efdeportes.com

Resenha do livro Passe de letra: crônica esportiva e sociedade brasileira

Reseña del libro Pase de letra: crónica deportiva y la sociedad brasileña

Book review Letter pass: Sports chronicle and Brazilian society

 

*Pró-reitor de graduação da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG)

Docente dos cursos de licenciatura e bacharelado em Educação Física da UEPG

Docente dos cursos de mestrado e doutorado em Ciências Sociais Aplicadas da UEPG

Doutor em História pela Universidade Federal do Paraná (UFPR)

**Mestre em Ciências Sociais Aplicadas

pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG)

***Graduando em licenciatura em Educação Física

na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG)

Miguel Archanjo de Freitas Jr.*

mfreitasjr@uepg.br

Bruno José Gabriel**

brunogabriel_uepg@hotmail.com

Edilson de Oliveira***

edilsonpgd@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O livro Passe de letra: crônica esportiva e sociedade brasileira é composto por uma coletânea de oito artigos, que utilizaram a crônica como recurso metodológico para discutir algumas interfaces sociais. Diante dos resultados alcançados pelos artigos, os organizadores do livro, dente outros apontamentos, destacaram que este contribui para a reflexão dos meandros futebolísticos e políticos que constituíram a sociedade brasileira.

          Unitermos: História. Crônica esportiva. Futebol.

 

Abstract

          The book Letter pass: sports chronicle and Brazilian society consists of a collection of eight articles that used the chronicle as a methodological resource to discuss some social interfaces. Given the results of these articles, the book's organizers, among other appointments, pointed out that this contributes to the reflection of soccer meanders and politics that constituted the Brazilian society.

          Keywords: History. Sport Chronicle. Soccer.

 

Recepção: 11/07/2015 - Aceitação: 16/08/2015

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 20, Nº 207, Agosto de 2015. http://www.efdeportes.com

1 / 1

    O livro Passe de letra: crônica esportiva e sociedade brasileira é constituída por uma coletânea de oito artigos interdependentes, que, segundo os organizadores, utilizaram a crônica como recurso para discutir algumas interfaces sociais. Ele foi dividido em duas seções, estando alocados na seção I os artigos que trataram da compreensão da origem da crônica no Brasil, sua aceitação e sua utilização metodológica.

    O primeiro artigo, “A crônica esportiva como fonte para o estudo histórico”, de Luiz Carlos Ribeiro, apresentou as necessidades metodológicas para a produção de estudos históricos que ensejam utilizar a crônica, produto jornalístico surgido no século XIX, como fonte.

    Segundo o autor, para a sua utilização científica é necessário compreender lugar social e político de sua produção e o seu universo de circulação e recepção. Utilização possibilitada pelas crises dos paradigmas da análise da realidade e pela falta de instrumentos que dessem conta das emergentes problemáticas sociais. Nessa direção, a aproximação entre a História e a Literatura ocorreu devido à necessidade de compreensão da afetividade humana pelo historiador. E, por conseguinte, propiciou o estudo das especificidades que constituíram o futebol enquanto um elemento socialmente significativo. Mesmo assim, tem-se verificado certa dificuldade em estudar os aspectos estéticos desse esporte, pois o que tem predominado é a subordinação da obra literária aos contornos de uma atribuída função social. Em contrapartida a esta situação, as crônicas de Nelson Rodrigues foram utilizadas para mostrar que mais do que falar acerca do futebol, ele retratava o imaginário social do período, aspecto que acabou sendo redescoberto recentemente pelos estudiosos que buscam compreender os sentimentos presentes em uma determinada época.

    O segundo artigo, “História, literatura e esporte: representações do remo e do turfe nas crônicas brasileiras do século XIX/décadas iniciais do século”, de Victor Andrade de Melo, não abordou a interrelação literatura/futebol. O autor optou por utilizar como fonte as crônicas de Machado de Assis, Artur Azevedo, Afrânio Peixoto, Coelho Netto, Paulo Barreto, João do Rio, Raul Pompéia, Olavo Bilac e Carlos Laet, intentando discutir o contexto histórico subjacente ao desenvolvimento do remo de do turfe, esportes que antecederam a prática futebolística no Rio de Janeiro.

