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As percepções de futuros professores de 

Educação Física sobre si mesmos, os alunos e a escola

Las percepciones de los futuros profesores de Educación Física sobre sí mismos, los alumnos y la escuela

The perceptions of future teachers of Physical Education about themselves, the students and the school

 

*Doutor em Educação (UNICAMP/UFSM)

Doutor em Ciências do Movimento Humano (UFSM)

Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação Física (UFSM)

**Doutorando em Ciências Médicas (UFSC)

Professor da Universidade de Cruz Alta (UNICRUZ)

Hugo Norberto Krug*

hnkrug@bol.com.br

Rodrigo de Rosso Krug**

rodkrug@bol.com.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O objetivo deste estudo foi analisar as percepções de acadêmicos, futuros professores, de um curso de Licenciatura em Educação Física de uma universidade pública da região sul do Brasil sobre si mesmos, os alunos e a escola. Caracterizamos a pesquisa como qualitativa descritiva do tipo estudo de caso. O instrumento para a coleta de informações foi um questionário. A interpretação das informações foi feita por meio da análise de conteúdo. Participaram do estudo vinte acadêmicos do 8º semestre do referido curso. Concluímos que os acadêmicos estudados possuem uma percepção positiva sobre si mesmo, enquanto futuros docentes da educação básica e uma percepção praticamente dividida entre uma visão positiva e negativa dos alunos da educação básica e da escola de educação básica, enquanto palco de sua futura atuação profissional.

          Unitermos: Educação Física. Formação de professores. Formação inicial. Docência.

 

Abstract

          The objective this study was to analyze the perceptions of academics, future teachers, of a curse of Bachelor's Degree in Physical Education from a public university in southern Brazil about themselves, the students and the school. We characterized the research as qualitative descriptive of the type case study. The instrument for collection of information was a questionnaire. The interpretation of the information was made through of content analysis. The study included twenty students of the 8th semester of that course. We conclude that the students research have a positive perception about themselves, while future teachers of basic education and a perception practically divided between a positive and negative view of students of basic education and of school of basic education, while stage of their future acting professional.

          Keywords: Physical Education. Teacher formation. Initial formation. Teaching.

 

Recepção: 02/06/2015 - Aceitação: 08/07/2015

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 20 - Nº 206 - Julio de 2015. http://www.efdeportes.com/

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1.     As considerações iniciais: o contexto do estudo

    Atualmente, tendo como propósito a melhoria da qualidade do ensino no contexto escolar, as discussões sobre questões que envolvem a formação inicial de professores de Educação Física, se tornam cada vez mais relevantes e freqüentes, quando o objetivo é que o futuro professor se insira na educação básica seguro e detentor de conhecimentos que qualifiquem a sua própria identificação como educador nas suas ações junto aos seus alunos (Kronbauer e Krug, 2014).

    E, no direcionamento deste contexto, é importante salientar que, segundo Ferreira e Krug (2001a), o principal objetivo de um curso de Licenciatura em Educação Física é habilitar o futuro professor a ter consciência de seu papel como educador na docência da educação básica.

    Desta forma, os cursos de Licenciatura em Educação Física precisam propiciar aos acadêmicos, experiências profissionais que os coloquem frente à realidade na qual irão trabalhar futuramente. Nesse contexto, conforme Bernardi et al. (2008), o acadêmico vivencia situações em que resgata ou trás à tona suas experiências com o curso, adquiridas através de diferentes disciplinas oferecidas, para embasar e oferecer subsídios para a sua atuação como professor. Além disso, segundo Krug et al. (2015), é muito importante que o acadêmico, futuro professor, tenha uma compreensão da realidade atual de seu campo de atuação profissional, bem como consiga projetar para o futuro uma melhoria deste referido campo.

    Neste sentido, consideramos necessário desenvolver estudos que mostrem como os futuros professores percebem a si mesmo como docentes, os alunos e a escola como seu campo de atuação profissional, já que, para Sarmento e Fossati (2011, p. 47), a escuta e a problematização das percepções de futuros professores de Educação Física “sobre a profissão docente são fundamentais, pois podem apontar dimensões importantes a serem consideradas em sua formação inicial”.

