Socialização e atividades
motoras. Um estudo Socialización y actividades motoras. Un estudio multicaso en educación preescolar Socialization and motor activities. A multi case study of pre-school education Socialisation et activités motrices. Une étude de cas multiples de l’education pré-scolaire |
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*Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico **Departamento de Educação - Universidade de Aveiro (Portugal) |
Juliana Rebelo Dias* Mara Soraia Carinha da Silva* Rui Neves** |
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Resumo O estudo multicaso de natureza qualitativa objetivou investigar a associação entre o processo de socialização e as práticas de atividades motoras nas sessões de expressão motora. Foram sujeitos do estudo três crianças de um grupo de vinte e duas de uma instituição particular de solidariedade social. Os instrumentos utilizados foram: um questionário dirigido à educadora, a observação indireta com base em gravação vídeo das sessões de Expressão Motora e de outras atividades na sala. Os resultados evidenciaram que os comportamentos das crianças sofreram mudanças positivas em função do desenvolvimento das sessões do nosso estudo. Conclui-se assim, que apesar da brevidade do projeto, os resultados indicam uma tendência das crianças, desta faixa etária, para alterarem os seus comportamentos com o intuito de se sentirem bem com elas mesmas e com os outros, muito em função dos objetivos das nossas sessões. Sendo que estes visavam lidar com a competição, com o trabalho cooperativo e as regras de socialização. Unitermos: Socialização. Partilha. Expressão motora. Crianças.
Abstract The multicase study of qualitative nature purposed to investigate the association between the process of socialization and practice of physical and sports activities in the motor expression sessions. The object of the study were three children of a group of twenty and two from an IPSS institution. The used instruments were: a questionnaire to the teacher, indirect observation in the classroom and motor expression sessions and recorded video sessions. The obtained results show that the children’s behavior suffered positive changes after the implementations of the sessions of this study. In conclusion, despite the project’s briefness, the results show a tendency of the children, ages studied, to change their behavior with the purpose to feel better with themselves and the others around them, much to the objectives of our sessions. These were intended to deal with the competition, cooperative work and socialization rules.Keywords: Socialization. Share. Motor expression. Children.
Résumé L'étude qualitative de cas multiples visait à étudier l'association entre le processus de socialisation et les pratiques d’une activité physique et sportive dans les sessions d'expression motrice. Les sujets de l'étude étaient trois enfants d'un groupe de vingt-deux d’une institution IPSS. Les instruments utilisés ont été : un questionnaire pour l´éducatrice, l'observation indirecte en salle de classe et les sessions d'expression motrice et l'enregistrement vidéo des sessions. Les résultats obtenus ont montré que le comportement des enfants a subi des changements positifs en raison de la mise en œuvre des sessions de cette étude. On peut donc concluier que, malgré la brièveté du projet, les résultats indiquent une tendance des enfants de ce groupe d'âge à modifier leur comportement afin de se sentir bien dans leur peau et dans la relation avec les autres, en accord avec les objectifs de nos sessions. Et ceux-ci visaient à faire face à la compétition entre paires, avec un travail de coopération des régles de socialisation .Mots-clés: Socialisation. Le partage. L'expression motrice. Enfants.
Recepção: 02/08/2015 - Aceitação: 11/09/2015
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 208, Septiembre de 2015. http://www.efdeportes.com/ |
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1. Introdução
O projeto de investigação-ação decorreu no Centro de Infância Artes e Qualidade (CIAQ), polo 2, da cidade de Aveiro (Portugal), uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS). A sala onde implementámos o nosso estudo é uma sala heterogénea onde encontrámos crianças com idades compreendidas entre os 3 e os 4 anos, sendo doze delas meninos e dez meninas.
Após um período inicial de observação ao grupo de crianças e à educadora conseguimos identificar algumas situações em que as crianças apresentavam dificuldades em estabelecer interações com o outro. Este fenómeno pode ser justificado pela escassez de trabalhos de grupo, do egocentrismo característico da idade da criança ou mesmo devido à ausência de atividades que impliquem a interajuda/cooperação (Tavares, 2007).
