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Espetacularização do esporte: influências do atleta na sociedade

La espectacularización del deporte: las influencias del deportista en la sociedad

Spectacularization of sport: athlete influences in society

 

*Graduanda em Educação Física e Saúde

pela Universidade de São Paulo, SP

*Professor Universidade de São Paulo

(Brasil)

Geislaine Farias de Lucena*

geislaine.lucena@hotmail.com

Larissa Brum*

larissa.brum@usp.br

Vanessa Serafim*

vanessa.serafim@usp.br

Marco Bettine**

marcobettine@usp.br

 

 

 

 

Resumo

          O esporte é um fenômeno com diversas formas de manifestação, o qual passou por processos de autonomização, burocratização e normatização, de forma dinâmica como reflexo da sociedade devido sua facilidade de utilização. Na sociedade do espetáculo, na qual a imagem se sobrepõe ao real e com tecnologias que permitem a comunicação mundial, o esporte foi inserido na Indústria Cultural através de sua mercantilização, ocorrendo então a espetacularização deste fenômeno. O esporte passou por processos de massificação e profissionalização, tornando-se objeto de consumo e gerando lucros. Dentro deste contexto e através dos meios de comunicação em massa, o atleta passa a ter papel de destaque na sociedade, sendo considerado herói e modelo de ideal, influenciando a sociedade.

          Unitermos: Esporte. Espetacularização. Atleta.

 

Abstract

          Sport is a phenomenon with many manifestations, which went through empowerment processes, bureaucracy and regulation, dynamically reflecting the society due to its ease of use. In the society of spectacle, in which the image is superimposed on the real and technologies that enable global communication, the sport has been inserted in the cultural industry through its commercialization, then occurring the spectacle of this phenomenon. The sport has undergone bulking processes and professional becoming consumer object and generating profits. Within this context and through the mass media, the athlete is replaced prominent role in society, being considered a hero and ideal model, influencing society.

          Keywords: Sport. Spectacularization. Athlete.

 

Recepção: 09/08/2015 - Aceitação: 24/09/2015

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 209, Octubre de 2015. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O presente artigo tem como objetivo apresentar, por meio de uma revisão bibliográfica, quais as principais influências exercidas por atletas de alto rendimento na sociedade, tendo em vista a espetacularização do esporte. Para compor a seguinte revisão, a metodologia utilizada basea-se em literaturas clássicas da sociologia e nas plataformas Scielo e Google Acadêmico.

    A sociedade do espetáculo esportivo é um tema que vem sendo discutido por muitos teóricos contemporâneos, entretanto, o papel específico do atleta inserido neste espetáculo e sua influência na sociedade, ainda é um tema pouco presente. Assim, este trabalho possui a finalidade de unir e discutir as informações sobre este tema contribuindo para a área da sociologia do esporte, além de apontar as semelhanças e possíveis controvérsias.

    Para isso, será abordado na primeira parte do presente artigo, o conceito de sociedade do espetáculo segundo Guy Debord, que aponta o domínio da economia em todas as esferas da vida e a conseqüente supervalorização do abstrato e da imagem nas relações sociais. Apresentado este cenário social, o artigo constrói reflexões a cerca da espetacularização do esporte a partir de estudos específicos sobre o campo da Sociologia do Esporte, os quais analisam a mercantilização do fenômeno esportivo e sua inserção na Indústria Cultural através da comunicação em massa.

    Em seguida, será discutido o papel do atleta na sociedade, refletindo sobre a sua relevância e influência na sociedade, através dos estudos propostos pelos pesquisadores Assis, Katia Rubio, entre outros estudiosos. Os autores apresentam os fatores motivacionais e a forma como a sociedade visualiza os atletas, estes passam a atuar como modelo de comportamento, assumindo a figura de líder e herói.

    No terceiro assunto, o artigo irá explanar como se constrói a relação existente entre o atleta frente à espetacularização do esporte, refletindo sobre aspectos como a dependência do atleta sobre o espetáculo e de que forma ele é inserido neste contexto, sendo considerado protagonista do esporte espetáculo, adquirindo papel de astro e atuando como produto de mercado esportivo.

Sociedade do espetáculo e espetacularização do esporte

    A sociedade contemporânea é vista como uma sociedade que se relaciona através de aparências, Guy Debord em seu clássico A Sociedade do Espetáculo, apresenta essa sociedade do consumo, pautada sobre a supervalorização da imagem pela qual se dão as relações sociais e a inserção da economia em todas as esferas da vida. O espetáculo é definido então por não ser apenas um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas, mediadas por imagens (Debord, 1997, p.6-10).