    No direcionamento destas ideias, Pimenta (2008) destaca que o desafio dos cursos de formação inicial é o de colaborar no processo de passagem do acadêmico de se ver como aluno para o se perceber como professor, ou seja, de construir a sua identidade docente, onde os saberes da experiência são importantes, mas somente esses não bastam, são insuficientes. A docência representa um desafio e exige conhecimentos, competência e preparação específica para o seu exercício.

    Desta maneira, torna-se importante um curso de formação inicial de professores ir ao encontro da percepção dos acadêmicos sobre a visão de si mesmos enquanto professores, dos alunos e da escola como palco de atuação profissional.

    Assim, embasando-nos nestas premissas anteriormente citadas formulamos a seguinte questão problemática norteadora deste estudo: quais são as percepções de acadêmicos, futuros professores, de um curso de Licenciatura em Educação Física de uma universidade pública da região sul do Brasil sobre si mesmos, os alunos e a escola?

    A partir desta indagação delineamos o objetivo geral do estudo como sendo: analisar as percepções de acadêmicos, futuros professores, de um curso de Licenciatura em Educação Física de uma universidade pública da região sul do Brasil sobre si mesmos, os alunos e a escola. E, para facilitar o atingimento desse objetivo geral desmembramo-lo em objetivos específicos: 1) analisar as percepções de acadêmicos, futuros professores, de um curso de Licenciatura em Educação Física de uma universidade pública da região sul do Brasil sobre si mesmos enquanto futuros docentes; 2) analisar as percepções de acadêmicos, futuros professores, de um curso de Licenciatura em Educação Física de uma universidade pública da região sul do Brasil sobre os alunos da educação básica; e, 3) analisar as percepções de acadêmicos, futuros professores, de um curso de Licenciatura em Educação Física de uma universidade pública da região sul do Brasil sobre a escola enquanto palco de sua futura atuação profissional.

    Justificamos este estudo afirmando que pesquisas desta natureza oferecem subsídios para reflexões que podem despertar modificações no contexto da formação inicial de professores de Educação Física, bem como uma melhoria da qualidade desses profissionais para a atuação docente na escola.

2.     Os procedimentos metodológicos: o caminho do estudo

    Caracterizamos os procedimentos metodológicos usados neste estudo como uma abordagem qualitativa do tipo descritiva sob a forma de estudo de caso. Para Triviños (1987) a preocupação fundamental da pesquisa qualitativa é com a caracterização do fenômeno, com as formas que se apresenta e com as variações, já que o seu principal objetivo é a descrição. Segundo Godoy (1995) a pesquisa qualitativa envolve a obtenção de informações descritivas sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo contato direto dos pesquisadores com a situação estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos participantes da situação de estudo. Conforme Gil (1999) o estudo de caso se fundamenta na idéia de que a análise de uma unidade de determinado universo possibilita a compreensão da generalidade do mesmo ou, pelo menos, o estabelecimento de bases para uma investigação posterior, mais sistematizada e precisa. Assim, neste estudo, o caso investigado referiu-se a um determinado curso de Licenciatura em Educação Física de uma universidade pública da região sul do Brasil.

    Neste sentido, a justificativa da escolha da forma de pesquisa qualitativa, descritiva e estudo de caso foi devido à possibilidade de se analisar um ambiente em particular, onde se levou em conta o contexto social e sua complexidade para compreender e retratar uma realidade em particular e um fenômeno em especial, ‘algumas percepções dos futuros professores’.

    O instrumento utilizado para coletar as informações foi um questionário com três perguntas abertas. A cerca do questionário, Triviños (1987) diz que, mesmo sendo de emprego usual no trabalho positivista, também o podemos utilizar na pesquisa qualitativa. Já pergunta aberta “destina-se a obter resposta livre” (Cervo e Bervian, 1996, p.138). Assim, as questões norteadoras que compuseram o questionário estavam relacionadas com os objetivos específicos deste estudo e foram as seguintes: 1) qual é a sua visão de si mesmo como futuro professor de Educação Física da educação básica? 2) qual é a sua visão, como futuro professor, sobre os alunos da educação básica? 3) qual é a sua visão, como futuro professor, sobre a escola da educação básica, enquanto palco de sua futura atuação profissional?