Ficámos assim sensibilizadas para a necessidade de alterar esta realidade e, assim, escolhemos trabalhar a temática da socialização. Assim, desenvolvemos comportamentos promotores de socialização através de sessões de Expressão Motora (EM), com o intuito de desenvolver valores como a partilha, o respeito e a interajuda, como preconizam as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (OCEPE), na área Formação pessoal e social, ao referirem que “ao possibilitar a integração com diferentes valores e perspetivas, a educação pré-escolar constitui um contexto favorável para que a criança vá aprendendo a tomar consciência de si e do outro” (ME/DEB, 1997, p. 52).
Despertas para esta problemática centrámos a nossa atenção nas sessões de EM e detetámos que, nesse curto espaço de tempo, as crianças cooperavam e colaboravam mutuamente nas atividades, ajudando os colegas, partilhando os objetos e o espaço.
Como refere Palacios (1995 citado por Borsa, 2007) a socialização necessita de passar por três processos para que se desenvolva: os “processos mentais de socialização”, os “processos afetivos de socialização” e, ainda os processos de conduta de socialização.
Considerando os primeiros, os “processos mentais de socialização”, incluímos nestes os valores, as normas e os costumes que, através do contacto com as pessoas/instituições, permitem à criança a sua aprendizagem. Nos “processos afetivos de socialização” são valorizados aspetos como a empatia, o apego ou a amizade entre as crianças, em função destes desperta-se para a proximidade com o outro. A criança consegue assim compreender que para viver harmoniosamente entre o grupo deve respeitar o outro. Por último, os processos de conduta de socialização, visam a aquisição de comportamentos/condutas desejáveis em sociedade. Esta adaptação às regras sociais conduz a criança a evitar comportamentos socialmente indesejáveis.
Estes três processos puderam ser trabalhados nas sessões de EM, pois a realização de jogos cooperativos, de equipa e de comunicação, ajudam a modificar os comportamentos socializadores na criança que melhoram as suas relações (Bento & Metzner, s/d).
Uma outra dimensão a salientar refere-se à disponibilização de recursos materiais. Estes por despertarem o desejo de descoberta e exploração permitiram-nos usufruir dos mesmos para planificar atividades em prol da socialização. Como recursos materiais na instituição encontrámos arcos, bolas, túneis coloridos, travessias, espelhos, colchões e pinos, que potenciaram a competitividade, a exploração e a partilha.
2. Objetivos do estudo
As OCEPE e as Metas de Aprendizagem foram o nosso suporte para a definição dos objetivos do nosso estudo.
No que se refere às OCEPE podemos destacar a área de conteúdo expressão e comunicação: Domínio das expressões motoras, onde encontramos uma referência que valoriza a importância dos jogos para trabalhar a socialização, sendo através destes que as crianças desenvolvem o controlo motor, a socialização, a compreensão e a aceitação de regras. Ainda neste documento, encontramos a área de conteúdo de formação pessoal e social que desperta para a importância de uma educação para os valores, para a possibilidade da criança interagir com diferentes valores, exigências e conflitos, constituindo um ambiente favorável para que a mesma tome a consciência de si e do outro. Este aspeto permite à criança compreender que é através das interações estabelecidas que desenvolve os seus valores e atitudes, melhorando a sua atuação e aceitação na sociedade.
No que concerne às Metas de Aprendizagem destacamos, essencialmente, o domínio cooperação e o domínio convivência democrática/cidadania. No primeiro domínio selecionamos a meta final 16) que nos desperta para a importância da partilha dos brinquedos e de materiais entre as crianças, a meta final 17) que salienta as oportunidades que as crianças oferecem entre si para intervir em conversas e jogos e, por último, a meta final 18) que preconiza a ideia de demonstrar comportamentos de apoio e interajuda por iniciativa própria.
Visando dar resposta a todas estas finalidades educativas definimos os seguintes objetivos para o nosso estudo:
Analisar a mudança de comportamentos da criança para com o outro e das suas interações sociais;
Compreender que atividades promovem o trabalho cooperativo e a partilha em crianças de idade pré-escolar.
3. Metodologia
O nosso estudo insere-se numa lógica multicaso de natureza qualitativa (Bogdan & Biklen, 1994). Utilizou como instrumentos e métodos de recolha de dados o questionário à educadora que acompanha o grupo e as sessões vídeo gravadas em sala e nas sessões de EM.
