador Romário (PSB-RJ) protocolou o pedido de criação de uma CPI. Ele obteve o apoio de 52 senadores, quando 27 assinaturas já bastariam. Para Mendes Junior, 2015, o escândalo é visto como um ponto favorável à aprovação da Medida Provisória do Futebol, que refinancia a dívida dos clubes mediante pesadas contrapartidas.

    O zagueiro Paulo André, atualmente no Cruzeiro FC, com experiência de três anos no futebol francês e outra de um ano no futebol chinês, é um dos fundadores do Movimento Bom Censo FC. , uma entidade de mais de mil jogadores profissionais que pede, há dois anos, a “regeneração” do futebol Brasileiro para que “seja mais transparente e democrático” e “o Brasil volte a ser o país do futebol” (El País, 2015).

    Segundo Paulo André (2015),

    “Temos graves problemas na administração do futebol, baseada em assegurar os interesses dos dirigentes da Confederação Brasileira de Futebol e das federações estaduais, que não estão preocupados com o desenvolvimento do esporte. Enquanto a CBF e as federações obtém lucros milionários, os clubes têm imensas dívidas, os jogadores recebem com atraso e 20.000 profissionais do futebol (jogadores, treinadores, diretores, preparadores físicos, etc.) passam a maior parte do ano desempregados por culpa de um calendário injusto e irracional. Sem falar do baixo comparecimento do público ou do atraso no desenvolvimento de uma metodologia para a capacitação dos profissionais e formação de novos treinadores e jogadores” (p. 1).

    Para o jogador, falta democracia, transparência e profissionalismo para a CBF. A política está acima do esporte e o dirigente está mais preocupado em garantir sua permanência no cargo do que com o desenvolvimento do futebol. Finaliza sua entrevista afirmando que “nas últimas décadas o poder político do futebol brasileiro mudou pouco de mãos. Há um status quo extremamente forte e perigoso que inibe qualquer tentativa de instaurar uma gestão voltada para o século XXI”.

    Para entendermos o que está acontecendo com o futebol brasileiro é necessário voltar no tempo. No início dos anos 80 a economia mundial começou a sofrer transformações radicais, com a formação de áreas de livre comércio e blocos econômicos integrados como o Mercosul, a União Européia e o Nafta, ocasionando uma crescente interligação e interdependência dos mercados físicos e financeiros, afetando indiscriminadamente todos os países. O futebol profissional não poderia ficar fora desse contexto.

    A mercantilização do esporte no século XX criou um situação nova no futebol brasileiro, envolvendo valores financeiros astronômicos.

    “A venda de direito de uso de imagem de seleções, clubes e jogadores a empresas de produtos esportivos e outros, a venda dos direitos de transmissão de jogos por TV, rádio, Internet etc.; as transferências de jogadores entre clubes e de um país a outro, tudo isso, somado, superou em muito a antiga fonte de recursos que era a renda resultante da venda de ingressos nos estádios. Numa fase mais recente, grandes grupos de investidores, fundos de investimentos, multinacionais inclusive, atraídos pelo potencial econômico do futebol, vêm entrando no setor patrocinando e tornando-se co-administradores de clubes e jogadores” (Azevedo & Rebelo, 2001, p. 1).

    Essas intervenções criaram situações novas, submetendo o futebol a mudanças e distorções com um alto índice de corrupção nos clubes. Surgem novos personagens nesse processo; emissoras de TV, empresas de investimentos e de marketing, empresários e agentes de jogadores, com obtenção de lucros elevados. Como exemplo, podemos citar a CPI do futebol, investigando a relação entre a CBF e a Nike para apurar a regularidade de contrato entre elas, instalada no Congresso Brasileiro em 17 de outubro de 2000. A conclusão das investigações foi de que a CBF foi convertida numa agência de negócios milionários que explora a imagem da seleção brasileira, onde milhões em patrocínio desaparecem (p. 18).

    Face ao momento crítico atual em que passa o futebol mundial e brasileiro, o objetivo deste estudo é o de analisar e fazer uma relação entre o futebol brasileiro e os “poderes” que estão interferindo nesse processo. Para tanto, procurou-se levantar vários conceitos de poder num contexto de mundo globalizado e sua relação com o futebol. Conclui-se que é necessário entender que, na estrutura do futebol brasileiro, o poder não tem mais um único centro (CBF e FIFA). O poder está espalhado por toda rede desportiva; federações, ligas, clubes, sindicatos, associações de jogadores entre outros.

Uma breve teoria do poder

    “Quem busca o poder pouco está pensando em prestar serviços públicos, mas em mandar, usufruir ou beneficiar-se do governo” (Martins, 2011).