    A interpretação das informações coletadas foi realizada por meio da análise de conteúdo, que é definida por Bardin (1977, p. 42) como um

    [...] conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.

    Para o autor, a utilização da análise de conteúdo prevê três etapas: 1ª) a pré-análise – trata do esquema de trabalho envolvendo os primeiros contatos com os documentos de análise, a formulação de objetivos, a definição dos procedimentos a serem seguidos e a preparação do material; 2ª) a exploração do material – trata do cumprimento das decisões anteriormente tomadas, isto é, a leitura de documentos, categorização, entre outros; e, 3ª) o tratamentos dos resultados – onde os dados são lapidados, tornando-os significativos, sendo que essa etapa de interpretação deve ir além dos depoimentos manifestados.

    Participaram do estudo vinte acadêmicos do 8º semestre de um curso de Licenciatura em Educação Física de uma universidade pública da região sul do Brasil. Consideramos que os acadêmicos no final do referido curso teriam mais pertinência para opinar sobre as questões levantadas. A escolha dos participantes aconteceu de forma espontânea, em que a disponibilidade desses foi o fator determinante. Quanto aos aspectos éticos vinculados às pesquisas científicas, destacamos que todos os envolvidos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e as suas identidades foram preservadas.

3.     Os resultados e as discussões do estudo: as percepções dos futuros professores de Educação Física sobre si mesmos, os alunos e a escola

    Os resultados e as discussões deste estudo foram orientados e explicitados pelos seus objetivos específicos, pois esses representaram as categorias de análise. Essa decisão está em consonância com o que afirmam Minayo, Deslandes e Gomes (2007) de que categorias de análise podem ser geradas previamente à pesquisa de campo. Assim, a seguir apresentamos o que expuseram os futuros professores de Educação Física sobre si mesmos, os alunos e a escola.

3.1.     As percepções dos futuros professores de Educação Física sobre si mesmos enquanto futuros docentes da educação básica

    Nesta categoria de análise sobre a percepção dos acadêmicos estudados sobre si mesmos, após a análise das informações coletadas, emergiram ‘oito unidades de significados’, descritas a seguir.

    ‘Ser competente’* (dez citações) foi a primeira e principal unidade de significado destacada. Em relação a esta unidade nos reportamos a Carreiro da Costa (1988) que evidencia que a maximização dos efeitos educativos decorre da competência do professor, mais especificamente, numa grande parcela, da competência pedagógica revelada pelo professor. Para Siedentop (1983) a competência pedagógica é o domínio da atividade do professor no processo pedagógico, entendido como uma relação de reciprocidade entre alunos e professor, sob a direção deste. Entretanto, saber muito a cerca do ensino não significa que seja um professor competente. Já Matos (1994) coloca que os conhecimentos são frequentemente designados como os componentes fundamentais da competência pedagógica do professor, pois não há competência sem conhecimentos. Sem conhecimentos não é possível formar capacidades, nem habilidades para a atividade pedagógica, que terão de serem trabalhadas em referências aos conhecimentos. Essa importância particular dos conhecimentos no desenvolvimento da competência pedagógica, resulta do fato de toda a ação consciente depender da existência de variados conhecimentos, pois ninguém ensina o que não sabe. O professor deve possuir conhecimentos objetivos a respeito de tudo o que for relevante para o processo pedagógico.

    Outra unidade de significado destacada, a segunda, foi ‘ser educador’* (oito citações). Sobre essa unidade citamos Luckesi (1992) que afirma que o professor educador é aquele que tendo adquirido o nível de cultura necessária para o desenvolvimento de sua função, dá direção ao ensino e à aprendizagem. Este assume o papel de mediador entre a cultura elaborada, acumulada e em processo de acumulação pela humanidade e o educando. O professor deverá fazer a mediação entre os resultados da cultura, ou seja, o coletivo da sociedade e o individual do aluno. O seu papel é o de mediador social entre o universo da sociedade e o particular do educando. Para que possa exercer sua função, o professor deve possuir conhecimentos e habilidades suficientes para poder auxiliar o aluno no processo de elevação cultural.