    Debord (1997, p.13) aponta que a sociedade está tomada pelo espetáculo, todas as relações sociais refletem nesse aspecto ilusório: “Toda a vida das sociedades nas quais reinam as modernas condições de produção se apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era vivido diretamente tornou-se representação.”

    Dessa maneira, o espetáculo atua como forma de dominação da sociedade, desvinculando o espectador de sua própria história, de suas origens e de seu modo de pensar e agir (Negrini; Ausguti, 2013, p.3). Essa dominação espetacular só acontece devido ao grande alcance e priorização dos valores econômicos, ou seja, todas as esferas sociais estão mergulhadas na mercantilização e no capitalismo: “O espetáculo submete para si os homens vivos, na medida em que a economia já os submeteu totalmente.” (Debord, 2003, p. 12-13)

    A resultante destes aspectos é a alienação dos indivíduos que influenciados pelo espetáculo e submissos a imagem e ao simbólico, passam a ter a ilusão como realidade e a consumir o que o espetáculo oferece dessa forma, tudo que era autêntico morre e passa a ser substituído pelo abstrato.

    O espetáculo na sociedade representa concretamente uma fabricação de alienação. A expansão econômica é principalmente a expansão da produção industrial. O crescimento econômico, que cresce para si mesmo, não é outra coisa senão a alienação que constitui seu núcleo original. (Debord, 2003 p. 20).

    Dentro deste contexto, o esporte que é caracterizado como fenômeno social, historicamente construído, está inserido diretamente na sociedade do espetáculo, refletindo essa espetacularização, considerando sua facilidade de instrumentalização.

    Influência direta dos acontecimentos da sociedade no âmbito esportivo e se deve a neutralidade interna do esporte, que não produz ideologia própria e se torna suscetível a instrumentalização da sociedade. (Bracht apud in Sigoli; Junior, p. 119).

    O esporte passa a possuir alicerces nas leis de mercado capitalista e na conseqüente busca por lucros, surgindo assim o esporte espetáculo, potencial setor da indústria cultural e economia pujante. Segundo Proni (1998), o esporte espetáculo deve ser entendido como fenômeno da sociedade de massa, produto da mercantilização de componentes do mundo esportivo e apresenta algumas características básicas:

    É importante pontuar que o esporte-espetáculo não se limita somente às competições de alto rendimento, profissionalizadas, pois exerce influência em manifestações esportivas amadoras, através do consumo de espaços, materiais e práticas tidas como produtos indispensáveis (Marques, 2007, p. 97).

    A comunicação em massa, principalmente a televisiva, colaborou para a espetacularização do esporte, por permitir um grande alcance e expansão do mercado consumidor, influenciando o telespectador nos seus gostos e desejos:

    O processo de massificação está intimamente ligado a espetacularização deste fenômeno. A divulgação de suas práticas, valores e significados amplia o campo de ação do mercado e do esporte como produto. (Marques; Gutierrez; Almeida, 2008, p. 48-52).

    O fenômeno esportivo foi transformado em um grande espetáculo, altamente valorizado pela indústria do entretenimento e por essa sociedade do consumo e de comunicação de massa crescentemente organizada em torno da produção e difusão de sons, imagens e informações (PRONI, 1998). O esporte como atração da indústria cultural é um chamariz de público, tendo em vista sua atuação como válvula de escape dentro dessa sociedade altamente controlada que reprime a maior parte de suas emoções.

    A espetacularização do esporte trouxe ainda outras características, como o crescimento do consumo de artigos esportivos e o desenvolvimento do marketing esportivo na divulgação de marcas através do esporte, além de conduzir ao desenvolvimento do profissionalismo dos atletas e técnicos. (Proni, 1998).

Papel do atleta na sociedade

    Ao analisar o meio onde o atleta é inserido, nota-se que a atuação desses esportistas é rodeada de gratificações e recompensas financeiras, entretanto o fator motivacional desse grupo é a necessidade de melhores resultados constantes. O atleta de auto-rendimento segue regras e normas universais determinadas por órgãos, que moldam todas as modalidades esportivas, nesse ambiente o atleta é exposto à vitória e derrotas, que podem acarretar em glória ou desgraça na profissão (Marques; Gutierrez; Almeida, 2013, p. 32-51).