    Esses literatos destacavam a interrelação entre o remo, o ambiente, o público, as influências sobre a forma de tratar o corpo, a queda da resistência esportiva e a transformação da cidade. No mesmo sentido, verificou-se que o turfe dispunha de popularidade, aparecendo na imprensa antes do remo através de José Silva Paranhos, José de Alencar, Artur Azevedo, Machado de Assis e Olavo Bilac. Outras modalidades esportivas, com menor freqüência, também estavam presentes nas crônicas dos cronistas supracitados, como o ciclismo, o boxe, as brigas de galo, a patinação e as touradas. Desta forma, a observação dessas crônicas forneceu indícios acerca do processo de criação do campo esportivo brasileiro.

    No terceiro artigo, “Futebol em pauta: sentimentos e ressentimentos entre os literatos do início do século XX”, de André Mendes Capraro, a análise do discurso presente nas crônicas de Lima Barreto, Gilberto Amado e Coelho Neto, três dos principais escritores desse período, foi efetivada devido o objetivo de identificar os aspectos que influíam nos seus escritos. Os textos do primeiro cativavam efusivamente os leitores, pois o seu vocabulário era bastante sentimental, expresso por fragmentos típicos da época inerentes as suas lembranças, resultando na compaixão e na empatia social. As crônicas do segundo expressavam a sua verdadeira adoração pelo futebol, e uma das características mais marcantes destas era o memorialismo. Já os textos do terceiro eram normalmente marcados por um tom de melancolia, pois o seu objetivo principal era demonstrar o luto pela morte prematura de um filho esportista. Ao invés de causar adversidade, esse acontecimento resultou na veemente defesa do futebol. Por conseguinte, concluiu-se que tanto as ideologias como as posições esportivas dos escritores podem ser identificados mediante as suas produções literárias.

    No quarto artigo, “A relação entre a crônica e o futebol: alguns apontamentos históricos”, de José Carlos Mosko, realizou-se a contextualização da influência dos cronistas durante a consolidação do futebol no Brasil. No início do século XX as crônicas sociais e as crônicas específicas acerca do futebol eram consideradas modismos pelos intelectuais, no entanto, elas adquiriram espaço na indústria cultural e popularidade perante as massas. Essas produções jornalísticas eram caracterizadas tanto pelo envolvimento emocional quanto pela oscilação entre posições racionais e passionais. Por essas características, recebiam influência e influenciavam os seus leitores, criando ídolos, mitos, heróis e vilões. Desta forma, concluiu-se que crônica esportiva era uma forma discursiva de expressão capaz de atuar na estruturação do imaginário coletivo relacionado aos diversos aspectos do futebol, pois se filigranavam neste processo o status dos literatos e o capital simbólico dos veículos de comunicação para o qual eles escreviam.

    A seção I é finalizada com o artigo “O futebol em Nelson Rodrigues: uma pesquisa historiográfica acerca de literatura e identidade nacional”, de Natasha Santos, que analisou três estudos que abordaram a relação entre a identidade nacional e o futebol, utilizando as crônicas de Nelson Rodrigues como fonte. As representações de Nelson Rodrigues eram contrárias as proferidas pela intelectualidade da época, visto que ele acreditava que fracassos da seleção brasileira resultavam do “complexo de inferioridade” dos habitantes brasileiros perante os europeus, e não da qualidade individual e coletiva dos futebolistas. O literato/teatrólogo também não dispunha de um projeto político, pois as suas posições sofreram modificações no decorrer dos tempos.

    Depois da derrota na Copa do Mundo de 1966, Nelson Rodrigues defendeu a utilização da violência nos gramados, característica típica dos futebolistas europeus, desvio posicional realinhado com a conquista do tri-campeonato Mundial, em 1970. Desta forma, as fontes utilizadas nesse artigo proporcionaram a conclusão de que os estudos contemporâneos que utilizaram as crônicas Rodrigueanas convergem em um ponto, qual seja o de que o fracasso da nação dita moderna estava na tentativa frustrada de cultivar as aparências.