    ‘Gostar do que faz’* (sete citações) foi a terceira unidade de significado destacada. A respeito dessa unidade mencionamos Feil (1995) que diz que gostar do que se faz é um fator determinante para que o professor faça bem o seu trabalho. Já Cunha (1992) salienta que é comum professores afirmarem que gostam muito do que fazem e que certamente repetiriam a opção profissional se lhes fosse dado um novo optar. Os fatores da influência sobre a origem desta opção são variadas. Entretanto, parece ser possível inferir que a experiência positiva com a docência realimenta o gosto pelo ensino.

    A quarta unidade de significado destacada foi ‘ser comprometido’* (cinco citações). Relativamente a essa unidade apontamos Krug e Canfield (2001) que colocam que é no compromisso que reside uma das grandes razões para o bom desempenho do professor, pois o comprometimento pelo que faz inquieta e leva ao aprimoramento, provoca a busca de novas alternativas de ensino. Já segundo Freire (1996) ensinar exige comprometimento. A presença do professor não pode passar desapercebida dos alunos na classe e na escola, pois é uma presença em si política. Enquanto presença não pode ser de omissão, mas de um sujeito de opções. O professor deve revelar aos alunos a capacidade de analisar, de comparar, de avaliar, de decidir, de optar, de romper, de fazer justiça, de não falhar à verdade.

    ‘Ser compreensivo’* (quatro citações) foi a quinta unidade de significado destacada. Essa unidade pode ser fundamentada em autores como Pereira (1988) e Cunha (1992) que dizem que existe a necessidade do professor ser compreensivo, mas isso não deve ser confundido com ‘pieguismo filantrópico’, e sim como uma qualidade importante ao professor. Já Ferreira e Krug (2001b) colocam que professor compreensivo é aquele que sabe analisar situações inesperadas da melhor forma possível, usando de franqueza com os seus alunos. Entretanto, salienta que isto não quer dizer que tenha que ser um professor ‘bonzinho’ que aceita tudo.

    Também outra unidade de significado destacada, a sexta, foi ‘ser perseverante/persistente’* (três citações). Sobre essa unidade nos reportamos a Luft (2000) que afirma que perseverar significa conservar-se firme e constante; persistir, ir até o fim, sem se deixar demover ou abalar; continuar, permanecer. Persistir é continuar inflexível na mesma ideia ou intento; é perseverar, continuar, permanecer, perdurar.

    A sétima unidade de significado destacada foi ‘ser responsável’* (duas citações). Quanto a essa unidade apontamos Luft (2000) que diz que responsável é aquela pessoa que responde pelos seus atos ou pelos atos de outrem.

    A oitava e última unidade de significado destacada foi ‘ser desvalorizado’** (uma citação). Nessa unidade citamos Castilho, Charão e Ligabue (2004) que dizem que a desvalorização do professor é um processo antigo, pois com o passar do tempo essa categoria foi tendo uma mutação, ou seja, aconteceu uma desvalorização profissional e, quem mais sofre são os profissionais da rede pública de ensino.

    Ao efetuarmos uma análise geral sobre a percepção dos acadêmicos estudados sobre si mesmos, enquanto futuros docentes da educação básica, verificamos um rol de ‘oito unidades de significados’, sendo sete unidades com conotações ‘positivas’ (*) e uma com conotação ‘negativa’ (**). Luft (2000) coloca que positivo é algo que tende a auxiliar para a melhoria de alguma coisa. Assim, para esta investigação, consideramos positivo, o aspecto apontado pelos acadêmicos estudados que tendeu para auxiliar em uma boa imagem de si mesmo. Ainda Luft (2000) afirma que negativo é algo que contém ou exprime recusa, é contraproducente. Assim, para esta investigação, consideramos negativo, o aspecto apontado pelos acadêmicos estudados que tendeu para tornar contraproducente a imagem de si mesmo. Também verificamos que somando o número de citações de todas as unidades de significados chegamos às quantidades de trinta e oito com conotações ‘positivas’ (*) e, somente uma citação com conotação ‘negativa’ (**). Nesse sentido, podemos inferir que os acadêmicos estudados possuem, de forma geral, uma percepção positiva sobre si mesmo, enquanto futuros docentes da educação básica.