    De um modo geral podemos definir poder sendo a capacidade ou possibilidade de agir, de produzir efeitos desejados sobre indivíduos ou grupos humanos. Aranha e Martins (2000) ressaltam que “o poder supõe dois polos: o de quem exerce o poder e o daquele sobre o qual o poder é exercido. Portanto, o poder é uma relação, ou um conjunto de relações pelos quais indivíduos ou grupos interferem na atividade de outros indivíduos ou grupos” (p.180).

    Para Aranha e Martins (2000), na Idade Moderna acontece uma profunda mudança na maneira de pensar medieval, que era predominantemente religiosa. O recurso da razão prevalece sobre as explicações religiosas. Segundo as autoras,

    “À tese de que todo poder emana de Deus, se contrapõe a teoria da origem social do pacto feito sob o consentimento dos homens. A legitimação do poder se encontra no próprio homem que o institui... o poder não é mais herdado, mas conquistado pelo voto...” (p. 182).

    Segundo Martins (2011), desde os tempos primitivos o homem deseja o poder por um instinto de sobrevivência e de comando, em que o servir é apenas um efeito colateral – mas não necessário – e que o próprio exercício do poder esconde uma luta pela sobrevivência, a qualquer custo, em patamares inimagináveis, em face das ambições dos que procuram. Ou seja, é da natureza humana a busca pelo poder.

    Para Martins (2011)

    “a ‘práxis’ do poder, através da história, veio confirmar não a tese de direito natural, mas uma indesejável tendência humana, de o mais forte terminar por conquistar o poder, dentro das leis da sociedade em que vive, principalmente nos regimes democráticos, ou fora delas, desde que tenha força para rompê-las, criando seu próprio espaço jurídico para justificar o poder. Sustentam-se, portanto, os poderosos, exclusivamente em sua capacidade de a força dos argumentos, nas democracias, ou a força bruta, nas ditaduras, ou, ainda, a força da astúcia, num regime ou no outro, para seus objetivos” (p. 24).

    Para Martins (2011), sem poder não há organização social, e sem os homens que o ambicionam não há poder. Muitas vezes, o poder é exercido não por uma única pessoa, mas por um determinado grupo que governa, impondo uma maneira peculiar de domínio.

    Segundo Martins (2011),

    “O homem, decididamente, não é confiável no poder e, enquanto for possível exercê-lo, mesmo nas democracias, procurará nele manter-se, com uma dose maior ou menor de discricionariedade ou arbitrariedade” (p. 199).

    Doria (2015), afirma que o clientelismo faz parte da copa composta pelo coronelismo, nepotismo e fisiologismo, sendo um instrumento de serventia no balcão das trocas políticas e motor de impulso à manutenção e à expansão de poder. E, segundo o autor, o exercício do poder pautado no clientelismo não resiste ao tempo.

    A ideia de poder sempre teve um papel mais negativo que positivo; que oprime as pessoas, que os indivíduos o temem, que têm medo de tê-lo, que ele suprime a realidade, manipula a vida entre outros (Marinho, 2008).

    Para Michel Foucault (1926-1984), filósofo contemporâneo, o poder não está localizado em uma instituição, e nem tampouco como algo que se cede, por contratos jurídicos ou políticos. O poder em Foucault reprime, mas também produz efeitos de saber e verdade. Acreditava ser possível a luta contra padrões de pensamentos e comportamentos, mas impossível se livrar das relações de poder (Ferreirinha & Raitz, 2010).

    Albuquerque (1995), entende que a teoria de Foucault opõe uma concepção de poder como um conjunto de forças materiais que se concentra no centro da sociedade, e se irradia de forma intermitente em direção à periferia, mediante espasmos que se desencadeiam para submeter aos bons súditos e esmagar os submissos;

    “...que funciona negativamente, por confisco e por coleta; a uma concepção de poder como relação assimétrica entre indivíduos, entre grupos, que se irradia da periferia para o centro, de baixo para cima, que se exerce permanentemente, dando sustentação à autoridade, e que funciona positivamente, dinamizando, incrementando as forças e recursos existentes” (p. 109).

    Albuquerque (1995) ainda ressalta que...

    “Pensar que a vontade pode apertar um botão em Brasília e haverá qualquer modificação, para melhor ou para pior na ponta do balcão, nos confins do Amapá, é de uma ingenuidade tal, que espanta. Para que deixe de faltar mercurocromo num pronto socorro, para que se distribuam boas merendas, boas cartilhas e um pouco de instrução numa sala de aula, são mais importantes as relações de poder ente o pessoal mais humilde dessas agências governamentais e a clientela local do que os devaneios de qualquer ministro” (p. 109).

    Pelo que podemos perceber, a ideia de poder de Foucault é diferente da tradicional, segundo a qual se apresenta como uma realidade única, estática e soberana. Para ele, existe uma falsa ideia de poder, como uma coisa única, alojado em um núcleo central de onde ele tudo controla, não conduz as pessoas a um verdadeiro conhecimento sobre este instrumento de nossas relações. Tal reflexão conduz à ideia de que certos indivíduos são guardiões do poder. O poder é dinâmico que se apresenta como algo enigmático, ao mesmo tempo visível e invisível, presente e escondido por toda parte (Marinho, 2008).