Durante o período de observação indireta que realizámos junto do grande grupo, de 22 crianças, conseguimos analisar os seus comportamentos relativamente à participação nas atividades em sessões de EM e em sala, à partilha de brinquedos entre os colegas e às interações que estabeleciam entre si.
Após a análise dos comportamentos de todas as crianças, destacámos o comportamento de três crianças do sexo masculino (uma de 2 anos e duas de 3 anos). Esta escolha justificou-se pelo facto de as termos sinalizado como crianças que demonstraram dificuldade em interagir com os outros, participar autonomamente nas sessões ou ainda na partilha de objetos entre si. Esta sinalização foi também validada pela Educadora de Infância da sala. Com o objetivo de garantir a confidencialidade atribuímos nomes fictícios a estas crianças.
Assim, as sessões foram gravadas para reter “a forma e o conteúdo da comunicação”, ou seja, permitindo-nos captar de forma espontânea e verdadeira o discurso das crianças, as suas interações e tudo o que acontece nas sessões (Estrela, 1994, p. 29). Para que nos fosse mais simples analisar os comportamentos que não identificámos no momento, comprovando se ocorreu a mudança de comportamentos.
Desta forma, as vídeo gravações foram feitas durante 60 minutos no período da manhã, na manta e durante as sessões de EM. Escolhemos estes períodos para, posteriormente, analisarmos a atividade dominante das crianças em observação em intervalos de 3 em 3 minutos distribuídos uniformemente. Esta técnica de observação por amostragem temporal, permite evidenciar o comportamento das crianças e traçar perfis das suas características mais frequentes, com alguma objetividade (Sarmento, 1993).
Como atividades planeadas para desenvolver os nossos objetivos principais procurámos realizar na 1ª sessão, jogos que promovessem a interiorização de regras de socialização e fomentassem o trabalho cooperativo. Desta forma, apresentámos às crianças jogos onde as crianças trabalhassem em grande grupo, nesta atividade as crianças cooperaram entre si para que o balão não caísse no solo.
Na 2ª sessão, tendo como objetivos específicos promover as regras de socialização e lidar com a competição, realizámos o jogo da barra do lenço. Nesta atividade as crianças trabalharam em grupos mais pequenos, tendo cada grupo onze elementos, ou seja, duas equipas a competirem entre si. Realçámos a importância do trabalho cooperativo na medida em que consciencializamos as equipas que só obteriam sucesso se trabalhassem todos para o mesmo objetivo.
Na 3ª e, última sessão, com os objetivos de fomentar a interação entre as crianças e sensibilizar para a importância de cuidar do outro, trabalhamos o jogo do contacto. Para a realização da atividade formaram-se 10 equipas de dois elementos cada. Neste jogo destacamos a importância do trabalho cooperativo, demonstrando que o trabalho com diferentes colegas permite igualmente o sucesso na atividade.
Considerando a duração do projeto e que somente o trabalho nas sessões de EM seria limitado, sentimos necessidade de trabalhar a socialização ainda na sala. O nosso trabalho orientou-se essencialmente para atividades de interação entre as crianças, como acontecia nas brincadeiras que tinham na manta e valorizámos ainda as intenções das crianças que traziam brinquedos de casa, pois demonstravam gosto em partilhar com os outros colegas os seus brinquedos.
Com objetivo de complementaridade utilizámos o questionário à Educadora de Infância (EI), por este apresentar a vantagem de não necessitar de “ser respondido de imediato permitindo ao inquirido a escolha da hora mais adequada para o efeito” (Pardal & Correia, 1995, p.52). A opinião da EI, que acompanha o grupo desde cedo, foi fundamental para compreender a urgência e adequabilidade do projeto que implementaríamos, pois “através da aplicação de um questionário a um público-alvo (…) é possível recolher informações que permitam conhecer melhor as suas lacunas, bem como melhorar as metodologias de ensino podendo, deste modo, individualizar o ensino quando necessário” (Amaro, Póvoa & Macedo, 2004/2005, p. 4).
Para a elaboração do nosso questionário tivemos presente as desvantagens que o mesmo poderia apresentar, ou seja, a dificuldade em compreender as questões apresentadas podem condicionar a resposta. Para combater esta dificuldade as questões foram apresentadas à EI e a mesma explicitou o que achava que as mesmas sugeriam.