3.2.     As percepções dos futuros professores de Educação Física sobre os alunos da educação básica

    No processo de análise das informações coletadas, consideramos a percepção dos futuros professores de Educação Física sobre os alunos da educação básica como uma categoria de análise que deu origem a ‘três unidades de significados', as quais foram elencadas a seguir.

    ‘Os alunos são indisciplinados’** (nove citações) foi a primeira unidade de significado manifestada. Essa unidade pode ser respaldada em Aquino (1996) que destaca que, há muito tempo, os distúrbios disciplinares dos alunos deixaram de ser um evento esporádico e particular no cotidiano das escolas brasileiras, para se tornarem, talvez, um dos maiores obstáculos pedagógicos dos dias atuais. Também, está claro que a maioria dos educadores não sabe como interpretar e administrar o ato indisciplinado. Para Jesus (1999) a indisciplina dos alunos integra todos os comportamentos e atitudes perturbadoras, inviabilizando o trabalho que o professor deseja desenvolver.

    Outra unidade de significado manifestada, a segunda, foi ‘os alunos são seres aprendentes’* (oito citações). Sobre essa unidade nos reportamos a Boff (apud Castro, 2013) que salienta que o ser humano é um ser aprendente, um ser de abertura, um ser potencial, um ser utópico, porque sonha para além daquilo que é dado e feito. Sempre acrescenta algo ao real. É um ser nunca pronto e por isso aprendente.

    A terceira e última unidade de significado manifestada foi ‘os alunos são seres diversos, únicos’* (três citações). A respeito dessa unidade citamos Gimeno Sacristán (2001) que afirma que uma das características que nos definem como seres humanos é sermos únicos, diversos e heterogêneos; é o que demonstra a riqueza de nossa espécie, manifestada em uma complexidade inigualável, na vida somos uma multiplicidade de seres: homens, mulheres, brancos, negros, índios, ricos e pobres, urbanos e rurais, desenvolvidos e subdesenvolvidos, deficientes físicos, mentais, múltiplos, enfim, diferentes e iguais entre todos. Já Todorov (1993) destaca que a diversidade é o que caracteriza a espécie humana, pois não existem duas pessoas ou duas culturas iguais. O outro existe e é sempre um diferente. Ainda Silva (2013) que diz que o discurso ao redor da diversidade humana vem tomando importância, na atualidade, visto que ele lembra o esquecido, o não contatado, o deixado de fora, o expulso, o excluído, o diferente.

    Ao realizarmos uma análise geral sobre a percepção dos acadêmicos estudados sobre os alunos da educação básica, observamos um rol de ‘três unidades de significados’, sendo duas unidades com conotações ‘positivas’ (*) e uma com conotação ‘negativa’ (**). A partir da definição do que é positivo e negativo de Luft (2000), citado anteriormente, consideramos para esta investigação, como positivo o aspecto apontado pelos acadêmicos estudados que tendeu para auxiliar em uma boa imagem dos alunos e negativo, o aspecto que tendeu para tornar contraproducente a imagem dos alunos. Também verificamos que somando o número de citações de todas as unidades de significados chegamos às quantidades de onze com conotações ‘positivas’ (*) e nove com conotações ‘negativas’ (**). Nesse sentido, podemos inferir que os acadêmicos estudados possuem, de forma geral, uma percepção dos alunos da educação básica praticamente dividida entre uma visão positiva e uma negativa.