    Para Michel Foucault (2014), o poder deve ser analisado como algo que circula, como algo que só funciona em cadeia. Nunca está localizado aqui ou ali, nunca está nas mãos de alguns, nunca é apropriado como uma riqueza ou bem (p. 284). Segundo o autor, o poder funciona e se exerce em rede. (o grifo é nosso)

    A ideia tradicional é que o poder sempre é exercido de cima para baixo. Foucault nos apresenta o poder numa realidade instável e não na estabilidade que a história tentou atribuir-lhe. Para ele, este poder único, centrado em uma pessoa não existe, não é propriedade de ninguém, não é uma coisa espacial, é somente um elemento dentro das relações entre os indivíduos. Ter consciência disso é indispensável para saber praticar a sua liberdade e respeitar a liberdade dos outros (Foucault, 2014). (o grifo é nosso)

Futebol e poder

    O desporto está ligado à sociedade e é um fenômeno humano estreitamente conectado ao mito, à religião e à cultura. Como muito bem ressalta António da Silva Costa, em Desporto e análise social (1992),

    “o universo desportivo é um excelente campo de observação da sociedade, onde podemos encontrar elementos para estruturar modelos de análise social, e pode servir também para nos ajudar a descobrir formas de pensamento e modelos de ação através dos quais nós compreenderemos melhor o sentido da existência do homem e da sua integração na comunidade humana e pressentir muitas das aspirações que povoam o nosso imaginário coletivo e que muitas vezes não conseguem ultrapassar as barreiras do inconsciente” (p. 101).

    O desporto moderno é fruto da sociedade capitalista industrial, onde valoriza a eficácia, o rendimento e o progresso. Vê o corpo como uma máquina humana de rendimento ou como ciência experimental do rendimento corporal. Como muito bem ressalta Costa (1992), sendo um produto da sociedade industrial, o desporto moderno reproduz a imagem desta mesma sociedade, com seu tipo de funcionamento, com suas crises e contradições e também com seus sonhos e suas esperanças (p. 102).

    Segundo Costa (1992), o futebol

    “...pode servir como ponto de partida para a construção de um modelo analítico completo e significativo da nossa sociedade; pela sua simbólica e pelos temas míticos que atualiza, este desporto pode oferecer ao homem e à própria sociedade um cenário existencial rico em ensinamentos e que funcione como sendo um ponto de apoio no universo de incertezas de que é vitima o mundo moderno” (p. 108).

    O mundo, hoje, vive num período de globalização, influenciando de maneira acentuada toda a vida no planeta e a agenda política e econômica dos países, criando uma economia global. São trocas de tecnologias, redes de comunicações, migrações, uma cultura transnacional e movimentos internacionais que caracterizam o nosso tempo.

    E o desporto não está à margem deste processo de globalização. São várias competições nacionais e internacionais, com o surgimento de organizações desportivas internacionais entre outras. Desenvolveu-se, também, uma poderosa indústria do desporto; deslocações de espectadores e de trabalhadores ligados às profissões do desporto, como as migrações de treinadores e atletas no futebol, grandes fluxos de dinheiro a circular em todo o planeta, com o envolvimento de grande circulação de informações entre os países, produzidas e distribuídas pelos jornais, revistas, rádios, filmes, televisão, vídeo, satélite, cabo e pela internet (Marques, 2006).

    Segundo Marques (2006), uma crítica à globalização do desporto

    “...reporta-se à redução da influência das instituições de governo nacional do desporto em favor das internacionais. Um exemplo recorrentemente referido pelos críticos respeita ao poder da FIFA. Em 1907 este organismo tinha sete membros, em 2005 já 207 países membros. A este propósito fala-se ainda de falta de transparência, de corrupção e de uma governação do desporto não comprometida socialmente, mas economicamente” (p. 27).

    Outras críticas dizem respeito ao envolvimento crescente de oligopólios globais de telecomunicações, à utilização de uma nova divisão do trabalho para produzir equipamentos desportivos, vestuários e calçados nas “super-exploradas oficinas de suor” do terceiro mundo e à exploração do trabalho infantil (Marques, 2006).

    Ramos (1984), em sua obra “Futebol: Ideologia do Poder” estuda o futebol brasileiro na sociedade capitalista subdesenvolvida. O autor entende que a concentração futebolística traz reflexos sobre a realidade, ocasionando um esvaziamento da percepção das condições históricas. Ressalta que a participação política e a organização de classe são abafadas, alienando o proletariado não permitindo que ele perceba as relações de produção capitalista.