4. Apresentação dos resultados
Os dados evidenciados a partir da análise das sessões vídeo gravadas e apresentados no Quadro-síntese sintetizam os comportamentos mais representativos de cada uma das 3 crianças observadas. Assim, analisando as Tabelas referentes a quatro horas de gravação de vídeo, os dados apresentados apontam para melhorias na comparação de cada criança nos diferentes momentos e atividades (antes e depois da implementação das sessões) e espaços (sala e aula de EM).
Quadro-síntese. Comportamentos das crianças antes e depois da implementação das sessões
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Sala |
Sessões em |
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Antes |
Depois |
Antes |
Depois |
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Luís |
- Chora quando se separa da mãe; - Permanece junto da educadora sempre a chorar; Pergunta constantemente quando é que a mãe chega; - Não brinca; - Brinca breves momentos sempre sozinho; - Procura um adulto com quem estar; - Não comunica com os colegas. |
- Pergunta menos vezes pela mãe; - Traz brinquedos de casa para partilhar com os colegas; - Brinca sozinho; - Estabelece interações com outras crianças; - Junta-se a outros colegas e participa na brincadeira delas; - Chama a atenção das educadoras para brincadeiras que faz. |
- Brinca durante a explicação das atividades; - Afasta-se do grupo constantemente; - Não participa nas atividades; - Permanece sentado; - Recusa participar quando as educadoras o chamam; - Não estabelece interações com os colegas. |
- Junta-se ao grupo; - Raramente realiza atividades; - Necessita ser chamado pela educadora para se juntar ao grupo. |
Rafael |
- Agarra-se ao pescoço do pai; - Chora muito (pede beijos e abraços ao pai); - Entra, muitas vezes, na sala quando a educadora puxa por ele; - Para de chorar, procura um canto na sala onde não esteja ninguém e fica agarrado aos brinquedos que traz de casa; - Nega participar nas atividades dirigidas; - Não partilha os brinquedos e nega brincar com outras crianças. |
- Entra tranquilamente, deseja os bons dias e despede-se do pai com um aperto de mão e um abraço; - Brinca sozinho por breves momentos; - Procura um colega para brincar; - Aceita brincar quando o convidam; - Partilha os brinquedos e muitas vezes esquece-se dos mesmos na manta. |
- Isola-se do restante grupo; - Espera que uma educadora o vá buscar para se juntar ao grupo; - Nega participar em atividades de grande grupo; - Não demonstra interesse nas atividades propostas e realiza o que é pedido. |
- Junta-se ao grupo normalmente para iniciar as atividades; - Conversa com os colegas quando existem momentos parados; - Participa nas atividades de grande grupo; - Motivado (ri-se/descontraído); - Realiza os exercícios com qualquer colega. |
Damião |
- Não apresenta dificuldade em separar-se dos pais; - Anda muito tempo pela sala; - Não sabe o que fazer; ao que brincar; - Brinca junto dos colegas, mas realiza a sua própria brincadeira; - Não estabelece interações com os colegas; - Não partilha os brinquedos que lhe foram emprestados. |
- Pede brinquedos emprestados; - Brinca com os colegas; - Partilha os brinquedos que lhe foram emprestados; - Brinca sozinho; - Tenta interagir com os colegas. |
- Não estabelece interações com os colegas; - Anda sozinho pelo espaço; - Afasta-se do restante grupo; - Distrai-se muito. |
- Ouve as explicações; - Participa junto do grande grupo; - Procura diferentes colegas para os vários exercícios; - Pede ajuda. |
Na perspetiva da EI esta considera que o processo de socialização é importante pois permite à criança estabelecer relações com o mundo que a rodeia. Salienta ainda que aspetos como a “empatia, o auto controle, a resiliência e o estabelecer relações positivas com o outro são a base para que a criança se sinta bem com ela própria e aberta a relações com os outros”.
Acerca do nível de desenvolvimento das crianças considera mais adequado trabalhar a socialização, referindo que a socialização não se restringe apenas a uma fase do seu desenvolvimento, sendo importante trabalhá-la desde cedo, pois fará parte de todo o seu processo de crescimento e desenvolvimento. Assim, logo que entre no jardim-de-infância a criança sente necessidade de ajustar os seus comportamentos e atitudes relativamente às diferentes componentes do desenvolvimento pessoal e social.