3.3.     As percepções dos futuros professores de Educação Física sobre a escola de educação básica enquanto palco de sua futura atuação profissional

    A construção do conhecimento, a partir das informações obtidas com os colaboradores do estudo, nesta categoria de análise, possibilitou a descoberta de ‘três unidades de significados’ apresentadas, neste momento, como fenômenos decorrentes das percepções dos futuros professores de Educação Física sobre a escola da educação básica, enquanto palco de sua futura atuação profissional.

    A primeira unidade de significado ressaltada foi ‘local/espaço com péssimas condições para o trabalho docente’** (quatorze citações). Quanto a essa unidade nos referimos a Farias, Shigunov e Nascimento (2001) que destacam que vários estudos realizados em escolas indicam que existem péssimas condições para o trabalho docente em Educação Física, pois ocorre uma falta de materiais e de locais, principalmente nas públicas, para o desenvolvimento das aulas. Além disso, Krug (2004) enfatiza que a falta de materiais e de espaço físico disponíveis para a realização das atividades é um fator que interfere negativamente na prática pedagógica dos professores de Educação Física. Já Santini e Molina Neto (2005) reforçam esta afirmativa abordando que a falta de espaços físicos fechados para as aulas de Educação Física acarretam vários problemas a serem superados no trabalho docente. Os alunos citam como desafios desta carência, por exemplo, as situações climáticas desfavoráveis, onde tanto professores como alunos estão expostos ao frio, umidade ou calor excessivo, e, frequentemente, os espaços destinados às aulas não suportam o número de alunos acarretando desordem e atitudes agressivas por parte dos alunos e ainda, por se tratar de um ambiente aberto, as aulas estão sujeitas às avaliações impróprias de colegas, alunos, pais ou funcionários, influenciando, desta forma, o bom desenvolvimento das atividades.

    ‘Local/espaço de preparação dos alunos para o mercado de trabalho’* (nove citações) foi a segunda unidade de significado ressaltada. Essa unidade pode ser respaldada por Libâneo (1994) que diz que a doutrina liberal defende a predominância da liberdade dos interesses individuais na sociedade e estabelece uma forma de organização social baseada na propriedade privada dos meios de produção, também denominada sociedade de classes, e sustenta a pedagogia liberal que tem como ideia de que a escola tem por função preparar os indivíduos para o desempenho de papéis sociais de acordo com as aptidões individuais. A tendência liberal tecnicista tem como função a preparação da mão-de-obra qualificada para a maximização da produção na indústria e à manutenção do Estado autoritário.

    A terceira e última unidade de significado ressaltada foi ‘local/espaço/campo de atuação profissional do professor de Educação Física’* (sete citações). Sobre essa unidade nos reportamos ao Parecer do Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno (CNE/CP) n.09 (Brasil, 2001) e a Resolução CNE/CP n.01 (Brasil, 2002) que colocam que o campo de atuação do licenciado em Educação Física é a escola de educação básica. Já Saviani (1999) destaca que a escola é um espaço formal de transmissão e construção de conhecimentos de forma crítica e contextualizada.

    Ao elaborarmos uma análise geral sobre a percepção dos acadêmicos estudados sobre a escola de educação básica, enquanto palco de sua futura atuação profissional, notamos um rol de ‘três unidades de significados’, sendo duas unidades com conotações ‘positivas’ (*) e uma com conotação ‘negativa’ (**). A partir da definição do que é positivo e negativo de Luft (2000), citado anteriormente, consideramos para esta investigação, como positivo o aspecto apontado pelos acadêmicos estudados que tendeu para auxiliar em uma boa imagem da escola e negativo, o aspecto que tendeu para tornar contraproducente a imagem da escola. Também verificamos que somando o número de citações de todas as unidades de significados chegamos às quantidades de dezesseis com conotações ‘positivas’ (*) e quatorze com conotações ‘negativas’ (**). Nesse sentido, podemos inferir que os acadêmicos estudados possuem, de forma geral, uma percepção da escola de educação básica, enquanto palco de sua futura atuação profissional, praticamente dividida entre uma visão positiva e uma negativa.