    Segundo Ramos (1984), o futebol desempenha papéis importantes na sociedade brasileira, sendo um dos responsáveis pela mistificação e legitimação do capitalismo. Após pesquisar copas do mundo, jornais, programas esportivos na televisão e rádio, categorizando as informações, concluiu que o futebol a) é um aparelho ideológico do Estado, b) o futebol mistifica a realidade e c) o futebol legitima o capitalismo.

    Mesmo tendo sido, na maioria das vezes, submetido a um uso político por parte do poder estabelecido como na a Itália fascista de Mussolini, no nacional socialismo de Hitler, no franquismo espanhol, na junta militar do general Videla na Argentina, no regime comunista da URSS e no Brasil pelos governos militares, também encontramos tendências contrárias, em casos em que o futebol se converteu em instrumento de luta contra o poder hegemônico.

    Segundo Úbeda, Molina e Villamón (2014) encontramos uma vertente totalmente contrária digna de ser ressaltada: situações em que o futebol, através dos clubes, os estádios ou as competições, tem apresentado uma importância significativa na construção de reivindicações contra o poder hegemônico. Podemos citar, como exemplo, o Barcelona F.C. durante a ditadura franquista e o futebol contra o apartheid na África do Sul contribuindo para a superação da segregação racial (p. 16-17).

    No Brasil, tivemos o movimento chamado de A Democracia Corinthiana, surgido na década de 1980 no time brasileiro de futebol Corinthians, liderado por um grupo de futebolistas politizados como Sócrates, Wladimir, Casagrande e Zenon. Constituiu o maior movimento ideológico da história do futebol brasileiro. Este foi um período da história do clube no qual decisões importantes como contratações, regras de concentração, direito ao consumo de bebidas alcoólicas em público, liberdade para expressar opiniões políticas e outros eram decididas através do voto igualitário de seus membros, de modo que o voto do técnico, por exemplo, valia tanto quanto o de um funcionário ou jogador. Isso criou uma espécie de "autogestão" do time, algo revolucionário para o contexto ditatorial em que estava inserido. Os jogadores tiveram, também, entre 1982 a 1984, uma participação importante no movimento político brasileiro das Diretas Já.

    Segundo Pecenin (2008), nenhum outro país é marcado pelo futebol na mesma medida que o Brasil e, ao mesmo tempo, reflete a sociedade constituindo uma relação de reflexão e refração que norteia o processo de constituição de identidades. Para o autor, a mídia mantém com o futebol e os torcedores uma relação de poder que, no discurso da primeira, gera identidades para os últimos.

    “...É preciso esclarecer que esse poder de que falamos é similar àquele teorizado por Foucault (1992), no livro Microfísica do poder. Como ensina Freitas Filho (1985), a mídia, tanto a imprensa quanto o marketing, serve-se da fascinação do esporte para criar para o futebol uma identidade palatável ao gosto dos torcedores. Em troca, beneficia as próprias identidades esportivas, fazendo-as operar como um negócio altamente rendoso para ambos”(p. 13).

    O futebol brasileiro está entranhado na história do país. Para Tajes Junior (2013), a relação entre o futebol e a televisão foi uma parceria que gerou um novo paradigma para a sua prática. Não se fala apenas de um jogo, mas da própria história do país, emaranhada com a evolução e desenvolvimento nas quatro linhas do campo.

Considerações finais

    “Nosso passaporte para o mundo das democracias estáveis, da inflação baixa, dos governos confiáveis, até agora só tem um visto de turismo que é o Plano Real. O visto só virá quando começarmos a mexer no voto e fizermos dele, não um cheque em branco, mas um vículo de poder”(Albuquerque, 1995).

    Por tudo que foi exposto aqui, é preciso reconhecer que a gobalização do futebol pode nos ter conduzido a negligenciar certos mecanismos de dominação e poder. Embora esteja claro que cada vez mais somos governados por mecanismos sutis de poder, é também evidente que precisamos tomar ciência desse processo e começar a mudar essas relações e, ainda, compreender que através das relações de controle, nos tornamos aquilo que somos. Ou seja, o futebol é, definitivamente, um território político e um espaço de poder.

    É necessário entender que, na estrutura do futebol brasileiro, o poder não tem mais um único centro (CBF e FIFA ). O poder está espalhado por toda rede desportiva; federações, ligas, clubes, sindicatos, associações de jogadores entre outros. O conhecimento ou consciência disso não é aquilo que põe em xeque o poder; o conhecimento é parte inerente do poder.

    Temos que ver o lado positivo de poder, pois ele é algo indispensável em nossa existência.

Bibliografia

Outros artigos em Portugués

www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 20 · N° 209 | Buenos Aires, Octubre de 2015
Lecturas: Educación Física y Deportes - ISSN 1514-3465 - © 1997-2015 Derechos reservados