    Observa-se que quanto melhor o resultado do atleta, mais aclamado pela mídia ele será, na sociedade atual o atleta tem um papel social e histórico enriquecedor, onde a rivalidade, superação, sacrifício, competitividade entre outros fatores, são essenciais, Assis (2013, p. 3) constata que:

    Dessa maneira o atleta se mostra como um ser humano que leva uma vida comum, mas que em determinado momento buscou algo a mais e alcançou sua superação, por isso ele é aclamado pelos seus semelhantes como sendo um herói.

    Os espectadores fazem de seus atletas verdadeiros heróis, demonstrando grande admiração. Discursos com as seguintes frases: Prefiro morrer em campo, faço tudo pelo o meu time, segundo o mesmo autor, pode ser comparado com os antigos discursos gregos, que relatavam a preferência em morrer na guerra e obter glória, e assim eram mitificados como heróis. Segundo Rubio (2012), o atleta de alto rendimento nos dias atuais tem sido transfigurado como herói, neste cenário quadras, campos, piscinas e pistas simbolizam campos de batalhas nos dias de notáveis competições.

    Santos e Medeiros (2009) discutem que o atleta, visto como ator social produz e reproduz um papel simbólico do nacionalismo nas competições esportivas. Além de assumir a figura heróica e mítica, atuando como modelo de comportamento, que quando transgredido ou subvertido, o torna vilão.

    Neste panorama, quanto maior for o número de acertos dos esportistas, e suas jogadas forem consideradas proezas difíceis de serem reproduzidas, a mídia focalizará sua atenção nesse indivíduo, e todas as suas grandes ações terão impactos na sociedade (Assis, 2013, p. 6-7).

    O atleta na etapa de sucesso de sua carreira influencia a sociedade, por esta razão os mais aclamados estão ligados ao marketing, e quando executam atitudes fora dos padrões éticos da sociedade seu valor é perdido e o símbolo de perfeição que os acompanhava é abalado, nesse momento acontece a humanização do ídolo, quando seus defeitos são expostos (Assis, 2013, p. 8).

    Rubio (2002) aponta que o atleta desenvolve sua carreira em um ambiente que pode levá-lo tanto ao sucesso imediato, quanto a finalização da sua carreira mais cedo do que o planejado. O aumento da competitividade e a crescente dificuldade para se alcançar destaque, requer uma especialização precoce, entretanto o lucro não é, exclusivamente, o fator decisivo para a escolha do esporte de alto rendimento como profissão e não seria capaz de manter os atletas na carreira.

    A carreira esportiva não é apenas baseada no talento esportivo, existe a influência latente do meio onde se está inserido, como valores familiares, expectativas sociais e pessoais. Segundo Giovanni (2005) os valores sociais possuem uma forma de se materializar, e esses elementos indicam para a sociedade que seu percursor efetua ações dignas de valorização.

O atleta e a espetacularização do esporte

    A vigente sociedade busca parâmetros efetivos com um propósito de se moldar a um determinado padrão social, e precisamente encontrar neste modelo o que gostaria de ter e ser. No esporte temos em diversos acontecimentos o fruto dessa pressão social e midiática, que simultaneamente esperam dos atletas algo mais a ser exposto e copiado.

    O atleta profissional é um novo tipo de trabalhador que vende a um patrão sua força de trabalho, sendo capaz de produzir um espetáculo que atrai multidões, caracterizando-o como profissional do espetáculo muscular. (Brohm apud Rubio, 2002, p. 3-10).

    Como visto anteriormente, o modo como a sociedade vê o atleta, produz uma admiração exacerbada do mesmo. Dessa forma de acordo com Rubio (2002), a espetacularização do esporte moderno e a supervalorização dos feitos e resultados alcançados pelo atleta sugerem uma relação na qual o atleta passa a ser o protagonista do espetáculo esportivo e figura espetacular do herói.

    Para viciar no esporte, basta uma distância entre o atleta e o espectador – uma distância grande o suficiente para fazer o espectador acreditar que seus heróis vivem em outro mundo. É assim que os atletas se transformam em objetos de admiração e desejo (Gumbrecht apud Diniz, 2007, p. 15-16).