4.     As considerações finais: a interpretação do estudo

    Destacamos que as conclusões deste estudo não se findam neste momento, porque muitos outros aspectos podem ser levantados e discutidos em relação a este tema. Assim, o que escrevemos aqui são alguns pontos que os participantes trouxeram em seus depoimentos e que achamos significativos para ser apresentados. E, nesse direcionamento de ideia, citamos Lüdke e André (1986) que dizem que há necessidade de delimitar os focos de análise, pois nunca será possível explorar todos os ângulos do fenômeno num tempo razoavelmente limitado mesmo se tratando de uma pesquisa do tipo estudo de caso.

    Então, neste momento, foi fundamental ressaltarmos que este estudo assumiu como objetivo geral analisar as percepções de acadêmicos, futuros professores, de um curso de Licenciatura em Educação Física de uma universidade pública da região sul do Brasil sobre si mesmos, os alunos e a escola e que a partir de agora explicaremos o seu desiderato.

    Quanto às percepções dos futuros professores de Educação Física sobre si mesmos, enquanto futuros docentes da educação básica, constatamos a existência de ‘oito unidades de significados’: 1) ‘Ser competente’*; 2) ‘Ser educador’*; 3) ‘Gostar do que faz’*; 4) ‘Ser comprometido’*; 5) ‘Ser compreensivo’*; 6) ‘Ser perseverante/persistente’*; 7) ‘Ser responsável’*; e, 8) ‘Ser desvalorizado’**. Esse rol de significados aponta sete unidades com conotações ‘positivas’ (*) e uma com conotação ‘negativa’ (**). Já relativamente à quantidade de citações constatamos que somando o número de citações de todas as unidades de significados chegamos às quantidades de trinta e oito com conotações ‘positivas’ (*) e, somente uma citação com conotação ‘negativa’ (**).

    Quanto às percepções dos futuros professores de Educação Física sobre os alunos da educação básica, constatamos a existência de ‘três unidades de significados': 1) ‘Os alunos são indisciplinados’**; 2) ‘Os alunos são seres aprendentes’*; e, 3) ‘Os alunos são seres diversos, únicos’*. Esse rol de significados aponta duas unidades com conotações ‘positivas’ (*) e uma com conotação ‘negativa’ (**). Já em relação ao número de citações de todas as unidades de significados chegamos às quantidades de onze com conotações ‘positivas’ (*) e nove com conotações ‘negativas’ (**).

    Quanto às percepções dos futuros professores de Educação Física sobre a escola da educação básica enquanto palco de sua futura atuação profissional, constatamos a existência de ‘três unidades de significados’: 1) ‘Local/espaço com péssimas condições para o trabalho docente’**; 2) ‘Local/espaço de preparação dos alunos para o mercado de trabalho’*; e, 3) ‘Local/espaço/campo de atuação profissional do professor de Educação Física’*. Esse rol de significados aponta duas unidades com conotações ‘positivas’ (*) e uma com conotação ‘negativa’ (**). Já sobre o número de citações de todas as unidades de significados chegamos às quantidades de dezesseis com conotações ‘positivas’ (*) e quatorze com conotações ‘negativas’ (**).

    A partir destas constatações concluímos que os acadêmicos estudados possuem, de forma geral, uma percepção positiva sobre si mesmo, enquanto futuros docentes da educação básica e uma percepção praticamente dividida entre uma visão positiva e negativa dos alunos e da escola da educação básica, enquanto palco de sua futura atuação profissional. Nesse sentido, inferimos que o curso de Licenciatura palco deste estudo precisa trabalhar mais com seus acadêmicos, futuros professores, a complexidade de ser professor de Educação Física e sua atuação na escola, para que os mesmos tenham uma visão mais positiva das suas possibilidades de docência na escola frente aos alunos da educação básica.

    Para finalizar, destacamos que é preciso considerar que este estudo fundamentou-se nas especificidades e nos contextos de um curso de formação inicial de professores em específico e que por isso não pode ser generalizado os seus achados.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 20 · N° 206 | Buenos Aires, Julio de 2015  
Lecturas: Educación Física y Deportes - ISSN 1514-3465 - © 1997-2015 Derechos reservados