    Na sessão II estão alocados os artigos que utilizaram a crônica como recurso metodológico para compreender alguns acontecimentos históricos pontuais e os sentimentos presentes na sociedade brasileira, em diferentes momentos. O primeiro artigo da segunda sessão, “Copa do Mundo de 1950: a cultura da desculpa como justificativa de um fracasso”, de Miguel Archanjo de Freitas Jr., tratou da confirmação da idéia de inferioridade que incomodava a elite local, decorrente do fracasso no Mundial de 1950, pois eles acreditavam que a vitória diante dos uruguaios mostraria a força e cultura do Brasil. Por conseguinte, as crônicas publicadas no Jornal dos Sports foram utilizadas para expor o enredo literário de tentativa da manutenção da esperança nacional na consolidação do país enquanto grande potência. Esse projeto era defendido pelo cronista Mario Filho, que, então, passou a utilizar a “cultura da desculpa” para manter viva a sua ideologia, tendo predominado três assertivas como as principais justificativas, quais sejam a invasão política e midiática da concentração brasileira, o tapa sofrido por Bigode e o excesso de confiança dos jogadores e dos jornalistas. As justificativas mencionadas foram exaustivamente abordadas, alternando entre o fornecimento de indícios sobre os sentimentos presentes na sociedade daquele momento e a apresentação dos desejos não concretizados de alguns literatos.

    Desta forma, chegou-se a conclusão de que a disputa da final do Mundial acabou unindo o Brasil em três circunstâncias distintas, entretanto interdependentes: 1. Para visualizar a concretização do sonho ideologicamente consumado; 2. Para lamentar a derrota até então considerada impossível; 3. Para justificar o fracasso brasileiro. Esse acontecimento demonstra que o torcedor brasileiro atribuiu (e atribui) ao futebol os seus sonhos, as suas expectativas e as suas frustrações, tornando-o um campo bastante fértil para acessar aos valores e os sentimentos presentes em uma determinada conjuntura.

    O segundo artigo, “A imprensa uruguaia e a conquista do Mundial de 1950”, de Álvaro Vicente do Cabo, tratou da visão da imprensa do Uruguai sobre as interfaces da final do Mundial de 1950. Antes da conquista do mundial, as matérias descreviam os aspectos estruturais do pré-jogo, a relevância mundial e uruguaia da competição. Depois, abordaram a caracterização identitária da seleção nacional como uma equipe filigranada a raça, a valentia e ao coração, além da influência do seu capitão, Obdulio Varela, símbolo da identidade da população desse país.

    Na visão da imprensa do Uruguai, destacou-se também a boa organização do Mundial do Brasil, o bom comportamento da torcida local e a boa conduta dos jogadores brasileiros. Em função deste episódio, reforçou-se a identidade charrua enquanto símbolo da raça e da determinação. Não obstante, houve o enaltecimento de que apenas a prevalência técnica não é suficiente para determinar o vencedor de uma partida, e de uma Copa do Mundo de futebol.

    O livro é finalizado com o artigo, “O autoritarismo entra em campo: representações da cultura política na imprensa esportiva (1966-1970)”, de Euclides de Freitas Couto. O autor utilizou as crônicas escritas durante a conjuntura repressiva vivenciada pela sociedade brasileira, mais especificamente as do período subsequente a realização da Copa do Mundo de 1966 até correspondente a final do Mundial de 1970. Neste recorte temporal, houve a observação de um intenso debate acerca de qual estilo de jogo deveria ser internalizado pela seleção nacional, o “futebol arte” ou o “futebol força”, além das contradições identitárias filigranadas ao desejo de modernização.

    Outra percepção se refere à divisão da imprensa local em dois grupos distintos, quais sejam o que atribuía o sucesso da seleção de 70 a influência militar e ao sofisticado planejamento que oferecia condições técnicas, administrativas e organizacionais, e o que defendia que mesmo desprovidos de treinamento o Brasil também seria campeão, pois contava com os melhores craques, aqueles que desempenhavam o verdadeiro “futebol arte”. Desta forma, chegou-se a conclusão de que posterior a conquista do tri-campeonato, em 1970, a imprensa passou a valorizar, referente à seleção brasileira, a habilidade técnica filigranada a obediência, a disciplina e ao espírito coletivo.

    Diante dos resultados alcançados pelos oito artigos mencionados, os organizadores do livro, dentre outros aspectos, destacaram que este contribui para a reflexão dos meandros futebolísticos e políticos que permearam a sociedade brasileira. Por isso, fica a sugestão da leitura!

Bibliografia

  • Freitas JR., M. A.; Capraro, A. M. (Orgs.) (2012). Passe de letra: crônica esportiva e sociedade brasileira. Ponta Grossa: Vila Velha, 194p.

Outros artigos em Portugués

www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 20 · N° 207 | Buenos Aires, Agosto de 2015  
Lecturas: Educación Física y Deportes - ISSN 1514-3465 - © 1997-2015 Derechos reservados