No que respeita ao grupo com que trabalha, a EI refere que estas crianças estabelecem “relações positivas com os adultos e com as outras crianças”. Contudo, destacou a importância de trabalhar aspetos como as “atitudes comportamentais, saber lidar com a frustração, aceitar e respeitar as regras da sala”.
Na última questão apresentada à EI referente às estratégias que considera mais adequadas para a trabalhar a socialização, a mesma refere que gosta de promover o diálogo entre as crianças, pois considera a palavra o meio de comunicação mais adequado para verem resolvidos os confrontos.
5. Análise e discussão dos resultados
A observação e intervenção junto do grupo de crianças com idades compreendidas entre os 2 e aos 4 anos, despertou-nos para a urgência de trabalhar a temática da socialização. O grupo apresentava dificuldades em participar nas sessões de EM e em estabelecer interações nesta atividade, bem como noutras no contexto da sala.
De acordo com a análise das sessões vídeo gravadas, conseguimos caracterizar o Luís como uma criança que demonstrava grande desconforto em ficar na instituição, em contexto de sala, chorava frequentemente quando se separava da mãe, permanecia muito tempo junto da educadora e estava sempre a perguntar pela mãe. Era uma criança que não brincava e, se o fazia era em atividades individuais, nas quais não sentia necessidade de interagir com o restante grupo. Nas sessões de EM o Luís demonstrava-se ausente, ou seja, estava constantemente afastado do grupo, não tinha interesse em ouvir/ver as demonstrações dos exercícios/jogos das educadoras, recusava participar mesmo sendo incentivado pelas educadoras para as fazer.
Acreditamos que alguns dos comportamentos e das atitudes desta criança são normais na sua idade, pois para Piaget (1962 citado por Tavares et al, 2007, p. 55) a criança de 2 anos encontra-se no estádio pré-operatório no subestádio pré-conceptual que se caracteriza essencialmente pelo seu egocentrismo, onde a criança não é capaz de se pôr no lugar do outro, apenas se centra no seu ponto de vista. Desta forma, acreditamos que as nossas intervenções devem incentivar aos aspeto da partilha e da convivência social, mesmo com crianças pequenas. A socialização melhora a autonomia e relação da criança com o outro, por isso desenvolvê-la desde cedo apresenta-se crucial.
A análise das participações do Rafael revelou uma criança insegura e com baixos níveis de bem-estar e implicação no contexto pré-escolar. O Rafael permanecia muito tempo agarrado ao pescoço do pai, chorava muito e pedia sempre beijos e abraços para conseguir ter o pai durante mais algum tempo. Muitas das vezes esta criança só conseguia separar-se do pai quando a educadora o puxava do colo deste.
Estando na sala, o Rafael procurava um canto onde não estivesse ninguém, ficava agarrado aos brinquedos que trazia de casa e não brincava. Não partilhava os seus brinquedos, negava brincar com outras crianças e recusava participar nas atividades dirigidas, ou seja, nas mesas de trabalho.
Nas sessões de EM isolava-se do grupo, esperava sempre por uma educadora para se juntar aos colegas, não demonstrava interesse nas atividades/jogos apresentados e a participação em atividade de grande grupo causavam-lhe desconforto, optando por não as realizar.
A terceira criança, o Damião de 3 anos, não apresentava dificuldades em separar-se dos pais. Na sala, andava muito tempo de um lado para o outro sem saber o que fazer ou ao que brincar. Durante as suas brincadeiras raramente estabelecia interações com as outras crianças e apresentava enorme dificuldade em partilhar os brinquedos que já lhe tinham sido emprestados.
Em EM o Damião não estabelecia interações, andava muito tempo sozinho pelo espaço e distraia-se muito durante a execução de atividades/jogos.
Após a implementação de três sessões, foram realizadas novas gravações vídeo e áudio que nos ajudaram a comprovar os resultados positivos que as diferentes atividades/jogos tiveram junto das crianças. Temos consciência que a brevidade da intervenção de sessões que desenvolvessem a socialização limitou os resultados desejados, mas acreditamos que a preocupação em trabalhar a temática melhorou comportamentos e atitudes das crianças.