    Essa distância separa o abstrato da realidade, sendo assim o consumidor do espetáculo valoriza o mundo da ilusão, no qual o atleta atua como personagem, produzindo a alienação da sociedade e causando influências como, por exemplo, o culto ao corpo do esportista, caracterizada pela busca do “corpo ideal” como um molde a ser reproduzido por todos, que não valoriza prioritariamente o bem-estar e a saúde, através da prática de exercícios físicos, mas que enfatiza a beleza escultural, presente em determinados parâmetros socioculturais.

    A imagem, a aparência, a estetização da existência se desdobram na chamada “cultura do espetáculo”, em que a exibição se transforma no objetivo essencial da existência do sujeito, sua razão de ser. A exigência pela performance passa a ter um destaque fundamental, pois, na cultura do espetáculo, se confunde o ser com o parecer. Consideram-se fracassados todos aqueles que não conseguem exercer o fascínio da estetização de sua existência. No esporte percebemos o quanto a valorização pela vitória toma conta do discurso estetizante, passando a ser desvalorizado qualquer outro resultado. (Vale, 2003, p.12-22).

    Refletindo sobre tais afirmações, é possível notar a ocorrência do egocentrismo no contexto social, no qual o culto ao corpo relacionado ao atleta reflete na estetização, ou seja, um produto do narcisismo reforçado pela comunicação em massa, através da espetacularização.

    As influências dos atletas sobre a sociedade não teriam tanto alcance sem a mídia e a espetacularização do cenário esportivo, sendo um importante fator que pode levar o atleta a ruína ou a ascensão.

    A mídia dá visibilidade, transforma o atleta em herói. Mas se esse não corresponder ele cai em descrença. Mesmo que o atleta tenha alto rendimento, se ele tiver reconhecimento das pessoas a mídia provavelmente o transformará em herói, seja mostrando suas jogadas, lances espetaculares. Por outro lado, se o atleta-herói tem problemas pessoais ou está diminuindo sua capacidade em jogo, ele começa a se tornar ‘humano’ novamente. Deixa de ser mito, afinal, o mito é um modelo a ser seguido. (Assis, 2013, p. 9-11)

    As ações mercadológicas e midiáticas criaram dentro do cenário esportivo inúmeros personagens ligados a esse universo, as quais existem a partir da espetacularização do esporte, e da ascensão da indústria cultural na sociedade, que desdobra o perfil atleta em duas vertentes.

    Entretanto, não é possível afirmar que o atleta seja fruto da espetacularização esportiva, visto que a repercussão do comportamento de um atleta extrapola a temática esportiva e mobiliza debates sociológicos mais amplos que perpassam a cultura do ídolo esportivo. Além de incitar questões quanto à significação da relação do esporte de rendimento e formações discursivas, a partir da criação de personagens míticos, heróicos e/ou transgressores, nos mais diversos aspectos sociais como citam Santos e Medeiros (2009). Dizer que o atleta seja fruto da espetacularização seria minimizar o papel deste na sociedade, tendo em vista as diversas formas de manifestação esportiva e conseqüentemente de atuação dos atletas.

Considerações finais

    Refletindo na discussão sobre o atleta e sua inserção na sociedade, é possível notar que este está submerso em uma extensa teia de relações sociais e econômicas, visto que o atleta influência a sociedade com a sua repercussão esportiva, e também sofre influências advindas da espetacularização do esporte.

    Neste panorama, o atleta ajuda a compor um modelo que contribui com a alienação da sociedade, resultando em fatores como o culto ao corpo, sendo fruto da inter-relação espetacularização-atleta-sociedade, pois a sociedade absorve o que é apresentado pela mídia, entretanto as conseqüências do processo de espetacularização não são percebidas, apenas vivenciadas de forma passiva, devido aos fatores alienantes.

    O atleta estabelece uma imagem que inspira a sociedade a segui-la, em decorrência a isso a sociedade busca um padrão de beleza, entretanto, as vertentes que corroboram para aparição do atleta no âmbito do espetáculo vão além da busca pela aparência perfeita, pois o atleta passa atuar como um produto do marketing, a ponto de formar e multidirecionar novos conceitos e princípios dentro da sociedade.

    Por fim, pode-se considerar que o atleta possui diversas formas de manifestação, considerando sua atuação como reflexo do fenômeno esportivo, além de abrange múltiplos âmbitos sociais, devido sua exteriorização, sendo considerado herói ou vilão da Indústria Esportiva.

Bibliografia

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