No caso da primeira criança, ou seja, o Luís de 2 anos, verificamos mudanças nas suas atitudes e comportamentos tanto na sala como na sessão de EM. Este pergunta menos pela mãe, a necessidade de interagir com os colegas já é visível, pois apesar de algumas vezes ainda brincar sozinho já é capaz de integrar-se num grupo e entrar nas brincadeiras deles como sua própria iniciativa, chamando a atenção do adulto com o intuito de mostrar que já consegue estabelecer ligações com os colegas.
No que diz respeito ao Rafael de 3 anos, este já não mostra sofrimento em deixar o pai ir embora, e após um tempo de estar na sala procura um colega para brincar, mesmo assim o Rafael ainda sente necessidade de quando chega a sala estar por breves momentos a brincar sozinho. A grande diferença que destacamos é o facto de sem qualquer constrangimento, o Rafael partilha os brinquedos que traz de casa, e por vezes até se esquece dos mesmos.
Relativamente ao Damião de 3 anos, passa menos tempo a percorrer a sala sem saber o que fazer, já é capaz de interagir com os outros colegas integrando-se na brincadeira que decorre. Nesta criança destacamos como grande diferença o facto de já ser capaz de pedir emprestado um brinquedo, e de mais tarde conseguir partilhar o brinquedo que lhe fora emprestado.
Tabela 1. Comportamentos do Luís antes da implementação das sessões em expressão motora e na sala
Tabela 2. Comportamentos do Rafael antes da implementação das sessões em expressão motora e na sala
Tabela 3. Comportamentos do Damião antes da implementação das sessões em expressão motora e na sala
Tabela 4. Comportamentos do Luís depois da implementação das sessões em expressão motora e na sala
Tabela 5. Comportamentos do Rafael depois da implementação das sessões em expressão motora e na sala
Tabela 6. Comportamentos do Damião depois da implementação das sessões em expressão motora e na sala.
Em síntese poderemos referir que com um plano de intervenção focado, estruturado e com objetivos claros é possível desenvolver alterações de atitudes e comportamentos ao nível da socialização das crianças nestas idades. Tal parece ser possível em função da natureza das atividades e das características das sessões de EM que possam ser desenvolvidas com as crianças.
Bibliografia
Amaro, A., Póvoa, A., Macedo, L. (2004/2005). A arte de fazer questionários. Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Portugal.
Bento, C., Metzner, A. (s.d). As contribuições da Educação Física no processo de socialização das crianças no Ensino Fundamental I. Brasil: Centro Universitário UNIFAFIBE.
Borsa, J. C. (2007). O papel da escola no processo de socialização infantil. Brasil: Portal dos psicólogos.
Bodgan, R., Biklen, S. (1994). Investigação Qualitativa em Educação. pp. 89-97. Porto: Porto Editora.
Estrela, A. (1994). Teoria e prática de observação de classe: uma estratégia de formação de professores, pp. 20-32. Porto: Porto Editora.
ME/DEB. (1997). Orientações curriculares para a educação pré-escolar. Lisboa: Ministério da Educação, Departamento da Educação Básica.
Ministério da Educação e Ciência (MEC)/ Direcção-Geral de Educação (DGE). (2012). Metas de aprendizagem Educação Pré-Escolar. Acessível em: http://metasdeaprendizagem.dge.mec.pt/educacao-pre-escolar/metas-de-aprendizagem/metas/?area=42&level=1.
Pardal, L. & Correia, E. (1995). Métodos e técnicas de investigação social, pp.47-76. Porto: Areal Editora.
Sarmento, P., Leça-Veiga, A., Rosado, A., Rodrigues, J. e Ferreira, V. (1993). Pedagogia do Desporto – Instrumentos de Observação Sistemática da Educação Física e Desporto, Lisboa, Edições FMH,
Tavares, J., Pereira, A., Gomes, A. Monteiro, S. & Gomes, A. (2007). Manual de psicologia do desenvolvimento e aprendizagem, pp. 43-65. Porto: Edições Porto Editora.
Sites
http://www.pedagogia.com.br/artigos/socializacaoorganizacional/index.php?pagina=0 (acedido a 13 de outubro de 2014 às 17:46)
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